Discurso durante a 59ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários a respeito de investigações criminais contra o ex-governador do estado do Paraná, Beto Richa.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:
  • Comentários a respeito de investigações criminais contra o ex-governador do estado do Paraná, Beto Richa.
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/2018 - Página 28
Assunto
Outros > CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Indexação
  • COMENTARIO, ASSUNTO, INVESTIGAÇÃO, REALIZAÇÃO, POLICIA FEDERAL, ATO, CORRUPÇÃO, OPERAÇÃO LAVA JATO, PARTICIPAÇÃO, AUDITOR FISCAL, AUSENCIA, LEGALIDADE, CONSTRUÇÃO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, DESVIO, VERBA, PUBLICO, ACUSADO, BETO RICHA, EX GOVERNADOR, ESTADO DO PARANA (PR).

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Senadora Vanessa, eu tinha duas opções de pronunciamento hoje. Uma opção se suportaria na visão bíblica do juiz iníquo; seria um discurso mais curto. Mas, dada a complacência do Plenário de V. Exª, eu farei um discurso um pouco mais longo, abrangendo questões, Senadora Gleisi, do nosso Paraná e do Brasil.

    Mais uma vez, Senadora Gleisi, eu sigo a recomendação de Marshall McLuhan e canto a minha aldeia, para ser universal. Canto as coisas de minha terra, o Paraná, para alcançar o Brasil.

    A novidade por lá é que, depois de sete anos e três meses de mandato, Beto Richa, o Governador, renunciou ao governo para ser candidato a alguma coisa e, assim, reconquistar imunidades.

    Como Beto está enrolado na Lava Jato e em mais quatro outras grandes investigações policiais, o foro privilegiado cairia à fiveleta para S. Exª. As operações atingem o candidato a qualquer coisa e têm nome de batismo, padrinhos, afilhados, compadres e adjacências registrados nos cartórios policiais, nas atas das devassas, nos livros dos malfeitos.

    Vamos à lista.

    Operação Voldemort, assim denominada para homenagear o personagem sinistro da série Harry Potter. Essa operação investigou um primo do Governador e associados, que montaram um esquema fraudulento de reparos de carros oficiais. A primeira reação de S. Exª, assim que o caso explodiu, foi negar o parentesco com o indigitado primo. Como isso era impossível, disse que se tratava, então, de um primo distante, que mal conhecia, fato também desmentido por fotos, vídeos e uma profusão de rastros, inclusive o fato de o primo ser seu assessor desde seu mandato na Prefeitura Municipal.

    Até cair em desgraça, o primo distante do Governador era uma das figuras mais influentes da gestão tucana, mesmo, num determinado momento, sem cargo público. Um homem nas sombras, atrás dos bastidores, influindo e decidindo.

    A Operação Publicano, que ganhou esse nome por referência ao coletor de impostos que aparece nos Evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas, desmantelou um esquema de desvio de 1,8 bilhão da Receita Estadual, envolvendo mais de uma centena de auditores, contadores e fiscais. O comandante do esquema era o inspetor geral de fiscalização, íntimo do Governador Richa, a ponto de ser o seu copiloto nas 500 Milhas de Londrina, competição que sempre contou com a prestigiosa participação do atualmente ex-Governador.

    Beto, é claro, disse que pouco conhecia seu copiloto. E, cá entre nós, eu acredito que isso é possível, porque o rapaz usava o capacete de competição nas corridas, e talvez o Governador, embora sendo ele seu copiloto, nunca o tivesse visto e conhecido ao vivo. Risível o argumento.

    Parte dos desvios bilionários, apurou-se, abasteceu as contas da campanha de reeleição do ex-Governador. O copiloto, no entanto, Srs. Senadores, ouvintes da Rádio e da TV Senado, já foi condenado a 97 anos de cadeia. O foro privilegiado deixa o ex-Governador, até agora, pelo menos, fora do foco da Justiça.

