Pela Liderança durante a 83ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre o artigo do jornalista Vinicius Torres Freire intitulado “País se revolta contra si e não sabe”.

Autor
Cristovam Buarque (PPS - CIDADANIA/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Reflexões sobre o artigo do jornalista Vinicius Torres Freire intitulado “País se revolta contra si e não sabe”.
Aparteantes
Dário Berger, Reguffe.
Publicação
Publicação no DSF de 31/05/2018 - Página 68
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • ANALISE, ARTIGO DE IMPRENSA, PUBLICAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ASSUNTO, GREVE, CATEGORIA PROFISSIONAL, MOTORISTA, CAMINHÃO, CRITICA, PREFERENCIA, TRANSPORTE RODOVIARIO, COMENTARIO, AUSENCIA, CONFIANÇA, POPULAÇÃO, CLASSE POLITICA.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF. Como Líder. Sem revisão do orador.) – Srªs Senadoras, Srs. Senadores, Sr. Presidente, a sensação que a gente tem, Senador, é a de que o Brasil foi sequestrado e sofreu um infarto – as artérias, todas, fechadas –, e o País, paralisado.

    A riqueza não se movia – e, agora, começa –, e as pessoas não se deslocavam. Isso é sequestro. Mas creio que esse sequestro que vemos é apenas uma pequena parte de um sequestro muito maior e invisível. Nossa mente foi sequestrada já há bastante tempo. Isso não estamos percebendo. E os outros sequestros, como esse dos caminhoneiros fechando as vias e parando de trabalhar, são uma manifestação que decorre de um sequestro anterior: a tendência nossa, de brasileiros, de todos nós, de não querermos enfrentar a realidade em toda a sua dimensão.

    O caso da greve dos petroleiros é apenas um exemplo visível do sequestro da realidade e também, quase visível, do sequestro da mente. Por exemplo: hoje, um artigo, que achei muito interessante, do jornalista Vinicius Torres Freire, com o título "País se revolta contra si e não sabe", mostra que, numa amostra feita pelo Datafolha, 87% dos brasileiros são a favor da paralisação dos caminhões, apesar do sofrimento. Todo mundo, sofrendo; e, favorável, jogando a culpa inteira na Petrobras. Não percebem que é algo muito mais profundo, que faz com que os caminhoneiros estejam descontentes e se revoltem. O que está por trás é uma opção lá atrás pelo transporte rodoviário, abandonando o pouco – mas que a gente tinha – de transporte ferroviário e até mesmo de transporte hidroviário.

    Abandonamos. Inventamos que o progresso era rodovia, movida a combustível fóssil, e que o sucesso era ter um automóvel. Tenho a impressão de que só o futebol sensibiliza mais cada um de nós brasileiros do que ter o carro próprio. E tenho minhas dúvidas se nós brasileiros estamos, hoje, preferindo sermos campeões a termos um carro na garagem, se pudéssemos escolher entre os dois. Uma prova é como fechamos os olhos e aceitamos bilhões de gastos para fazer estádios, para fazer Olimpíadas, sabendo – ou sem saber, o que é mais grave – que isso ia cobrar um preço.

    Nós fomos sequestrados quando o carro-chefe da economia brasileira e o carro-chefe da mobilização e sinônimo de progresso foram o automóvel a gasolina, privado, e o ônibus, em vez do transporte coletivo ferroviário dos metrôs.

    Mas essa crise, essa prisão, esse sequestro mental não fica só nisso. Nós somos sequestrados pelo vício de décadas na ilusão inflacionária de que o Governo tem dinheiro para tudo. Por isso, esses 87% de brasileiros que apoiam a greve se recusam à alternativa de aumento de imposto ou de corte de outros gastos para pagar a chamada conta do diesel. Ou seja, temos que baixar o preço do diesel.

