Discurso durante a 63ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa do fim do instituto do foro privilegiado.

Autor
Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CONSTITUIÇÃO:
  • Defesa do fim do instituto do foro privilegiado.
Publicação
Publicação no DSF de 08/05/2018 - Página 63
Assunto
Outros > CONSTITUIÇÃO
Indexação
  • DEFESA, ENCERRAMENTO, FORO ESPECIAL, PRIVILEGIO, GRUPO, AUTORIDADE PUBLICA, PRERROGATIVA DE FUNÇÃO, ELOGIO, DECISÃO JUDICIAL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), FAVORECIMENTO, LIMITAÇÃO, BENEFICIO, COMBATE, IMPUNIDADE.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Muitíssimo obrigado, Senador Paulo Rocha.

    Srªs Senadoras, Srs. Senadores, todos que nos assistem e nos ouvem pela TV e pela Rádio Senado, nesta semana, o Supremo Tribunal Federal, num julgamento que eu considero histórico, limitou a extensão do chamado foro... O nome, inclusive, foro privilegiado, como foi apelidado, é mais adequado do que o nome pomposo que está na Constituição, de foro por prerrogativa de função, porque ele se tornou lamentavelmente no Brasil, de fato, isto: um instituto que privilegia a impunidade.

    Nesta semana, o Supremo Tribunal Federal, num julgamento que, repito, considero histórico, modulou os efeitos do foro, em especial para membros do Congresso Nacional.

    É importante aqui resgatar um pouco da história da tramitação desse tema pelo Congresso Nacional.

    Aliás, Sr. Presidente, o fato de essa questão... Eu considero inapropriado essa questão ter sido resolvida pelo Supremo Tribunal Federal, porque essa era uma questão típica do Parlamento. E o Parlamento teve a sua chance de resolução da questão.

    Nunca é demais lembrar que, há exato um ano, no mês de maio de 2017, nós aprovamos, neste plenário, por unanimidade, com o voto favorável de 75 Senadores, a Proposta de Emenda à Constituição nº 10, de 2013, cujo primeiro signatário foi o Senador Alvaro Dias, e coube a mim relatá-la. A proposta de emenda à Constituição foi aprovada por unanimidade e seguiu para a Câmara dos Deputados.

    A Câmara dos Deputados hoje pode adequadamente dizer que não pode fazer tramitar nenhuma proposta de emenda à Constituição, em decorrência do disposto no art. 60 da Constituição, e um dos entes federados está sob intervenção, no caso, o Rio de Janeiro, e a própria Constituição impede propostas de emenda à Constituição de tramitar. É verdade, mas nunca é demais lembrar também que é verdade que a PEC 10 foi aprovada em maio, seguiu imediatamente para a Câmara dos Deputados, e a intervenção no Estado do Rio de Janeiro só veio a ocorrer no mês de fevereiro, março deste ano. Ou seja, durante quase um ano na Câmara dos Deputados, o Sr. Presidente da Câmara e os Líderes partidários nem sequer designaram os membros da comissão especial para averiguar, para analisar, melhor dizendo, a proposta de emenda à Constituição que nós aprovamos aqui no Senado.

    Há quase um ano, a proposta de emenda à Constituição ficou parada na Câmara dos Deputados. Logo, há de se saudar a decisão do Supremo Tribunal Federal para que fique claro que, na política, como não existe espaço vazio, o Judiciário acaba tomando atitudes quando os agentes políticos, no caso, o Congresso Nacional, não tomam.

    Esse é um caso típico. Nós poderíamos já ter aprovado, no Congresso Nacional, a proposta de emenda à Constituição que acaba com o foro privilegiado para todas as autoridades, e não receber somente uma proposta, receber somente uma interpretação do Supremo que modula os efeitos do foro, somente para as Srªs e os Srs. Congressistas.

    Nunca é demais lembrar o dado astronômico dos números, Senador Paim. São 38 mil autoridades, segundo a Constituição, que têm acesso ao foro por prerrogativa de função. Em alguns Estados – é o caso, por exemplo, da Bahia, do Piauí e, se eu não me engano, do Pará –, o foro privilegiado é estendido até – pasmem os senhores – para vereadores e vice-prefeitos. Totalizam em todos os ordenamentos constitucionais – na nossa Constituição e nas Constituições estaduais – 54 mil autoridades com foro por prerrogativa de função.

