Discurso durante a 79ª Sessão Especial, no Senado Federal

Críticas à reforma trabalhista e aos prejuídos causados ao trababalhador.

Autor
Vanessa Grazziotin (PCdoB - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Críticas à reforma trabalhista e aos prejuídos causados ao trababalhador.
Publicação
Publicação no DSF de 29/05/2018 - Página 180
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • CRITICA, REFORMA, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, MOTIVO, PREJUIZO, TRABALHADOR, AUMENTO, INDICE, DESEMPREGO, REPUDIO, PRIVILEGIO, ACORDO, CONVENÇÃO, COMENTARIO, PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS), AUTORIA, ORADOR, OBJETO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

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COORDENAÇÃO DE REDAÇÃO E MONTAGEM - COREM

28/05/2018


    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PCdoB - AM. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no século XIX, os trabalhadores lutavam para garantir a jornada diária de oito horas, dada a sobrecarga excessiva de trabalho, que chegava a 12 ou 16 horas diárias. Agora, em pleno século XXI, enfrenta-se um retrocesso sem tamanho. Pasmem! Entre as bandeiras de luta dos brasileiros está evitar gestantes e lactantes de trabalharem em locais insalubres.

    A reforma trabalhista, aprovada recentemente, impõe hoje um marco regulatório das relações de trabalho equivalente ao dos primórdios do capitalismo da Inglaterra de 200 anos atrás.

    A Lei que protegia o direito do trabalhador no Brasil (Lei 5.452/1943), a chamada Consolidação das Leis do Trabalho, recebeu inúmeras modificações ao longo do tempo, para adaptá-la às mudanças da realidade. Isso, entretanto, não a salvou de ser completamente desfigurada em 2017, com a aprovação da Reforma Trabalhista.

    Temer, com a colaboração decisiva de uma maioria parlamentar e sem nenhum constrangimento, subtraiu os direitos mais elementares dos trabalhadores. Ao votar o projeto de lei tal qual submetido pela Câmara dos Deputados, meus colegas senadores aceitaram abrir mão da prerrogativa de legislarem em troca de uma promessa assumida por Temer na qual promoveria vetos e editaria uma medida provisória, o que, como já se sabia, não se verificou.

    E quais foram os direitos subtraídos ou atingidos? Férias, jornada de trabalho, tempo de descanso, remuneração, fim do salário mínimo, negociação, prazo de validade das normas coletivas, representação, indenização nas demissões, danos extrapatrimoniais, contribuição sindical, terceirização, gravidez, rescisão contratual, entre outros.

    Criaram absurdos como a possibilidade de discriminação no pagamento de indenização por dano extrapatrimonial, cuja base passa a ser proporcional à remuneração de cada trabalhador, como se cada um valesse o que ganha.

    Com o contrato intermitente, acaba-se com a obrigatoriedade do pagamento do salário mínimo. Mesmo quando trabalha com exclusividade e de forma contínua, a figura do autônomo representa o fim da carteira de trabalho, tendo como consequência o fim das férias, décimo terceiro e tudo ou mais. E mais duro para nós, mulheres e mães, foi a "flexibilização" do artigo da CLT para permitir o trabalho de mulheres grávidas em ambientes insalubres, desde que a "empresa" apresente atestado médico que garanta não haver risco ao bebê e à mãe.

    Em defesa da possibilidade de aprovar uma única emenda contra esse absurdo, no dia da votação ocupamos a Mesa Diretora, éramos seis senadoras da República. O fato levou os senadores governistas a nos denunciar na comissão de ética.

    Estamos diante de uma tragédia. Os efeitos da reforma são devastadores para milhões de brasileiros que teve pouco a comemorar no dia do trabalhador.

    Esta sessão, em homenagem ao Dia do Trabalhador reveste-se de particular importância.

    Desde 1925, quando o Primeiro de maio passou a ser comemorado no Brasil, podemos dizer que este é o momento de maior ataque da história do país aos direitos dos trabalhadores.

    No governo Temer a imensa massa de desempregados chegou a 13,1 milhões de brasileiros, segundo o IBGE.

    Também produziu a maior informalidade registrada pelos institutos de pesquisa.

    Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, cresceu o emprego sem carteira (5,3%, com mais 533 mil), o trabalho por conta própria (3,8%, mais 839 mil) e o emprego formal caiu 1,5% (-493 mil).

    A Reforma Trabalhista serviu para muitos propósitos, todos inconfessáveis.

    A disposição do governo Temer de atacar direitos e fragilizar a Previdência com a criação do trabalho intermitente e outros absurdos mostram qual os reais objetivos do golpe de 2016.

    Também mostrou que a palavra do governo e de seus líderes também não vale nada. Haja vista o descumprimento do acordo com os senadores da base sobre os vetos e também sobre as supostas correções no texto através de MP, contamos hoje com 325 dias de quebra dos direitos trabalhistas.

    Temos feito a resistência aqui neste plenário. Senador Paim apresentou vários projetos, e eu também.

    O primeiro projeto trata do negociado sobre o legislado. Como alertamos ao longo dos debates realizados nesta

    Casa, trata-se do mais absurdo ataque neoliberal ao precioso e heroico legado das lutas sociais dos trabalhadores já visto na história deste País e provavelmente um dos mais graves de toda a história recente em todo o Mundo.

    Minha proposição tem por objetivo modificar, de forma crucial um dos pontos mais agressivos dessa pretensa reforma. Trata-se da possibilidade de que os termos de acordos e convenções coletivas se sobreponham à letra da Lei, o infame "negociado sobre o legislado".

    Esse postulado, aparentemente inócuo, representa um atentado aos direitos sociais, aos direitos humanos, aos objetivos do Estado brasileiro e, mesmo, à própria democracia.

