Discurso durante a 105ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 6.299, de 2002, que substitui o termo agrotóxicos por pesticidas e defesa da necessidade de debate sobre o tema.

Considerações sobre a insegurança jurídica gerada a partir da decisão do Desembargador Rogério Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, de soltar o Ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO:
  • Considerações sobre o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 6.299, de 2002, que substitui o termo agrotóxicos por pesticidas e defesa da necessidade de debate sobre o tema.
PODER JUDICIARIO:
  • Considerações sobre a insegurança jurídica gerada a partir da decisão do Desembargador Rogério Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, de soltar o Ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 10/07/2018 - Página 9
Assuntos
Outros > AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • COMENTARIO, PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS), ASSUNTO, SUBSTITUIÇÃO, PALAVRA, AGROTOXICO, ROTULO, PRODUTO, MOTIVO, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, PROTEÇÃO, SAUDE PUBLICA, REGISTRO, CAPACIDADE, PRODUÇÃO, BRASIL, NECESSIDADE, COMBATE, PRAGA, DEFENSIVO AGRICOLA, DEFESA, REALIZAÇÃO, DEBATE, MATERIA.
  • CRITICA, ROGERIO FAVRETO, DESEMBARGADOR, TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL (TRF), QUARTA REGIÃO, MOTIVO, DECISÃO JUDICIAL, ALVARA, PRISÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, LEITURA, DOCUMENTO, AUTORIA, JUIZ FEDERAL, MANIFESTAÇÃO, REPUDIO, DECISÃO, COMENTARIO, NOTA, AUTOR, CARMEN LUCIA ANTUNES ROCHA, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ATUAÇÃO, MAGISTRADO, ELOGIO, RAQUEL DODGE, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, QUESTIONAMENTO, SUSPEIÇÃO, IMPEDIMENTO, AUTORIDADE JUDICIARIA.

    A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente desta sessão, Senador Fernando Collor, antes de entrar no tema que me traz a esta tribuna, eu queria dizer a V. Exª, em relação ao seu pronunciamento muito oportuno, que esse tema merece de todos nós muita responsabilidade. E a responsabilidade decorre, Sr. Presidente, do fato da relevância que tem a matéria não apenas para a saúde pública, para a defesa do consumidor, mas, sobretudo, para a segurança alimentar e para a questão relacionada à sustentabilidade na produção agropecuária brasileira.

    A sustentabilidade prevê, entre outros requisitos, Sr. Presidente, a questão da preservação ambiental. E produtos que eventualmente possam ter uma contaminação ambiental também devem ser examinados sob o crivo da absoluta técnica de apuração, de investigação. E hoje nós estamos fazendo o consumo de produtos vindos de países vizinhos que consomem defensivos agrícolas que são proibidos no Brasil. Então, nós temos que ter uma regra igual nesses episódios.

    Nós tivemos uma lei aqui, que foi submetida à Comissão de Agricultura – eu estive presente nessa votação –, que previa que produtos que nós importássemos e que usassem, nos países de origem, agroquímicos que fossem proibidos aqui fossem vedados de entrar no mercado brasileiro, com o mesmo argumento de que é a proteção à saúde do consumidor. Essa lei não foi aprovada porque todos os ministérios, Sr. Presidente, alegaram que a Organização Mundial do Comércio impede o estabelecimento de regras com esse grau de barreira comercial. Todos os ministérios justificaram o regramento da OMC para inviabilizar a aprovação desse projeto, que tem toda a lógica e toda a coerência dentro do que V. Exª fala.

