Discurso durante a 39ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com os efeitos jurídicos de eventual decisão favorável do STF no habeas corpus de ex-Presidente Lula.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Preocupação com os efeitos jurídicos de eventual decisão favorável do STF no habeas corpus de ex-Presidente Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 04/04/2018 - Página 14
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • PREOCUPAÇÃO, ASSUNTO, RESULTADO, JULGAMENTO, HABEAS CORPUS, IMPETRAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, LOCAL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), MOTIVO, AMPLIAÇÃO, UTILIZAÇÃO, DECISÃO, DIREITO A LIBERDADE, REU, CONDENADO, SEGUNDA INSTANCIA.

    A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Senador Antonio Carlos Valadares, caros colegas Senadores, nossos telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, é inescapável hoje ou nesta semana tratar da questão relacionada ao exame que o Supremo Tribunal Federal deve fazer sobre um habeas corpus que terá repercussões não só sobre uma pessoa, uma figura, mas repercussão sobre todo o campo jurisdicional brasileiro.

    E não me refiro apenas a crimes do colarinho branco, corrupção envolvendo agentes públicos ou empresários, mas também estou me referindo a sequestradores, estou me referindo a estupradores, estou me referindo àqueles que cometem crimes, como o caso histórico de um fazendeiro, Omar Coelho Vítor, que foi beneficiado pela decisão da nossa Suprema Corte de 2009 – bastante tempo, portanto – de dar ao réu o direito de ficar em liberdade até o processo transitar em julgado.

    Esse assassino, que matou um jovem por ciúme, nunca cumpriu a pena. Seu recurso contra a condenação – está hoje informado no Jornal O Globo –, em segunda instância, passou 12 anos – 12 anos! – no STJ e o crime foi considerado prescrito em 2014. Se isso não é um estímulo à impunidade e um estímulo à criminalidade, então não existe outra receita para explicar porque no nosso País a violência grassa do jeito que grassa.

    Até 2009, o colegiado dos Ministros da Suprema Corte nunca havia decidido sobre quando um condenado deve começar a cumprir a pena. As duas Turmas da Corte votavam caso a caso, com decisões muitas vezes divergentes. Pois só em 2016, por duas oportunidades, no mês de fevereiro e no mês de outubro, confirmado, é que o Supremo Tribunal Federal deliberou colegiadamente sobre essa matéria, considerando, sim, que a prisão após a segunda instância deveria ocorrer.

    Então, não estamos falando de coisa nova, estamos falando simplesmente de segurança jurídica, porque não se pode imaginar que numa Copa do Mundo, num jogo da Seleção Brasileira ou qualquer outra seleção, as regras do jogo do campeonato mundial, que agora acontece na Rússia, sejam mudadas para beneficiar este ou aquele lado.

    É isto, simplesmente isto o que se quer fazer: a mudança da regra do jogo com o jogo andando. O que dizer de todos esses presos que estão com base na investigação feita pela Lava Jato, que, definida essa questão, e ela não vai se limitar exclusivamente ao recurso do habeas corpus de uma figura... Engana-se, porque ela vai, na visão dos especialistas – e eu não sou especialista, mas me valho de quem sabe e entende do Direito –, vai valer para abrir a porteira, e vários estupradores e vários criminosos, sejam de colarinho branco ou de outra natureza de crime, vão ser beneficiados por esse liberalismo, que agora está se querendo impor ao Supremo Tribunal Federal.

    E a Suprema Corte tem que entender claramente do que vai deliberar. É selar, dar um tiro de misericórdia na Operação Lava Jato, que é um consenso nacional? Vai estimular estupradores a continuarem praticando os crimes? Ou vai cuidar e vai zelar para resguardar e mitigar a impunidade que graça em nosso País?

    Queria me valer também das manifestações, que, para alguns, surpreendem. E a sociedade, e a democracia funciona exatamente para que dê abrigo às divergências e aos diferentes pontos de vista que tratam do mesmo assunto. Então, para uns é surpreendente que magistrados ou representantes do Ministério Público, seja do Ministério Público Federal ou dos Estados, encaminhem um manifesto recomendando uma deliberação. O argumento é: imagine se os ministros não têm capacidade para fazer uma interpretação adequada. É aceitável esse argumento. Só que, para essas mesmas pessoas que fazem esse julgamento ou essa crítica, é bom lembrar que o que a Suprema Corte deliberar vai balizar, vai pautar as decisões da própria Justiça, porque a Suprema Corte é que diz e que dá o nível e o limite do julgamento.

