Discurso durante a 84ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao modo como o Governo Federal tem gerenciado a crise do País.

Autor
Roberto Requião (MDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Críticas ao modo como o Governo Federal tem gerenciado a crise do País.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 02/06/2018 - Página 14
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • CRITICA, GESTÃO, GOVERNO FEDERAL, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, ATUAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO, CRISE, ECONOMIA NACIONAL, REGISTRO, SITUAÇÃO, DEPENDENCIA, SUBORDINAÇÃO, EMPRESARIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), EUROPA, COMENTARIO, ASSUNTO, PRECARIEDADE, EXECUTIVO, LEGISLATIVO, DIREITOS SOCIAIS, BEM ESTAR SOCIAL, REPUDIO, CAPITAL ESPECULATIVO, AUSENCIA, TRABALHO, PRODUÇÃO.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/MDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Senador Presidente, Senador Paim, vou aproveitar esta sexta-feira para repetir o mantra que eu venho repetindo com insistência sobre o que realmente está acontecendo no Brasil. Nós não estamos, Senador Paim, descolados de uma circunstância global. O que acontece no Brasil, acontece em outros países também.

    O Papa Francisco, quando os governantes mais poderosos do mundo se reuniam em Davos, com os homens mais ricos da Terra, os concentradores do capital, dizia: "O capital é bom quando ele é investido, gera empregos, produtos, inova na tecnologia, mas o capital tem que servir à sociedade e não pode dominá-la." Na verdade, o que o Papa estava repetindo é o velho dito bíblico: "Não se pode servir a Deus e a Mamon." Não se pode servir ao povo e ao dinheiro, à concentração da renda. E "mamon", na Bíblia, não é nem o diabo nem outro deus; é uma palavra que, em hebraico, significa dinheiro.

    Mas como começa esta crise que nós vivemos no Brasil hoje e que já atingiu a Europa, destruiu os países mais importantes da Europa de uma maneira arrasadora, como ocorreu com a Grécia?

    Acontece que, com a queda do nazismo, com a queda da Alemanha e a progressão da Revolução Russa, os detentores do poder e do dinheiro nos países europeus se assustaram. Assustaram-se com a Rússia, o comunismo, o fantasma do comunismo, a entrega da economia para os trabalhadores. E passaram a fazer algumas concessões para evitar que o modelo russo chegasse aos países europeus.

    Mas em determinado momento, em função das suas próprias contradições, o sistema comunista na Europa desaparece. Vem a Glasnost, o degelo, e a Perestroika, a reconstrução. Então, nesse momento há um recrudescimento dos detentores do capital. Eles resolvem reagir contra o Estado social que havia sido construído com o pavor do comunismo da União Soviética.

    O que era o Estado social, Senador Paim? O Estado que respeita as minorias; o Estado que respeita o trabalho; o Estado que respeita a natureza; o Estado das garantias do trabalho; o Estado do avanço das mulheres, do voto feminino, da participação, do protagonismo das mulheres na política dos países; o Estado que respeita as minorias raciais, as minorias étnicas, os negros, os índios. E esse Estado construído na Europa passa a ser enfrentado pelo capital, duma forma radical.

    E esse enfrentamento se dá num tripé, Senador Paim. Em primeiro lugar, é a precarização do Executivo, com a valorização do Banco Central, que passa a ser o verdadeiro dirigente dos países. E o Executivo se reduz à condição duma organização policial para reprimir os protestos duma população que tinha avançado nos seus direitos e que estava, a partir desse momento, perdendo os seus direitos para a hegemonia do capital. A precarização do Estado social e a valorização dos bancos centrais dominados pelo grande capital acumulado.

    O segundo ponto de apoio desse tripé é a precarização do Parlamento, através do financiamento privado das campanhas. Nós conhecemos bem isso, Senador. Não há mais programa partidário, não há mais a credibilidade nos discursos dos políticos no palanque. Elegem-se, não têm como referência os seus partidos, os seus discursos e passam a ser meros mandaletes, prepostos dos seus financiadores. Isso acontece no Brasil hoje, da câmara municipal até o Congresso Nacional. Com exceções, com brilhantes exceções, graças a Deus.

