Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação contrária ao Projeto de Lei do Senado nº 626, de 2011, que trata do cultivo de cana-de-açúcar na Amazônia.

Autor
Paulo Rocha (PT - Partido dos Trabalhadores/PA)
Nome completo: Paulo Roberto Galvão da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO:
  • Manifestação contrária ao Projeto de Lei do Senado nº 626, de 2011, que trata do cultivo de cana-de-açúcar na Amazônia.
Aparteantes
Flexa Ribeiro.
Publicação
Publicação no DSF de 28/03/2018 - Página 45
Assunto
Outros > AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO
Indexação
  • CRITICA, PROJETO DE LEI, OBJETIVO, AUTORIZAÇÃO, CULTIVO, CANA DE AÇUCAR, LOCAL, REGIÃO AMAZONICA.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, sem dúvida nenhuma, o que o nosso Líder está repercutindo e contra o que nós do Partido dos Trabalhadores nos rebelamos é porque nós fazemos parte de uma geração que entrou na política exatamente com rebeldia, para construir um País que fosse de todos, para construir uma Nação que desse oportunidades iguais para todos os brasileiros e brasileiras e para aqueles que aqui vivem, através de um processo que construímos e conquistamos, que é a democracia no nosso País.

    Então, nós vamos nos rebelar contra todos aqueles, sejam fascistas, sejam parte do Judiciário ou do poder econômico... Nós haveremos de nos rebelar e pregar, em alto e bom som, que, num País como o Brasil, desse tamanho, com toda a potencialidade de riqueza para se desenvolver e com toda essas diferenças regionais, de raça, de cultura e de economia, só a democracia é que recupera e cria condições de o povo conquistar um governo que leve adiante aquilo que nós já havíamos conquistado.

    Nós, do Partido dos Trabalhadores, temos autoridade perante o País, porque foi através dos governos do PT e da democracia, junto com nossos aliados, que estávamos levando o País a um desenvolvimento, com inclusão social, com distribuição de renda, com oportunidade para todos.

    Com o golpe, com o impeachment da Presidenta Dilma, nós estamos vivendo um retrocesso ao qual levaram o nosso País.

    Nós não haveremos de nos calar enquanto não conquistarmos o processo democrático. Isso vai ser demonstrado a partir das eleições de 2018, quando todos terão oportunidade de disputar os seus projetos políticos, principalmente o companheiro Lula, que já deu demonstração das responsabilidades e da capacidade de levar este País a ser uma Nação de oportunidade para todos e para todas.

    Mas eu gostaria de trazer um tema aqui que foi produto da discussão, na semana passada, a partir de um projeto de um Senador da Amazônia. É o Projeto de nº 626, de 2011, que permite o plantio de cana-de-açúcar na Amazônia.

    Discordo da proposta, como filho da região, nascido na área rural, por entender que a natureza já nos ensina que uma floresta heterogênea, como é a questão da Floresta Amazônica, que não comporta projetos de monocultura, pois traz consequências graves não só para a questão ambiental, mas também para a própria economia da nossa região.

    A Amazônia foi concebida de uma forma equivocada e de uma visão elitista. Para desenvolvê-la, só a partir dos grandes projetos: dos grandes projetos minerais, dos grandes projetos agropecuários ou, agora, dos grandes projetos de produção de energia. Por isso, há o argumento de que o plantio da cana-de-açúcar era somente em áreas degradadas.

    Ora, permitir o cultivo de cana na Amazônia, mesmo em áreas degradadas, significa plantar mais uma ferramenta para o desmatamento, isso sem mencionar o alto custo de investimento que será necessário à recuperação. Defendo que, em vez de os clarões de capim existentes na floresta sejam ainda maiores, as áreas alteradas e degradadas sejam substituídas por espécies nativas da Amazônia, que podem gerar renda e alimentos para a população.

    As espécies florestais – inclusive com madeiras nobres, porque lá já existe um projeto de manejo na exploração das madeiras –, como também outras plantas, inclusive medicinais, como a andiroba, ou plantas muito importantes, que servem inclusive de produção de alimentos até de exportação, como o cupuaçu, o açaí, a pupunha, o cacau e outras, que não só regeneram a floresta e permitem que se façam consórcios, equilibrando o ambiente e assegurando o espaço para culturas alimentares, inclusive a própria mandioca ou outros tipos de produção de gêneros.

     A justificativa do projeto é que o cultivo de cana permite a valorização do etanol, como commodity energética. Mas nós já sabemos que a cana-de-açúcar não é a única alternativa para a produção de etanol. Existe pesquisa, experimento, inclusive da Universidade Federal do Tocantins com o uso da batata, uma batata que eles conseguiram produzir para a produção de etanol.

    Eu estive em Palmas, em março de 2015, na inauguração de uma usina de etanol. Um empreendimento financiado pela Sudam, em parceria com a Universidade Federal do Tocantins, revelou que a batata-doce tem a capacidade de produção superior à da cana-de-açúcar na produção de etanol, tanto como o resíduo quanto como o hidrato, para a produção de ração. E o mais importante: não necessita de queimadas e pode ser usada nas áreas degradadas, porque ficam até 14 meses embaixo do solo. Uma tonelada de batata-doce pode produzir até 170l de álcool e 300kg de resíduos úmidos, que se transformam em 150kg de farelo com o mesmo teor proteico do farelo de soja.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Permite um aparte, Senador Paulo Rocha?

