Discurso durante a 40ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com as supostas ameaças à democracia brasileira.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA POLITICO:
  • Preocupação com as supostas ameaças à democracia brasileira.
Aparteantes
Fátima Bezerra, Jorge Viana, José Medeiros, Randolfe Rodrigues, Vanessa Grazziotin.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2018 - Página 36
Assunto
Outros > SISTEMA POLITICO
Indexação
  • APREENSÃO, POSSIBILIDADE, AMEAÇA, DEMOCRACIA, PAIS, CRITICA, DECLARAÇÃO, GENERAL DE EXERCITO, ATUAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, REDE GLOBO, DEFESA, LEGALIDADE, HABEAS CORPUS, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, RESPOSTA, JOSE MEDEIROS, SENADOR, ASSUNTO, ORIGEM, CRISE.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, eu confesso que, quando fui eleito Senador da República, eu não conseguiria me ver nessa situação de hoje, de estar aqui, no Plenário do Senado Federal, fazendo um apelo aos Senadores, para que a gente faça um grande manifesto em defesa da democracia brasileira, cada vez mais atacada, cada vez mais ameaçada.

    A gente aqui já denunciou, naquele processo do golpe, do impeachment da Presidenta Dilma, que não cometeu crime de responsabilidade, que ali eles estavam rasgando um pacto pela redemocratização de 1988, que se assentava em cima de quê? Da soberania do voto popular, de eleições livres e democráticas. Rasgaram a Constituição, afastaram uma Presidenta eleita com 54 milhões de votos, mas, de lá para cá, a gente está vendo crescer o autoritarismo, o discurso do ódio e da intolerância e, agora, Senadora Fátima, agressões fascistas. O nome é esse.

    Eu vi, numa reportagem na TV Globo, o jornalista perguntando: "Como nós chegamos até aqui?" O Senador Paulo Paim acabou de falar e falou do Mandela. O Mandela tem uma frase em que ele diz que ninguém nasce com ódio, o ódio é ensinado.

    Foram três anos, Senador Jorge Viana, de uma campanha violentíssima, criminalização da política, o ataque ao Presidente Lula. Aí, há pessoas hoje que querem eliminar... Há uma parte da sociedade com um discurso fascista de eliminar o adversário.

    E a gente chega, no dia de hoje, preocupado com o que houve ontem. Mais do que o Twitter do Gen. Villas Bôas, eu acho que a maior gravidade foi a forma como a TV Globo, Senador Jorge Viana, colocou aquilo: o apresentador William Bonner, em tom solene, encerra o Jornal Nacional com aquele tuíte.

    Mais grave do que o tuíte do Comandante do Exército, o Gen. Villas Bôas, foi a repercussão dentro. Eu vi, com muita preocupação, o Gen. Miotto, em resposta ao Gen. Villas Bôas: "Comandante! Estamos juntos na mesma trincheira! Pensamos da mesma forma! [...] Aço!" Vi um outro que diz: "Caro Comandante, Amigo e líder receba minha respeitosa e emocionada continência. Tenho a espada ao lado, a sela equipada, o cavalo trabalhado e aguardo suas ordens!!"

    A forma como a Globo usou foi para chantagear o Supremo Tribunal Federal, uma chantagem à democracia brasileira.

    Eu trago aqui, Senadora Fátima Bezerra, Ulysses Guimarães hoje, porque acho que nunca foi tão necessário defender a nossa Constituição de 1988, que eles estão cada vez destruindo – com o golpe, com a Emenda à Constituição 95... Disse Ulysses Guimarães:

Traidor da Constituição é traidor da pátria. Conhecemos o caminho maldito: rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério.

[...] temos ódio à ditadura. Ódio e nojo. Amaldiçoamos a tirania onde quer que ela desgrace homens e nações, principalmente na América Latina.

    Então, senhores, eu estou aqui para fazer um apelo. Sinceramente, até agora não escutei a palavra de um Líder tucano, num momento de maior gravidade como esse. Quero fazer um apelo aos Senadores de todos os partidos: eu acho que a sessão de hoje, quando chegar o Presidente Eunício Oliveira, tem que se transformar numa sessão em defesa da democracia brasileira. É fundamental que o Senado se pronuncie nesse momento.

    Concedo o aparte ao Senador Randolfe.

