Discurso durante a 30ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas às opiniões expressadas sobre o assassinato de Marielle Franco, Vereadora do Rio de Janeiro (RJ).

Críticas à Marília de Castro Neves, Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (RJ), pelos comentários aos professores com síndrome de Down.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA:
  • Críticas às opiniões expressadas sobre o assassinato de Marielle Franco, Vereadora do Rio de Janeiro (RJ).
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Críticas à Marília de Castro Neves, Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (RJ), pelos comentários aos professores com síndrome de Down.
Publicação
Publicação no DSF de 21/03/2018 - Página 80
Assuntos
Outros > SEGURANÇA PUBLICA
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • CRITICA, DIVULGAÇÃO, OPINIÃO, INFORMAÇÕES, AUSENCIA, VERDADE, ASSUNTO, HOMICIDIO, MARIELLE FRANCO, VEREADOR, RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MOTIVO, ATIVISTA, DEFESA, DIREITOS HUMANOS, REFERENCIA, OMISSÃO, JAIR BOLSONARO, DEPUTADO FEDERAL, ENTREVISTA, JORNAL, EL PAIS, RELATORIO, AUTORIA, ORADOR, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MORTE, JUVENTUDE.
  • CRITICA, OPINIÃO, AUTORIA, DESEMBARGADOR, TRIBUNAL DE JUSTIÇA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ASSUNTO, DISCRIMINAÇÃO, PROFESSOR, SINDROME DE DOWN, REFERENCIA, REPRESENTAÇÃO, CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), IMPORTANCIA, EDUCAÇÃO, PAIS.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Senador Dário, eu agradeço ao Senador Paulo Rocha.

    Estava escutando o discurso importante da Senadora Rose de Freitas. Eu vim também falar sobre isso, Senadora Rose de Freitas.

    Há uma segunda morte da Marielle aí. Assassinaram a Marielle e o Anderson, um crime duríssimo, político, e agora preparam uma segunda morte simbólica. A morte de Marielle foi um atentado político. O assassino pretendeu matar mais do que o corpo físico de Marielle; também pretende alvejar o corpo simbólico.

    No Brasil cresceu um perigoso vírus. Grupos e pessoas pretendem romper as normas básicas da civilização. Esse segundo assassinato simbólico está em pleno curso. Quem são os assassinos simbólicos de Marielle e de Anderson?

    Em editorial, que eu peço que seja transcrito nos Anais, o jornal El País nomeia alguns dos personagens e suas suspeitas atitudes. "Jair Bolsonaro – fala o jornal El País – não se atreveu a dizer uma palavra depois do assassinato político que comoveu o País. Segundo assessores, não quer falar para não ser polêmico."

    Fale, Sr. Bolsonaro! O silêncio é a arma dos covardes. Fale, senhor candidato! Explique por que não condenar o crime de uma política democrática.

    Eu não sei os motivos racionais ainda do assassinato, da execução. Agora, com certeza, eu digo uma coisa: aqueles que atiraram na cara de Marielle tinham uma ideologia ali por trás, de que defender direitos humanos é defender bandido. Atiraram com raiva. Todos esses que constroem esse discurso de ódio foram um pouco cúmplices dessa execução de Marielle.

    Nada mais vai nos surpreender nesse Sr. Bolsonaro, de o termos visto, algumas semanas antes, posando com o cartaz: "Direitos humanos: esterco da vagabundagem".

    Houve essa base ideológica.

    O MBL, em sua habitual mistura de ousadia e ignorância, lança uma teoria destinada a revolucionar a ciência política. Segundo o MBL, todos os assassinos, todos os assassinatos, absolutamente todos são políticos. O pior é que em seu afã de levantar todos os dias uma trincheira, se prestaram a agir como veículo para espalhar uma série de mentiras, que além de manchar a memória da vítima, servem no fundo de justificativa para o seu assassinato.

    O álibi dos difamadores é simplesmente compartilhar mentiras alheias fisgadas nas redes. Esse é o álibi dessa incrível Desembargadora Marília de Castro Neves, do TJ do Rio de Janeiro. A desembargadora disse que Marielle estava "engajada com bandidos"; "não era apenas uma lutadora"; "a tal Marielle descumpriu compromissos assumidos com seus apoiadores, que seriam do Comando Vermelho".

    Aqui, novamente, Senador Dário, quero chamar a atenção para o editorial do jornal El País. Essa cobertura internacional é muito melhor do que o que está sendo feito pela imprensa aqui no Brasil.

