Discurso durante a 109ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexões sobre a necessidade de educação das mulheres brasileiras ante a recente visita ao Brasil da ativista paquistanesa e prêmio Nobel, Malala Yousafzai.

Preocupação com a situação de violência nas escolas do Estado do Tocantins.

Autor
Kátia Abreu (PDT - Partido Democrático Trabalhista/TO)
Nome completo: Kátia Regina de Abreu
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO:
  • Reflexões sobre a necessidade de educação das mulheres brasileiras ante a recente visita ao Brasil da ativista paquistanesa e prêmio Nobel, Malala Yousafzai.
SEGURANÇA PUBLICA:
  • Preocupação com a situação de violência nas escolas do Estado do Tocantins.
Aparteantes
Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DSF de 13/07/2018 - Página 31
Assuntos
Outros > EDUCAÇÃO
Outros > SEGURANÇA PUBLICA
Indexação
  • COMENTARIO, PRESENÇA, PREMIO NOBEL, PAZ, ORIGEM, PAIS, ESTRANGEIRO, PAQUISTÃO, VITIMA, PERSEGUIÇÃO, RELIGIÃO, ATUAÇÃO, LUTA, DIREITO, EDUCAÇÃO, MULHER.
  • APREENSÃO, MOTIVO, SITUAÇÃO, VIOLENCIA, LOCAL, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, ESTADO DO TOCANTINS (TO), AUTORIA, ESTUDANTE, ADOLESCENTE, VITIMA, PROFESSOR.

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Obrigada, Sr. Presidente.

    Bom dia aos telespectadores da TV Senado, que nos ouvem por todo o País, aos meus colegas Senadores Benedito Lira e Requião e ao nosso Presidente da Mesa.

    Muito obrigada pela cessão da palavra.

    Nesta semana, o Brasil recebe, pela primeira vez, a visita de uma figura ilustre, um símbolo ilustre para todo o mundo, que é uma das maiores vozes da atualidade pelo direito das mulheres à educação. E isso para mim é fundamental.

    Nunca tive e nunca trabalhei com bandeiras feministas, não se trata disso. Mas nós temos que reconhecer e defender todos aqueles que estão em desvantagem, não interessa o gênero – todos que se sintam em desvantagem. É obrigação de qualquer Parlamentar lutar por aquilo que acredita.

    Trata-se da jovem paquistanesa Malala, a pessoa mais jovem a receber o Prêmio Nobel da Paz, quando tinha apenas 17 anos, Senador Benedito de Lira. Essa menina, desde os 11 anos, morando num país de regime talibã, totalmente machista... Não é nem machista, a mulher para eles não existe, a não ser para procriar. E ela, desde os 11, registrava, num pequeno blogue, o seu protesto contra o impedimento de meninas estudarem no seu país, o Paquistão.

    Ela tinha outras amigas que falavam que também pensavam igual a ela, mas os pais não deixavam fazer nenhum tipo de manifestação. E os pais de Malala, ao contrário, permitiam que ela escrevesse, no seu pequeno blogue, a respeito do seu protesto contra a ausência de educação para as mulheres – a proibição, não é nem a ausência. E quando ela tinha 15 anos, os talibãs a seguiram e a procuraram dentro de um ônibus, junto com as amigas, e deram um tiro na cabeça dela, ferindo, inclusive, duas outras amigas. Ela esteve na UTI por muito tempo, mas, graças a Deus, ela sobreviveu e tornou-se um símbolo importante para todos nós, um símbolo da luta pela educação para as mulheres.

    Há uma frase muito bonita dela que eu gostaria aqui de ler: "Eles acharam que as balas nos silenciariam, mas falharam e do silêncio surgiram milhares de vozes", diz a ativista. Disse também: "A minha melhor vingança será educar a todos, inclusive as filhas e irmãs daqueles que me atacaram."

    Então, ela, desde o Prêmio Nobel, roda o mundo todo. Ela montou uma fundação que tem alguns milhões de dólares conseguidos por doações para lutar pela educação das mulheres. Aqui no Brasil, no momento em que ela está aqui, ela está adotando – vamos assim dizer – três meninas brasileiras com esse fundo: uma é de Pernambuco, a outra é da Bahia e uma é de São Paulo. A da Bahia, inclusive, é uma menina indígena. Então, são símbolos, não é quantidade que Malala está procurando, mas é a simbologia do gesto para que outras pessoas... Uma menina da Malásia vem ao Brasil, onde há 1,5 milhão de mulheres, de meninas sem escola, e, quando ela patrocina e apoia três dessas meninas de todo o Brasil, de certa forma, dá uma sacudida em todos nós, no Governo Federal, na Justiça, no Congresso Nacional, com o seu exemplo.