    O Sr. Randolfe Rodrigues (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP) – Senador Lindbergh, quero primeiramente apoiar a manifestação de V. Exª no sentido de que a Ordem do Dia de hoje seja transformada em um debate sobre a democracia. Tenho as minhas convicções em relação à sentença de segunda instância, mas, desde a noite de ontem, o que está em jogo não são as convicções ou os lados de ser favorável à prisão após a segunda instância ou contrário. As manifestações do Comandante do Exército são gravíssimas; e, no meu entender, são ameaçadoras à democracia. O Congresso não pode ficar imune, não pode ficar sem dar resposta a isso. Esse é o momento em que eu diria, Senador Paim, que nós, na sessão de hoje do Senado, teríamos até que ficar em vigília cívica pela democracia, porque não pode ser aceito... Em qualquer democracia, chefes militares, generais só têm um papel a cumprir: garantir a ordem e a serenidade. É esse o único papel. O julgamento de hoje do Supremo Tribunal Federal vai passar. Seja qual for o recado, o resultado do julgamento, a Suprema Corte brasileira, como corte suprema, tem que ser respeitada no seu parecer, na sua decisão de hoje, seja qual for ela. Há quem defenda uma posição, há quem defenda outra. Não pode – eu considero uma chantagem, uma chantagem – haver manifestações, na véspera de um julgamento dessa dimensão, de parte de alguma liderança militar, de algum chefe militar, tanto fosse tendendo para um lado quanto para o outro. Então, V. Exª tem aqui a minha palavra no sentido de que as manifestações de lideranças militares do dia de ontem foram absurdas e incompatíveis com o Estado democrático de direito. E é dever desta Casa – eu concordo com V. Exª –, é dever de todas as Lideranças políticas desta Casa, de todos os partidos se manifestarem. Eu vi com péssimos olhares a manifestação, inclusive, de candidatos à Presidência da República apoiando as manifestações do General. Aliás, este seria o momento em que todos os candidatos – e eu faço aqui este chamamento – à Presidência da República deveriam, em um só tom, em tom uníssono, subscrever... Eu falo todos os candidatos, mas há um que claramente representa o fascismo; eu nem conto com ele. Mas todos os demais candidatos à Presidência da República deveriam ter o dever de, no dia de hoje, assinar uma carta conjunta em defesa da democracia, em defesa da estabilidade democrática, em defesa das instituições, em defesa, principalmente, de que – neste ano há as eleições – o resultado das urnas seja respeitado.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Eu agradeço a V. Exª, Senador Randolfe. E quero dizer que há um manifesto, que está circulando aqui no Senado – era importante V. Exª assinar, e outros Senadores também –, que é muito simples, mas se faz necessário, reafirmando o nosso compromisso com a democracia.

    Eu espero que a gente consiga mais da metade...

    O Sr. Randolfe Rodrigues (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP) – V. Exª conte com o meu apoio e a minha assinatura. Conte conosco.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Claro. Eu sei disso.

    Eu quero conceder o aparte ao Senador Jorge Viana, antes dizendo que o Senador Jorge Viana tinha mandado para mim, hoje, um comentário do jornalista Chico Pinheiro:

Michel Temer, com empresários e políticos na diretoria da Fecomércio-SP: "Em 64, o povo se regozijou, porque, novamente, uma centralização absoluta do poder que, mais uma vez, durou de 64 a 88. (...) não houve golpe de Estado. Houve um desejo de centralização'."

[Aí diz Chico Pinheiro:] Era um anúncio?

    Essa frase é de Michel Temer; e o Chico Pinheiro a publica e diz: "Era um anúncio?"

    Concedo o aparte ao Senador Jorge Viana.