    A solução é um subsídio: vem um preço da refinaria, que está alto, a gente baixa esse preço para aqui e cobre com o subsídio. Mas ninguém aceita cortar gastos para pagar esse subsídio. Ninguém aceita aumentar impostos para pagar esse subsídio, porque, na nossa mente sequestrada, o Tesouro público é uma cartola de mágico, de onde você consegue tirar coisas, dinheiro, mesmo quando não há lá dentro.

    A arrecadação cai, porque o PIB caiu, mas você ainda acha que pode continuar gastando o mesmo, sem o novo imposto – que ninguém quer porque já existe imposto demais. É verdade! A solução seria reduzir o consumo e se acostumar com uma sociedade mais austera.

    A nossa gasolina vem de petróleo importado. Então, quando o dólar sobe, e, portanto, aquilo que a gente consome importado sobe de preço, não há outro jeito a não ser reduzir o consumo, ou arranjar alguém que o financie. No caso do Estado, esse alguém somos todos nós, mas nós não queremos, porque a nossa mente foi sequestrada para não aceitar isso.

    A sensação, Senador Dário, quando eu vejo a polêmica política que agora tomou conta no lugar dos caminhoneiros – agora, são movimentos políticos –, é de que existem dois tipos: uns que estão ali querendo rasgar a Constituição para trazer o autoritarismo ao Brasil; os outros estão querendo rasgar a aritmética para trazer o populismo. Aqueles dizem: "Vamos mandar destruir, prender, torturar, por ordem, sem respeitar a Constituição". E esses dizem: "Vamos gastar, sem respeitar que dois mais dois é igual a quatro", como fizemos ao longo das décadas, não dos séculos. Durante o Império, respeitava-se a moeda. Durante a Primeira República, respeitou-se a moeda. Foi a partir dos anos 50 e 60 que nós dissemos que moeda não era algo importante e deixamos que se desmoralizasse, porque dois mais dois é igual a quatro na aritmética, mas, nas finanças públicas, pode-se dizer que a gente tem dois mais dois, quatro, mas gasta cinco, porque cinco só vale quatro. É a inflação de 20%.

    Esse artigo alerta para o fato de que nós estamos nos revoltando contra nós próprios sem perceber. O jornalista diz:

Acreditam [nós todos] que a culpa de "tudo que está aí" é do bode expiatório de duas cabeças, a corrupta e a política, que nos impedem de chegar até o fim do arco-íris, onde está o pote de ouro a ser aberto e dividido para benefício geral, sem conflitos.

    E, de fato, a inflação dilui os conflitos. Pelo menos enquanto não chega ao nível da inflação da Venezuela, ela vai diluindo. Se os caminhoneiros, Senador Dário, pudessem aumentar diariamente o preço do frete, eles fechariam os olhos ao aumento diário do preço do combustível – a inflação. O problema é a injustiça de aumentar o combustível sem poder aumentar o frete. É uma injustiça isso. Mas a inflação, que permitiria aumentar os dois, simplesmente não é injusta, mas é um desastre completo para o País!

    Por isso, se não tem como barrar o aumento do combustível pelas leis do mercado que estão aí e que funcionam, é preciso compensar isso, porque não dá mais para continuar com um preço de combustível tão alto. Não dá. É preciso baixar o preço do combustível, mas só tem um jeito: ou quebrando a Petrobras, como se fez no governo anterior, baixando o preço artificialmente para ganhar voto, ou dando subsídios, mas aí alguém tem que pagar. E o Brasil não quer abrir mão de nada.

    Vou citar outra pesquisa cujos números são muito parecidos a esses, Senador Reguffe – uma pesquisa feita pela CNI.

    A CNI fez uma pesquisa para saber se as pessoas acham que é preciso mais dinheiro para a educação. Todo mundo acha. Aí pergunta: "Você é a favor de aumentar imposto para a educação?" Quase ninguém é a favor. Aí pergunta: "E tirar dinheiro de outro gasto para passar para a educação?" Ninguém é a favor. Não perguntaram se eram a favor da inflação, porque também iriam dizer que não eram a favor da inflação.