    O que o Supremo Tribunal defendeu foi a modulação dos efeitos. Isso não significa que os que cometerem crimes no exercício dos mandatos congressuais responderão na primeira instância ou responderão como qualquer outro cidadão. Esses continuam protegidos pelo foro privilegiado. O que o Supremo Tribunal Federal definiu foi a moderação dos efeitos do foro para aqueles Congressistas que cometeram crimes, para os crimes cometidos anteriormente ao exercício do mandato.

    Hoje há uma convicção na sociedade brasileira, pesquisa recente aponta que 70% dos brasileiros são contra o instituto do foro privilegiado. Não é à toa, eu repito, essa denominação de privilegiado – não é à toa –, porque tem servido para isso, como um instituto para privilegiar alguns e acobertá-los com o manto da impunidade.

    Para se ter uma ideia, é importante destacar que um levantamento feito, em 2007, pela Associação de Magistrados Brasileiros apontou que, da promulgação da Constituição de 1988 até maio de 2006, ou seja, quase 20 anos de vigência da Constituição, nenhuma autoridade havia sido condenada no Supremo Tribunal Federal em 130 ações penais ajuizadas.

    No Superior Tribunal de Justiça, o dado é igualmente absurdo. Um total de 333 processos resultou na condenação no STJ de 5. Ou seja, o número absurdo de julgamentos no intervalo de 20 anos de 1,5% no Superior Tribunal de Justiça. No mesmo período, a Revista Congresso em Foco levantou que mais de 500 Parlamentares foram investigados no Supremo Tribunal Federal.

    A primeira condenação ocorreu apenas em 2010. Ou seja, em 124 anos da existência da nossa Suprema Corte, do nosso Supremo Tribunal Federal, somente tivemos uma condenação de alguém com foro de prerrogativa de função. De lá para cá, apenas 16 Congressistas que estavam no exercício do mandato foram condenados por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro, desvio de recursos públicos. Apenas em 2013, o primeiro Congressista em exercício do mandato, desde 1988, foi preso por ordem da Suprema Corte.

    Esses dados alarmantes, Sr. Presidente, são motivo de desgaste para as instituições, de enfraquecimento. O fato de o Congresso Nacional não ter resolvido a pendência sobre o foro, mesmo após o Plenário deste Senado ter aprovado, por unanimidade, é um fato que descredencia, descredibiliza o Congresso Nacional.

    O Sr. Presidente da Câmara resolveu montar agora a comissão especial. Obviamente a proposta de emenda à Constituição nem sequer poderá ser levada ao plenário agora neste período, por força da própria Constituição e do fato, repito, de haver uma intervenção num Estado federado. Mas ele a montou agora, e este é um tipo de procedimento, Sr. Presidente, que fica inadequado para os homens públicos, fica feio para os homens públicos. Passa-se um ano e não se instala a comissão especial para extinguir o foro privilegiado. Com a proposta de emenda à Constituição lá parada, passa um ano. Depois que o Supremo Tribunal Federal resolve instalar, numa espécie de tentativa de retaliação, ou correndo atrás, busca-se instalar a comissão especial.

    Sr. Presidente, tudo isso... Nós já sabemos das limitações e do que representa o foro privilegiado.

    Eu venho aqui à tribuna do Senado para anunciar uma iniciativa que estarei apresentando no dia de hoje. No dia de hoje, estarei apresentando um projeto de decreto legislativo para que os cidadãos brasileiros, nas eleições deste ano, através de plebiscito, decidam se querem a continuação do instituto do foro privilegiado no Brasil ou não.

    Eu acho isso mais adequado em vez de aguardarmos a tramitação da proposta de emenda à Constituição na Câmara dos Deputados, que está funcionando ao bel prazer da vontade do Sr. Presidente da Câmara dos Deputados, que ora instala a comissão logo após somente ter tido um julgamento do Supremo Tribunal Federal. E, mesmo assim, por força da própria Constituição, não poderá, pelo menos até o final do ano, esta proposta de emenda à Constituição ser votada. Considero mais adequado, Senador Paulo Paim, utilizarmos os instrumentos que a Constituição nos dá do exercício da democracia direta.

    O senhor, Senador Paulo Paim, Constituinte que foi, outorgou para nós, ou melhor, promulgou para nós, entregou para os brasileiros a Constituição mais avançada e democrática da nossa história. E, ao entregar essa Constituição, fundou em nosso País um regime de democracia semidireta participativa.