    O Sr. Jorge Viana (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – Eu queria aqui me somar um pouco ao aparte do colega Randolfe, que, de maneira muito clara e explícita, apoia o discurso de V. Exª, Senador Lindbergh. E nós só estamos aqui fazendo algo que, como ele bem disse, todos os candidatos...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Jorge Viana (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – ... deveriam fazer: se manifestar, no dia de hoje, por algo que nos une e, talvez, pacifique até nossas diferenças, que é a democracia. Sem ela, não há saída a não ser a barbárie, a não ser aquilo que alguns, inclusive, estão defendendo em redes sociais e até em candidatura, que é o autoritarismo com ações fascistas. Então, eu confesso que fico triste, de certa forma – mas a palavra certa é muito preocupado –, com esse ambiente que nós estamos vivendo no País, essa ação em cima do Supremo Tribunal Federal. Nós estamos aqui no Congresso; para chegar aqui tem que ter tido voto; a chancela mais importante no regime democrático, o voto; a autoridade do voto. Temos o Presidente da República mais impopular da história do Brasil e um Congresso fragilizado. A crise institucional de que nós falamos, em que alguns não acreditam, teve o ápice no impeachment, no golpe, numa farsa: sem tipificação de crime de responsabilidade, uma Presidenta, com 54 milhões de votos, foi apeada do poder. E, a partir daí, a insensatez tomou conta. Eu sei que o General Villas Bôas – eu o conheço bem – é um grande brasileiro, um nacionalista. E é desse grande brasileiro e desse nacionalista que o País está precisando, mas para não cometer atos que vou chamar de atos falhos, como os de ontem. Certamente, ele deve ter suas razões. Eu li o Twitter. O problema não é o Twitter do General Villas Bôas, que nós sabemos ser um democrata e um grande brasileiro. O problema é o uso que se faz de uma manifestação dele. Foi num momento errado, no tom errado, sobre o tema errado. Em nenhum país do mundo que vive a plenitude da democracia, os que têm o poder de conduzir as Forças Armadas se manifestam. Em democracia, não. E, todas as vezes em que se manifestaram, o resultado foi péssimo. Então, eu espero, sinceramente, até por conhecê-lo bem, que ele possa, de algum jeito, trazer a tranquilidade e se some a essas declarações que estamos fazendo aqui, de apreço, de compromisso e de subordinação à democracia. É isso que esse manifesto nosso faz. Por isso que eu o assinei também. Então, parabenizo V. Exª. É isso que dá pôr no poder aqueles que não passaram nas urnas, agravar crise com um Governo ilegítimo, que destrói as conquistas sociais, que vende e põe à venda o Estado brasileiro, o patrimônio do povo brasileiro, e que leva o País a uma situação de absoluta insegurança institucional. Estamos vivendo, sim – é bom assumirmos –, a maior crise institucional das últimas décadas. Parabéns, Senador Lindbergh.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Senador Jorge Viana, eu agradeço o aparte.

    Eu quero ler aqui, Senadora Fátima Bezerra, uma carta que é uma carta história, do grande jurista Geraldo Prado, dirigida a Fachin e ao Ministro Luís Roberto Barroso, que ele respeita. É uma carta importantíssima. Eu nunca faço essa leitura, mas quero fazer aqui.

    Antes dizendo, Senador Paulo Rocha, que José Afonso da Silva, um dos maiores constitucionalistas deste País, fundador do PSDB, secretário de Mário Covas, fez um parecer desmontando, ponto a ponto, a tese da prisão após condenação em segunda instância.

    Ele diz o seguinte... Fala da nossa Constituição, do texto da Constituição: "Pode-se criticar o texto, pode-se condená-lo, mas o texto de uma Constituição rígida tem que ser respeitado, principalmente pela instituição incumbida de guardá-lo e garantir sua eficácia e aplicabilidade na sua inteireza."

    Mas vamos lá.

    E eu peço desculpas e vou tentar fazer o mais rápido possível, mas essa carta é importantíssima.

    Geraldo Prado, um dos maiores juristas do País:

Escrevo aos Ministros Luís Roberto Barroso e Edson Fachin, em homenagem à sincera admiração que nutro por ambos, há mais de duas décadas, fruto do imenso respeito por suas trajetórias acadêmicas e profissionais.

Escrevo publicamente porque, em se tratando do tema que diz com a República não se recomenda a confortável opção pela reserva, cabendo à publicidade o papel de veículo de receios, mas também de legítimas expectativas.

Finda a ditadura empresarial-militar, o Brasil experimentou dois processos de impeachment de Presidentes eleitos. Foram momentos críticos em nosso recente estágio de amadurecimento institucional democrático. Ainda não sararam as feridas do que cassou o mandato de Dilma Rousseff.

Fato é que quaisquer que sejam nossas opiniões sobre as relações de causa e efeito entre a crise política gerada no último impedimento presidencial e o atual momento de instabilidade, a manifestação do Comandante do Exército, às vésperas do julgamento pelo STF do habeas corpus impetrado pela Defesa do ex-Presidente Lula, que tem por matéria central a definição do âmbito da presunção de inocência, traz implícita inédita grave ameaça à ordem democrática.

Chegar a esse ponto – que intranquiliza os brasileiros comprometidos com a democracia e a República – apenas foi possível porque antes, a passos largos e decididos, os vários setores responsáveis pela estabilidade democrática decidiram tensionar ao máximo a nossa jovem democracia, levando a Constituição ao estresse, em seu grau mais avançado.