    Ou seja, são a favor de rasgar o livro Os Elementos, de aritmética, de Euclides. Aritmética não vale. Outros propõem rasgar a Constituição, porque, rasgando a Constituição, vão escolher quem paga. Escolhem: "Você vai pagar!" Mas, com a Constituição em funcionamento e com a democracia, todos nós temos o direito e a obrigação de vir aqui e dizer: "Não; daqui não se tira dinheiro"; "daqui não se tira dinheiro"; "não se tira daqui". Não se tira de nenhum lugar... Estamos caminhando para o extremo autoritário de rasgar a Constituição ou para o extremo populista de rasgar a aritmética e trazer de volta a inflação.

    É triste essa sensação que se tem hoje de se estar entre rasgar a Constituição e rasgar a aritmética. Não podemos aceitar essas duas opções. E o caminho é escolher onde haverá sacrifício; onde haverá sacrifício ou se o sacrifício será de todos, se for o caso. Mas isso a gente não vê como se debater, porque...

    E eu volto a insistir no artigo do Vinicius Torres Freire quando ele diz: "Quase nove em dez brasileiros estão em revolta desnorteada, uma escassa explicação restante para o apoio quase irrestrito a um protesto que está ou esteve à beira de levar economia e relações sociais ao colapso." É essa revolta desnorteada. É uma escassa explicação, mas é a única explicação.

    E por que estamos fazendo isso? Como ele diz, desnorteada... Porque houve um sequestro da mente brasileira – da mente brasileira do transporte privado, da mente brasileira do transporte do combustível fóssil, da mente brasileira de que tudo é possível, de que o dinheiro do Tesouro é ilimitado, de que dá para fazer estádios e escolas. Não dá! Um tijolo só pode ser usado, Senador Dário, em uma parede. O Brasil inventou uma maneira de usar um tijolo em duas paredes. Sabe como? Pega o tijolo único, dissolve na água, faz dois tijolos fajutos e põe um em cada parede. O que vai acontecer? As paredes vão cair. É isso que a gente faz quando gasta mais do que é possível, quando pega R$1,00 e transforma em R$2,00, mas os dois só valem 50% cada um, quando a inflação for de 100%. Não vai dar para encher o supermercado.

    E isso está espalhado em tudo. É óbvio que o sistema previdenciário não consegue pagar as aposentadorias nas regras do nosso sistema atual. Só há duas soluções: uma reforma ou uma inflação, porque na inflação todo mundo continua recebendo igualzinho ao que recebe hoje, mas só compra a metade, quando chegar a 100%. E para uma inflação de 5%, se não tomarmos cuidado, chegar a 100% é rápido. Eu não falo para chegar aos 18 mil da Venezuela – aí podemos levar alguns anos –, mas para passar de 5%, 6%, 7% para 100% é muito rápido em países que tem cultura como a nossa, por causa da mente sequestrada.

    Aí eu continuo ainda pegando um pouco da crítica do jornalista Vinícius, que é a todos nós que estamos aqui: "Uma elite política quase toda desprezível e que sequestrou o País acabou com a esperança." Eu estou lendo aqui um artigo de um jornalista. Se eu estou lendo, é porque eu respeito esse artigo, mas ele bate duro em nós: "Uma elite política quase toda desprezível e que sequestrou o País acabou com a esperança." É mentira? Não. Esse "quase" que ele colocou pode deixar que alguns de nós digam: "Eu não faço parte disso." Mas faz! Se não pela corrupção, se não pela omissão, pela incompetência de deixar que os corruptos, de deixar que os outros tomem conta.

    Aí ele vai mais longe: "A classe dirigente toda [aqui ele põe "toda", ele tirou o quase], elites de variada espécie, não são muito melhores, pois tolera essa escória, quando não é cúmplice." Tolera... Eu usei a palavra "omissão"; ele usou a palavra "tolerância", até mais forte, não é?