    O Brasil, eu diria – sou de um Estado agrícola, assim como V. Exª, que comandou o nosso País –, é um país que está no hemisfério sul, é um país de clima tropical e subtropical, em que é possível fazer, Sr. Presidente, de duas a três safras agrícolas por ano. Qual é o país no mundo capaz de produzir de duas a três safras agrícolas por ano, com comida para mais de 250 milhões, quase 300 milhões de brasileiros e comida para abastecer o mundo, que passa fome, como alguns países da África e outras regiões do Planeta? Então, nós estamos na condição de um país tropical e subtropical, diferentemente do hemisfério norte, em que há geadas, neve, temperaturas muito elevadas e que só pode, por conta do clima, do frio e da neve, produzir apenas uma safra por ano. Nós aqui temos infestação de lagartas, infestação de pragas, de ervas daninhas, o que não existe no hemisfério norte. O hemisfério norte consome mais fungicidas por causa da excessiva umidade, e nós aqui, herbicidas. Então, a diferença...

    É preciso também, nessa matéria, quando examinarmos aqui esses temas, que, primeiro, à luz do que diz a Organização Mundial do Comércio, à luz do que a saúde pública brasileira exige, a defesa do consumidor – V. Exª, quando Presidente, criou e sancionou a Lei de Defesa do Consumidor – prevaleça para o interesse maior da coletividade, sem descuidar, é claro, desse procedimento.

    É claro que um país do tamanho do Brasil – nenhum país no mundo tem uma produção igual à nossa – tem que usar esse volume por ser um país tropical, por ter temperaturas altas, chuvas. Aí aparecem, exatamente, todas as ervas daninhas e os problemas que têm que ser combatidos.

    A indústria química hoje se esforça muito – eu vejo o esforço – pela pesquisa de produzir produtos biológicos que não tenham o mesmo impacto de produtos químicos, de origem biológica. Então, é o combate biológico às pragas em produção e escala que possam ser usadas para todas as culturas. Nós temos ferrugem asiática, nós temos a lagarta, nós temos o excesso de ervas daninhas, o que compromete, ao final, uma safra, se não for bem tratada.

    Quando introduziram aqui os produtos modificados geneticamente, houve uma grande discussão e um debate. Fizemos uma lei de biossegurança – V. Exª acompanhou muito bem essa matéria. Essa Lei da Biossegurança misturou célula-tronco com produtos modificados geneticamente, duas coisas que não têm relação nem intimidade. Mas nós somos um Brasil assim. É um país muito estranho o nosso. E essa lei hoje está em vigor no Rio Grande do Sul, e hoje, com a legalização, com o regulamento sério, pesquisado e avaliado, o senhor vai às lavouras de soja e vê abelhas produzindo mel lá, de excelente qualidade; a vegetação, os pássaros em enorme quantidade. Não morreram os pássaros, que são, eu diria, mais próximos da produção e do uso dos chamados defensivos agrícolas ou produtos agroquímicos. Então, nós temos que olhar esse aspecto também.

    E, quando dizem que o Brasil é o maior consumidor de agroquímicos, é preciso ver o tamanho do Brasil e o tamanho da nossa safra: somos o segundo maior produtor e exportador do mundo, e, para isso, a lavoura precisa de uma proteção. E, percentualmente, o país que mais usa agrodefensivos, ou agroquímicos, por incrível que pareça, Presidente, chama-se Holanda. E não é só por causa das tulipas maravilhosas que nos encantam. É o país que mais usa comparativamente ao uso hectare-quilo de produtos.

    Então, esse é um tema muito importante. Como presidi a Comissão de Agricultura, eu não podia deixar de fazer um comentário ao que V. Exª fez, exatamente focando naquilo que tem relevância: a saúde da população, os direitos do consumidor. Há uma lei que precisa ser preservada, mas nesse guarda-chuva é preciso enxergar também o outro lado da questão, porque nós tentamos fazer uma lei que impedisse de entrarem no País produtos agroquímicos de países vizinhos ou de outros países que são proibidos aqui. Ora, então, estamos consumindo produtos que também vão lesar nossa saúde, e há produtos proibidos aqui, que não foram liberados aqui.

    Portanto, concordo com o senhor: vamos abrir um debate bastante intenso e racional sobre esse tema, não ideológico, porque, quando a ideologia se mete na ciência e na pesquisa, nós estamos no caminho errado. E quando a ideologia se mete no Poder Judiciário acontece também o mesmo desastre.