    E o terceiro ponto de apoio dessa precarização do Estado social, dessa agressão ao Estado social é a precarização do trabalho. É o que nós vemos no Brasil hoje, com a destruição da CLT e a tentativa insistente de acabar com a Previdência pública, que seria entregue na mão dos grandes bancos, das financeiras, do capital vadio, esse capital que não produz nada, que se acumula fundamentalmente na rolagem da dívida dos Estados. Não produz um emprego, a peça duma máquina, o botão duma camisa. Ele vive da sua própria razão e dinâmica, com juros, sem produzir rigorosamente nada.

    O Brasil está conhecendo isso. A tal Ponte para o Futuro, que o Temer e o Moreira Franco apresentaram ao PMDB e que nunca foi aceita pelo Partido, foi rejeitada em uma reunião aqui no Hotel Nacional, com a presença de 17 diretórios, uma reunião da Fundação Ulysses Guimarães. Mas ela acabou sendo implantada como apoio do Congresso Nacional, com o apoio do Senado com o apoio da Câmara majoritário. É evidente que as resistências se estabeleceram e continuam ainda firmes.

    O que é essa Ponte para o Futuro? É mais ou menos a teoria do dependentismo do Fernando Henrique Cardoso. Ou seja, o Brasil não tem condições de se autoadministrar. Ele não tem dirigentes empresariais; o povo não consegue forjar e sustentar um modelo; o Brasil só pode avançar se subordinando ao comando de empresários de países mais avançados, como os Estados Unidos e países europeus. Essa é a teoria da dependência.

    E a Ponte para o Futuro propõe o quê? Propõe a precarização do Parlamento; com o parlamentarismo, a precarização da política nacional. Ou seja, destrói as possibilidades de mudança do Executivo com o parlamentarismo, que se suporta nesse financiamento privado de campanha, e o capital passa a dominar o Congresso – quando todos nós sabemos que em uma eleição presidencial a coisa se dá de forma diferente: os candidatos a Presidente apresentam os seus programas, e a população vota como um todo em um programa, e não atomizada nesses feudos controlados por partidos burocratizados e com mandaletes internos.

    E propunha mais ainda: A entrega de terras brasileiras aos interesses internacionais, sem limite de tamanho. É evidente que nós temos hoje uma produção agrícola magnífica, uma produtividade igual ou superior à norte-americana, que é a maior do mundo. Então, aumentar a produção do País com a invasão de áreas de preservação, aumentando o espaço de produção. E, dessa forma, com mecanização, que nós já temos; com métodos novos de tecnologia sofisticada de produção, que nós já usamos. Mas isso levaria necessariamente ao desemprego, porque ocupação de terras, mecanização, alta tecnologia significam ocupação precária de mão de obra.

    Mas o Brasil seria o celeiro do mundo, vendendo matérias primas, minérios e produtos da agricultura não industrializados. É o que estão fazendo com a Petrobras hoje: vender petróleo. O Brasil tem que ser um entreposto de venda de petróleo, não refinando rigorosamente nada e entregando para as multinacionais que controlam a energia combustível no mundo.

    Mas o que aconteceria nesse processo? Esse modelo de "Brasil celeiro do mundo" levaria ao desemprego... Não, eles se inspiraram, acredito eu, no crescimento da China. Quando o capital norte-americano começou a sair do País e investir nas zonas de produção industrial chinesa, eles ofereceram aos chineses um emprego. A relação, na época, da China com os seus trabalhadores era medieval, não havia direito algum. Então, para um chinês, ter um emprego firme era a garantia do almoço e provavelmente do jantar da sua família também, sem nenhum direito. E o capital americano foi para a China, provocou aquele início de crescimento extraordinário, mas provocou, dentro dos Estados Unidos, o desemprego, porque passou a investir lá fora e a vender no mercado interno americano.

