Discurso durante a 40ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Crítica à nota pela qual senadores solicitam ao Supremo Tribunal Federal a condenação do ex-Presidente Lula.

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATIVIDADE POLITICA:
  • Crítica à nota pela qual senadores solicitam ao Supremo Tribunal Federal a condenação do ex-Presidente Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2018 - Página 65
Assunto
Outros > ATIVIDADE POLITICA
Indexação
  • COMENTARIO, CRISE, POLITICA, PAIS, CRITICA, NOTA, AUTORIA, GRUPO, SENADOR, DESTINAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), OBJETIVO, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CONDENAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, VIOLAÇÃO, COMPETENCIA, SENADO, REFERENCIA, CASSAÇÃO, DEMOSTENES TORRES, EX SENADOR, DESAPROVAÇÃO, QUALIDADE, INTERVENÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DECLARAÇÃO, GENERAL DE EXERCITO.

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL. Sem revisão do orador.) – Senador Lindbergh, se V. Exª pudesse aguardar dois minutinhos, nós faremos uma rápida comunicação ao Senado Federal e ao País sobre este momento dramático, sombrio que nós vivemos no Brasil.

    Ulysses Guimarães, ao proclamar a Constituição Federal, advertira, Sr. Presidente e Srs. Senadores:

A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa ao admitir a reforma.

Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca.

    Pelo que vemos, continuam atualíssimas as palavras de Ulysses Guimarães, que, nesse mesmo discurso, Senador Jorge Viana, enfatizou que traidor da Constituição é traidor da Pátria.

    Continua Ulysses:

Conhecemos o caminho maldito: rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério.

[...]

Quando, após tantos anos de lutas e sacrifícios, promulgamos o estatuto do homem, da liberdade e da democracia, bradamos por imposição de sua honra [e enfatizou Ulysses]: temos ódio à ditadura. Ódio e nojo.

    Sr. Presidente, eu estava nessa sessão e saboreei palavra por palavra o discurso de Ulysses Guimarães. Como um jovem Constituinte, depois como Presidente do Congresso Nacional, cargo que honrosamente ocupei por quatro vezes, Sr. Presidente, a circunstância me levou a fazer várias reformas na Constituição. Eu mesmo promulguei 37 reformas à Constituição, reformas feitas, Sr. Presidente, pelo Congresso Nacional, a quem cabe fazê-la, desde que ela própria admite ser revisada por três quintos dos votos, em dois turnos, nas duas Casas do Congresso Nacional.

    Sr. Presidente, eu queria pedir permissão a todos para citar uma declaração do conhecido jurista paulista José Afonso da Silva, que diz que o que nós estamos vivendo é uma deformação eloquente do Constituinte. Como constitucionalista, afirma o citado: "Fico muito pesaroso, se não triste, ao ler isso em um julgado do Supremo Tribunal Federal, a respeito de uma norma que alberga um direito fundamental." Continua José Afonso: "Pode-se criticar o texto, pode-se condená-lo, mas um texto de uma Constituição rígida tem que ser respeitado, principalmente pela instituição incumbida de guardá-lo e garantir sua eficácia e aplicabilidade na inteireza" – fecha aspas para José Afonso.

    Isso tudo, Sr. Presidente, me fez lembrar – e eu peço a atenção de V. Exª e dos Senadores – um discurso publicado pela Secretaria de Imprensa, em 1965, do Gen. Humberto de Alencar Castelo Branco, que diz o seguinte – aspas: "Eu os identifico a todos e são muitos deles os mesmos que, desde 1930, como vivandeiras alvoroçadas, vêm aos bivaques bulir com os granadeiros e provocar extravagâncias do poder militar".

    Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco identificava, com esse pronunciamento, simpatias dentro dos altos setores da sociedade civil, pela substituição do presidente João Goulart, servindo-se dos militares para a consecução de seus objetivos, que ele chamou de extravagâncias do poder militar.

    Sr. Presidente, fui informado pelo noticiário que ontem vinte Senadores – vinte Senadores! – fizeram questão de escrever uma nota, como vivandeiras alvoroçadas, Senador Lasier, e foram entregar essa nota ao Supremo Tribunal Federal, pedindo ao Supremo Tribunal Federal para que ele rasgue a Constituição e não garanta a presunção de inocência, como se discute hoje no País. Tenho aqui os nomes. Como Castelo, eu identifico a todos.