A classe dirigente toda, elites de variada espécie, não são muito melhores, pois tolera essa escória [a escória dos outros], quando não é cúmplice.

Mas o povo que se revolta contra a mão pesada dos impostos é o mesmo que quer a mão do governo a balançar o berço, subsídios para todos.

    A mente foi sequestrada. Perdemos a capacidade de somar, dividir, diminuir e multiplicar. Entramos na ilusão de que tudo é possível. Não percebemos ainda que este País vai ter que ter um choque de austeridade. E o Reguffe fala muito nisso.

    Ontem eu estava conversando com uma pessoa que trabalha comigo e perguntei se ela tinha gasolina: "Está acabando..." "O que você vai fazer?" Ele disse: "Vou usar ônibus." Eu disse: "Pronto, para alguma coisa serviu a greve dos caminhoneiros. Você vai descobrir que o sistema de transporte público funciona ou vai lutar para melhorar o sistema de transporte público vagabundo que nós temos."

    Todo mundo reclama da taxa de juros, mas ninguém quer abrir mão do seu cartão de crédito, de pagar as contas em crédito ao invés de em desconto imediato. Todo mundo quer trocar de seus bens, e não têm, na conta corrente própria, o suficiente para comprar... Um desses dias, numa audiência sobre taxa de juros, eu disse: "Quer fazer a taxa de juros cair? Basta a gente ficar um mês sem comprar nada a crédito. Os bancos vão chorar para que a gente vá pegar um empréstimo lá e vão baixar os juros." Mas é impossível a taxa de juros baixar, enquanto nós sofremos de uma anorexia de poupança – não poupamos – e de uma voracidade de consumo. Nós queremos consumir muito e poupar pouco – temos que ir para o banco. E o banco, que não tem dinheiro suficiente, porque não há poupança no País, joga os juros lá para cima.

    Mas não é só aí que a mente está fraca; é a mente nossa, aqui, da elite também. Todos estão criticando isso. Mas, se a gente propor aqui quebrar o monopólio da refinação do petróleo, para que haja concorrência entre refinarias e para que não haja esse monopólio na Petrobras, você vai ver que muitos que estão criticando o Governo atual vão defender a Petrobras.

    Será que – estou perguntando, nem estou afirmando – não é hora de autorizar outras refinarias privadas? E sabe por que elas não virão? Porque elas não confiam em quanto tempo vão durar com o preço de mercado, porque os capitalistas vão se perguntar: "Eu monto uma refinaria hoje, daqui a alguns anos, sobe um governo que vai me obrigar a baixar o preço." Aí não querem. Quebrar o monopólio do petróleo hoje, certamente, não atrairá investimentos para a refinaria por falta de uma coisa chamada credibilidade, que é o principal insumo.

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Ou seja, o recurso necessário no Brasil hoje é credibilidade. Todo mundo fala da credibilidade quase zero do Presidente da República, mas, com toda a franqueza, a nossa, aqui, de Senadores não deve estar muito mais alta que a do Presidente Temer, não. Eu vejo todo mundo aqui chegando e dizendo que o Temer tem credibilidade quase zero. E é verdade; merece crítica. Mas façamos uma autocrítica também. E a nossa? Está em quanto a nossa credibilidade? Por este artigo aqui, não está alta, não. Ele chamou não de escória... Chamou de escória! E o povo acha que é mesmo. Será que há argumento sério para dizer que não somos?

    Eu vou concluir, porque há pedido de aparte.

    O último parágrafo dele é meio assustador. Mas antes...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – ... ele lembra o que ele escrevia há um tempo atrás: "Como também se escrevia nestas colunas, o paradão caminhoneiro e suas repercussões são [apenas – eu botei o apenas] um ensaio geral para a crise fiscal que virá."