    Foi isso, inclusive, que viabilizou a eleição do Trump, que se suportou no desemprego americano, no fato de que famílias de classe média com nível universitário não conseguiam mais formar os seus filhos – porque o ensino universitário nos Estados Unidos é pago; os básicos são gratuitos, o ensino universitário é pago. E elegeu-se o Trump com base nessa estrutura desempregadora e se apropriando de teses bárbaras de racismo, de ódio aos latino-americanos. Somos nós latino-americanos, Senador Paim, os porcos latinos – frase do Presidente eleito dos Estados Unidos.

    Mas, no Brasil, isso não daria certo, porque, ao contrário da China, que tinha uma relação medieval de trabalho, o Brasil já viveu as conquistas sociais do Ocidente, a CLT do Getúlio Vargas e o avanço extraordinário nesses 13 anos de governo do PT – inclusão social, aumento do salário mínimo, integração no mercado de trabalho e no mercado de consumo. A pobreza diminuiu; a população pobre passou a ter três refeições por dia. E essa mudança toda não veio acompanhada – daí a minha crítica a esse período – de um projeto de industrialização sustentável.

    Nós tivemos uma oportunidade ímpar, porque invertemos aquela crítica que o Brizola fazia das perdas internacionais. O crescimento econômico da China possibilitou a inversão disso. Os produtos primários brasileiros passaram a ser valorizados de uma forma que nunca tinham sido valorizados antes, o que viabilizou essa política social do PT, de integração. Mas, no acordo feito com o capital, aquela carta do Lula ao mercado na sua primeira eleição, se passou a fazer uma composição em que se melhoravam as condições de vida do trabalhador, mas não se questionava o modelo econômico, não se apostou no crescimento industrial do País, o que dá emprego sustentável e com salário decente, e nós chegamos à situação aonde chegamos.

    Mas a conclusão é a seguinte: ao contrário dos chineses, que tiveram uma vantagem com essa industrialização, que dava o emprego, o que imaginavam aqui no Brasil, Paim? Que, no momento em que não havia garantia alguma do trabalho e que o capital estrangeiro viria aqui se aproveitar de uma mão de obra semiescravizada, o trabalhador não faria greve, porque ele perderia o emprego. Esse emprego, embora precário, era o que garantia um rendimento mínimo para que ele pudesse almoçar e jantar. Mas o Brasil viveu uma situação diferente: conquistas do Ocidente, conquistas sociais e as conquistas de integração do governo Lula, integração no mercado de trabalho e no mercado de consumo. Então, isso rigorosamente não deu certo. Não vai dar certo. Eu tenho dito algumas vezes que o fim disso é uma convulsão social brutal, como vive, por exemplo, a Ásia hoje.

    Qual seria a solução, Senador Paim? Qual seria a solução? O mundo conhece soluções para crises recessivas extremamente bem-sucedidas. Na Alemanha, por exemplo, um economista assume a condução do país. Chamava-se Hjalmar Horace Greeley Schacht. Ele resolve o problema do desemprego e da inflação da seguinte maneira... Era um economista liberal, mas quando assumiu a condução da economia, transformou-se em um alemão, esqueceu as regras básicas da religião liberal e passou a agir a favor da Alemanha. Primeira medida que ele toma: ele cria uma moeda não-moeda, era um título que se chamava Mefo, ligado ao setor metal-mecânico. Monta um projeto com grandes empresas alemãs de reestruturação do país – as autobahns, indústria metalúrgica, usinas de geração de energia – e com a possibilidade de investimento nessa área. E possibilidade quase que obrigatória, Senador Paim, porque ele reduziu a zero a rolagem da dívida; soberanamente ele fez isto.

    Então, o capital alemão entrou em desespero: "Meu Deus, se nós não temos mais a remuneração da rolagem da dívida, o nosso capital acumulado vai virar pó". Schacht disse: "Não, nós damos a vocês a possibilidade de investirem nas letras garantidas pelo Governo" – pelo Banco Central e pelo Governo alemão. Seriam 4,5% de rentabilidade ao ano, o que era muito àquela época. Eles não tinham outra saída, porque a moeda alemã, como a brasileira hoje, não era conversível. Então, ou eles aplicavam dentro da Alemanha ou o dinheiro desapareceria. E surgiram os grandes projetos de infraestrutura e de reconstrução da Alemanha. Em seis meses, acabou o desemprego. E conta a lenda que em uma semana acabou a inflação.

