Discurso durante a 96ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do indiciamento, por parte da Polícia Federal, do Ex-Procurador da República Marcelo Miller, responsável pelas delações premiadas de indiciados no curso da Operação Lava Jato.

Autor
Renan Calheiros (MDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:
  • Registro do indiciamento, por parte da Polícia Federal, do Ex-Procurador da República Marcelo Miller, responsável pelas delações premiadas de indiciados no curso da Operação Lava Jato.
Publicação
Publicação no DSF de 20/06/2018 - Página 64
Assunto
Outros > CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Indexação
  • REGISTRO, POLICIA FEDERAL, INDICIAMENTO, PROCURADOR DA REPUBLICA, MOTIVO, CORRUPÇÃO PASSIVA, RESPONSABILIDADE, DELAÇÃO PREMIADA, OPERAÇÃO LAVA JATO, SERGIO MACHADO, ODEBRECHT S/A, DELCIDIO DO AMARAL, EX SENADOR.

    O SR. RENAN CALHEIROS (Bloco Maioria/MDB - AL. Sem revisão do orador.) – Para uma rápida comunicação, Sr. Presidente.

    Ontem, a Polícia Federal indiciou o ex-Procurador da República Marcelo Miller por corrupção passiva, por ter, Sr. Presidente e Srs. Senadores, recebido dinheiro para coordenar delações enquanto atuava como braço direito de Rodrigo Janot.

    Miller passou a atuar no escritório Trench, Rossi & Watanabe Advogados, do Rio de Janeiro, um escritório renomado, contratado pela JBS para negociar a leniência, enquanto dava expediente no Ministério Público e fazia parte do grupo da Lava Jato.

    Miller esteve à frente das delações do Sérgio Machado, da Odebrecht, do Delcídio do Amaral, do Cerveró, do Ricardo Saud e dos donos da JBS, todas usando os mesmos métodos: gravação feita sem o conhecimento de quem estava sendo gravado.

    Sérgio Machado, Sr. Presidente, Srs. Senadores, gravou políticos do MDB e ofereceu as fitas à Procuradoria-Geral da República, em ato de desespero para salvar a pele, e mais R$1 bilhão, encontrados nas suas contas no exterior e nas contas dos seus três filhos, também delatores. Aceitaram as gravações, mesmo, Sr. Presidente e Srs. Senadores, que seus conteúdos, como no meu caso e no de vários Senadores, não representassem nada, absolutamente nada.

    Em fevereiro, Senador Otto Alencar, e março de 2016, Sérgio Machado, temendo ir para a cadeia, como revelou na própria gravação clandestina que fez, orientado por Miller, insistia e forçava a barra para obter alguma coisa que pudesse incriminar terceiros e favorecê-lo. Num ambiente onde estavam cerca de dez pessoas, gravou até meu neto, com oito anos de idade.

    Aqui está o ápice desse espetáculo dantesco: a impunidade de Sérgio Machado, que teve quase nada para devolver em 30 anos, apenas uma pequena parte, uma parte ínfima do que amealhara dos cofres públicos e a lavagem consequente de milhões de euros, com o beneplácito de Rodrigo Janot. Ele obteve imunidade penal e a proibição de compartilhar provas com outros países, arranjadas por Fernanda Tórtima, sua advogada e advogada em todos esses casos, nas negociatas entabuladas por Janot e por Miller.

    Os elementos de corroboração apresentados por Fernanda Tórtima e aceitos por Rodrigo Janot, Miller, Pelella e Ancelmo de Barros para ultrapremiar – e já encerro, Sr. Presidente – Sérgio Machado e seus três filhos eram as prestações de contas disponíveis no site do Tribunal Superior Eleitoral. Estas foram as provas apresentadas por Sérgio Machado: as prestações de contas públicas disponíveis e publicadas no Tribunal Superior Eleitoral.

    No ano passado, a Polícia Federal pediu a perda dos benefícios de Sérgio Machado, afirmando ao Supremo Tribunal Federal que o delator não merecia os benefícios oferecidos pela Procuradoria porque sua colaboração premiada era ineficaz e ele não provava as acusações feitas na delação. Mesmo assim, Sr. Presidente, os benefícios continuam mantidos. E, pior ainda, suas acusações sem provas seguem avolumando os números de investigações abertas pelo Janot, seu grupo, que agora começam a ser desmascaradas.

    Outra investigação aberta contra mim envolveu a atuação ilícita de Miller, Senador Otto Alencar, partindo da delação forjada de Delcídio do Amaral, envolvendo-nos numa tentativa de obstrução da Lava Jato, que, segundo ele, Delcídio, depois cassado aqui pelo Senado Federal, teria sido articulada no Instituto Lula, por mim, pelo ex-Presidente Lula e pelo Senador Edison Lobão.

