Discurso durante a 11ª Sessão Solene, no Congresso Nacional

Sessão solene do Congresso Nacional destinada a homenagear o centenário de nascimento de Athos Bulcão.

Autor
Cristovam Buarque (PPS - CIDADANIA/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Congresso Nacional
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Sessão solene do Congresso Nacional destinada a homenagear o centenário de nascimento de Athos Bulcão.
Publicação
Publicação no DCN de 05/07/2018 - Página 10
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • SESSÃO SOLENE, CONGRESSO NACIONAL, OBJETIVO, HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, PINTOR.

     O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PPS-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, senhores convidados, raras pessoas conseguem ser lembradas no centenário de seu nascimento por alguns poucos descendentes -- raras pessoas! A maioria, quando completaria 100 anos, é apenas uma lembrança quase que esquecida. Quase nenhum é lembrado aos 100 anos em uma homenagem como esta que fazemos aqui hoje ao grande Athos Bulcão. É muito raro.

      Nós temos certeza de que, no caso de Athos, daqui a 100 anos e daqui a 200 anos, a 300 anos, teremos sessões de homenagem a ele, por cinco razões -- e poderiam ser mais --, mas nenhuma delas teria sentido se não fosse o seu talento e também o momento histórico em que ele viveu.

      Talento e momento histórico permitem que ele seja lembrado -- essa é a primeira razão -- porque é dos raríssimos artistas no mundo que conseguiram ter uma vinculação com a cidade que criaram junto com outros. Poucos artistas são vinculados à cidade de maneira íntima. Alguns de Florença, alguns de Roma, mas eles não criaram a cidade. No caso de Athos, além da sua vinculação à cidade, ele foi um dos criadores, dos inventores, dos fundadores da cidade. Isso faz com que ele esteja sendo homenageado aqui.

      Graças ao seu talento e ao momento histórico, coincidiu que sua cidade fosse seu museu, como é também o museu de Burle Marx. É muito raro um artista ser o criador da cidade, ser identificado com ela e tê-la como seu museu ao ar livre ou dentro dos espaços, como lembrou o Presidente ao falar do teto do local onde estamos, ou quando vamos à Catedral.

      Segunda razão: ele é o criador de uma nova estética. Ele não foi apenas mais um pintor. Ele conseguiu romper, formular uma estética própria, como vemos nos seus azulejos. Ele deu um salto, e isso é raro para os artistas. A maioria deles dá pequenas contribuições. Raros rompem com a estética, como ele conseguiu fazer.

      A terceira razão da sua permanência é a parceira que ele teve com figuras como Portinari e Niemeyer. Com Portinari, ele começou a trabalhar aos 21 anos em Belo Horizonte, na Pampulha. Essa parceria com Portinari, com Niemeyer, contribuiu para dar-lhe a grandeza que nos leva, 100 anos depois de seu nascimento, 10 depois da sua morte, a estar aqui nos lembrando dele.

      A quarta razão da sua permanência é a parceria com o tempo. Ele foi um parceiro do tempo. O tempo da Nova Capital, o tempo do desbravamento do Brasil em direção ao oeste, que fez com que ele, tão jovem, viesse para cá e aqui ficasse até o final de seus dias. A parceria com a estética do seu tempo, não só nas artes plásticas, como também na música, com Villa-Lobos, com a Bossa Nova, com a nova arquitetura em geral, na pintura de Portinari, na literatura de Guimarães Rosa, na poesia de Drummond, de Manuel Bandeira. Ele foi produto e parceiro do seu tempo na criação estética do mundo e foi também obviamente parceiro do momento histórico que o Brasil vivia de desenvolvimento industrial e de desbravamento para o oeste. A figura dele, além de outros artistas, está vinculada também ao nome de Juscelino Kubitschek.

      Eu diria que ele conseguiu fazer com que esse grupo todo e com que o Brasil daqueles anos 50 e anos 60 fossem algo parecido com Viena na passagem do século XIX para o século XX. E coincidiu de um conjunto de pessoas de tão diferentes profissões, especialidades e vocações se juntarem, estarem juntas e ali fazerem uma nova maneira de ser um povo, um país. A verdadeira forma nova de ser um povo é quando rompemos com a cultura e criamos outro jeito de ser.

      Finalmente, a quinta razão: ele está aqui sendo homenageado pela geração à qual pertenceu, não apenas a parceria do seu tempo do ponto de vista histórico, mas também da coincidência existencial dele com figuras como Pancetti, Enrico Bianco, Glauber Rocha, Vinicius de Moraes, Villa-Lobos, Tom Jobim e tantos outros que fizeram daquela uma das melhores gerações de brasileiros que tivemos no mundo da cultura, sem dúvida alguma, uma das mais ricas de todas as gerações que tivemos.

      Por isso, estamos aqui, 100 anos depois do nascimento de Athos Bulcão, prestando-lhe uma homenagem que é tão rara de se fazer para qualquer ser. Athos mereceu este momento e vai merecer outra vez um momento como este, daqui a 100 anos, a 200 anos e outros tempos no futuro, porque ele foi grande, o grande Athos Bulcão, que alguns -- eu inclusive -- tiveram o privilégio de conhecer e de conversar com ele. As futuras gerações terão o privilégio de ver a obra que ele criou.

      É um privilégio estar aqui prestando essa homenagem especial a um dos maiores brasileiros que nós já tivemos na nossa história.

      Sr. Presidente, Athos está aqui comemorando 100 anos e continua vivo na sua obra, na sua trajetória, no seu exemplo de tudo aquilo que fez e nos deixou.

      Muito obrigado, Athos Bulcão. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DCN de 05/07/2018 - Página 10