    Nos Estados Unidos foi a mesma coisa. Os Estados Unidos viviam uma recessão brutal em função daquele desastre imobiliário da Flórida, e não se sabia o que fazer. Mas um industrial chamado Henry Ford se suporta nas ideias do economista Taylor. O que Taylor dizia? Nós aumentamos a produtividade com especialização do trabalho. O Henry Ford pega esse conceito e joga na linha de montagem e começa a fazer o famoso fordinho. Um grupo de trabalhadores se especializava na fundição do motor; outro, na usinagem; outro, na montagem do motor; outro grupo, numa caixa de troca. E essa linha de montagem viabilizava que o trabalhador treinado, especializado produzisse com mais qualidade, em menos tempo e com o mesmo salário do que o trabalhador destreinado. A linha de montagem empolgou os Estados Unidos. E a economia americana, que era diversificada como é a brasileira hoje – nós não éramos um Paraguai nem uma Bolívia do ponto de vista do crescimento industrial –, adota a linha de montagem, e se aumenta de forma brutal a produtividade.

    Roosevelt, Presidente da República, resolve condecorar Henry Ford com a mais alta condecoração que o Governo americano poderia oferecer a um industrial que estava colaborando com o fim da recessão. Pasmem os senhores: Ford recusa a condecoração. E o Roosevelt, espantado, diz: "Mas por quê, Henry Ford? Por que a recusa?". E ele responde: "Simplesmente, Presidente, porque a linha de montagem baseada no taylorismo vai quebrar os Estados Unidos definitivamente. Não teremos nenhuma possibilidade de desenvolvimento com esse processo". "Mas, meu Deus, como?" "Porque nós estamos aumentando a produção e não temos consumo. O desemprego está muito grande, e não vai haver consumidor para aquilo que estamos produzindo, vai quebrar todo mundo linearmente." "Meu Deus, o que eu faço?" E o Ford dá a solução: "Em primeiro lugar, Presidente, reduza a carga horária dos trabalhadores por lei, para aumentar o número de trabalhadores com renda e na estrutura de produção, e, em segundo lugar, aumente o salário básico do trabalhador por lei" – era o salário mínimo. "Com isso V. Exª estará reconstruindo a demanda nos Estados Unidos, e a produção pode ser realizada."

    Posteriormente, Roosevelt passa a investir deficitariamente, do ponto de vista orçamentário, em hidrelétricas – são as famosas empresas americanas, municipais, estaduais e federais –, em estradas, hospitais e em escolas. Por que ele fez isso? Porque, num momento de recessão, capitalista algum investe na produção. Ele procura esse artifício da financeirização. Não investe na produção porque não há consumo. Ele não vai produzir o que não pode ser comprado, o que ele não pode vender.

    Então, esse processo todo passa a ter um impulso do investimento negativo, do ponto de vista orçamentário do Estado, porque o Estado, mesmo deficitário, investe porque ele não procura o lucro imediato. Ele investe na recuperação da infraestrutura e, com a recuperação da infraestrutura, passa a empregar, contrata empresas privadas também, mexe com a economia e restabelece o círculo de desenvolvimento. Esse é o New Deal. Assim, os Estados Unidos saíram da crise. O Schacht saiu com a Mefo; os Estados Unidos saíram dessa forma.

    Na crise do Japão, foi a mesma coisa. Japão, lá atrás, atrasado. Já atrás, lá na reforma Meiji, passaram a utilizar o alfabeto ocidental para se conectarem com o mundo. Mas a grande reforma foi um acordo entre a Keidanren, que é uma associação dos grandes empresários japoneses, e o Estado. Este passa, no Japão, a financiar o desenvolvimento de produtos, que é o que existe de mais caro, num processo moderno de produção.

