Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a violência na política.

Autor
Cristovam Buarque (PPS - CIDADANIA/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATIVIDADE POLITICA:
  • Preocupação com a violência na política.
Aparteantes
Lindbergh Farias.
Publicação
Publicação no DSF de 28/03/2018 - Página 78
Assunto
Outros > ATIVIDADE POLITICA
Indexação
  • APREENSÃO, ORADOR, FATO, VIOLENCIA, PERSEGUIÇÃO, POLITICA, MOVIMENTO SOCIAL, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, VISITA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Mas fui colega de banca de escola do Flexinha, embora em cidades diferentes. Colegas por termos tido o mesmo professor, lá, atrás, o Prof. Afonso, que está bem velhinho hoje em dia.

    Mas, Sr. Presidente, eu estou vindo falar aqui depois de um longo tempo. Tivemos férias, depois das férias, tivemos alguns feriados, e eu tive um longo processo de pneumonia, que me deixa ainda em fase de recuperação não completa.

    Presidente, eu não poderia deixar de vir aqui manifestar a minha preocupação com a maneira como as caravanas do Presidente Lula estão fazendo a marcha sob ameaças no Sul do País.

    Eu já sofri algumas ameaças e violências desse tipo, muito menores do que aquelas que estão acontecendo agora contra o Presidente Lula e sua caravana. O Brasil inteiro tem visto manifestações violentas, há muitos meses, por grupos corporativos, até por grupos políticos. Mas o que agora está acontecendo é muito mais grave do que aquilo que eu passei e do que todos esses pequenos movimentos ao redor do Brasil. Porque o que está em jogo não são apenas manifestações contra um cidadão, um cidadão que já foi Presidente da República, que é o líder de um partido, mas é uma manifestação violenta durante um processo eleitoral.

    Quando o processo eleitoral cai na violência, a democracia desaparece implicitamente; ou melhor, a democracia fica apenas aparente. Ela deixa de ser realidade. Democracia é por meio de urnas, jamais de armas, sejam as armas fuzis, sejam as armas bombas, sejam as armas tratores, sejam as armas ferramentas usadas com finalidades diferentes daquelas para as quais aquelas ferramentas foram fabricadas.

    Impedir um líder candidato ou não candidato, se é um cabo eleitoral, de fazer seus discursos, suas caminhadas, suas passeatas, colocar seus cartazes, isto é absolutamente não apenas antidemocrático, do ponto de vista da democracia, que fica zumbi, deixa de ser uma democracia plena, mas é mais grave, porque busca mais violência. A violência se retroalimenta com mais violência, e se chega ao ponto em que a violência domina. E quando a violência domina, ela destrói, ela jamais constrói. E aí o que a gente pode perfeitamente perceber, no final, se essa violência continua – hoje é um grupo contra a caravana do Presidente Lula, amanhã vai ser contra os opositores ao Presidente Lula, não tenho dúvida de que isso vai acontecer –, aí a democracia desaparece explicitamente. É óbvio o final, bastando para isso olhar a história.

    E o quadro mais dramático de como a violência termina violentando a democracia é o caso da Alemanha, que terminou levando Hitler ao poder. Os militantes socialistas de um lado, os militantes nazistas de outro: em vez de argumentarem, em vez de buscarem convencer um ao outro, um tentava impedir o outro de falar, de caminhar, de marchar. E o resultado é que todos foram massacrados por aquele que teve mais força, que, no caso, foi o movimento nazista.

    Eu vim aqui manifestar a minha solidariedade e vim aqui manifestar a minha preocupação. Solidariedade com um cidadão e seus companheiros que estão fazendo política, que estão buscando votos; e preocupação com esse comportamento que levará à retroalimentação da violência, que terminará inviabilizando o processo eleitoral.

    O SR. PRESIDENTE (Hélio José. PROS - DF) – Senador Cristovam, eu queria, se o senhor permitir, fazer uma pequena intervenção no discurso de V. Exª.

    Na qualidade de Presidente interino do Senado, neste momento, quero dizer que esta é a Casa da democracia. Então, eu quero cumprimentar V. Exª, porque creio que essa é a palavra dos 81 Senadores. A intolerância não é admitida em nenhum lado, nem da direita, nem de centro, nem da esquerda. Nós moramos em um país que tem uma Constituição que prevê o direito à livre manifestação.

    Então, V. Exª está coberto de razão. Quero cumprimentá-lo e dizer que todos nós temos que respeitar as instituições, respeitar o direito individual e o direito de manifestação dos vários partidos e dos vários campos políticos. Então, parabéns a V. Exª por essa fala tão importante, que, tenho certeza, retrata a posição de todos os Senadores desta Casa.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Muito obrigado. E eu creio que retrata não apenas por uma questão de solidariedade, mas por uma questão de preocupação. Quero deixar essas duas coisas juntas. A solidariedade com aqueles que estão sendo vítimas neste momento desses atos violentos, como eu fui e não apenas uma vez, algumas vezes eu fui, com ovos inclusive também. Mas é mais do que solidariedade, é a preocupação. Ninguém controla um processo desse se ele não for paralisado pela consciência geral das pessoas, nem a polícia garantindo, o processo paralisará. A polícia garante numa manifestação, depois em outra, em outra, em outra, mas, no conjunto, não garantirá.

    Além disso, enquanto ficamos em algumas violências graves, mas menores, tudo bem. Mas haverá mortes se isso continuar. E eu não falo como a da Marielle, bandidos escondidos, que eu espero que muito em breve sejam agarrados e punidos; é morte por uma pedrada, que às vezes mata; por um tiro, que ninguém vai saber de onde vem, mas com a clareza de ato político. E, isso acontecendo, não é uma questão de acender um barril de pólvora, é uma questão de arrebentar vulcões em todo este País. E aí, o final a gente já sabe: todos serem derrotados do ponto de vista da democracia.