    Fico triste com algumas assinaturas que vejo aqui: Lasier Martins. Em todos os episódios nós o identificamos como um defensor desse pensamento, inclusive quando esteve aqui o juiz Moro, V. Exª fez questão de colocar o Poder que V. Exª integra, em segundo plano, defendendo, sem motivação judicial nem outra qualquer, a superposição da instância inferior da Justiça aos tribunais, porque o Moro entendia, num discurso que foi referido por mim na oportunidade, que qualquer mudança no Brasil tem que vir pela massa de juízes jovens, concursados. Elas não podem vir jamais pelos tribunais superiores, porque os tribunais superiores são produtos da política.

    Lasier Martins, Simone Tebet. Ontem, a Senadora Simone Tebet foi escolhida para ser Líder do PMDB, fiz questão de assinar sua indicação. Confesso, e tenho esse triste defeito de dizer o que penso, eu confesso que se soubesse que a Simone teria assinado este documento, eu não votaria na Simone para ser minha Líder,...

    O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) – Concede-me um aparte, Senador?

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – ...porque jamais um Líder pode ser Líder senão nos limites da Constituição.

    O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) – Concede-me um aparte, Senador?

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Já concedo o aparte a V. Exª, que talvez não seja uma das vivandeiras. Estou apenas começando a ler aqui os nomes.

    Tasso Jereissati, Flexa Ribeiro, Airton Sandoval, Ana Amélia, Maria do Carmo Alves, Cristovam Buarque,...

(Intervenção fora do microfone.)

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Já chamarei V. Exª.

(Intervenção fora do microfone.)

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Eu chamarei já V. Exª.

    O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) – ...preocupação. É muito justo. E se tiver qualquer projeto dessa natureza, qualquer emenda de Constituição, estarei...

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Até porque V. Exª, se alguém aqui...

(Intervenção fora do microfone.)

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Se alguém nesta Casa...

    O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) – Eu estarei...

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – ...não precisa respeitar a Constituição é V. Exª...

(Soa a campainha.)

    O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. PMDB - CE) – Calma.

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – ...que não foi eleito.

    O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP. Fora do microfone.) – ...não tem o direito...

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Se alguém não precisa respeitar essa Constituição é V. Exª que não foi eleito, e veio aqui para puxar o saco do Governo, de um Governo moribundo que está entregando, vendendo o País.

    Eu chamaria...

    O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) – Moribundo está V. Exª que já está fedendo nesta Casa!

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – V. Exª não se elegeu para vir representar o Estado de São Paulo...

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) – Senador, aqui fala um Senador eleito, Lasier Martins.

    Tão logo V. Exª entender oportuno, peço que me conceda um aparte.

    Peço a inscrição.

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Eu já identifiquei...

    O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. PMDB - CE) – Eu quero só coordenar os trabalhos, só coordenar os trabalhos.

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Deixa eu terminar a leitura.

    O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. PMDB - CE) – Não cabe aparte. Depois os Senadores que foram citados podem pedir pelo art. 14 que eu darei a palavra. Não cabe aparte.

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Cristovam Buarque, Raimundo Lira. O Raimundo Lira era Líder do PMDB até ontem. Ontem, eu fui chamado para votar no Congresso Nacional e não tinha quem orientasse a votação da Bancada do PMDB porque o Líder do PMDB abandonara a nave. Nós perdemos o piloto que, naquele mesmo dia, saiu, foi para o PSD.

    Ronaldo Caiado, Ricardo Ferraço, Lúcia Vânia, Randolfe Rodrigues, Magno Malta, Alvaro Dias, Romário, Reguffe, Waldemir Moka, Ataídes e José Medeiros. Muitos, Sr. Presidente – não há aqui nenhum descrédito para nenhum, porque eu tenho a melhor convivência com todos –, muitos podem até rasgar a Constituição porque não foram eleitos para defendê-la, para protegê-la. Fizeram um improvisado juramento na forma da Constituição que querem rasgar, que querem rasgar e ir ao Supremo Tribunal Federal entregar um documento e pedir que não se cumpra a Constituição, traindo a Constituição, Sr. Presidente. Esse é um momento que esta Casa não pode viver, não pode viver.