    O desenvolvimento de um produto é a sua viabilização técnica, mecânica para ser colocado no mercado, para ver se o mercado aceita ou não. Isso tudo passou a ser pago pelo Governo japonês. E o Japão saiu da crise desta forma: investimento direto do Estado. Nós temos que ir por esse caminho.

    Essa PEC da paralisação de investimentos é a coisa mais grotesca e estúpida que algum país já tentou realizar na Terra. Por quê? Porque nós estamos dominados por economistas de banco e figuras como esse Guardia, que me contesta na Comissão de Assuntos Econômicos dizendo o seguinte: "Não. Acho que há um antagonismo básico com V. Exª, Senador. Acho que o mercado corrige a economia". O livre mercado: e bota o Exército a reprimir as pessoas que não aceitam o aumento absurdo do mercado, um mercado monopolizado. É rigorosamente um absurdo!

    E os corruptos continuam mandando no Brasil, porque, se havia corrupção – e havia –, eram estes mesmos políticos que estão mandando hoje que asseguravam os diretores corruptos, os que desviavam dinheiro nas empresas estatais e se beneficiavam do financiamento pessoal ou partidário das contratações públicas, das concessões e dos projetos.

    O Brasil precisa ter a dignidade de volta, e a possibilidade básica de crescermos é iniciarmos com investimento público, retomarmos os investimentos para o crescimento econômico do País, restabelecendo o círculo virtuoso do desenvolvimento, como fez a Alemanha, em 30, como fizeram os Estados Unidos em 30 e como fez o Japão, na sua Associação Kendaren com os empresários, mas nós estamos no caminho extraordinariamente contrário a isso.

    Mas, enquanto isso, o Donald Trump, dos Estados Unidos, que, guardadas as devidas proporções, sofreu uma crise semelhante à nossa, porque essa crise é global, com a saída do capital americano para investir na China, pede, e o Congresso Nacional norte-americano autoriza, um investimento em infraestrutura público de US$1,5 trilhão, ou seja, ingressa heterodoxamente na política keynesiana.

    E, para nós, esses religiosos, como esse Guardia e o Meirelles, propõem o domínio do mercado, a mão invisível do mercado. Estão tentando seguir à risca a cartilha do Adam Smith, liberal a serviço, à época, da Companhia das Índias, que era inglesa e, portanto, com grande vantagem, com a abertura do mundo, porque o domínio inglês era absoluto, mas um liberal que, ironicamente, morreu como fiscal da alfândega na Escócia, que era a fiscalização, a retenção, a proibição de importação que ele contestava nos seus escritos, nas suas teses e teorias.

    Enfim, o que acontece hoje é que o Brasil está sendo governado pelo interesse do capital financeiro, por Mamom, pelo dinheiro, pelo dinheiro que quer comandar o mundo, que quer acabar com o Estado social, e o que nós sofremos aqui é o que sofre a Espanha, o que acabou com a Grécia, o que destrói todos os países, com uma exceção: o pequeno Portugal, com a sua geringonça.

(Soa a campainha.)

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/MDB - PR) – Quando uma associação de partidos de esquerda tomou conta do governo, mandou o liberalismo às favas e passou a aumentar o salário e a investir em obras públicas, diziam que aquilo era uma geringonça. Eles tomaram a crítica como bandeira e disseram: "O nosso projeto é a geringonça." E essa geringonça não liberal está fazendo de Portugal uma exceção na Europa. É o único país que está pagando as dívidas e está crescendo. Aumento de salário, diminuição de carga horária e investimento público.

    Mas, no Brasil, nós estamos vendo exatamente o contrário disso: é um Governo que se submete à cartilha geopolítica dos interesses dos Estados Unidos e que está acabando sistematicamente com o Estado social no Brasil. Estão com pressa, porque eles sabem que o povo não vota mais em projeto dessa natureza. Ninguém se ilude mais com isso, nem os próprios industriais brasileiros, que estão acordando para a sua liquidação. Primeiro, liquidam a Petrobras, mas, como o Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães tem repetido: "os banqueiros brasileiros que se cuidem." Eles são discípulos de Mamom, mas o Mamom deles lá é mais importante que o Mamom deles aqui. Vai acabar, como sequência da destruição da Petrobras, a estrutura bancária brasileira, seguindo os interesses geopolíticos dos que dominam o mundo hoje.