    Diz o editorial do El País:

Depois do que aconteceu nos últimos dias, fica mais claro do que nunca que não se trata de uma batalha entre direita e esquerda, nem de Governo contra oposição. A reação majoritária, acima das diferenças ideológicas, foi própria de uma sociedade democrática como a brasileira. Mas há outra corrente que percorre o país há tempo e que propõe um dilema que vai muito além do jogo político habitual: a civilização ou a barbárie.

    Hoje aqui, mais cedo, também trouxe a posição dessa Desembargadora Marília de Castro Neves, que postou críticas a professores com síndrome de Down.

    Amanhã é o Dia Internacional da Síndrome de Down, dia 21 de março. Foi uma vitória conquistada cinco anos atrás, por iniciativa do Governo brasileiro, na Organização das Nações Unidas. Eu estava lá na criação desse dia, que virou o dia internacional.

    Essa Desembargadora Marília de Castro Neves diz o seguinte, ao se referir à Profª Débora Seabra, primeira professora com síndrome de Down no País... Fez uma carta em resposta e a postagem é preconceituosa da Desembargadora Marília de Castro Neves.

    Eu já li isso hoje à tarde. Eu não vou ler novamente, porque eu li essa carta vergonhosa dessa desembargadora, e eu não quero ler novamente tamanho desrespeito. E eu falo aqui como pai de uma criança de sete anos que tem síndrome de Down.

    Mas eu quero, sim, ler um trecho da resposta da professora a essa desembargadora:

Eu ensino muitas coisas para as crianças. A principal é que elas sejam educadas, tenham respeito pelas outras, aceitem as diferenças de cada uma, ajudem a quem precisa mais. [...] O que eu acho mais importante de tudo isso é ensinar a incluir as crianças e todo mundo para acabar com o preconceito porque é crime. Quem discrimina é criminoso.

    Ela fez uma carta aqui de próprio punho, uma carta belíssima, sem um erro de Português, mas foi uma grande resposta, porque a Débora Araújo tem 36 anos e trabalha há 13 como professora auxiliar em uma escola particular de Natal – escola particular! Ela é ainda autora de livro infantil chamado Débora Conta Histórias. Por ser considerada exemplo no desenvolvimento de ações educativas no País, ela recebeu, em 2015, o Prêmio Darcy Ribeiro de Educação em Brasília.

    A Desembargadora Marília de Castro Neves já havia se envolvido em uma polêmica na última semana, como citei aqui, com a Vereadora Marielle Franco.

    Agora, por causa dessa postagem, uma representação contra a desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio foi protocolada no Conselho Nacional de Justiça. E eu, sinceramente, Senador Dário, espero que o Conselho Nacional de Justiça seja rigoroso e tome uma decisão firme, porque isso aqui não pode ser uma desembargadora. Que irresponsabilidade! Eu fico pensando que Justiça é essa que a gente está vivendo aqui.

    E V. Exª, Senador Dário, hoje falou aqui muito bem sobre a necessidade de uma intervenção social, de mais investimentos em educação, de mais políticas públicas para a juventude. Eu quero trazer alguns dados para V. Exª aqui.

    Há um estudo feito pelo Ipea, do Prof. Daniel Cerqueira, que diz o seguinte: para cada 1% a mais de jovens entre 15 e 17 anos nas escolas, há uma diminuição de 2% da taxa de assassinatos nos Municípios. Está no estudo do Ipea. As chances de homens com menos de sete anos de estudo sofrerem homicídios são 15,9 vezes maiores do que as daqueles com nível universitário.

    Tem mais, para reforçar o discurso de V. Exª.

    Um aumento de 1% na taxa de desemprego dos homens jovens, de 15 a 29 anos, contribui para um aumento da taxa de homicídios no Município em questão de 2,5%. Ou seja, 1% a mais de desemprego, 2,5% a mais de homicídios! Há uma correlação direta aqui.

    O Rio de Janeiro foi um dos Estados que mais sofreram com o aumento do desemprego nesses últimos três anos, de acordo com a pesquisa do IBGE. O número de desempregados saltou de 494 mil para 1,2 milhão. Uma alta de 157%.

    Eu chamo a atenção para o fato de que boa parcela desses números está ligada ao fim da política de conteúdo local, que destruiu a indústria naval, que cresceu ali, junto com o setor de petróleo e gás.