    E um líder brasileiro me disse, alguns anos atrás, que toda essa crise é pequena, que o Brasil vai se desagregar – isso bem antes da crise no Rio de Janeiro, bem antes de crise de petroleiro agora e de caminhoneiro.

    Será que nós não estamos na véspera de algo, meu caro Vinicius, pior do que crise fiscal? De uma crise de desagregação social? Aí ele continua: "Pode ser uma explosão, se tentarem resolvê-la por meio de mais endividamento." E eu acho que no fim é o que vão tentar, mas aí o juro vai subir.

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Aí a recessão continua, aí o desemprego aumenta.

Pode ser uma agonia crônica [da sociedade], morte nacional lenta, se for resolvida apenas no corte de gastos [vai precisar de austeridade no dia a dia da gente], sem mudanças estruturais. [É aqui que chega a coisa. Ninguém fala nas mudanças estruturais, ferrovias, mais transporte público.] Pode ser uma inflação, com o que a vida será um inferno, mas um tanto mais fresco para os ricos e a miséria para os mais pobres.

    Aí ele conclui – e eu passo a palavra:

Mas a crise virá. Como se escrevia nestas colunas em julho de 2013: "O povo das ruas vai descobrir que o pote de ouro é pequeno; que redividi-lo vai exigir conversa ou conflito. Talvez descubra que boa parte do ouro não está no castelo estatal. No fundo desse castelo do 'tudo que está aí', enfim, tem [apenas] um espelho".

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Não vai ter muito, o Tesouro está vazio. E a gente querendo, olhando no espelho, achar que tem dinheiro.

    Era isso, Sr. Presidente, mas eu vejo dois pedidos de aparte.

    Senador Dário.

    O Sr. Dário Berger (Bloco Maioria/MDB - SC) – Eu pergunto para o Presidente se ele amplia o espaço de V. Exª para que nós possamos ampliar o nosso debate. Se V. Exª ampliar, eu preciso de dois minutos e alguma coisa, talvez um pouco mais; e imagino que o Senador Reguffe também precise do mesmo.

    O SR. PRESIDENTE (Thieres Pinto. Bloco Moderador/PTB - RR) – Senador, por mim não há problema nenhum, eu darei o tempo que for necessário; mas, em seguida, a Senadora Gleisi Hoffmann que estará com a palavra. Se ela concordar,...

    O Sr. Dário Berger (Bloco Maioria/MDB - SC) – A Senadora Gleisi Hoffmann aguarda...

    O SR. PRESIDENTE (Thieres Pinto. Bloco Moderador/PTB - RR) – ... a palavra é toda nossa. Vocês são os donos da palavra.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Dário Berger (Bloco Maioria/MDB - SC) – Tenho certeza de que ela aguarda mais uns cinco minutos. Não é, Senadora Gleisi?

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Fora do microfone.) – Aguardo.

    O SR. PRESIDENTE (Thieres Pinto. Bloco Moderador/PTB - RR) – Com a palavra V. Exª por cinco minutos. A Mesa lhe concede.