    Operação Quadro Negro, que apura o desvio de dezenas de milhões de reais na construção de escolas no Paraná. Conforme denúncias, o dinheiro subtraído também abasteceu a campanha de reeleição de Beto Richa. Aqui novamente o envolvimento de pessoas de relações pessoais íntimas do Governador.

    Operação Integração, que investiga um mega esquema de corrupção, propina, extorsão e enriquecimento ilícito envolvendo concessionárias de pedágio, empreiteiras e funcionários públicos. Mais uma vez, pessoas do círculo próximo e familiar do ex-Governador foram presas, denunciadas ou ficaram sob suspeição.

    A Operação Publicano começou em janeiro de 2015, com a prisão de um assessor de Beto Richa, o fotógrafo Marcelo Caramori. O rapaz era tão entusiasta do ex-Governador que tatuou o nome de S. Exª em seu corpo e exibia orgulhoso, como um cachorro amestrado, a marca do dono.

    Caramori foi preso por corrupção e exploração de menores. Na cadeia abriu o bico e entregou os esquemas da Receita e os feitos do primo distante de Richa. Não se sabe se Caramori ou "Camarori" apagou ou não a tatuagem.

    Outra marca da gestão de Beto Richa é a Batalha do Centro Cívico, ocorrida no dia 29 de abriu de 2015, que resultou no massacre de professores e de funcionários públicos, que, entre outras coisas, protestavam contra a reforma da previdência pública estadual.

    Fatos marcantes da Batalha do Centro Cívico, além da brutal repressão ao ato dos manifestantes, são a formação da "Bancada do Camburão" e a fuga grotesca, ridícula do então Secretário de Segurança – o famoso Francischini, Senadora Gleisi Hoffmann –, quando confrontado por um único professor, saiu rapidamente, em uma espécie de balé desesperado, na fuga amedrontado.

    Essa cena ao mesmo tempo hilária e patética do professor que tirou o valente secretário para dançar está na internet. Recomendo a audiência dessa cena no YouTube.

    A bancada de apoio a Beto Richa ganhou um apelido, "Bancada do Camburão", porque chegou de camburão da Polícia à Assembleia Legislativa para votar o raio da reforma previdenciária. Foi a forma que o Governador encontrou para proteger seus deputados, abrigá-los em carros blindados usados para transporte de presos perigosos. Apropriada a condução.

    A reforma, é claro, foi aprovada. E dois anos depois, na exata semana em que Beto Richa deixava o governo, veio a revelação: o patrimônio da Paranaprevidência sofreu, até agora, um rombo de R$4,6 bilhões. Com a reforma, o caixa do instituto vem sendo saqueado mês a mês, ininterruptamente.

    Inepto e perdulário, o governo Richa descapitalizou o fundo de pensões dos servidores públicos do Paraná para cobrir toda sorte de rombos, de buracos que a gestão incompetente provocou nas finanças estaduais.

    Caso fossem somados os resultados dos desvios da Voldemort, da Publicano, da Quadro Negro e da Integração, teríamos uma soma igual ou superior àquela que ele arrebatou, retirou, sorrateiramente, à sorrelfa, da Paranaprevidência.

    Mais ainda: na busca ensandecida por dinheiro, o ex-Governador voltou a cobrar impostos dos microempresários e aumentou a alíquota dos pequenos empresários. Os micros não pagavam nada quando eu fui Governador, e a alíquota dos pequenos não chegava a dois por cento.

    Com uma rejeição semelhante à de Michel Temer, S. Exª estadual também recorreu à propaganda, à manipulação da propaganda para sair do atoleiro. Boa parte da dinheirama desviada da Previdência foi destinada a simular obras, a distribuir migalhas a prefeitos e assim sustentar a candidatura de Sua ex-Excelência a um cargo qualquer que lhe garanta foro privilegiado.

