Discurso durante a 105ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com o precedente gerado pela decisão do Juiz Sérgio Moro, de negar seguimento à determinação do Desembargador Rogério Favreto com relação à soltura do Ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Preocupação com o precedente gerado pela decisão do Juiz Sérgio Moro, de negar seguimento à determinação do Desembargador Rogério Favreto com relação à soltura do Ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.
Aparteantes
Rudson Leite.
Publicação
Publicação no DSF de 10/07/2018 - Página 27
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • PREOCUPAÇÃO, DECISÃO, AUTORIA, SERGIO MORO, JUIZ FEDERAL, ASSUNTO, DENEGAÇÃO, HABEAS CORPUS, CONCESSÃO, ROGERIO FAVRETO, DESEMBARGADOR, TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL (TRF), QUARTA REGIÃO, PACIENTE, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRITICA, OBJETIVO, IMPEDIMENTO, CANDIDATURA, DISPUTA, CARGO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, internautas que nos seguem pelas redes sociais.

    Obviamente, Sr. Presidente, eu também não poderia fugir ao tema que hoje monopolizou os debates, as manifestações aqui nesta Casa e que diz respeito ao triste episódio de ontem, protagonizado por integrantes do Poder Judiciário do Brasil, por integrantes da própria Polícia Federal e, até que se esclareça a veracidade ou não, até mesmo por integrantes do Poder Executivo.

    O Brasil ficou estarrecido com a instrumentalização, o uso que as elites deste País fazem do Poder Judiciário, de forma política, contra Lula, como foi visto ontem. Um festival de equívocos, de ilegalidades, que devem deixar cada cidadão e cada cidadã brasileiros e brasileiras preocupados, estupefatos, em condição de alerta, porque, se aconteceu a Lula, poderá acontecer a qualquer cidadão brasileiro, Sr. Presidente.

    Nem no período da ditadura militar... Quando um habeas corpus era concedido, nem naquele período havia uma posição daqueles que eram responsáveis por custodiar um preso ou pelo interrogatório de quem quer que fosse, nunca se viu desrespeito a uma decisão judicial que concedesse o habeas corpus. E o habeas corpus, durante a época da ditadura, salvou muitas pessoas de serem mortas, de serem torturadas, de serem vilipendiadas na sua condição de humanidade. E o que aconteceu ontem é um precedente, no meu ponto de vista, extremamente perigoso.

    E eu aqui ouvi alguns Senadores, uma Senadora, que falaram sobre o caso, não discutindo o fato em si da desobediência a uma decisão judicial, mas querendo fazer um questionamento ao próprio desembargador, o primeiro que teve coragem de dar uma decisão justa e favorável ao Presidente Lula.

    Aqui, eu vi as pessoas dizendo: "Ah, ele foi filiado ao PT, ele foi auxiliar de Tarso Genro, foi não sei o quê...". Se o critério é esse, com certeza no Brasil nós não teríamos ministros do Supremo, desembargadores da idoneidade, da competência e do papel de estadista como, por exemplo, o Ministro Nelson Jobim, que não só foi filiado como foi Parlamentar, por muitos anos, do PMDB. E isso nem é impedimento, do ponto de vista legal nem ético, de ele ter tomado tantas posições e de ter tido a posição de respeito por ele conquistada junto ao povo brasileiro; ou o Ministro Gilmar Mendes, por exemplo, que foi da Advocacia-Geral da União no governo de Fernando Henrique Cardoso e foi por ele indicado; ou do Ministro recém-nomeado Alexandre de Moraes, que foi secretário de um governo do PSDB, que era filiado ao PSDB, que foi Ministro do Governo Temer... Ninguém questiona as posições dele por conta disso.

    Então, isso é um argumento pequeno. Tentam levar uma politização, quando são eles que têm politizado o tempo inteiro esse debate sobre os processos de que Lula tem sido vítima.