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Permito sim.

    Outra vantagem é que o etanol da batata-doce abre oportunidade para os pequenos e médios trabalhadores rurais da Amazônia e do norte do Brasil, que podem desenvolver a cultura nas áreas já abertas na floresta, sem a utilização de agroquímicos, mas através de técnicas da agroecologia, em consórcio com outras espécies que asseguram a renda ao agricultor o ano inteiro e mantêm o solo equilibrado.

    Outro argumento, Senador Flexa, para ser contrário ao projeto é que existe um zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar para a produção de etanol, que exclui o bioma amazônico. Mas o investidor poderá implantar seus projetos em outras áreas, já que o Brasil dispõe de 64,7 milhões de hectares de áreas aptas à expansão do cultivo da cana-de-açúcar.

    Cedo o aparte.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Senador Paulo Rocha, conheço V. Exª e sei que V. Exª está usando argumentos que lhe foram passados pelos que trabalham contra o projeto, contra o desenvolvimento da Amazônia e do nosso Pará. V. Exª, quando fala em monocultura, eu perguntaria se plantio de soja não é monocultura também. É monocultura. E V. Exª sabe que a soja está em expansão, é uma nova fronteira no Estado do Pará em áreas alteradas – em áreas alteradas.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Não é verdade. Não é só em área alterada, já avançou na floresta também.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Não, não existe plantio de soja em floresta, porque o plantio de soja tem que ser em áreas planas para que haja a colheita mecânica. Então, área que tenha ondulação, que tenha topografia acidentada não planta soja, muito menos em floresta. O projeto a que V. Exª está se colocando contrário é um projeto que não agride a floresta em nenhum centímetro; ele apenas utiliza as áreas antropizadas. Eu pergunto a V. Exª: por que, nessas áreas antropizadas, pode-se plantar soja, pode plantar-se milho, pode-se plantar cacau, pode-se plantar capim e não se pode plantar cana?

(Soa a campainha.)

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – V. Exª sabe que foi implantado um projeto, lá em Medicilândia, de uma usina de álcool e açúcar. Diga-me quem eram os produtores de cana para essa usina.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Por isso que faliu.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Eram os assentados do Incra.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Por isso que faliu.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Não foi por isso, não, e V. Exª sabe muito bem por que faliu.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Faliu.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Não foi por isso. Não foi por isso. Então, já houve apoio do governo. É evidente que não foi do governo do PT, mas do governo lá dos militares, que tinham uma visão diferenciada para a Amazônia. V. Exª se referiu, Senador Paulo Rocha, ao zoneamento econômico e ecológico.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – O seu Presidente Lula, quando...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Quando mandou fazer o zoneamento econômico e ecológico da soja, ele mandou retirar a Amazônia. O zoneamento econômico e ecológico exclui a Amazônia. Ora, como pode? V. Exª tem conhecimento do estudo da Esalq.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – A Amazônia e o Pantanal. A Amazônia e o Pantanal.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – A Amazônia e o Pantanal!

    O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. PMDB - CE) – Senador, vamos começar a Ordem do Dia.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Se V. Exª me der a oportunidade de concluir meu aparte...

    O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. PMDB - CE) – Eu já prorroguei duas vezes o tempo. Então, vamos para a Ordem do Dia.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Eu pedi um aparte ao Senador Paulo Rocha.

    O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. PMDB - CE) – Conclua o aparte de V. Exª. Conclua o aparte, por favor.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – Então, Senador Paulo Rocha, eu tenho certeza absoluta de que V. Exª vai refletir sobre o projeto e vai ver que ele visa a uma única coisa, que é gerar emprego e renda no nosso Estado, inclusive nas áreas de assentamento, porque, como já foi feito, pode ser feito novamente.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – V. Exª sabe que o levantamento de desmatamento feito... As áreas de maior desmatamento no Pará são os assentamentos, e há uma razão para isso. Como o assentado é largado lá, a primeira coisa que ele faz é cortar a floresta para ter alguma renda. Mas vamos discutir no debate quando o projeto vier ao plenário. Obrigado, Senador.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Sr. Presidente, só para concluir.

    Senador Flexa, você sabe que os projetos de monocultura na Região Amazônica não deram conta de sobreviver ao processo do mercado internacional. O senhor sabe, no sul do Pará, dos problemas que vivem ali com a monocultura do gado. Agora estão todos passando para dividir a monocultura do gado com o grão e com a piscicultura, com a criação do pirarucu. É um projeto falido da monocultura. E o senhor sabe também que, economicamente, no projeto da cana lá na Amazônia, é 50% que tem que usar o tamanho...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – ... do território e 50% manter floresta. Economicamente, os grandes grupos econômicos não vão investir, porque é um projeto que inicia...

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – V. Exª está equivocado.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – ... economicamente inviável.

    O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco Social Democrata/PSDB - PA) – É 80%, não 50%. V. Exª está equivocado.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Foi aí que morreu o projeto lá de Medicilândia, porque se basearam na pequena produção da cana, e o pequeno não tem condição de produzir cana, mesmo que seja num processo integrado. É um projeto falido economicamente, e é um projeto que avança na degradação ambiental.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/03/2018 - Página 45