    Ah, sim! Como outras vestais da política brasileira, Beto também vestiu a camisa da CBF e foi às ruas, protestar contra a corrupção, com o mesmo arroubo, com a mesma fúria moralista e com as mesmas palavras incandescentes de um Geddel Vieira Lima.

    Ele também apoiou o "Bonde do PSDB" que, no dia 13 de março de 2016, foi à Paulista pedir o impeachment de Dilma, mas acabou sendo hostilizado pelos manifestantes.

    Fraudes nos reparos de veículos oficiais; escolas pagas e não construídas; desvios na Receita; propina nos contratos de pedágio; desfalque na previdência do funcionalismo; aumento dos impostos dos pequenos empresários e isenção absoluta de impostos para o maior fabricante de cerveja do mundo; venda das ações das estatais de energia e de água e esgotos; aumento de 135% na tarifa de água, para dar mais lucro ao sócio privado da empresa de saneamento; trapaças na propaganda oficial, com o ex-governador assumindo obras que não fez e não fará, porque já, felizmente, saiu do Governo.

    Triste Paraná! Quantos negócios, quantos negociantes, diria o poeta baiano!

    Do prisma do qual contemplo os descaminhos da Administração Pública em meu Estado, vejo reflexos na vida nacional.

    Vejo que a farsa da retomada do crescimento econômico desfaz-se melancolicamente, sombriamente. E, para animar a torcida e dar manchetes aos "jornalões", eis que vem a Diretora-Gerente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, saudar a – abro aspas – "recuperação do Brasil graças às reformas estruturais feitas pelo Governo Temer".

    Sobre isso, antes que volte à rota a que me propus seguir, permito-me três comentários.

    Primeiro, o FMI, com o qual o Lula saudou a dívida e mandou passear, ressurgiu na pauta da tal "grande imprensa". Folha e Globo, por exemplo, voltaram a despachar enviados especiais para cobrir as reuniões do Fundo em Washington. Virou de novo, novamente, uma estrela preferida da imprensa brasileira.

    Segundo lugar: Lagarde trapaceou descaradamente sobre as tais "reformas estruturais de Temer", já que a trabalhista é um fracasso retumbante, a previdenciária gorou, e a PEC dos Gastos é desrespeitada toda hora pelo próprio Governo. Em março, por exemplo, as contas do Governo registraram um rombo de 25 bilhões de reais, o maior rombo para os meses de março em 22 anos. E não foi, é claro, para dar dinheiro à educação, à saúde ou à segurança

    Em terceiro lugar, com o estouro da bolha financeira, em 2008, o FMI, o Banco Mundial, o FED – americano –, o Banco Central Europeu, as agências de risco, os economistas de mercado e os 391 comentaristas econômicos das Organizações Globo desmoralizaram-se, porque, na véspera do cataclismo, saudavam a higidez da economia mundial. Agora, retomam o mesmo discurso, reentronizam em seus altares de devoção ao FMI, as agências de risco.

    No final do ano passado, esta tribuna era ocupada diariamente pelos arautos do bom tempo. Comemoravam o fim da crise econômica, o crescimento do PIB, a criação de empregos, a religação das máquinas nas indústrias.

    Embora esta chuva de maná não fosse percebida pelos brasileiros, especialmente as massas desempregadas, havia festa no plenário do Senado. Mas qual a realidade mal disfarçada pela propaganda, pelo voluntarismo da Bancada governista, pela mídia aliada e manipuladora?

    Vejam: no primeiro trimestre do ano passado, o crescimento foi de 1,3%; no segundo trimestre, cai para 0,6%; no terceiro, nova queda, 0,2%; no quarto e último trimestre, outro rombo, 0,1%. Onde, então, a retomada?

    Em janeiro deste ano, um novo choque de realidade: queda do PIB de 0,65%, e um desenxabido crescimento de 0,09% em fevereiro.

    "Ah, mas a inflação continua caindo", proclama a mídia amiga, e orgulha-se a rapaziada do Banco Central.