    Sob o argumento de que a modificação da Lei busca favorecer a negociação e a ação coletiva dos sindicatos e dos trabalhadores, a modificação do art. 611-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei n° 5.452, de 1° de maio de 1943, contempla o real propósito de subjugar os trabalhadores aos desígnios dos patrões e extirpar a maior parte das proteções sociais.

    Isso ocorre no contexto de uma desmobilização sindical trazida pela retirada dos mecanismos de financiamento sindical e da severa incerteza dos trabalhadores durante uma crise internacional de grandes proporções.

    Trata-se de possibilitar que os empregadores gananciosos utilizem livremente seu poder de pressão para retirar os direitos de seus empregados, valendo-se, para tanto, apenas de uma leve aparência de normalidade, por meio de uma suposta negociação entre as partes, mas que na verdade envolve um sindicato laboral enfraquecido se contrapondo a poderosas e prósperas empresas ou entidades patronais.

    O "negociado sobre o legislado" viola a dignidade da pessoa humana ao fazer tábula rasa dos direitos do trabalhador, negando-lhe a certeza de percepção dos direitos que julgava lhe pertencerem, ao permitir que, de um momento para outro, passe a ter de se submeter a condições mais precárias de trabalho, para seu evidente prejuízo.

    A negociação coletiva será bem-vinda, mas apenas para acrescentar mais direitos, nunca para retirá-los!

    Cada vez mais e mais direitos, essa é a chave para uma sociedade justa social e economicamente. Somente pela expansão dos direitos sociais iremos vindicar os séculos de exploração que o imperialismo interno e externo nos tem submetido.

    Nossa proposta reconhece, ainda, que, em casos excepcionais, poderá haver uma redução temporária de direitos, mas apenas quando vinculada a uma compensação adequada dos trabalhadores e estabelece, ainda, a competência da Justiça do Trabalho para a apreciação das controvérsias referentes aos termos de negociação.

    Outro projeto que apresentei trata da presença de insalubridade gestante e lactante.

    A nova redação dada ao caput do at. 394-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) pela Lei n° 13.467, de 13 de julho de 2017 (Reforma Trabalhista) permite que a empregada gestante ou lactante exerça suas atividades em contato com agentes insalubres.

    Trata-se de situação que fere o princípio constitucional da proteção do trabalho da mulher, agravado pelo fato de que a exposição a agente nocivo, em qualquer grau, afeta o nascituro, que sequer pode expressar a sua vontade.

    O Congresso Nacional já aprovou uma redação próxima ao que estamos propondo, nos termos da Lei n° 13.287, de 11 de maio de 2016, ou seja, ainda no ano passado se instituiu relevante avanço protetivo do trabalho da gestante e da lactante e que mal completou um ano de sua vigência e foi revogado.

    A Constituição Federal, em seu art. 6°, caput, elenca entre os direitos sociais a proteção à maternidade.

    As normas de saúde, higiene e segurança, que, nos termos do inciso XXII do art. 7°, da CF, visam à redução dos riscos inerentes ao trabalho, dirigem-se a todos os trabalhadores, e mais ainda, aos que se encontram em situação de vulnerabilidade, caso notório da gestante ou lactante.

    Assim, é necessário restabelecer a lei revogada, pois está evidente a inconstitucionalidade da previsão de que a empregada gestante, ou a lactante, possa ser submetida ao trabalho insalubre, em qualquer grau.

    Também apresentamos um projeto para o fim da quitação anual, uma norma que institucionaliza a fraude aos direitos dos empregados que, durante a vigência do pacto laboral, serão impelidos a conferir a quitação de todos os haveres monetários decorrentes da prestação dos serviços, ainda que não os tenha percebido.

    Outro que determine o fim da clausula de exclusividade no contrato do autônomo, restabelecendo a primazia da realidade (art. 9° da CLT), no sentido de se conferir ao trabalhador autônomo que se vê obrigado a trabalhar perante um único tomador dos serviços a sua real condição jurídica, qual seja, a de empregado, em observância, pois, ao disposto no art. 7°, I, da Constituição Federal, que assegura ao trabalhador o reconhecimento da relação empregatícia, quando presentes, no cotidiano laboral, os requisitos previstos nos arts. 2° e 3° consolidados.

    Outra proposta restabelece o direito da trabalhadora lactante amamentar o próprio filho, até que este complete um ano de idade, bem como a manutenção ao direito, durante a jornada de trabalho, de dois descansos especiais, de meia hora cada um, para fins de amamentação.

    Também proponho o fim do trabalho intermitente, um instrumento de precarização, inconstitucional e que afeta direitos e garantias dos trabalhadores urbanos e rurais previstos na Constituição Federal, no art. 7° da Constituição Federal - princípio do não retrocesso social.

    Por fim apresentei projetos que permitem a incorporação da gratificação de função, arbitragem e reparação de danos nas relações de trabalho e a vedação à ultratividade das normas coletivas de trabalho fixadas em acordos ou convenções coletivas de trabalho.

    Esse é o papel do Parlamento, discutir nossa legislação à luz dos reais interesses da nação. Abrir mão disso, ou subordinar-se a interesses escusos e inconfessáveis como alguns parlamentares fizeram na tramitação da Reforma equivale à morte do Congresso e da nossa democracia.

    Valho-me das palavras de um ex-líder da oposição, o saudoso Mario Covas para ilustrar o sentimento que tenho sobre a Reforma Trabalhista: "Não permitais que um delito impossível possa transformar­ se no funeral da Democracia, no aniquilamento de um Poder e no cântico lúgubre das liberdades perdidas".

    Era o que tinha a dizer.

    Muito obrigada.

    Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/05/2018 - Página 180