    É sobre isso que venho falar agora, Presidente, exatamente porque aconteceu nesse domingo a questão da tomada de uma posição que deixou os brasileiros perplexos, depois da derrota que tivemos na sexta-feira, da nossa Seleção Brasileira perante o time da Bélgica. E nós deparamos, naquela sexta-feira... Eu estava em Uruguaiana, lá na fronteira com a Argentina e, como todos, cabisbaixa, mas, enfim, chegamos onde pudemos chegar. Isso não pode nos tornar trágicos, dizendo que não temos solução. Há solução, sim. O Brasil é maior que a crise.

    Mas a surpresa não veio do futebol. A maior veio do Poder Judiciário, de onde exatamente não se esperaria jamais a insegurança jurídica que foi instalada no País. Dentro do próprio Poder Judiciário, de que se espera harmonia, a mesma que se quer do Estado democrático, a harmonia dos Poderes, o equilíbrio, a equipotência dos Poderes: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Esse mesmo equilíbrio precisa existir na primeira, na segunda e na terceira instância do Poder Judiciário, junto com a representação da sociedade, que é a Defensoria Pública, o Ministério Público, a PGR (Procuradoria-Geral da República).

    Mas o que nós vimos nesse domingo foi uma inversão de valores. E parece toda uma ópera ensaiada, uma manobra jurídica, uma chicana, eu diria, ardilosamente preparada, como se ninguém fosse perceber o que estava acontecendo.

    Aliás, todos estávamos lá, e aí, acompanhando o noticiário, a cada hora a perplexidade se tornava maior, e a insegurança maior ainda... Como fica o cidadão brasileiro que depende da Justiça olhando esse cenário? Não é preciso ter grande conhecimento jurídico para entender que alguma coisa não está certa. E começa, quando o conterrâneo do meu Rio Grande querido Rogério Favreto, Desembargador do TRF-4, de plantão, a partir da sexta-feira, às 18h – e ele ficaria até hoje, às 11h –, monocraticamente, expede um alvará de soltura ao ex-Presidente preso na Polícia Federal em Curitiba, imediatamente. Aí começam os problemas das instâncias. O superior sendo desrespeitado pela instância inferior, colegiados ignorados, inclusive a Suprema Corte, que já havia arquivado um pedido da defesa para essa mesma finalidade num habeas corpus. E aí não se entendeu mais essa verdadeira confusão jurídica de uma instabilidade impensável a três meses das eleições no Brasil. Imaginávamos que o cenário político estava incerto; agora o que está incerto é a situação institucional brasileira.

    Começo lendo aqui uma nota da União Nacional dos Juízes Federais. Não é a Senadora Ana Amélia que está falando, mas a representação da liderança da categoria que integra o Sr. Desembargador Rogério Favreto.

    O que diz a entidade representativa dessa categoria de juízes federais?

[...] – manifesta seu mais profundo repúdio diante da decisão proferida em plantão judiciário no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região que determinou a soltura do Sr. Lula esclarecendo ao povo brasileiro que a referida decisão não é juridicamente válida e tampouco merece qualquer crédito pelo seu caráter ilegal e manifestamente contrário aos princípios que regem decisões tomadas em sede de plantão judiciário, violando a sistemática de funcionamento prevista pelo Conselho Nacional de Justiça [Sr. Presidente].

A decisão [prossegue a nota oficial da Unajuf] proferida pelo Desembargador, oriundo do chamado quinto constitucional [teremos que examinar isso futuramente], apenas demonstra que é necessária uma profunda reformulação do Poder Judiciário em razão do aparelhamento político que este órgão [no caso dessas Cortes, Justiça Federal] sofreu nos últimos 15 anos, colocando a nu situações esdrúxulas de indicações políticas.

Por fim [conclui a nota] deixamos nosso mais veemente repúdio pela afronta aos ditames da legalidade e sobretudo de honestidade que se espera de decisões judiciais.