    O Sr. Dário Berger (Bloco Maioria/MDB - SC) – Senador Cristovam, em primeiro lugar, mais uma vez, quero cumprimentar V. Exª pelo pronunciamento e, em segundo lugar, fazer um ou dois registros. O primeiro deles: nós estamos vivendo um fenômeno social interessante na minha opinião. Nós estamos infelizes. Nós perdemos a noção de felicidade. Eu não sei que fenômeno é esse, se é só a questão econômica ou se há algo além disso, talvez a falta de convivência humana, propiciada pela internet, por exemplo, em que nós agora conversamos é com o nosso celular. Nós não almoçamos mais juntos, nós não jantamos mais juntos; nas famílias, uns chegam numa hora, outros chegam noutra hora, diferentemente da época do meu avô, por exemplo, e da época do meu pai, em que ninguém se sentava à mesa antes de eles sentarem. E ali, além de fazermos as refeições, nós conversávamos sobre alguns assuntos. E essa questão me dá a impressão de que hoje nós estamos infelizes com tudo o que aparece na nossa frente. Nós estamos infelizes com o Presidente Temer, por exemplo, mas amanhã vamos colocar um outro Presidente e vamos estar infelizes com o outro Presidente também. Esse é um fenômeno que precisa de uma explicação, porque, se nós continuarmos com essa insensatez, essa radicalização, nós não vamos reconstruir o que precisa ser reconstruído. Aliás, todos nós aqui defendemos reformas estruturais para o Brasil, todos nós desejamos fazer as reformas e todos querem que nós façamos as reformas, desde que não seja no nosso próprio quintal. Podemos reformar tudo que precisa ser reformado, desde que a reforma não nos atinja. Ele vem de encontro ao posicionamento, ao discurso e ao pronunciamento de V. Exª, porque, na verdade, nós não desejamos, não queremos e não aceitamos perder algo que conquistamos com muito sacrifício. Outros são os privilégios que efetivamente fazem parte de uma sociedade completamente desigual como a nossa. De maneira que na falta de credibilidade aqui, do Parlamento, permita-me discordar ligeiramente de V. Exª, eu não quero me incluir, absolutamente, nesse conceito de V. Exª, da minha culpa, porque a nossa credibilidade aqui depende diretamente da credibilidade do Poder Executivo. Quer queira, quer não queira, é o Poder Executivo que tem a obrigação, que tem a missão primordial, essencial e vital de propor as alterações necessárias para que nós possamos aqui dar a nossa contribuição. Eu, sinceramente, quero contribuir, mas eu tenho aqui a minha voz, só a minha voz. Eu não tenho a caneta, eu não tenho o poder de fazer as transformações que precisam ser feitas. Então, eu não quero pagar o mesmo preço que outros Poderes estão pagando, porque acho que isso não seria justo e não seria legítimo. De forma que me preocupa muito esse cenário e me preocupa muito o cenário em que nós encontramos o problema. Precisamos solucionar o problema. Todos desejam que o problema seja solucionado o mais rapidamente possível, desde que ninguém faça nenhum sacrifício para que aquele problema seja resolvido. Isso é impossível de acontecer, como V. Exª está mencionando aí. Toda ação tem uma reação e precisa efetivamente ser implementada.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Dário Berger (Bloco Maioria/MDB - SC) – De maneira que a minha preocupação é grande com essa insensatez que nós acabamos construindo, com essa arrogância, essa prepotência e essa falta de credibilidade que nós adquirimos para construir o verdadeiro Brasil que todos nós desejamos.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Obrigado, Senador Dário.

    Senador Reguffe.