    Portanto, é de nos deixar absolutamente estupefatos.

    Hoje, por exemplo, o Ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, "insuspeitíssimo", declarou com todas as letras: "Jamais, jamais o juiz de primeira instância poderia se recusar a obedecer uma decisão de um tribunal revisor", porque o juiz plantonista está ali não representando a si próprio, não decidindo por ele próprio, mas representando e decidindo pelo tribunal, já que o tribunal está em recesso. Portanto, jamais um juiz de primeira instância poderia sequer questionar – isso nas palavras de Marco Aurélio Mello. Ele diz que, se questionamento tivesse que acontecer, teria que ser feito pelo Ministério Público. O Ministério Público poderia questionar a decisão, pedir, fazer algum recurso, tentar apressar aquela decisão liminar que precisaria passar por uma turma do TRF, mas jamais um juiz de primeira instância, que foi o responsável pela condenação. Assim fica parecendo que um réu, condenado por um juiz na primeira instância, até o momento em que recorra ao Supremo, se couber, ele está submetido à interferência do juiz de primeira instância, que sai da sua condição de estar em recesso para articular, com outros integrantes do TRF, a cassação da decisão do Juiz Favreto.

    Hoje, por exemplo, o jornalista Kennedy Alencar disse, com todas as letras, que o Juiz Sergio Moro e o Presidente do TRF4, Thompson Flores, agiram de forma parcial, absolutamente parcial. Foi essa a colocação que fez o jornalista respeitado por todos nós; e esse é o sentimento do povo brasileiro. Todos aqueles com quem tivemos contato, inclusive pessoas que não são do PT, que são contra o PT, ficaram alarmados com a possibilidade de que esse precedente se transforme em regra. Imaginem se o Supremo Tribunal Federal tomar uma decisão e nós, aqui do Senado, resolvermos não cumpri-la. Imaginem que caos vai se tornar o Brasil. Ou se um juiz toma uma decisão e o soldado de polícia se recusa a cumpri-la. Não pode, Sr. Presidente. Temos que tratar desse tema com seriedade, porque isso envolve a constitucionalidade, isso envolve o Estado democrático de direito.

    E o Juiz, que emitiu três despachos determinando a liberdade do Presidente Lula, não foi atendido. Até que se criou um falso conflito de competência: aí o Presidente do Tribunal foi e definiu esse conflito de competência em desfavor de quem? De Lula – já se esperava que agisse dessa maneira.

    Fala-se inclusive que o Ministro da Segurança Pública teria sido mobilizado para dar uma contraordem à Polícia Federal: "Não soltem enquanto não houver uma outra posição do TRF4." Era importante que o próprio Ministro viesse a público confirmar ou não se ele foi mobilizado para isso e se ele compactuou com esse desrespeito à posição, à decisão judicial. E quem fala em falso conflito de competência são vários juristas do Brasil inteiro.

    Portanto, Sr. Presidente, esse fato é um demonstrativo da grave crise institucional que nós estamos vivendo no Brasil.

    Nesse ponto, eu concordo plenamente com o Senador Cristovam Buarque quando lembra que o Judiciário, durante muito tempo, gozou de alta credibilidade da população brasileira, de grande respeito por parte da população brasileira; respeito que nós, infelizmente, aqui no Congresso Nacional, há muito tempo não gozamos – e também o Executivo. E, hoje, a imagem que a população tem, detectada por várias e várias pesquisas de opinião, é de que o Poder Judiciário decide pelos poderosos; decide pelos ricos; pode perseguir pessoas por razão de ordem política. Isso, para nós, é muito triste.

    Então, Sr. Presidente, eu quero registrar aqui não só a minha, mas a posição do nosso Partido que vê em todas essas ações um claro objetivo, que é o de impedir, pelos meios institucionais, de forma errada, injusta, equivocada, o direito de o povo brasileiro livremente escolher o novo Presidente da República. Porque, se não houver o impedimento construído por essas forças, pelo mercado, pelos meios de comunicação...