    Eu estou há meses sem vir aqui, inclusive por razões de saúde. Estou até fugindo de recomendações, não era hora ainda nem de estar neste ambiente, que muitos dizem que é nocivo politicamente, mas é nocivo fisicamente. Esse ar-condicionado tão poluído, para quem está com o problema que eu estou, de pneumonia, mas também porque este é um momento em que não dá para deixarmos de falar.

    Minha manifestação, mas, sobretudo, minha preocupação com o fato de um grupo político – por coincidência, está com o Presidente Lula na liderança, mas é um grupo político – estar sendo impedido de fazer tranquilamente o que deveria ser feito na democracia: dizer o que pensa, fazer as críticas que quiser e pedir voto.

    Era a minha fala, Sr. Presidente, mas o Senador Lindbergh pediu a palavra.

    O Sr. Lindbergh Farias (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Só cumprimentar V. Exª, desejar a reabilitação, Senador Cristovam. Eu acho que a fala de V. Exª é uma fala importante. Eu acho que a gente está vivendo algo novo no País, infelizmente, eu falava para o senhor ali quando entrou. Eu, por exemplo, eu vivi só depois de 1988 a minha vida política como líder estudantil, depois da Constituição de 1988, depois daquele pacto pela redemocratização. E eu creio, Senador Cristovam, que a gente está entrando num terreno novo. Eu estou muito preocupado com o futuro do País. De fato, houve um crescimento hoje da extrema direita preocupante, de uma extrema direita agressiva. Eu, quando vi esse caso da Marielle e do Anderson, lá no Rio de Janeiro, Senador Cristovam, você sabe que tem um medo hoje em tudo que é liderança de favelas no Rio de Janeiro. Eu repeti isso algumas vezes: independentemente dos motivos, as pessoas vão... Espero que descubram os assassinos, quem executou Marielle e Anderson, mas havia uma ideologia ali por trás, de que defender direitos humanos é defender bandido, quando, na verdade, não é; é defender a vida. E a Marielle sempre defendeu policiais executados também, mas tinha aquilo, aquele tiro tinha isso. O que está acontecendo lá no Sul do País, e a minha preocupação é essa, é porque a gente passou muito tempo disputando processos eleitorais. Pode ter tido um exagero aqui, outro exagero ali, por parte das forças políticas, mas respeitavam esses processos. Isso que aconteceu lá não acontece desde o final dos anos 70. Não é só de 1988, desde os anos 70. Na verdade, eram grupos que estavam seguindo organizados como milícias. Eu estive com a Presidenta Dilma ontem. Quebraram o vidro do ônibus. Ela estava numa cadeira; quebraram outro vidro do ônibus dela. Dois ex-Presidentes da República. Em outro momento, me contou a Presidenta Dilma, quebraram o vidro do motorista. O ônibus saiu da pista. É uma cena de, sabe, querer destruir, querer atacar, querer matar. Então, é algo muito grave. Eu, infelizmente, Senador Cristovam, eu acho... Quando eu digo infelizmente é porque falo isso mesmo, porque nós todos vamos viver isso. Eu acho que a gente está entrando num momento, em algo novo, de violência política. Então, eu estou muito preocupado com o que está acontecendo no País. Eu acho, sinceramente, Senador Cristovam, aí não é questão de defender PT, Lula, nada disso. Não é coisa só da esquerda, não. Não é coisa só da esquerda! Eu acho que a gente tinha de fazer um movimento amplo neste País, de forças políticas amplas, uma frente contra um discurso fascista. Não é só discurso de ódio e de intolerância; nós estamos partindo para agressões físicas fascistas. Então, eu acho que esse é um movimento muito importante. As pessoas não devem olhar isso como algo contra o Lula ou contra a Dilma, porque isso vai vir para tudo que é lado. Então, eu quero cumprimentar V. Exª pela clareza do discurso. Eu acho que a gente tinha, não é fácil, mas a gente tem de insistir na capacidade de buscar diálogos neste País e de fugir desse caminho. Então, cumprimento V. Exª e trago aqui as minhas preocupações de quem está acompanhando aquilo o tempo inteiro. Você sabe que eu estou acompanhando, inclusive, nós temos grupos de WhatsApp de que eu participo, grupos internos. Às vezes, quando eu fico vendo o que o pessoal dos ônibus lá está vivendo... Em vários momentos, foram cercados, Senador Cristovam. As pessoas com pânico, entendeu? Então, eu quero cumprimentá-lo. Eu acho que o pronunciamento de V. Exª é um pronunciamento muito correto num momento de gravidade como este.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Obrigado, Senador. É um posicionamento de solidariedade e de preocupação. Solidariedade com os que ali estão, preocupação com a democracia inteira no Brasil.

    E eu espero que tenhamos a lucidez, todos nós, de saber que, sem paz, as armas vêm; e, as armas vindo, as urnas somem. Democracia é feita por urnas, jamais por armas. Não apenas armas como fuzis e revólveres, mas por pedras usadas como armas, paus usados como armas. Esses não são os vetores da democracia. Vamos saber distinguir ser oposição de um determinado grupo, de ser atacante de um determinado grupo. Sejamos opositores, não sejamos atacantes, fisicamente, como os nazistas fizeram e levaram aqueles países, como a Alemanha e a Itália, especialmente, à tragédia na Europa. E como aqui no Brasil terminamos levando também alguns dos nossos países, inclusive o Brasil...

    Minha solidariedade, mas, sobretudo, minha preocupação.

    É isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/03/2018 - Página 78