    Nenhuma das nossas Constituições anteriores dizia que o poder pode ser exercido diretamente pelo povo; essa Constituição disse isso, no parágrafo único do seu art. 1º, e remeteu as formas do exercício direto do poder pelo povo no art. 14 da Constituição: a iniciativa popular de lei, que já foi utilizada por este Congresso; o referendo, que já foi utilizado pelo povo brasileiro; e o plebiscito, que também já foi utilizado.

    Nós, nesses 30 anos de Constituição, utilizamos poucos, convidamos poucos, convocamos muito pouco o povo brasileiro a exercer o direito de democracia direta. Façamos isso este ano, utilizemos isso com o tema do foro privilegiado. Vamos para as urnas, não teremos dificuldades para isso.

    O cidadão, ao eleger Presidente, governador, dois Senadores, Deputado Federal e deputado estadual, terá, na urna eletrônica, mais uma quesitação: "Você é a favor, você concorda ou não com a continuação, com o instituto do foro por prerrogativa de função no Brasil?". E o povo decidirá. Não fiquemos mais a esperar o Supremo Tribunal Federal fazer julgamentos de modulação de efeitos e aí aplicar uma fórmula de modulação de efeitos para Congressistas que manda para a primeira instância aqueles que cometeram crimes fora do exercício do mandato, mas mantém o foro privilegiado para os Congressistas no exercício do mandato e para aqueles que cometeram crimes no exercício do mandato. Não fiquemos à mercê e à disposição de uma resolução que acaba mantendo o foro privilegiado para membros do Ministério Público, membros do Judiciário, membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, governadores, prefeitos e vereadores. Não é adequado e não é justo extinguir ou limitar para uns e não extinguir o foro privilegiado para todos. Remanesça-o somente ao Presidente da República e aos chefes dos Poderes e assim fique, mas essa decisão não pode mais...

    Não é adequado a essa altura aguardarmos para o ano que vem que a Câmara dos Deputados, ao bel-prazer de uma nova legislatura, aprecie uma proposta de emenda constitucional para encerrar ou não o foro privilegiado. É chegado o momento de o Congresso Nacional ter coragem. Nós podemos fazer isso por plebiscito.

    O projeto de decreto legislativo pode ser apreciado nesta semana; na semana seguinte, esse projeto de decreto legislativo pode ser aprovado pelo Plenário desta Casa; segue para a Câmara, a Câmara o aprova – e repito: um projeto de decreto legislativo não se submete à sanção presidencial –; o Tribunal Superior Eleitoral incluirá isso nas urnas da eleição deste ano; o povo decide; e se acaba o foro privilegiado no Brasil.

    É essa a proposta que estamos fazendo e apresentando a partir desse projeto de decreto legislativo para que nós não fiquemos mais à mercê de proposta de emenda constitucional; não fiquemos à mercê de julgamentos. Levemos e façamos o exercício da soberania popular, do sufrágio da soberania popular através do voto; e façamos isso já, de imediato, nas eleições deste ano.

    Então, Sr. Presidente, quero anunciar desta tribuna que estarei protocolando no dia de hoje – mais tarde teremos o número – esse projeto de decreto legislativo e convido os colegas Congressistas, Senadores e Senadoras, a debatermos essa proposta e ousarmos, tomar a decisão mais ousada e arrojada sobre o foro privilegiado. Não ficar à mercê ou refém de qualquer tipo de decisão.

    Encerremos essa polêmica sobre o foro da melhor forma que uma polêmica pode ser encerrada: decidida soberanamente pelo povo brasileiro, nas urnas. E, assim, sob a consulta do povo brasileiro, em seguida, o Congresso Nacional e as instituições apenas ratificariam – e tenho certeza de que assim vai ser – a decisão da ampla maioria dos brasileiros, se essa for a vontade do Congresso, de nas eleições optar pelo fim desse instituto em nosso País.

    Então, Sr. Presidente, o projeto de decreto legislativo será apresentado e eu aguardo o quanto antes a manifestação da nossa Casa, do Senado Federal, e do Congresso Nacional, para que o povo possa decidir sobre o fim do foro privilegiado ainda nas eleições deste ano.

    O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Senador Randolfe, permita-me dizer que estou junto com V. Exª também nessa empreitada. Conte comigo, sou parceiro.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP) – Honra enorme, Sr. Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Fim do foro privilegiado para todo mundo.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP) – Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/05/2018 - Página 63