Comunicação inadiável durante a 92ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Comemoração do Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil (“World Day Against Child Labour”), celebrado em 12 de junho.

Autor
Marta Suplicy (MDB - Movimento Democrático Brasileiro/SP)
Nome completo: Marta Teresa Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Comunicação inadiável
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Comemoração do Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil (“World Day Against Child Labour”), celebrado em 12 de junho.
Publicação
Publicação no DSF de 14/06/2018 - Página 30
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, COMBATE, TRABALHO INFANTIL.

    A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/MDB - SP. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) – Obrigada, Presidente.

    Nós comemoramos ontem o Dia Nacional do Combate ao Trabalho Escravo. Uma em cada dez crianças de cinco a sete anos no mundo sofre com a exploração do seu trabalho. São 152 milhões de crianças submetidas ao trabalho infantil; 64 milhões do gênero feminino e 88 milhões, masculino. São mais meninos que estão no trabalho infantil do que meninas.

    No Brasil, a situação é muito, muito ruim. Os dados também são estarrecedores. Mas eu gostaria de falar de algo que foi visto na televisão, viralizou nesses dias, Senador, que aconteceu na Bahia e que impactou, de uma forma horrível, todos nós. Uma criança pobre, via-se nitidamente que era uma criança pobre, estava dentro de uma lanchonete, de um supermercado, e ela queria comer, estava olhando aquilo ali com muita fome, e um cidadão que estava ali se prontificou a comprar comida para a criança. E o que aconteceu? Veio um segurança, tratou mal a criança, tentou tirar a criança dali, enfrentou o cidadão que queria pagar a comida para a criança. E aí a gente fica pensando... O cidadão gritava: "Ele vai comer porque eu vou pagar. Ele não está assaltando." E não houve jeito, até que a coisa prosseguiu...

    Mas eu fico pensando: o que está acontecendo? É uma situação tão horrível impedir uma criança de comer em um lugar e depois ainda impedir o cidadão que quer pagar a comida da criança...

    A gente chama isso de preconceito, porque é um preconceito contra o pobre, contra o negro. E depois nós temos preconceitos contra tantos outros cidadãos. Mas, como nós estamos falando de trabalho escravo, de crianças, isso aí foi muito impactante.

    O Senador Otto Alencar contou hoje, na Comissão de Assuntos Sociais, uma coisa bonita: que o time de futebol para o qual ele torce – agora eu não lembro, acho que se chama Vitória, e desculpe–me se eu estiver errada – vai patrocinar esse menino. Já colocou o menino na escola, com o patrocínio do clube. Achei muito legal isso. Mas eu gostaria de lembrar que nós tivemos uma grande empresa, chama-se Starbucks, que está no Brasil em muitos lugares, onde houve também uma situação de discriminação, de duas moças negras que estavam sentadas, esperando alguém, mas não pediram nada, e o segurança quis tirar essas moças. Aí chegou um cidadão branco, homem, e sentou, e aí ocorreu uma situação que, parece, também foi extremamente constrangedora, pelo jeito que estavam sendo tratadas, depois pelo jeito que passaram a ser tratadas. Mas eu estou contando tudo isso, Senador, porque a reação da empresa foi legal.

    Ela fechou o dia seguinte de trabalho para que todos os seus funcionários – sei lá, são milhares – repensassem o que é o preconceito, o que é a falta de respeito à cidadania. Então, essas situações ocorrem sem parar no Brasil.

    Há três anos – eu lembro desse episódio, que foi muito, muito comentado – um pai viu o seu filho ser expulso da frente de uma loja na Oscar Freire. O menino nem estava na loja, estava na frente. O menino era negro, o pai era branco, mas estava sem o pai. Estava ali quieto, olhando a loja. Foi expulso. O crime era ele ser negro.

    Então, às vezes, a gente fantasia que o nosso País é um país que não tem racismo, não tem homofobia, não tem preconceito. Tem e nós temos que combater. Isso se combate desde a escola. Essa questão de respeito ao diferente tem que ser entendida desde a escola, porque, senão, a mentalidade das pessoas está sendo muito contaminada por ódios, por radicalismos. E também, eu diria, até pela própria observação: ver alguém tratando mal o outro e achar que aquilo pode ser feito, que é bonito fazer aquilo. Mas isso é crime. Isso é um crime. Se não é um crime, muitas vezes, na lei, é um crime de humanidade.

    Bom, eu queria dizer também que essa questão do trabalho infantil pode ser ainda mais dura, pois há crianças que estão pela cidade trabalhando como vendedoras nos faróis, como engraxates e guardadoras de carros. Isso, às vezes, porque são exploradas ou, às vezes, porque não têm casa mesmo e estão lá para comer. E é assim que fazem. Há outras na invisibilidade, acometidas por árduas rotinas de trabalho doméstico – criança trabalhando é extremamente comum no Brasil – ou atuando em trabalhos insalubres que colocam em risco a saúde e desenvolvimento da criança, as chamadas piores formas de trabalho infantil, segundo a OIT.

    Nós também tivemos vários debates hoje na Comissão de Assuntos Sociais, quando o Senador Moka lembrou a questão da primeira infância, da importância das sinapses que são feitas no cérebro, da questão do carinho, da alimentação, como tudo isso faz diferença e como nós estamos meio parados no tempo. Nossa educação não lida com essas questões por preconceito puro, e a sociedade está muito radicalizada.

    Então, hoje eu quero aplaudir essa iniciativa que foi comemorada ontem, o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil, que é o dia 12 de junho, na campanha conjunta com o Dia Mundial de Segurança e Saúde no Trabalho. É uma campanha conjunta que visa eliminar o trabalho infantil e melhorar a segurança e saúde dos jovens trabalhadores.

    Nós sabemos que lei não muda as coisas, mas, sem lei, nós não conseguimos avançar. Então, nós temos que juntar a possibilidade de educar, de falar, de se expressar, de mostrar indignação, como foi mostrado nesse episódio que eu falei do supermercado lá na Bahia, e também brigar para que as escolas passem a ter uma atuação mais forte em relação ao diferente, ao respeito pelo outro e ao não ao preconceito.

    Muito obrigada, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/06/2018 - Página 30