    Deus meu! A atividade econômica está em baixa, consumo em baixa, crédito em baixa, desemprego em alta. Com essas interferências na conta, como não ter uma inflação hibernal, abaixo de zero? Comemorar deflação é a idiotia em seu estado puro.

    A nudez do fracasso da política de austeridade escancara-se despudoradamente, mas há ainda quem insista em não ver do que é feita a velha roupa do rei.

    E nada faz tão mal ao Brasil que as notícias falsas, que os números fantasiosos sobre a volta do crescimento do País.

    Tomar alguns espasmos, aqueles movimentos irrefletidos, involuntários, de um corpo em agonia, como manifestação de vida é coisa ou de nefelibatas ou de pessoas mal-intencionadas. Escolham, Srs. Senadores.

    Há uma simetria, um sincronismo perfeito entre esse discurso da volta do crescimento e o discurso moralista do combate à corrupção e do "punitivismo". Ambos têm a mesma base falaciosa e a mesma determinação de desviar do que interessa.

    Se a fantasia da volta do crescimento econômico pretende empanar o fracasso da política de austeridade fiscal, a cruzada moralista serve de biombo para que se pratique toda espécie de crimes, de assaltos e pilhagens contra o País.

    Os nossos Torquemadas, os Savonarolas de primeira instância, os bem nutridos e corados ascetas jejuadores, oradores de orações em jejum, para viabilizar prisões indevidas, os juízes e procuradores habitués de Harvard (oh, que glória, Senador Flexa, habitués de Harvard, coisa chique, para ninguém pôr defeito) pouco se dão se o País desfaz-se do petróleo, das hidrelétricas, dos rios, das terras, do espaço aéreo, do mar territorial, da tecnologia e da inovação.

    Pouco se dão, se a fome volta à mesa...

(Soa a campainha.)

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR) – ... de milhões de brasileiros, se a reforma trabalhista é um desastre que impulsiona o desemprego, o subemprego, a escravização.

    Pouco se dão, se o combustível de cerca de 10 milhões de brasileiros volta a ser a lenha, Senador Lindbergh.

    Que se lhes dá, se o País se desarticula e se desmancha, desde que Lula esteja preso? Desde que, com a colaboração da mídia canalha e a farsa do tríplex, se tenha colocado Lula na cadeia? Que se lhes dá, desde que a CIA, a NSA, o FBI, o Departamento de Estado, a CNN e os "jornalões" norte-americanos os aprovem, incensem, puxem-lhes o saco e acariciem-lhes o ego, desde que a mais venal, perjura e farsesca mídia comercial sob a face da Terra, que é a mídia brasileira, os eleve a heróis?

    Diante disso, e apesar disso, da altura dos meus 77 anos e desde muito cedo na liça, não perco a fé, não me esmorece a esperança.

    O que esses néscios, desprovidos de entendimento e de discernimento, incapazes de romper o círculo da ignorância, do provincianismo e da patetice, o que eles não entendem é que, muito em breve, serão lembrados com a mesma repulsa que causam os inquisidores, os fascistas e os traidores da Pátria.

    Esses tempos trevosos, lá no meu Paraná e aqui no meu País, serão iluminados pela Justiça, pela brasilidade, pela soberania nacional, pela honradez, pelo amor ao povo e pela ação administrativa competente. Afinal, o meu Estado e o meu País não são feitos pela média da opinião dos imbecis que circula na internet, na mídia comercial e parece, aparentemente, dominar a rede.

    Que assim seja! É a esperança que nós temos.

    Este momento triste deverá ter fim. E terá fim, se tiver coragem o Supremo Tribunal de libertar rapidamente o Lula, para que o Brasil seja rediscutido, com referendo revogatório e, finalmente, uma Constituinte, para a devolução da dignidade aos brasileiros e para a devolução da soberania ao nosso País.

    Obrigado pela tolerância no tempo, Exmo Sr. Presidente eventual da Casa, neste momento.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/2018 - Página 28