Fala da Presidência durante a 48ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Abertura da sessão de debates temáticos destinada a discutir a proteção, o tratamento e o uso de dados pessoais referente ao Projeto de Lei do Senado nº 330, de 2013.

Autor
Ricardo Ferraço (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Fala da Presidência
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO CIVIL:
  • Abertura da sessão de debates temáticos destinada a discutir a proteção, o tratamento e o uso de dados pessoais referente ao Projeto de Lei do Senado nº 330, de 2013.
Publicação
Publicação no DSF de 18/04/2018 - Página 12
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO CIVIL
Indexação
  • ABERTURA, SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, DESTINAÇÃO, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS), AUTORIA, ANTONIO CARLOS VALADARES, SENADOR, ASSUNTO, PROTEÇÃO, UTILIZAÇÃO, TRATAMENTO, DADOS, PESSOAL.

    O SR. PRESIDENTE (Ricardo Ferraço. Bloco Social Democrata/PSDB - ES) – Declaro aberta a sessão.

    Sob a proteção de Deus iniciamos os nossos trabalhos.

    A presente sessão de debate temático destina-se à discussão e ao diálogo que o Senado está fazendo acerca de um tema muito delicado e muito sensível, estratégico para o nosso País, porque diz respeito à proteção, ao tratamento e ao uso de dados pessoais, referente ao Projeto de Lei do Senado nº 330, de 2013, de autoria do eminente Senador Antonio Carlos Valadares.

    Agradecendo a presença de todos, nós gostaríamos de convidar para que pudessem ter assento à mesa do Senado S. Exª o Sr. Embaixador da Delegação da União Europeia no Brasil, Sr. João Gomes Cravinho; S. Exª o Sr. Secretário de Tecnologia da Informação e Comunicação do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Sr. Luis Felipe Salin Monteiro; o Secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e Conselheiro do Comitê Gestor da Internet no Brasil, Sr. Maximiliano Martinhão; o Diretor do Departamento de Defesa e Segurança da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Sr. Rony Vainzof; o Gerente-Executivo de Política Industrial da Confederação Nacional da Indústria, Sr. João Emílio Padovani Gonçalves; o pesquisador da Rede Latino-Americana de Estudos sobre Vigilância, Tecnologia e Sociedade, Sr. Bruno Bioni; o advogado especialista em Direito dos Negócios Digitais, Sr. Márcio Cots; e o consultor e especialista em privacidade e proteção de dados pessoais, Sr. Mario Viola de Azevedo Cunha. Sejam V. Sªs bem-vindos. Desde já, o agradecimento, em nome do Senado, pela disponibilidade de todos os senhores e senhoras para que nós possamos iniciar o nosso trabalho.

    O sentido desta audiência é recolher contribuições, informações e percepções acerca de um tema extremamente sensível e delicado. À medida em que a internet se impõe no mundo como evidência definitiva de revolução tecnológica e civilizatória, o mundo digital se respalda como extraordinária ferramenta de emancipação nas relações humanas no campo público e no campo privado.

    Não sem outra razão, aprovamos, em março de 2017, aqui no plenário desta Casa, o projeto de lei de minha autoria que deixa a internet banda larga livre de custos adicionais e de controle de fluxos de dados. Hoje dependendo de apreciação da Câmara dos Deputados, a matéria veda qualquer restrição na utilização dos planos fixos. Na prática, proíbe as operadoras de limitar a transmissão de dados de seus usuários.

    Também relatamos, aqui no Senado, o Marco Civil da Internet, que é considerado um avanço estratégico, reconhecido por todos como uma espécie de "Constituição" da internet, como um conjunto normativo de deveres, direitos e responsabilidades dos usuários da internet em nosso País.

    Agora, Srªs e Srs. Senadores, especialistas convidados, brasileiros que nos acompanham pela TV Senado, pelos meios de comunicação, estamos diante de um novo desafio: estabelecer princípios e diretrizes para a proteção, o tratamento e o uso de dados pessoais na internet nas relações públicas e privadas.

    Esse debate ora colocado, enriquecido por sessão temática, é fruto de proposta apresentada, ainda em 2013, pelo Senador Antonio Carlos Valadares, a quem saudamos e cuja presença registramos.