    Essa nota foi emitida ontem, 8 de julho, pela Associação Nacional dos Juízes Federais.

    Não foi diferente, embora em outros termos, a manifestação de ninguém mais, ninguém menos do que a Srª Presidente da Suprema Corte do País, a Ministra Cármen Lúcia, a quem nós respeitamos e admiramos.

    Vou apenas resumir o que disse a nota da Presidente Ministra Cármen Lúcia. Abro aspas.

A Justiça é impessoal, sendo garantida a todos os brasileiros a segurança jurídica, direito de todos.

    Prossegue a nota da Srª Presidente da Suprema Corte:

O Poder Judiciário tem ritos e recursos próprios, que devem ser respeitados. A democracia brasileira é segura, e os órgãos judiciários competentes de cada região devem atuar para garantir que a resposta judicial seja oferecida com rapidez e sem quebra da hierarquia [sublinho: sem quebra de hierarquia], mas com rigor absoluto no cumprimento das normas vigentes.

    Encerra a nota – resumida, mas que diz tudo na sua profundidade – da Srª Presidente da Suprema Corte, Ministra Cármen Lúcia, Senador Alvaro Dias.

    E ainda sobre o mesmo tema, o Procurador-Geral da República em exercício, Humberto Medeiros, nas férias da Procuradora, a Drª Raquel Dodge, diz, encaminhando à Presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Ministra Laurita Vaz – outra mulher comandando um Poder importante. Diz ele:

[...] como a prisão de Lula foi determinada pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região [...], não caberia habeas corpus para um desembargador da própria Corte, mas somente ao STJ, instância superior. [É aquilo de que falávamos ainda há pouco.]

Ainda segundo o procurador-geral em exercício, não é cabível a impugnação da decisão que mandou prender Lula "em habeas corpus contra o juízo de primeiro grau que é mero executor de determinação do Tribunal Regional Federal da 4ª Região".

    Aliás, foi preciso que o Relator, o comandante da Lava Jato, tivesse manifestado estranheza com essa manifestação do Desembargador Rogério Favreto, para que o próprio Presidente do Tribunal Federal Regional da 4ª Região, Desembargador Thompson Flores, desse a última palavra para repor e colocar os pingos nos is, falando na linguagem popular, ou colocar as coisas como deveriam estar: obedecendo à lei – e não essa confusão hierárquica de um desembargador de plantão, se insurgindo contra deliberações de instâncias colegiadas superiores.

    Esse é o risco, Senador Alvaro Dias, Presidente Fernando Collor, o risco exatamente de uma quebra da institucionalidade.

    E para nós aqui, que já estamos mergulhados em tantas incertezas políticas com o futuro do País – e aqui há dois pré-candidatos à Presidência à nossa frente, o Senador Alvaro Dias, do Podemos, e o Senador Fernando Collor –, já não seria suficiente estarmos nesse limbo político? E agora mais um que diz respeito à essa questão relacionada às instâncias...

    E aí veio a minha modesta compreensão sobre a questão que é elementar – eu penso – e que vale para a Suprema Corte, como vale para um juízo de primeira instância: a questão da suspeição e do impedimento. A gente tem visto que os exemplos da Suprema Corte não têm sido edificantes, e talvez isso tenha até inspirado o que aconteceu ontem em Porto Alegre. Também há, a gente nota quando há alguns julgamentos na Suprema Corte... Não há... Porque a suspeição – parece-me –...

(Soa a campainha.)

    A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) – ... advém de uma decisão de foro íntimo do magistrado em se sentir impedido – eu diria – moralmente, no caso da suspeição, por ter um vínculo com a parte que está em julgamento, por qualquer razão. Porque há, na Lei do Impedimento, que tem alguma analogia com a suspeição, um regramento a seguir: não ser parente em terceiro grau, todo um regramento previsto que parece que, em algumas instâncias, não é observado, e por isso se suscita: já que a porteira se abriu, vamos todos aproveitar essa balburdia na ordem institucional brasileira em relação a procedimentos como esses que trazem total insegurança jurídica ao País.

