Discurso durante a 66ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Pesar pela morte de uma das líderes do movimento Mães de Maio, Sra Vera Lúcia.

Reflexão a respeito da atual situação da segurança pública no Brasil.

Autor
Regina Sousa (PT - Partido dos Trabalhadores/PI)
Nome completo: Maria Regina Sousa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Pesar pela morte de uma das líderes do movimento Mães de Maio, Sra Vera Lúcia.
SEGURANÇA PUBLICA:
  • Reflexão a respeito da atual situação da segurança pública no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 10/05/2018 - Página 65
Assuntos
Outros > HOMENAGEM
Outros > SEGURANÇA PUBLICA
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, MULHER, FUNDADOR, PARTICIPAÇÃO, MOVIMENTO SOCIAL, DENOMINAÇÃO, MÃE, MAIO, REIVINDICAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, MORTE, FILHO, VITIMA, HOMICIDIO.
  • APREENSÃO, MOTIVO, AUMENTO, VIOLENCIA, REALIZAÇÃO, POLICIA, ESTADO, AGENTE, PUBLICO, VITIMA, HOMEM, MULHER, NEGRO, POPULAÇÃO, LESBICAS GAYS TRAVESTIS TRANSSEXUAIS E TRANSGENEROS (LGBT).

    A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, eu vim aqui para fazer mais um registro e aprofundar a discussão que se fez aqui, segunda-feira, sobre a violência.

    Então, eu queria fazer um comunicado: a Vera Lúcia, uma das fundadoras do grupo Mães de Maio, foi encontrada morta em casa, provavelmente por suicídio. Talvez a maioria das pessoas não saibam o que é esse movimento das Mães de Maio, lá de São Paulo. Em maio de 2006, mais de 500 pessoas foram executadas. E, daí, as mães que perderam os seus filhos, suas filhas, criaram esse movimento. Até uma delas veio aqui uma vez, no Dia Internacional da mulher.

    Elas ficam na Praça da Sé, com faixas, com cartazes, a maioria delas, porque não tiveram sequer o direito de enterrar os seus filhos. O grupo de extermínio, polícia, mataram seus filhos, e elas sequer tiveram o direito de enterrá-los. Não sabem onde foram parar os corpos.

    E essa moça era uma das grandes lideranças lá, mas ela entrou em depressão, porque, nesse extermínio, mataram a filha dela, grávida de nove meses, e o genro.

    Então, eu já estive lá em São Paulo, numa diligência, em que essas mães foram ao Ministério Público comigo, com o Paulo Teixeira, com alguns Senadores, e nós ouvimos depoimentos terríveis, de mãe dizer que a polícia matou o seu filho no seu colo. O menino correu, sentou-se no colo da mãe, e a polícia matou assim mesmo. Estava na porta de casa.

    Então, são depoimentos dolorosos, um grito de dor, uma dor indizível.

    Essas mães estão lá, e a maioria das pessoas passam indiferentes. E o Governo e a Prefeitura de São Paulo também não tomam providências, para pelo menos amenizar, fazer investigação, dar uma resposta. Elas querem uma resposta.

    Então, a Vera Lúcia foi encontrada morta, e é mais uma perda no movimento.

    Eu quero entrar na questão da violência, que nós debatemos tanto aqui, porque agora há um projeto de segurança pública que, se não levar em conta as várias violências que existem neste País, vai virar só um aparato policial, de melhorar o aparato, de aumentar o efetivo, de aumentar o salário... Tudo isso é necessário, mas, se não se levar em conta as várias violências, para propor políticas para resolvê-las, não vai adiantar muito.

    Essas mães precisam de uma política para elas. Elas já estão virando zumbi. Algumas dizem que não levantam mais da cama, que não têm mais coragem de se levantar. Então, aos poucos elas vão sumir, vão desaparecer, porque há depoimentos incríveis, aqui, de mães que perderam seus filhos, suas filhas, naquele episódio de São Paulo, no mês de maio.

    A gente discutiu aqui, segunda-feira, com a CNBB, a questão das violências. E a gente tratava exatamente disso: a violência institucional, a violência do Estado. Se não cuidar disso, o Susp, famoso, que vem para ser discutido aqui, não vai ter solução. O Estado tem a sua violência, que a gente chama de violência institucional.

    A gente tem o Estado que exterminou – houve a CPI da juventude negra –, que extermina a juventude, principalmente os meninos e as meninas negras, mais os meninos. E houve a CPI. Quais foram as políticas adotadas? Os negros continuam morrendo.

    Um Estado que não vê uma população em situação de rua: 300 mil pessoas, segundo as contas das pastorais. O IBGE não conta, porque eles não têm endereço. E as pessoas passam indiferentes àquilo lá.

    E a audiência pública que a gente fez lá também revelou coisas incríveis. Ouvi um menino de rua, uma pessoa que mora na rua, dizer – e a gente percebia que ele estava drogado. E ele dizia: "Senadora, nós não somos perigosos; nós estamos em perigo." Então, eles têm lá a mão do Pe. Júlio Lancelotti e de algumas pessoas que ajudam.