Quer pelos motivos menos honestos, como os que inspiraram o ex-Deputado Eduardo Cunha, quer por razões que à vista de seus autores seriam justificáveis pelo apego a valores de probidade, a realidade é que esses setores colocaram concretamente à prova o sentido mais essencial de integridade das cláusulas fundamentais da Constituição, da legitimidade do exercício dos Poderes, ao significado textual inquestionável da presunção de inocência, assegurado pelo histórico de sua delimitação na Constituinte de 1987-1988.

As cláusulas pétreas [porque o que nós estamos discutindo nesse habeas corpus do Presidente Lula são as cláusulas pétreas] foram testadas, como foi testada a resistência da democracia, ao desrespeito dessas franquias, violações dissimuladas, em superação das suas razões históricas.

O resultado não poderia ser diferente. Se as principais instituições responsáveis por assegurar e aplicar a Constituição acham-se com poder para modificar as regras constitucionais, à revelia da proibição expressa na própria Carta, outras pessoas e instituições sentem-se incentivadas a também violar a Constituição, a propósito de preservar o seu espírito.

    Senadora Fátima, o art. 5º, inciso LVII, esse que fala que a pessoa só pode ser presa com trânsito em julgado, é cláusula pétrea. Nem por emenda constitucional nós podemos modificar. Só pode modificar em outra Assembleia Nacional Constituinte. Imaginar, então, que uma interpretação do Supremo pode modificar a cláusula pétrea... É para isso que chama a atenção aqui o grande jurista Geraldo Prado.

    E diz mais:

Havia um motivo político para a proibição de emendas constitucionais relativamente a determinados temas. As três décadas passadas, desde 1985, empalideceram a memória desse motivo, mas não o fizeram desaparecer.

A crença constitucional de que determinados temas são intocáveis tem a ver com a experiência histórica de que apenas o amplo e escrupuloso respeito às regras do jogo democrático pode garantir o não retorno ao arbítrio e, assim, impedir aventuras políticas caprichosas, violentas, decididamente criminosas, como são os crimes de Estado praticados contra a soberania popular.

Se um pode violar a Constituição, em virtude de sua confiança pessoal nas melhores razões, por que outro não poderá? [Pergunta o Prof. Geraldo Prado.]

Para alguns trata-se de garantir a governabilidade, procedendo-se ao impeachment mesmo sem crime de responsabilidade.

Para outros, a questão consiste em "pôr fim à corrupção", contornando-se o aparente obstáculo da presunção de inocência.

No andar da carruagem, era previsível que as forças políticas reacionárias e ultraconservadoras também se sentissem à vontade para, igualmente, exprimir seus "anseios patrióticos", postulando "corrigir os rumos" desviados pelas principais instituições do Estado, mesmo sendo uma delas o STF.

Ao ser o porta-voz da promulgação da Constituição, Ulysses Guimarães advertira: 'A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa, ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca.' [Olhem essas palavras de Ulysses na promulgação da Constituição 30 anos atrás!]

Ao enfatizar que temos ódio e nojo à ditadura, Ulysses, perseguido que havia sido pelos militares pós-64, registrava para a história: 'Traidor da Constituição é traidor da Pátria. Conhecemos o caminho maldito. Rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério (...)

    Sr. Presidente, a carta continua. Eu vou parar aqui, porque, na verdade, eu sei que há outros Senadores inscritos. Eu vou parar aqui por isso. Agora, é uma carta da qual digo: todos têm que ler. A carta do Prof. Geraldo Prado dirigida ao Ministro Luís Roberto Barroso e ao Ministro Fachin, explicando e mostrando como foram criadas essas cláusulas pétreas: findo o período da ditadura militar, para impedir retrocessos. Então, eu acho que ela vem num momento importantíssimo.

    Eu já tinha, Senadora Vanessa, citado José Afonso da Silva também, que é um constitucionalista do PSDB que fez um parecer irretocável. Mas eu concedo um aparte a V. Exª antes de terminar meu pronunciamento.

