Fala da Presidência durante a 57ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Comentário acerca das medidas necessárias para melhorar a distribuição de renda no País.

Autor
Cristovam Buarque (PPS - CIDADANIA/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Fala da Presidência
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL:
  • Comentário acerca das medidas necessárias para melhorar a distribuição de renda no País.
Publicação
Publicação no DSF de 27/04/2018 - Página 67
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL
Indexação
  • COMENTARIO, PROVIDENCIA, OBJETIVO, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, PAIS, ENFASE, IGUALDADE, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, DESTINAÇÃO, PESSOAS, POBREZA, RELEVANCIA, QUANTIDADE, RENDA, DEFESA, AMPLIAÇÃO, ACESSO, EDUCAÇÃO, QUALIDADE.

    O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Senador Dário, eu queria fazer um comentário, sobre uma pergunta sua, que é raro a gente ouvir aqui: "Eu não posso fazer nada para quebrar essa maldição da concentração de renda?".

    O senhor é o primeiro que pergunta, e, segundo, uma pergunta tão boa.

    Eu vou dizer: pode. O que a gente faz para distribuir a renda? Por que o Brasil continua hoje como o décimo pior país do mundo em concentração de renda? Já foi até o terceiro. Décimo... É terrível! Para se ter uma ideia, a Coreia do Sul é a décima melhor em distribuição. Nós somos o décimo pior em concentração.

    O que precisamos fazer? Colocar a escola dos 10% mais ricos na mesma escola dos 50% mais pobres. Como o senhor disse, 10% da população tem 50% da renda. E 50% da população tem 10% da renda. É uma concentração brutal.

    Pode fazer escola igual. A escola igual distribui a renda, e vou mostrar porque, dando um exemplo em que isso acontece. Eu duvido que haja um jogador de futebol da seleção brasileira que tenha sido originado filho dos 10% mais ricos. Eles são de baixo. Até terminam ficando ricos, como esse Neymar. Mas eles são quase todos originados de baixo. E sabe por quê? Porque a bola é redonda para pobre e para rico. Então, chegam lá em cima os mais talentosos, persistentes – porque é preciso persistir – e com vocação.

    É a bola redonda que distribuiu o talento do futebol, igualmente independente da renda da família. Se a gente fizesse isso com a escola, primeiro a gente distribuiria melhor, muito melhor. Segundo, não ia ser todo mundo igual, mas quem estivesse em cima ou embaixo era pelo talento, não pela herança. É disso que a gente precisa.

    Todo problema termina sendo educação. A concentração de renda talvez seja o maior deles, desde que seja igual. Mas há outra coisa mais importante. Sabe qual é? O senhor perguntou o que a gente pode fazer: vamos supor que houvesse um jeito de distribuir a renda sem precisar da educação; todo mundo ganhando igual. Sabe qual seria a renda de cada um? R$2 mil por mês. Se a gente pegasse a renda geral do Brasil, PIB, e distribuísse por todos, daria uma renda de R$2 mil. Não é essa coisa toda.

    O bom da educação é que, além de distribuir bem, aumenta a renda por causa da produtividade. Cada pessoa educada tende a produzir mais do que uma pessoa sem educação, e, ao produzir mais, aumenta o produto e distribui melhor o produto.

    Então, no fim, o que a gente pode fazer? É a educação, como fizemos com o futebol. Eu acho até perigoso eu falar isso porque – temos aqui, que chegou, o Deputado Izalci, que é muito ligado à educação –, eu fiquei preocupado em falar nesse negócio de bola redonda para todos os filhos de pobres que chegam na seleção porque é capaz de começar a haver gente propondo dar bola quadrada para os filhos dos pobres para que eles não cheguem na seleção. Fizeram com a escola, podem fazer com a bola... Mas, felizmente, não vai dar muito para isso.

    Agora, quero dizer o seguinte: pode mudar de repente isto de que os filhos dos pobres chegam na seleção. É que não basta a bola, é preciso ter um campo de pelada, e estão sumindo os campos de pelada por causa da especulação imobiliária e da violência. As pessoas já não deixam seus filhos irem bater bola na quadra, na rua. Daqui a pouco, para ser futebolista, tem que ter um clube, tem que ser pago ou tem que ser uma escola em horário integral, e só os ricos têm. Então, a gente pode estar caminhando para, em 20 ou 30 anos, mudar o perfil social dos jogadores de futebol brasileiro, beneficiando os ricos.

    Agora, sabe o que vai acontecer com o futebol brasileiro? Ele vai cair porque, se o número dos que jogam é menor, estamos jogando fora talento – e é isso que a gente faz com ciência. Estamos jogando fora os talentos e não temos um Prêmio Nobel. Temos muitos bons jogadores de futebol porque a bola é redonda, todo mundo pratica, e os melhores chegam lá. Mas na ciência não: só poucos têm acesso. Então, os nossos cientistas morreram antes de aprender as quatro operações, os nossos literatos morreram sem saber ler. Jogamos fora o potencial. É educação, respondendo a sua pergunta que eu agradeço muito.

    Dito isso, dou por encerrada esta sessão.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/04/2018 - Página 67