    Então, o que a Suprema Corte fará é dizer que daqui para diante vai ser assim, ou o passado terá que ser modificado. E aí é que está o perigo. E aí é que está o risco da decisão que será tomada amanhã.

    Se assim é válido, que magistrados e também promotores encaminhem um manifesto pela democracia – que permite isso, nós não vivemos num regime totalitário – e, também da mesma forma, advogados liderados pela OAB vão ao Supremo para pedir exatamente o contrário do que magistrados e procuradores estão solicitando. A democracia é assim. E aqui, no Senado também, o Senador Lasier Martins leve ao Supremo um manifesto assinado por vários Senadores, pedindo que o Supremo simplesmente preserve aquela convicção que foi manifestada em 2016 por duas oportunidades. Isso é segurança jurídica para o nosso País.

    E essa percepção que temos em relação à segunda instância não é só o Brasil que defende ou, na sua maioria, pelas suas instâncias jurisdicionais, mas são também países como os Estados Unidos, como a França, cuja democracia e cujo valor institucional do seu Poder Judiciário dispensam qualquer avaliação de critérios de valor ou de relevância.

    Aliás, a Procuradora-Geral da República, Drª Raquel Dodge, hoje, na sessão do Conselho Superior do Ministério Público, disse que o princípio da presunção de inocência é garantia importante em todos os países, mas que, sublinho, a execução de uma pena após quatro instâncias é exagero que aniquila o sistema de Justiça, "porque uma Justiça que tarda é uma justiça que falha" – uma Justiça que tarda é uma justiça que falha.

    Essa é uma palavra que precisa balizar a compreensão desse tema, porque "o princípio da presunção da inocência – acrescentou ela – é uma garantia individual importante em todos os países. É importante também no sistema jurídico brasileiro. No entanto, apenas no Brasil, o Judiciário vinha entendendo que só se pode executar uma sentença após quatro instâncias judiciais confirmarem uma condenação. Esse exagero aniquila o sistema de Justiça exatamente – e ela repete – porque uma Justiça que tarda é uma justiça que falha", disse a Procuradora, Drª Raquel Dodge.

    O julgamento do habeas corpus do ex-Presidente da República valerá apenas para o caso específico do ex-Presidente, mas pode indicar – e aí está o risco e o perigo – uma mudança no posicionamento firmado pela Corte, no ano de 2016, como mencionei, quando a Suprema Corte reconheceu a possibilidade de execução imediata da pena...

(Soa a campainha.)

    A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) – ...após condenação em segunda instância.

    Estou encerrando, Sr. Presidente.

    "Esse é, provavelmente – como reconheceu a Procuradora Raquel Dodge –, um dos julgamentos mais importantes da história do Supremo Tribunal Federal exatamente porque vem na esteira de uma modificação da Constituição brasileira e do novo Código de Processo Civil na expectativa de garantir resolubilidade ao sistema criminal – em nosso País – do Brasil", conforme a convicção da Drª Raquel Dodge.

    Ela também criticou o sistema recursal que, para ela, apenas atende aos mais afortunados que podem pagar advogados caríssimos para evitar o julgamento final e o cumprimento da pena.

    Eu queria apenas dizer que ainda estão pendentes de julgamento definitivo, pelo Plenário, duas ações genéricas sobre essa questão. A Ministra Carmem Lúcia...

(Interrupção do som.)

    A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) – ...já afirmou, Sr. Presidente, que não pretende pautar essas ações. Segundo ela, faz apenas dois anos que o Supremo analisou a questão favorável à prisão após segunda instância.

    Então, é disso que estamos tratando e é disso que nós precisamos que o Supremo Tribunal Federal dê uma resposta adequada, sem lesar o princípio da presunção de inocência, como está reafirmado aqui em todos esses posicionamentos.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/04/2018 - Página 14