    Quando, na democracia, um dos Poderes deixa de exercer o seu poder moderador para colocar limites nos outros Poderes, Sr. Presidente, a democracia sofre, se fragiliza.

    O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) – Me serve um aparte, Senador.

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Ora o Poder Judiciário tem que ser o moderador, tem que colocar limite nos outros poderes e, ora o Poder Legislativo tem que colocar limites nos outros poderes.

    Eu não entendi – e confessei a V. Exª ontem – o porquê do Supremo Tribunal Federal, por liminar, Senador João Alberto, ter cassado a decisão do Senado e tornado Demóstenes Torres elegível. O Supremo Tribunal pode fazer isso? Ele pode até cassar o processo por problemas judiciais, mas caçar uma decisão do Senado Federal, que foi tomada regimentalmente na forma do Conselho de Ética com todos os seus prazos sendo cumpridos? Isso não pode! Isso não pode, mas alguém tem que exercer o papel de poder moderador na democracia. Não é o Gen. Villas Bôas que vai fazer isso.

    A fragilidade desse Governo – que muitos dos Senhores aqui representam – já fez com que os militares voltassem a comandar a Defesa. O Jungmann foi expelido da defesa e foi colocado numa intervenção da polícia do Rio de Janeiro, sem que o decreto de intervenção sequer contenha os meios necessários como exige a Constituição Federal.

    Eu até votei, porque não se vota contra intervenção, mas fiz questão de dizer que isso estava fadado a não ter resultado nenhum, nenhum, mas nós não podemos permitir que companheiros, na forma do que falou Ulysses Guimarães, traiam a Constituição, até mesmo suplentes, que não se elegeram para representar aqui os seus Estados – eu sempre defendi os direitos dos suplentes –, mas para defender a Constituição, conforme o juramento deles aqui perante todos nós.

    Sr. Presidente, o Senado construiu esta Nação. Tudo foi construído aqui nos escaninhos deste Senado Federal, e nós, em nome da coerência e da participação histórica desta instituição, que é uma das mais relevantes da República, não podemos, Sr. Presidente, deixar registrado nos Anais essa traição à Constituição, que mais do que nunca está sendo ameaçada.

    Quanto à nota do Gen. Villas Bôas, é uma nota que não diz nada, mas está cheia de insinuações nas entrelinhas. Quando esse Gen. Mourão, lá atrás, fez uma insubordinação à Presidência da República, ele foi demitido. Ele foi demitido pela então Presidente Dilma Rousseff. Se houvesse Governo, nós já teríamos tido a demissão desse General, que publicou uma nota, que não se sabe para quê, mas carregada de insinuações contra a democracia, contra a paz social e contra a própria Constituição.

(Soa a campainha.)

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – O Governo está acabando, os militares já voltaram para a Defesa, o Jungmann foi expelido para conduzir uma intervenção à Polícia Militar do Rio de Janeiro sem dinheiro, sem dinheiro, suscitando uma contraposição, um contrafogo da própria polícia ao assassinar a Vereadora Marielle, ou a milícia, tanto faz, ao assassinar a Vereadora Marielle. Mas o fato é que a democracia não pode periclitar. Alguém tem que colocar, ora, o Poder que representa como Poder moderador, porque democracia é um sistema de pesos e contrapesos, porque, se nós ficarmos achando que são bonitinhas essas vivandeiras alvoroçadas, que, tal qual lembrou Humberto Castelo Branco, podem ir 20 representando o Senado Federal pedindo para rasgar a Constituição, isso é um horror, Senador Ataídes, isso é um horror, Senador Lasier, isso é um horror, outros ilustres Senadores que assinaram essa nota, com a qual eu jamais vou concordar. Jamais vou concordar, jamais!

(Soa a campainha.)

    O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) – Defendo o direito de os senhores fazê-lo, mas isso é contra a nacionalidade, é contra a Constituição.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2018 - Página 65