    Eles não tiram documento porque não têm endereço. E um deles disse que duro não é morar na rua; duro é não ter direito. "Eu quero morar na rua, mas eu quero ter direito." Então, são depoimentos, assim, de fazer a gente chorar, daquela população de lá de São Paulo, que é um resumo de tudo. Não é só de São Paulo, mas falamos de São Paulo porque é muito maior o volume, é mais gritante a situação das pessoas. E esse Estado não vê, esse Estado não assume isso. É invisível: essa população é invisível para o Estado. Não existe.

    É um Estado que não dá segurança aos seus policias. Quantos policiais estão morrendo, estão sendo assassinados?

    É um Estado que permite a violência dos autos de resistência, e aquilo é uma autorização para matar. Tem que acabar com isso. Auto de resistência é autorização para matar. Diz que resistiu e mata.

    Então, isso tudo é responsabilidade do Estado, um Estado que, de certa forma, aceita o trabalho escravo, porque, se dá para emitir uma portaria regulamentando o trabalho escravo, é porque acha que é normal. Um Estado que faz a reforma trabalhista que, gera desemprego... E depois esse pessoal pode descambar para a violência também.

    Então, a gente precisa discutir violências, com todos os esses que a gente puder puxar, porque não adianta vir um plano que não considera essas questões, que não considera a violência contra a mulher, contra os negros, contra a população LGBT– a pessoa morre por sua opção sexual.

    Está aí o assassinato da Marielle. Pelo que se está vendo aí, foi só uma disputa política: "Essa mulher está me atrapalhando...". Não sei, se for verdade o que está dito aí... "Está e atrapalhando, por isso tem que morrer." Que País é este que nós estamos construindo?

    E, aí, eu quero lembrar aqui os atentados, que não são sequer apurados – e eu vou ler alguns aqui –, que têm acontecido com o PT. Pelo menos nove sedes do PT sofreram atentado, de 2016 para cá. Não há resultado de nenhuma apuração. Alguns nem foram apurados; de outros, abriram inquérito, mas não há um resultado.

    E há mais a caravana Lula. Descobriram de onde foi, de que tipo de arma saiu, mas também ficou por isso. O delegado que iniciou o processo foi, inclusive, afastado, porque ele disse que tinha sido um atentado. E o outro, que ficou no lugar, agora concluiu que foi um atentado. Quem fez aquilo estava querendo matar alguém dentro daquele ônibus. Mas também não se encontra o culpado, apesar de ter sido na fazenda de um dos que estavam interditando a estrada, com seus tratores. Um fazendeiro. Pelo menos, alguém mandado por ele pode ter feito isso.

    E o atentado ao acampamento lá em Curitiba.

    Sabe-se que uma pessoa passou atirando, há vídeos, mas até agora também não se sabe... É muito lento o processo! Quando querem, é bem rápido. Mas essas coisas... Se a gente banalizar atentado, eu não sei para onde vai este País. Se a gente não cuidar disso... Porque foi contra o PT? Mas pode ser contra outro partido, porque, se fica normal, qualquer um pode praticar um atentado contra qualquer sede de partido. Simplesmente porque não gosta, porque não é partidário desse grupo, tem que fazer essas coisas? É, só pode ser. Achando que não se vai apurar nada, que não tem nada.

    Depois, um policial federal vai lá e quebra o som do... Um policial federal! Imagina nas mãos de quem nós estamos? Porque a Polícia Federal, hoje, é a menina dos olhos. E, aí, um policial federal, um delegado, vai a um acampamento e quebra um aparelho de som, do acampamento, para parar de fazer barulho. E fica por isso mesmo.

(Soa a campainha.)

    A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) – Não me consta que tenha sido tomada alguma providência.

    Então, fazendo essa reflexão, eu queria mais um minuto, Senador, para falar de um grupo que esteve comigo, do Pará, um grupo de quilombola, do Quilombo Turé III, lá em Acará, no Pará. Eles vieram aqui pedir socorro, porque dizem que não conseguem respaldo lá na polícia, no Governo, porque eles acham que os empresários são protegidos. Três empresas que produzem dendê, azeite de dendê, simplesmente cercaram o quilombo, com plantação da palma que produzem. Então, plantaram, e as pessoas ficaram ilhadas. E, porque as pessoas denunciam isso, já mataram um – a CPT denunciou isso –, o Nazildo, que era o líder quilombola lá nesse quilombo, e um outro foi baleado quinta-feira.

    Enquanto eles estavam me contando a história, o outro lá mandou um vídeo todo ensanguentado, mostrando que tinha escapado, acabado de sofrer um atentado. Conseguiu se arrastar, descer do carro e se arrastar, mas fez o vídeo e mandou.

    Então, essas coisas todas acontecem. A violência no campo está impossível de se sustentar. Setenta pessoas foram assassinadas em 2017, quatro chacinas, grupos executados. A perícia diz que as pessoas foram executadas pelas costas.

    Então, que País é esse? A gente tinha diminuído muito a violência no campo. A gente ouvia falar de uma morte aqui e outra ali, porque não acaba mesmo, mas 2017 bateu recorde: 70 pessoas, chacinas... Lá em Colniza, lá em Pau d'Arco, no Pará, os indígenas...

    Então, acho que a gente precisa discutir violência, se a gente quiser, de fato, ter segurança pública neste País, para valer. Discutir só segurança só leva para o aparato policial, e não é só disso que nós estamos precisando. Bem longe disso!

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/05/2018 - Página 65