    Ontem era uma coisa absurda: algumas emissoras de televisão, de canal aberto e de canal fechado, a convocarem especialistas – não sei em quê – para estarem emitindo opiniões, tentando formar a opinião pública, para respaldar ou, no mínimo, não se levantar contra aquela decisão que eles queriam que fosse tomada.

    E, agora, o mais interessante é que desembargadores, procuradores e juízes de primeira instância entram de férias, entram em recesso, e, aqui, ali, resolvem, diante de um caso – não diante de todos; diante de um caso –, se manifestar, se intrometer, se colocar e descumprir uma decisão da Justiça. Os desembargadores, também, do TRF4 estavam todos de férias e voltaram de imediato para cassar essa decisão cautelar, essa decisão liminar.

    Enfim, essa posição, isso que nós podemos chamar de um escândalo, porque escandaliza a população brasileira ver juízes em conflito entre si naquilo que a lei é absolutamente clara, esse escândalo é hoje um escândalo internacional.

    Se já ficou claro, se já era claro que há no Brasil uma perseguição política desenvolvida contra o Presidente Lula para impedir que ele seja candidato a Presidente da República em processos onde não há provas, onde o devido processo legal não foi cumprido, onde o Estado de direito vai sendo agredido a cada momento e a cada decisão, imaginem depois dessa decisão e desse teatro de horrores que aconteceu no dia de ontem, lamentavelmente, envolvendo o nosso Poder Judiciário, que, como eu disse, já foi um Poder profundamente respeitado pela população brasileira. Hoje, o que nós vemos são coisas absurdas por erros do próprio Poder Judiciário, ministros do Supremo sendo agredidos, sendo xingados nos aeroportos. Quer dizer, isso não é porque essas pessoas tomam posição "a", "b" ou "c", é porque o Poder Judiciário como instituição tem permitido que isso aconteça, a começar com essa ideia, que eu acho que em vários países do mundo é uma ideia inaceitável. Nos Estados Unidos, ninguém filma julgamento, nem julgamento em primeira instância, nem tribunal de júri. As sessões da Suprema Corte americana são praticamente todas secretas, para impedir que o Poder Judiciário seja influenciado pela opinião pública, pelo clamor popular e a partir daí é que nós vemos hoje juízes e ministros serem importunados, sofrerem verdadeiros bullyings porque tomaram a posição "a", "b", "c" ou "d" e, na grande maioria das vezes, decisões corretas.

    Então, é necessário que se faça uma reflexão, que o próprio Poder Judiciário faça uma reflexão sobre esse momento que está vivendo. Por exemplo, Sr. Presidente – e aqui não quero fazer nenhuma crítica a quem quer que seja –, mas por que permanece esta situação: uma parte do Supremo dá habeas corpus, arquiva processos quando entende que isso é correto, vários ministros não aceitam a ideia de que a prisão deva ser cumprida quando a condenação se dá em segunda instância – é uma visão, é uma concepção, é a minha também – e, do outro lado, outros ministros entendem que a prisão em segunda instância, com decisão e condenação em segunda instância, deve-se aplicar. Como pode? Metade pensa assim, metade pensa do outro jeito, e o Supremo não para para discutir a ação de constitucionalidade que trata do impedimento da prisão em segunda instância. Se essa decisão tivesse sido tomada já, se a Presidência do Supremo Tribunal Federal já tivesse colocado para votar essa matéria – e que o resultado fosse para um lado ou para o outro –, esse tema estaria pacificado, esse episódio de ontem não teria acontecido, Sr. Presidente.

    Portanto, quero aqui lamentar, lamentar porque, à medida que o tempo vai passando, ao invés de nós sermos desmentidos naquilo que nós afirmamos o tempo inteiro, desde o golpe de 2016, perpetrado por este Congresso Nacional contra a Presidenta Dilma, ao invés de nós sermos desmentidos, ao contrário, a cada dia que passa, nossos argumentos se comprovam pela prática.