    Comprovado que não se cogitou de criação de qualquer grupo para embaraçar a Lava Jato, a narrativa mentirosa veio abaixo. A investigação foi arquivada no mês de julho passado, mas o noticiário, como todos sabem, dedicou poucas linhas ao assunto. Vale lembrar ainda que nenhuma punição foi dada a Marcelo Miller pelo Ministério Público Federal. Janot chegou a mentir em público afirmando, Sr. Presidente, que ele não participou da negociação das delações da JBS e que existe, inclusive, uma cláusula de que ele não pode atuar pelos escritórios nos acordos.

    Pego na mentira, fez um teatro para a imprensa e pediu a prisão do comparsa, Marcelo Miller, transferindo ao Supremo Tribunal Federal os desgastes que as descobertas trariam, inclusive, como V. Exª sabe e os Senadores e Senadoras sabem, insinuando envolvimento dos próprios ministros do Supremo Tribunal Federal.

    No meio disso tudo, vale ressaltar os vazamentos feitos, muitos mentirosos, em processos sigilosos por essa turma do Janot. Vazamentos facilitados por relações questionáveis, como, por exemplo, a presença da esposa de Eduardo Pelella, Débora Pelella, então braço direito e chefe de gabinete do ex-Procurador, agora, Sr. Presidente, no gabinete do Ministro Edson Fachin. Mas era, em todos os momentos, a principal acusada de ter possibilitado os vazamentos, muitos deles verdadeiros e muitos deles mentirosos também, sem correspondência na própria investigação, para a imprensa. Isso ainda não foi investigado, apesar do DNA, da certeza de setores da imprensa de que essa senhora, Débora Pelella, era quem fazia industrialmente esses vazamentos.

    A imprensa vem divulgando os fatos pela lógica desses vazamentos criminosos e pela lógica desse grupo, que cuidava das investigações. Espero, Sr. Presidente, Srs. Senadores, que agora a imprensa se dedique a denunciar os abusos, os acordos forjados e a corrupção praticada nos bastidores da Procuradoria-Geral da República por esse grupo, que dominou o Ministério Público Federal nos últimos oito anos, Gurgel, Janot, Anselmo Barros, Pelella e outros.

    Acredito que as investigações da Polícia Federal seguirão com a quebra de sigilos e o cruzamento de dados financeiros para seguir o dinheiro. Que dinheiro? O dinheiro que essa gente amealhou através de contratos com renomados escritórios de advocacia. Só assim, Sr. Presidente, a sociedade conhecerá as negociatas desses procuradores que desonraram o Ministério Público Federal.

    Não canso de repetir que defendo a Lava Jato. Em todos os momentos, trabalhamos aqui no Legislativo para garantir a instituições, como Ministério Público Federal e Polícia Federal, órgãos de investigação e também de persecução penal, autonomia e independência.

    O Brasil foi um dos países que mais avanços teve no fortalecimento dessas agências, mas, Sr. Presidente, Srs. Senadores, não fizemos isso para transformá-los em perseguidores de ninguém e entregá-los nas mãos dessa gente, Rodrigo Janot, Marcelo Miller, Eduardo Pelella e Anselmo Góes. O indiciamento de Miller é o início, é o início. Meus parabéns à Polícia Federal.

    Começo a confiar que os excessos da Lava Jato serão corrigidos, e a atuação ilícita dessas figuras que desvirtuaram o propósito das investigações para ganhar dinheiro, Sr. Presidente, começa finalmente a ser desmascarada. Primeiro, a Polícia Federal pediu a revogação da delação de Sérgio Machado, por inexistirem provas. Agora pede a inexistência do acordo de delação e incrimina Marcelo Miller por ter praticado corrupção ativa no episódio da delação da Lava Jato.

    Eu sempre defendi investigação. Acho que ninguém, Senador Otto, está livre de investigação. Eu acho até que o homem público, muitas vezes exposto ao noticiário, tem que aproveitar a investigação como um momento para se defender, para fazer a prova negativa, para demonstrar o contrário, mas eu, da mesma forma, defendo a investigação no Ministério Público, Sr. Presidente, e defendo, como nós votamos aqui, no Senado, a atualização das penas do abuso de autoridade, para que essas coisas não continuem a acontecer impunemente no nosso País.

    Foram muitos os Senadores desta Casa que tiveram condução coercitiva, com que agora o Supremo Tribunal Federal acabou. Muitos com filhos e filhas pequenas, que foram submetidos aos excessos de uma condução coercitiva, de uma invasão domiciliar, Sr. Presidente, muitas vezes denunciado, como muitos, no caso de Sérgio Machado, em uma delação que tem como documento, Senador Omar Aziz, os dados das contas eleitorais publicados no Tribunal Superior Eleitoral.

    Isso não pode continuar. Isso é incompatível com a nossa democracia e é desproporcional com esta Casa, que sempre dotou essas agências dos mecanismos necessários para um permanente combate à corrupção no Brasil.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/06/2018 - Página 64