    Presidente, obrigado pelo tempo que...

    O Sr. Paulo Paim (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Senador Requião...

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/MDB - PR) – Como não, Senador Paim?

    O Sr. Paulo Paim (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... se me permitir, primeiro, quero cumprimentar V. Exª pelo pronunciamento, mas eu acabei não falando – e eu acho que V. Exª tem a mesma posição que eu tenho – que eles tentaram ainda entregar toda a previdência para o sistema financeiro.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/MDB - PR) – Sim, exatamente.

    O Sr. Paulo Paim (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Tentaram. Só não conseguiram porque houve uma resistência heroica aqui dentro de um grupo de Senadores e também de Deputados Federais, e, com isso, se deu espaço, além dos movimentos das centrais, federações e confederações e de homens de bem deste País, para instalarmos a CPI da Previdência, que mostrou que não havia necessidade alguma de se fazer aquela entrega para o sistema financeiro, que era a privatização da previdência. Meu aparte é pequeno, é só esse complemento, porque eu sei que V. Exª também tem esse ponto de vista. A previdência é uma questão de gestão, fiscalização, combate à sonegação, à fraude, e, principalmente, de execução dos grandes devedores. E quem são os grandes devedores – eu presidi a CPI e Hélio José foi o Relator? Os banqueiros. Por isso, V. Exª está coberto de razão.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/MDB - PR) – Senador, eu diria mais. A previdência depende da geração de empregos, empregos industriais, empregos com bons salários, que viabilizam a contribuição. A CLT liquida a previdência. O emprego intermitente não dá para o trabalhador a garantia de uma carteira assinada, não dá a garantia da continuidade do recebimento de um salário determinado. Então, o trabalhador intermitente não tem acesso ao crédito, ele não pode comprar, embora o sistema de prestação no Brasil consuma praticamente a metade da moeda circulante, e o empresário, quando vê que não consegue mais ter um lucro como tinha antigamente com o seu empreendimento, atribui a diminuição da sua lucratividade ao progresso do trabalhador, ao salário mínimo do Lula, às garantias sociais construídas no Brasil nas últimas décadas. Ele não enxerga que, na verdade, quem está ficando com a verdadeira mais-valia do trabalho, da produção, não é o trabalhador. A mais-valia é o que se acrescenta no sistema produtivo pelo trabalho ao valor de uma mercadoria. É o capital que está ficando com esse dinheiro. Eles esterilizam esse dinheiro jogando na rolagem da dívida pública e enriquecem cada vez mais.

    Mas, como não há conscientização de que quem está predando a produção no Brasil é o mercado financeiro, a financeirização total da economia, eles, induzidos pela Globo, pelo SBT, pela Bandeirantes, por esses idiotas todos, acreditam que vão passar a ganhar mais, a poder aumentar seus recursos e a produção predando o trabalho, mas eles não percebem que, quando eles avançam em cima do trabalho, eles acabam com o mercado de consumo. O trabalhador, ganhando cada vez menos ou não ganhando nada, compra cada vez menos ou não compra nada, e a estrutura econômica desaba. É isso que eles estão fazendo.

    Daí propõem o quê? Brasil dependente, produtor de matérias-primas, celeiro do mundo, minérios e produtos agrícolas, petróleo, minérios de uma forma geral e produtos agrícolas, vão fornecer para o mundo. E suportam isso na exploração do trabalho. Mas, como diz a nossa Igreja Católica no último documento da Congregação da Fé: eles exploram o trabalho, mas para os desempregados, os desesperados, que aumentam de forma exponencial na sociedade, eles não têm projeto algum, consideram como lixo. Eles querem a repressão apenas, e um desprezo total à ausência total de políticas sociais.