    Em seguida, V. Exª fará uso da palavra, na condição de autor, antes que possamos ouvir, meu caro Senador Valadares, os nossos convidados, a academia, as autoridades e os especialistas no tema.

    Portanto, o esforço legislativo para regular a proteção de dados pessoais antecede a conjuntura de vazamentos de informações de usuários, fato que, nas últimas semanas, ganhou dimensão e ganhou grande polêmica global envolvendo empresas de redes sociais digitais.

    Nesse período, entre 2013 e esta data, houve uma impactante mudança de legislação sobre proteção de dados pessoais na União Europeia. Também estivemos atentos e continuamos atentos a um debate estendido há anos nos Estados Unidos da América sobre privacidade de dados dos cidadãos.

    Agora, no próximo mês de maio, a União Europeia coloca em vigor um código geral a ser seguido em seus países-membros e, naturalmente, por todos aqueles países que se relacionam com a União Europeia. A nova lei de proteção de dados da União Europeia, a Regulamentação Geral de Proteção de Dados, entra em vigor em maio, exigindo o consentimento dos usuários para a coleta de dados.

    Esse regramento por certo está servindo de inspiração para o nosso debate e para o encaminhamento deste tema em nosso País, até porque esta é a sessão temática derradeira para que nós possamos apresentar o nosso parecer na Comissão de Assuntos Econômicos. E, em seguida, o sentido e o objetivo é trazer este tema para que o Plenário do Senado possa deliberar.

    Afinal, há coisas muito boas derivadas da tecnologia, mas também enfrentamos desdobramentos perigosos, que colocam em risco não só a nossa privacidade como pessoa humana, mas também a democracia, com todas as notícias falsas e manipulações que temos observado.

    Caros colegas e especialistas, a privacidade digital é base para uma democracia livre e forte e deve ser protegida. Proteger os dados e as comunicações digitais é fundamental para garantir a democracia e o direito à livre escolha, a fim de evitar situações de manipulação, considerando por certo o papel que a internet tem nos dias atuais e que continuará tendo.

    A privacidade é um direito fundamental, porque, se você não tem direito a proteger a sua privacidade, qualquer um pode controlá-lo ou manipulá-lo. A privacidade é uma condição fundamental, por exemplo, para que você tenha sua própria opinião, para que você expresse sua opinião e se certifique de que ninguém está lhe influenciando. É parte importante de uma democracia livre. Portanto, precisa ser protegida.

    A relatora do projeto de proteção de dados no Parlamento Europeu, a Deputada Birgit Sippel faz uma importante comparação – aspas: "Se você manda uma carta a alguém, pelos correios, essa carta obviamente será confidencial. É a mesma coisa para ligações telefônicas, mensagens eletrônicas ou qualquer outra coisa. Para nós, é muito claro que, se queremos proteger a privacidade dos cidadãos, nós precisamos de regras rigorosas, mais do que apenas proteger os dados."

    Nossa legislação precisa não apenas inibir e mitigar, mas também combater os desdobramentos perigosos da tecnologia digital – perigoso para o bem e para o mal. Para isso, o Brasil deve se valer do melhor da experiência internacional, enraizada em dois campos complementares pelo menos: trata-se de preservar e garantir direitos fundamentais à privacidade e à informação, além de dialogar com garantias legais que incentivem a inovação. Afinal, a inovação digital em negócios no poder público, nas relações pessoais, assim como na comunidade internacional como um todo, configura, por certo, uma facilitadora no dia a dia das pessoas.

    Srªs e Srs. Parlamentares, convidadas e convidados, brasileiros que nos acompanham pela TV Senado, o atual regime de proteção à privacidade no País não conta ainda com uma lei de proteção de dados pessoais que atenda a dois princípios essenciais: a proteção a direitos fundamentais relacionados à internet e o necessário e adequado fomento a atividades econômicas baseadas em análises de dados. Nesse sentido, precisamos equilibrar os interesses econômicos e sociais e, assim, estimular o uso racional e eficaz das informações, sem que sejam violados os direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, nem inviabilizada a atividade econômica.

    Precisamos, em outras palavras, reforçar o equilíbrio entre privacidade e inovação. Nesse sentido, queremos conciliar os fundamentos das legislações europeia e norte-americana. A primeira tem evidente protagonismo pró-consumidor, enquanto a segunda tem destacado foco na inovação, pró-iniciativas de mercado. Os Estados Unidos abrem espaço para empresas de armazenamento e tratamento de dados, o que estimula a geração de empregos e de renda.