    Eu queria louvar a manifestação da Srª Presidente do Supremo Tribunal Federal; a posição rápida do Presidente do Tribunal Federal da 4ª Região, Ministro Thompson Flores, que tem agido com uma visão republicana, uma visão da impessoalidade das decisões que tem tomado; o Desembargador Gebran, da mesma forma; o próprio Juiz Sergio Moro; a Procuradoria da República; a União Nacional dos Juízes Federais, pois eles foram protagonistas em trazer tranquilidade ao País e demonstrar: este País tem jeito.

    Aí me veio à memória – o senhor, que é um cidadão brasiliense, com a convivência desde a juventude aqui, em Brasília – Renato Russo, o compositor da Legião Urbana que todos admiramos, que compôs uma música, feita em 1987: Que País é Esse? Eu até fiz uma nota lembrando apenas dessa frase: Que Judiciário, que Justiça é essa que mais cria incerteza, dúvida do que segurança jurídica ao cidadão brasileiro? Não é apenas por uma pessoa importante que está envolvida, um ex-Presidente de República. Por mais importante que seja, a lei é igual para todos.

    E o que foi protagonizado por três Parlamentares, com todo o direito que tinham de criar um factoide, mas não eram os advogados, não tinham procuração para se apresentar como tal ao Desembargador Rogério Favreto naquela canetada que, monocraticamente, mandou a Polícia Federal soltar. E a Polícia Federal, cautelosamente, esperou que um poder maior se levantasse, uma voz maior se levantasse para, enfim, fazer a execução.

    Na música Que País é Esse?, do Renato Russo, ele disse: "Nas favelas, no Senado – eu incluo, e no Judiciário –, sujeira para todo lado, ninguém respeita a Constituição, mas todos acreditam no futuro da Nação."

    Esse é o lado que sobressai da mente, da alma, do coração dos brasileiros, porque, apesar de todos os pesares, de tudo que está acontecendo, ainda há uma chama, tênue, mas uma chama de esperança de que nós vamos passar essa fase, essa transição, imaginando que o País possa trazer mais conforto, mais serenidade para os brasileiros.

    Mas nós precisamos também, como nós somos cobrados aqui, por maior honestidade, por maior comprometimento com as questões nacionais... Assim como nós somos cobrados, que nós possamos sair nas ruas e encontrar, olhar olho no olho das pessoas, conversar com as pessoas. Felizmente, não são só os políticos hoje que correm o risco de não ter a possibilidade de receber o respeito da população.

    Lamentavelmente, esse cenário não é positivo. Eu não tenho nenhuma alegria de saber que magistrados da Suprema Corte são hostilizados em aeroportos, em cidades no exterior, aqui, em restaurantes... Isso não é bom, mas isso é a reação a uma ação, a uma ação que move os sentimentos dos brasileiros, que percebem alguma coisa equivocada nas sentenças ou, simplesmente, no não uso da suspeição, numa hora de um julgamento ou no respeito à regra do impedimento, que está prevista na lei.

    Mas, como disse, eu trago aqui, para terminar, porque penso que a ex-ministra do STJ, que comandou o Conselho Nacional de Justiça, é uma baiana de muita coragem. Aqui nem estou puxando a brasa para o meu lado, porque sou uma Senadora mulher, do Rio Grande, com muita honra, da minha Lagoa Vermelha, mas por mulheres bravas, como Raquel Dodge – e, às vezes, divergimos, como a questão da urna, da impressão do voto na urna eletrônica –, a Ministra Cármen Lúcia, a Ministra Laurita Vaz, que comanda o STJ, e essa Ministra, guerreira e combativa, Eliana Calmon, que comandou o Conselho Nacional de Justiça.