    Segundo a Unesco – por isso, essa luta dela por todo o mundo –, quase 16 milhões de meninas entre seis e onze anos nunca irão à escola. O número é duas vezes maior do que o de meninos: 8 milhões de meninos na mesma idade não irão à escola. Mas meninas são 16 milhões que nunca irão à escola.

    Nesta semana, ela completa 21 anos, nessa visita. Tudo começou aos 15 anos, com o atentado, e hoje ela está com 21 anos rodando todo o mundo, um símbolo duradouro e sustentável, um símbolo verdadeiro que não se desfez ao longo do tempo, porque a sua bandeira é justa e genuína. Ela colocou em risco a sua própria vida, uma menina daquela idade.

    E, às vezes, eu fico me lembrando de mim com essa idade da Malala, se eu me interessava tanto assim pelos estudos. Quantas meninas que podem estudar pelo Brasil afora e pelo mundo afora, às vezes, são displicentes com a escola, com o estudo, com essa importância – como eu própria nessa idade? E essa menina, desde os 11, era uma criança que já tinha paixão pela escola, pela educação e se interessava por tudo, era uma menina extremamente curiosa.

    Então, eu quero dizer que desse 1,5 milhão de meninas no Brasil, essas três foram escolhidas, porque também são ativistas no Brasil, são ativistas da mesma bandeira. E o objetivo dela, principalmente – apesar de ser branca –, e do fundo é tratar especialmente as meninas afrodescendentes. E, aqui no Brasil, ela está dando uma atenção especial.

    Mais frases de Malala: "Não existe educação sem segurança", porque depois ela tinha que ir à aula com guardas. "Entendi que educação era mais do que ler e escrever, era sobre empoderamento e emancipação."

    Quando se fala em empoderamento da mulher, muitos homens têm um pouco de implicância porque a palavra empoderamento pode não ser, talvez, muito bem-vinda e muito bem-vista porque trata-se de poder, de ser maior do que os homens. Às vezes, pode levar a uma determinada competição. Mas não se trata disso.

    Quando se fala de empoderamento, é espaço. Muito mais do que espaço, é emancipação. Então, quando você não é emancipado, você não tem poder nenhum. Não significa o poder de mandar no outro, de ser autoridade sobre o outro, mas principalmente de ser autoridade sobre si, sobre si mesmo, de se empoderar, de ter confiança própria. E, sem a educação, ninguém tem confiança. Muito raramente isso pode acontecer.

    Então, ela diz que precisamos sempre lembrar nossos políticos de que a responsabilidade é deles, que eles precisam ouvir as pessoas para saber o que pode ser feito no país, para eles saberem – para nós, políticos, sabermos – o que as pessoas de verdade querem e anseiam.

    E eu aproveito, falando de violência, para aqui falar alguns números a respeito da violência nas escolas. Nós estamos com um número muito elevado de violência nas escolas, muito além do que está sendo mapeado porque as estatísticas são novas. O Tocantins, por exemplo, já é o sétimo Estado do País, entre 27 Estados, com índice de violência nas escolas, o professor que recebeu algum tipo de violência por parte dos alunos.

    Então, é o oposto da Malala. Ela recebeu violência porque ela queria ir à escola. No caso aqui no Brasil, as crianças são obrigadas a irem para a escola – é uma meta brasileira e muito correta. Agora, quando chegam à escola, estão praticando violência contra os seus próprios professores.

    Nós tivemos uma eleição suplementar no Tocantins e eu fui candidata e rodei todo o Estado, dialogando, conversando com todos os segmentos. Eu vi infinidades, centenas de professores e professoras do meu Estado desesperadas, angustiadas, depressivas, com problema de pânico, justamente pela violência, especialmente dos adolescentes na sala de aula. E ninguém pode dizer nada, ninguém pode dar suspensão, ninguém pode dar advertência porque o Estatuto ECA não permite.

    O ECA tem um valor especial para a criança e o adolescente, agora ele não pode ser usado para o mal. Ele não pode ser usado para ser uma autorização de agressividade e de desrespeito ao professor. O número, Senador Requião, de professores hoje afastados fazendo terapia, sofrendo de pânico e depressão não é brincadeira. Nós temos que tomar providências.