    Diante da realidade do fluxo internacional de dados, a adoção dessa abordagem globalizada é fundamental para garantir e estimular a inovação. Na economia digital, as transações comerciais são suportadas por fluxos de dados internacionais. Daí que custos desnecessários ou restrições injustificadas podem limitar significativamente o potencial das tecnologias. O excesso de proteção a informações pessoais por meio da privacidade pode levar a efeitos indesejados, como a criação de obstáculos ao desenvolvimento econômico e tecnológico, à livre iniciativa e à livre concorrência.

    Reconhecemos que a proteção à vida privada é um direito fundamental, sem o qual não há pleno desenvolvimento da personalidade. Ao mesmo tempo, defendemos o balanceamento de interesses constitucionais relevantes, como a livre iniciativa e a segurança jurídica, assim como a eficiência na Administração Pública, bem como a inovação.

    Defendemos, portanto, uma calibragem, unindo as duas pontas desse modelo. E, para todos nós, será muito importante que nós possamos ouvir as percepções e aquilo que todas as senhoras e os senhores têm de experiência acumulada neste campo. Afinal, não podem ser ignorados os benefícios da inovação no dia a dia das pessoas e nos avanços civilizatórios.

    Por outro lado, claro que a inovação precisa ter passagem, mas não a qualquer e todo custo. Uma internet sem ética é um retorno ao primitivismo, à guerra do todos contra todos, do mais forte contra o mais fraco. A internet, repito, não pode ser uma terra de ninguém. Vamos, portanto, devagar com o andor, pois o santo é de barro.

    Srs. Parlamentares, autoridades e especialistas, é tarefa do Congresso Nacional, especificamente do Senado, legislar em defesa da sociedade, evitando dolo, prejuízo ou limitação no tráfego de informação por meio virtual. Precisamos assegurar que informações pessoais não sejam contrabandeadas num mercado paralelo e caiam na mão de terceiros.

    A Constituição Federal, no seu art. 5°, inciso X, tratou de proteger a privacidade, assim assegurando: "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".

    Sabemos, pois, que o acesso à internet não representa apenas diversão e entretenimento, mas propicia inclusão social, conhecimento e exercício da cidadania no dia a dia. É ferramenta, portanto, indutora de inovação e de avanço tecnológico. Não seria razoável permitir que esta fonte de informação, de transações econômicas, de relações pessoais e de serviço público seja alvo de limitação ou de uso inadequado.

    Ora, a internet não é e não pode ser uma terra sem lei. Nesse sentido, nosso relatório pretende preservar a constituição desta rede como patrimônio coletivo e fundamental para a igualdade de oportunidades. É um serviço de utilidade pública que não pode ter interferências ilegais.

    Em estudo, ainda em 2015, o Comitê Gestor da Internet no Brasil, com outras instituições, mostrou que 58% da população brasileira usam a rede mundial de computadores. Isso representa mais de 105, 108 milhões de brasileiros.

    Além disso, diversos aspectos do exercício da cidadania dependem da internet, como acesso a processos judiciais, ensino a distância, declaração de Imposto de Renda e pagamento de obrigações tributárias. Tudo isso aponta para uma única direção: a legislação brasileira precisa garantir privacidade e correto tratamento de dados a esses usuários.

    Ao fazer, portanto, a abertura, manifestando alguns princípios e alguns conceitos, nós gostaríamos, sem mais delongas, de convidar para fazer uso da palavra, S. Exª o Senador Antonio Carlos Valadares, que, ainda em 2013, apresentou proposta para a proteção de dados, que, portanto, durantes esses anos todos, estamos debatendo aqui no Senado.

    Por certo, esta é uma sessão temática derradeira, para que nós possamos apresentar, na Comissão de Assuntos Econômicos, o nosso parecer, à luz, inclusive, das mudanças e das transformações que aconteceram de lá para cá, para que possamos oferecer à sociedade brasileira uma legislação adequada e equilibrada.

    Com a palavra S. Exª o Senador Antonio Carlos Valadares.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/04/2018 - Página 12