    Veja, Sr. Presidente, onde o Temer cortou agora para favorecer e subsidiar os importadores de petróleo e as multinacionais. Cortou na política social. O que o Temer fez? Estou aqui com o modelinho. Edita três medidas provisórias para garantir acordo com os caminhoneiros e reduzir em R$0,46 o litro do diese. Manda para o Congresso. A Câmara coloca lá o fim do PIS, do Cofins e da Cide, o que é uma verdadeira estupidez. A Cide é o dinheiro repartido com os Estados, 40%, para a manutenção e construção de estradas. Então eles estariam dando a um caminhoneiro, um diesel um pouco mais barato com o subsídio da Cide, mas tirariam as estradas, ele ia andar nos buracos, sem nenhuma possibilidade de reconstrução e manutenção. Depois ele abre um crédito extraordinário no Orçamento de 9,58 bilhões para compensar a Petrobras e garantir 0,30 de redução do preço do diesel.

    Então o que ele está fazendo? Ele está cobrindo o absurdo que a Petrobras está fazendo. A Petrobras reduz o refino de petróleo no Brasil para viabilizar a importação. E o nosso Temer, com a redução do preço, confirma a política suicida da Petrobras e põe dinheiro público para isso. Para compensar quem? Fundamentalmente, os acionistas privados da Petrobras, os americanos. Lembra o Fernando Henrique vendendo 30% das ações da Petrobras na Bolsa de Nova York? E tira dinheiro dos setores estratégicos: desenvolvimento regional, saúde, assistência social, obras contra a seca, gestão de desastres, etc. Ou seja, está tratando os excluídos e os mais pobres como lixo. Está desprezando a população que não tem acesso ao mercado de trabalho e ao mercado de consumo. Este é o Governo que nós precisamos ver terminar.

    Por isso, eu me somo aqui à tese levantada pelo Senador Paim. Se o Congresso tiver vergonha na cara decreta, estabelece a antecipação das eleições, para a gente pôr um fim a este período dramático pelo qual o País está passando, sofrendo nas mãos desta gente.

    Alguns são corrompidos ideologicamente, como aqueles discípulos do Jim Jones, lá no Equador, lembra? Que beberam suco de uva envenenado e morreram todos. A política econômica do Meirelles, do Temer, do Governo é uma espécie de suco de uva envenenado que está sendo fornecido ao Brasil. Mas eles, fanaticamente, seguem o Jim Jones da economia – o Meirelles, o liberalismo e tudo mais. Agora outros não; outros nós sabemos bem o que os mobiliza: é corrupção material pura e simples; é o financiamento que podia ser eleitoral, mas que acaba se transformando e é apropriado pessoalmente ao patrimônio de cada um. Os corruptos estão conduzindo a política brasileira ao lado dos ideológica e filosoficamente corrompidos por uma religião neoliberal absolutamente sem sentido.

    Presidente, agradeço o tempo que me ofereceu V. Exª.

    V. Exª pretende ocupar a tribuna?

    O SR. PRESIDENTE (Thieres Pinto. Bloco Moderador/PTB - RR. Fora do microfone.) – Não.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/MDB - PR) – Porque aí eu assumiria a Presidência. Afinal, nesta sexta-feira, aqui no Plenário, estou eu, o nosso Presidente e o Senador Paim, tentando utilizar este espaço do Senado, para esclarecer um pouco mais o que realmente acontece com o petróleo.

    Nós somos autossuficientes em petróleo. Se o petróleo brasileiro fosse refinado, o petróleo do pré-sal, que tem um custo de extração de US$7 num cálculo do Paulo César Lima, um Consultor aqui da Câmara, se fosse refinado o petróleo do pré-sal, sobre o qual o Paulo César...

(Soa a campainha.)

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/MDB - PR) – ... coloca impostos e outros custos e parte de um valor de US$40, se ele fosse refinado com lucro para a Petrobras de 50% e com lucro para a revenda de 50%, o preço do diesel hoje seria R$2,80. Vocês vejam o que o Temer está garantindo.

    E, quanto a esse mantra "Nós estamos defendendo o livre mercado", vão ao diabo que os carregue com essa bobagem toda!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/06/2018 - Página 14