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) – Senador Cristovam, eu queria também pedir ao Presidente se pudesse dar um pouquinho mais de tempo para que eu pudesse fazer este aparte. Sobre a greve dos caminhoneiros, Senador Cristovam, eu vou falar, já me inscrevi para falar. Eu vou fazer um pronunciamento também. Vou falar mais tarde. Agora, eu queria tocar em um ponto aqui do pronunciamento de V. Exª, que é essa questão dos gastos do Governo. Sem dúvida nenhuma, o Governo gasta de forma despropositada...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) – ... e de forma irresponsável o dinheiro do contribuinte brasileiro. Eu sou um defensor da responsabilidade fiscal. Um governo não pode gastar mais do que arrecada. Isso, para mim, é princípio. Às vezes, sou criticado por isso, mas isso é o correto. Um governo não pode gastar mais do que arrecada. Como na casa de qualquer um, a pessoa não pode gastar mais do que ela recebe de salário. Então, um governo não pode gastar mais do que arrecada. E onde deveria começar a cortar? Nós temos uma máquina inchada, gorda, cheia de privilégios, cheia de mordomias. Existem privilégios e mordomias nos três Poderes. Enquanto no governo de Juscelino Kubitschek havia 11 ministérios, hoje nós temos mais de 30, uma quantidade enorme...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) – ... de secretarias, uma quantidade enorme de cargos comissionados. Enquanto a França possui 4.800, os Estados Unidos inteiro possuem 8 mil, no Brasil nós temos 25 mil só na administração direta. Uma quantidade de carros oficiais, cada chefe de departamento tem um carro oficial. Que País é este? E depois faltam recursos para outras coisas, claro, não existe almoço grátis. No Poder Judiciário também, carros oficiais, prédios luxuosos, auxílio-moradia para juízes. E, aqui no Legislativo também, uma mordomia também sem fim, carros oficiais, plano de saúde vitalício...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) – ... assessores também em excesso. Então, há que se cortar nos três Poderes, sim. Todo final de semana, ministro de Estado viaja de aviãozinho da FAB para o seu Estado de origem. E isso é normal, é normal. Não é normal, não. Não é normal um ministro viajar num avião da FAB para o seu Estado de origem no final de semana. Quanto custa isso? Como também não é normal o Parlamento aqui aprovar algumas benesses: para o setor tal, vamos dar tanto; para o setor tal, vamos dar tanto. Depois, falta dinheiro. Como também não é normal se criar um fundo público de R$3 bilhões, contra o meu voto, para uma campanha eleitoral. Então, é preciso se discutir isso com profundidade.

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) – Um governo não pode gastar mais do que arrecada. Isso, para mim, é princípio. Agora, nós temos de fazer cortes numa série de áreas do Governo. Por que é preciso tanto cargo comissionado, tanta secretaria, tanto ministério, tanto carro oficial? Por que cada ministro precisa ter um avião da FAB à sua disposição para viajar? E o gasto com combustível? Há uma série de coisas que não dá para aceitar. Nós temos um péssimo Governo, um Governo que não toma as atitudes que deveria tomar, e a sociedade, com toda razão, fica revoltada com esse estado de coisas. Agora, os três Poderes precisam apurar o seu gasto, precisam ter critério na hora de gastar o dinheiro do contribuinte brasileiro. Infelizmente, não vêm tendo o menor...

(Interrupção do som.)

    O SR. PRESIDENTE (Thieres Pinto. PTB - RR) – Vou-lhe dar mais cinco minutos para V. Exª concluir. Está bom?

    O Sr. Reguffe (S/Partido - DF) – Só para encerrar aqui o aparte. Então, infelizmente, os três Poderes não vêm tendo o menor critério no gasto do dinheiro do contribuinte brasileiro.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Eu encerro, Sr. Presidente, dizendo apenas que concordo totalmente com as colocações do Senador Reguffe e tenho procurado dar exemplo, na minha vida, no dia a dia aqui, de que cumpro essa preocupação. Mas, como eu sou defensor da seriedade no discurso, na aritmética, eu defendo o fim de todas essas mordomias e vantagens como uma questão simbólica, para que tenhamos autoridade para cortar outros gastos também, porque só isso, que é suficiente para recuperar a decência na imagem de cada um de nós, não é suficiente para financiar todos os projetos do Brasil.

    Nós vamos ter, sim, de dizer onde corta no real e não só na máquina do Governo, porque, quando se reduz o número de ministérios, reduz-se o número de motoristas, de alguns cargos comissionados. Mas não podemos parar grandes partes das funções daquele ministério. Aí é que vai entrar a grande discussão: quais funções o Governo deve deixar de ter como trabalho dele e passar para outros setores? Cortar as mordomias é para que tenhamos credibilidade. Mas vamos ter, sim, de reduzir as funções do Estado brasileiro para aquelas que sejam realmente fundamentais. Para mim, é a educação com a máxima qualidade e igual para todos.

    Era isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/05/2018 - Página 68