    Ela deu, há uma semana... Parece que ela estava adivinhando o que iria acontecer. Aliás, está sendo fácil a gente fazer previsões. Até o Renato Russo adivinhou, em Que País é Esse?, indignado com o que acontecia lá, em 1987 – a coisa está igual agora. E a Ministra Eliana Calmon, numa entrevista que deu na semana passada, falando sobre as mazelas que vive o Judiciário... E ela precisa ser elogiada, porque a crítica que ela faz ajuda o Poder Judiciário; ajuda, porque, se nós entendermos a crítica construtiva feita a nós e nós soubermos aproveitar a lição, nós saberemos também melhorar aqui, meu caro Senador Elmano Férrer, Senador Collor e Senador Alvaro Dias. Nós saberemos também aproveitar.

    O que nós não aceitamos é o desrespeito, é o achincalhamento, é a forma errada, equivocada, mas uma boa crítica como ela faz, sobre a Casa a que ela pertenceu – ela está hoje aposentada, Eliana Calmon –, é procedente. Precisa ser ouvida a voz dela, e não ignorada. Ignorar o que ela diz é contribuir para continuar do jeito que está, e do jeito que está não está bom, no entendimento do brasileiro em todas as camadas da nossa população.

    Ela falando sobre as regras do impedimento e suspeição: "Não existem [disse ela] para os magistrados de terceiro grau; só existem para os juízes de primeiro grau e para os tribunais intermediários." Continua ela: "Somos interessados em termos um Supremo Tribunal Federal que seja a garantia de que efetivamente se está julgando, independentemente de quem esteja sendo julgado."

    A lei é igual para todos – frase minha.

    "As regras de suspeição e impedimento são parecidas [didaticamente explica ela]. A suspeição, quando existe, é um desconforto do magistrado em julgar, porque não se sente à vontade, porque é amigo íntimo, porque é inimigo, não quer se descobrir para aquela pessoa com quem se tenha amizade."

    Suspeição. Então, ele se autodeclara: "Por suspeição, não julgo, não entro nesse caso."

As questões de impedimento [continua explicando a ex-Ministra Eliana Calmon] estão capituladas em lei; são as mesmas causas de suspeição. Mas a lei é que estabelece, nesses casos, que o magistrado não pode. Por exemplo: o parentesco até o terceiro grau não pode; filiação não pode; enfim, a lei estabelece as regras em que não são possíveis fazer o julgamento nesses casos do impedimento, previstos em lei.

    Mas, como ela observa aqui, isso está sendo válido só para a primeira instância; nos graus superiores, não é obedecido – terceira instância.

    Disse ela: "As regras de impedimento e de suspeição têm que ficar claras" – ponderou e defendeu corajosamente a Ministra Eliana Calmon.

    Não é possível que uma pessoa, que conviveu a vida inteira, foi subordinada, chefe, assessor, julgue um caso posteriormente, sem o mínimo constrangimento, sem nenhuma satisfação. Isso aconteceu ontem, domingo, quando o desembargador, que foi indicado pelo quinto constitucional – e precisamos debater essa questão agora aqui – para compor a Justiça Federal da 4ª Região, em Porto Alegre.

    Menos mal que nós acordamos com a certeza de que a justiça está sendo feita e que os homens da Justiça, que comandam a Justiça brasileira, estão ainda tendo a serenidade, a responsabilidade, a ponderação e o equilíbrio para que tenhamos a convicção de que a Justiça é igual para todos – e essa é a única forma.

    Penso que, agora, o Conselho Nacional de Justiça, como ponderou muito bem a União Nacional dos Juízes Federais, tem que fazer o dever de casa e examinar esse caso que aconteceu ontem, à luz das prerrogativas do desembargador em violentar um princípio – não só de hierarquia, mas um princípio de competência –, em relação à instância superior e colegiada.

    Então, é dessa forma que eu deixo esta mensagem aqui, para que nós possamos esperar que o CNJ faça o exame também de forma impessoal, mas julgue todos os aspectos desse gesto que – eu renovo – foi uma ardilosa e inteligente, mas esperta demais, chicana política e institucional, que não deu certo porque foi flagrada na sua inteireza.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/07/2018 - Página 9