    Nós hoje temos a clareza absoluta e total de que Lula é, de fato, um preso político, de que o objetivo da sua condenação e da sua prisão é impedir que ele volte a ser Presidente da República para resgatar programas, ações, políticas que melhoraram a vida do povo brasileiro e que fizeram o povo brasileiro ter orgulho de ser brasileiro, de ter a sua autoestima elevada. Hoje, nós voltamos a ser verdadeiras...

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – ...verdadeiras pessoas que só fazem se lamentar pela imagem que o Brasil tem para nós e para o mundo lá fora.

    Sr. Presidente, isso não vai mudar a nossa estratégia – nós continuamos com Lula candidato. O fato de ter acontecido isso ontem é mais uma demonstração de que é o candidato que o povo brasileiro quer, de que é o candidato que é temido pelas multinacionais, pelas petroleiras, pelo setor financeiro, por esses todos que só querem massacrar o povo brasileiro para usufruírem cada vez mais lucros.

    Concedo, com satisfação, o aparte.

    O Sr. Rudson Leite (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PV - RR) – Senador Humberto, sexta-feira fui à formatura de vários alunos do curso de Direito, pois um sobrinho meu formou-se, o Vítor. E ontem eles fizeram uma festa. O que mais eles discutiam... O aluno, quando sai da faculdade, sai meio perdido. E agora, né? Os alunos de Direito saíram e o agora é essa situação que foi criada neste último final de semana: um desembargador solta; um juiz diz que não solta; o outro desembargador vem e diz que solta e ficou essa confusão. Professores escreveram em suas páginas: "O que vou dizer a meus alunos? Como é que vou interpretar isso?" Então, independente da questão do Presidente Lula, se ele vai ser Presidente ou não, essa questão jurídica, essa insegurança, nos preocupa muito, tem de nos preocupar. Esse recado que ele está nos dando, que o Judiciário está nos dando, está nos dizendo o seguinte: é preciso fazer alguma coisa. Nós precisamos refletir sobre toda essa situação, sobre esses posicionamentos contraditórios de juízes de uma mesma corte. Então, a gente precisa que a Justiça, que a Corte Suprema, tome alguma providência. O Supremo Tribunal Federal tem de dizer alguma coisa. O que vale? Qual é a orientação geral? Porque, se um juiz tomar uma decisão de um jeito, o juiz inferior não obedecer, daí a pouco o policial não obedecer, vai ficar uma confusão que não faz bem para a nossa Nação. Obrigado.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Sem dúvida, eu não somente incorporo integralmente o aparte de V. Exª como me manifesto aqui em total acordo com as preocupações que V. Exª manifesta na sua fala.

    Portanto, Sr. Presidente, para concluir aqui e dar a vez aos nossos companheiros e companheiras, o que nós temos a dizer ao Brasil é que nós vamos continuar defendendo a candidatura de Lula. Sabemos que Lula, apesar desse ódio que alguns lhe devotam – e que é difícil até compreender o porquê, porque muitos foram fortemente beneficiados nos governos de Lula, pelo crescimento do País, pelo fortalecimento da nossa economia, por mais gente consumindo produtos no nosso País –, mas, apesar desse ódio, o povo brasileiro sabe...

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – ... muito bem o que quer.

    Imagine o que é ser alguém que está preso há 90 dias praticamente, condenado em duas instâncias, e continuando a liderar as pesquisas de opinião. O que o povo está dizendo, Sr. Presidente, é o seguinte: por mais que as elites deste País não queiram que o povo vote em Lula e traga de volta tudo o que Lula fez, o povo vai votar, e aí vai ser em Lula, e, se eles impedirem Lula, com certeza quem Lula indicar vai ter o voto da esmagadora maioria do povo brasileiro.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/07/2018 - Página 27