    Tem mais, reforçando o discurso de V. Exª.

    Falando da política e do próprio Bolsa Família. O aumento de renda da família do adolescente reduz o incentivo à necessidade de esses jovens se envolverem em crimes por motivação econômica. E aqui também o estudo do Ipea apresenta vários números.

    Eu, Senador Dário Berger, quero encerrar dizendo que V. Exª fez um pronunciamento correto. Eu fico vendo agora o General Braga Netto, que foi nomeado interventor no Rio de Janeiro... Ele disse que precisava de R$3,1 bilhões, e esse governo que está aí falou em R$800 milhões. Depois, falou em R$1 bilhão. De R$3,1 bilhões, R$1 bilhão só para pagar salário atrasado, R$600 milhões para pagar fornecedores atrasados e R$1,5 bilhão para começar a fazer custeio e investimento.

    Eu sempre, desde o começo desse processo de intervenção, disse que essa política de austeridade econômica, de ajuste fiscal, estava agravando a situação. No Rio, é isto: salários atrasados, carros sem manutenção... E eu vejo que nem num momento como este, de aperto, este Governo modifica a sua política de austeridade fiscal, que está expressa naquela Emenda Constitucional nº 95.

    Eu encerro dizendo que não têm sido fáceis esses dias. Tudo o que a gente viveu, tudo o que viveu o Rio de Janeiro, a execução de Marielle e do Anderson, essas declarações, envergonham. Eu fico pensando que País é este em que, nas elites, acima de dez salários mínimos, quem lidera a pesquisa de opinião no País é Jair Bolsonaro? No povo, não. Lula tem mais que o dobro de Bolsonaro. Mas eu fico pensando que elite é essa que defende isso aqui, que aplaude coisas irresponsáveis como essa, que não tem um mínimo de sentimento de civilidade?

    É muito grave o que a gente está vivendo, Senador Dário. Eu, quando vejo toda essa campanha de ódio feita, fico olhando, puxa! E agora com o Presidente Lula...

    Então, encerro dizendo que, com o Presidente Lula, e eu fico olhando declarações inclusive da Presidente do Supremo Tribunal Federal, falando que não pode haver casuísmo. O casuísmo é justamente porque é o Lula, porque hoje há uma nova maioria no Supremo Tribunal Federal. Mas o Lula também é vítima desse processo, que é um processo que não aceita que o povo brasileiro tenha protagonismo, não aceita jovens negros, moradores das periferias, não aceita o que Lula representa, o que Marielle representa.

    A denúncia da Marielle, eu fico vendo como querem pasteurizar o que significa Marielle, uma mulher que lutou e defendeu posições extremamente avançadas, dizia que essa política de guerra às drogas não adiantava nada, dizia que era necessário reformar as polícias, porque não bastava apenas uma operação militar.

    Nós vamos encontrar forças nesses exemplos para resistir e para lutar.

    Esse golpe nós vamos derrotar, como derrotamos o golpe militar que houve lá atrás, em 64. Na próxima semana, dia 28 de março, vai fazer 50 anos do assassinato do estudante Edson Luís, no Calabouço, no Rio de Janeiro.

    A partir daquele 28 de março, começou a haver um processo de resistência. Tivemos a passeata dos 100 mil. É claro que depois houve o AI-5. Mas eu não tenho dúvida também de que em outro março, 50 anos depois, a luta de Marielle vai fazer novos lutadores surgirem neste País para defender a democracia, para defender a inclusão do povo negro, que é massacrado, porque, como falou o Senador Dário Berger, são assassinados em média 30 mil jovens por ano, 77% são jovens negros que estão morrendo nessa guerra nas mãos da milícia, do tráfico, de uma polícia completamente despreparada.

    Senador Dário Berger, agradeço a V. Exª.

    E hoje, neste horário, já deve ter havido a Missa de Sétimo Dia da Marielle, ou está havendo neste momento; outro dia de mobilização, porque as mobilizações têm sido cotidianas, não só no Rio de Janeiro, mas no Brasil, porque a Marielle simboliza isto: essa profunda exclusão, esse extermínio, extermínio que, no relatório que apresentei na CPI sobre extermínio dos jovens, classifiquei na verdade como genocídio da juventude negra brasileira.

    Muito obrigado.

DOCUMENTO ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR LINDBERGH FARIAS.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

    Matéria referida:

     – Como escreve corretamente o editorial de El País.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/03/2018 - Página 80