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PCdoB - AM) – Eu serei breve, porque, na mesma linha de V. Exª, Senador... Hoje, o jornal... E eu repito aqui: tive oportunidade de falar, mas acho importante, Senador Paim, que a população brasileira procure se informar, ouvir os argumentos, conhecer inclusive a história, algo em que V. Exª nos ajuda muito, com esse pronunciamento. O jornal Valor Econômico traz hoje uma matéria em que ouviu dois ex-Parlamentares constituintes, um ex-Deputado e um ex-Senador, Constituintes ambos. Eles falaram do espírito do inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal. Segundo eles, não há dúvida nenhuma, até porque saíam, Senador Lindbergh Farias... A Constituição, nós sabemos, superou um período de 21 anos de liberdades restritas. Então, a Constituição, que até então permitia o cumprimento da pena antes do trânsito em julgado, foi modificada em 1988. Por isso mesmo o Código de Processo Penal foi adaptado no Brasil. Então, o ex-Senador José Ignácio Ferreira e o ex-Deputado Sigmaringa Seixas deveriam ser ouvidos também, assim como o Relator da Constituição brasileira, o Senador Bernardo Cabral, do meu Estado, que vai dizer a mesma coisa. Então, não há que interpretar aquilo que a lei mostra de forma muito clara. E o que nós estamos defendendo não é desobediência. Nós não estamos defendendo a impunidade de ninguém. O que nós estamos defendendo é o cumprimento da Constituição para todos: para Lula e para qualquer cidadão e cidadã do Brasil. Parabéns pelo pronunciamento, Senador Lindbergh.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Muito obrigado, Senadora Vanessa.

    Eu passo à Senadora Fátima Bezerra, essa lutadora, Senadora do Rio Grande do Norte.

    A Srª Fátima Bezerra (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Senador Lindbergh, apenas para complementar aqui o aparte que a Senadora Vanessa acaba de lhe fazer, quando cita aqui exatamente os dois Constituintes à época, o Senador José Ignácio Ferreira e o Deputado Sigmaringa Seixas. O Senador José Ignácio foi exatamente quem apresentou, Senador Lindbergh, a sugestão, à época, de incluir a proibição de prisão antes do trânsito em julgado. O Deputado Sigmaringa Seixas, que também defendia a mesma tese, disse exatamente o seguinte, na defesa da tese da prisão só depois do trânsito em julgado. Abro aspas: "O que se tinha era realmente uma preocupação muito grande com a possibilidade de se impor uma pena forte, e depois, no recurso, ficar provado que a pessoa não havia cometido o delito. Então [dizia Sigmaringa Seixas], é preferível aguardar o julgamento final em liberdade, a manter presa uma pessoa que depois se revela inocente." Fecho aspas. Portanto, quero aqui concluir, dizendo o seguinte, que esses dois Parlamentares, repito, Constituintes à época...

(Soa a campainha.)

    A Srª Fátima Bezerra (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – ... que participaram ativamente da redação da regra constitucional, ora aqui em debate, afirmam ainda que a inserção do dispositivo na Carta Magna não provocou polêmica. Ou seja, não havia dúvida sobre a interpretação do dispositivo. Para eles, se o Supremo, portanto, quiser respeitar a intenção dos Constituintes, deve considerar ilegal a prisão antes do trânsito em julgado. É isso que nós esperamos, Senador Lindbergh, que seja o resultado do julgamento ora sendo feito pelo Supremo Tribunal Federal do habeas corpus pedido em favor do Presidente Lula.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Muito obrigado, Senadora Fátima.

    O Professor Geraldo Prado acaba dizendo o seguinte:

No julgamento de hoje, 04 de abril de 2018, reconhecer que o STF não é Constituinte e não tem poderes para reescrever o texto da presunção de inocência cumprirá, nas circunstâncias, o papel de mensagem inequívoca dirigida a toda a sociedade: a de que o poder civil governa o Brasil. E somente o poder civil, na forma da Constituição, poderá legitimamente nos governar, hoje e sempre.

Confio, sinceramente, pela história de vida dos amigos e mestres, que, ao se alinharem ao sentido literal do texto de 1988, do dispositivo constitucional que assegura que ninguém será considerado culpado senão após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ainda que sob a crença de que a Constituição não é perfeita, estarão reafirmando o compromisso do STF, como instituição, de ser o guardião da Constituição, porque ser o guardião da Constituição é ser o guardião da democracia.

Ulysses Guimarães não está mais entre nós, mas são os eventos que constituem as grandes figuras públicas para a história.

Professor Geraldo Prado.

    Eu concedo o último aparte ao Senador José Medeiros.

    O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - MT) – Senador Lindbergh, em que pese achar que V. Exª está fazendo, hoje, talvez um dos seus discursos históricos, permito-me divergir em alguns pontos. Eu vejo que a Constituição brasileira começou emblematicamente a ser muito desrespeitada naquele dia do julgamento, e V. Exª foi um dos artífices daquele particionamento do julgamento do impeachment, aqui, quando se particionou... E ali foi rasgada, realmente, não somente a Constituição, como foi rasgado um artigo. Então foi relativizado, e começou-se ali, a partir dali, uma relativização total do nosso ordenamento. Bem, mas vamos ao caso em tela que nós estamos tratando aqui, que já vem desde 1940, do nosso Código Penal. Há um entendimento quase – não, é geral –... E aí vamos fazer um parênteses: eu respeito toda essa, vamos dizer, discordância de vocês pelo fato de ser quem é que está hoje na base desse habeas corpus, que é o ex-Presidente Lula, figura mítica, personalidade do Partido dos Trabalhadores, mas esqueçamos, tiremos o Lula desse negócio e vamos observar à luz do caso concreto. Veja bem, Senador Lindbergh, a partir da segunda instância, V. Exª sabe que não tem mais... tribunal nenhum verifica mais prova. Portanto, réu nenhum vai ser condenado ou inocentado por questões de provas. As provas são analisadas até a segunda instância. A partir daí são questões formais. Portanto não há que se dizer que um réu lá, depois da segunda instância, foi condenado sendo inocente. As provas já foram analisadas. A gente retirar isso por causa de uma casualidade, retirar a segunda instância... E aqui não estou condenando. Respeito totalmente e concordo com V. Exª: o que o Tribunal, o STF decidir hoje eu respeito porque eu sou escravo da lei e respeito aquele Poder. Mas eu acho uma temeridade que nós mudemos esse entendimento a respeito da segunda instância, porque nós vamos ter, amanhã ou depois,... Os assassinos de Marielle, por exemplo: vão ser presos? E aí, não: nós só vamos poder ver eles na cadeia depois, daqui a 20 anos, quando chegar ao último recurso lá do STF. Nós não podemos conduzir um país com um grau de impunidade dessa forma.

(Soa a campainha.)

    O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - MT) – Então é por isso que eu peço uma reflexão: que se possa separar esse caso, que é um caso umbilical de vocês, do ordenamento jurídico geral deste País, porque não é possível que a gente possa contaminar tanto uma coisa que é particular do Partido dos Trabalhadores com a vida da Nação.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Senador Medeiros, é claro que eu discordo completamente de V. Exª.

    V. Exª faz o raciocínio oposto ao que aconteceu na verdade. Os irresponsáveis foram os senhores, que colocaram o País nesta crise, não respeitando o resultado das eleições, rasgando o voto popular. O senhor sabe que não houve crime de responsabilidade da Presidenta Dilma. Colocaram o País nessa situação! Fabricaram o fascismo! O fascismo surgiu disto: da covardia dos senhores, que foram para as ruas com quem defendia a intervenção militar, e não demarcaram um campo.

    Eu me lembro de falar aqui em 2015 para os tucanos: os senhores estão estimulando manifestações com quem defende intervenção militar, e não estão se diferenciando. Foram comidos pela extrema direita, por esse discurso de práticas... Não é só discurso de ódio e intolerância, de agressões fascistas...

    E agora, concretamente, eu já falei muito sobre o tema da presunção de inocência, mas eu quero responder a V. Exª com José Afonso da Silva. Eu, na verdade, não conheço um bom jurista que defenda essa tese.

    José Afonso da Silva. Eu citava... Estudei Direito, Senadora Lídice da Mata, e os maiores livros de Direito Constitucional são de José Afonso da Silva, que é o autor mais citado em acórdãos do Supremo Tribunal Federal. Ele começa seu parecer do Presidente Lula, dizendo o seguinte: "Não sou eleitor do consulente nem de seu Partido". E ele diz que foi do PSDB, que foi Secretário de Segurança. E não há como tomar uma posição de interpretação contra a letra da Constituição. O art. 5º, inciso LVII, é claro: só pode haver prisão após o processo ter transitado em julgado.

    Então, sinceramente, espero que o resultado de hoje facilite a reconciliação do País com a sua democracia. Quem aposta na prisão do Presidente Lula está apostando em dar vitória a esses grupos de extrema direita, em colocar mais radicalização na pauta política do País.

    Eu espero que hoje vença a Constituição, vença a democracia brasileira.

    Muito obrigado, Senador Paulo Paim.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2018 - Página 36