    E aqui, como mãe e avó, eu quero dizer que muitas famílias estão entregando para as escolas uma responsabilidade que é sua. Professor não é pai e mãe, não. Professor é educador, tem que ensinar Português, Matemática, História, Geografia. Quem ensina princípios é a família. E ninguém vai abrir mão disso. Não tem Estatuto da Criança e do Adolescente que permite que isso aconteça.

    Então, além de ganhar mal, além de ter trabalho precário, ainda vai receber abuso de menino mal-educado, de menino agressivo, de menino que não recebe a educação adequada? Então, não se trata só de educação propriamente dita. Não se trata apenas disso, mas o desemprego muito elevado, os pais também em conflitos, as famílias se debulhando. Porque, quando falta o dinheiro da luz, do gás e da comida, desestrutura a família toda. O desemprego é um dos causadores disso tudo, inclusive da violência.

    Então, os pais e as famílias estão desarticulados e desestruturados e não conseguem mais segurar os seus filhos, não conseguem mais dar o sentido de família para que eles continuem. Por que antigamente as crianças... no meu tempo de criança e adolescente, nós tínhamos um respeito impressionante pelos professores. A minha alegria era ir à escola e levar um presente para minha professora. O que está acontecendo com o País? A Malala pede segurança para ir à escola, os nossos alunos vão à escola e querem agredir os nossos professores. Não têm direito de suspensão, não têm direito de nenhuma punição, porque justamente apelam pelo Estatuto. Crianças e jovens nem lá queriam estar.

    Agora, voltando ainda ao número das mulheres, o Brasil tem uma estatística, Senador Requião e meu Presidente Benedito de Lira, muito impressionante. Dos jovens, entre 15 e 17 anos, no Tocantins – vou falar o número de Tocantins, mas no Brasil é semelhante –, 8% dos meninos de 15 a 17 não estuda e nem trabalha. Agora, das meninas, 12%. No Tocantins, 8% dos homens e 12% das meninas, mocinhas.

    Vamos mais além: entre 18 a 24 anos, 18% de meninos, rapazes, no Tocantins, não estuda e nem trabalha. Sabem quantas meninas? 36% de meninas, entre 18 a 24 anos, não estuda e nem trabalha.

    Então, quando se fala que não estuda e nem trabalha, não é obrigatoriedade das duas coisas, mas de estudar, sim. Não estuda porque trabalha. Não, nesse caso nem trabalha e nem estuda.

    Assim, entre 25 a 29 anos – podem procurar nos Estados de V. Exªs e verão que não é diferente –, rapazes e moças maiores, 15% dos meninos, em Tocantins, não estuda e nem trabalha; as meninas a mesma coisa, 36%.

    Para um Estado de 1,5 milhão de habitantes, quase 100 mil rapazes e moças, no Tocantins, entre 15 e 29 anos, não estuda e não trabalham; 100 mil pessoas desalentadas, jovens, com uma energia enorme dentro de si, no coração, com vontade de fazer, com vontade de crescer, com vontade de ser alguém na vida e estão com o seu futuro jogado fora, porque quem não estuda está desistindo de sua própria vida, de seus estudos.

    Então, eu peço e conclamo que possamos olhar para essas pessoas. Não são só as crianças. As crianças precisam estar na escola – isso está quase universalizado no País, menos entre aquelas de zero a três anos, que está um horror –, mas nós precisamos de um esforço concentrado, porque a equação é mundial, que ninguém discute mais, Presidente: quanto menos estudo, mais pobreza; quanto mais estudo, menos pobreza. Aliás, os recursos da pobreza e da educação deveriam ser juntos, porque não há como combater pobreza se não der escolaridade, se não der aprendizado. Não é uma frase feita. Se você pegar os brasileiros, que são 24,4% que estão abaixo da pobreza, pegar aqueles que estão na extrema pobreza – em Tocantins são 55% que estão abaixo da linha da pobreza, segundo o Banco Mundial, e 22% destes estão na extrema pobreza –, são 200 mil famílias passando fome, literalmente. Se pegar o currículo de cada uma delas e fizer uma pesquisa, pode ter certeza que a maioria não tem o ensino fundamental primeira fase, muitos analfabetos. Então, é constatado em estatística, não é só uma frase feita para poder ganhar eleição – eu nem candidata sou em outubro. Então, nós estamos com as mulheres com bastantes dificuldades. Há um agravante: a gravidez na adolescência. Em 2015, que é o último dado que temos no Brasil e no Tocantins, quase 6 mil meninas de dez a dezenove anos engravidaram. Então, esse é o primeiro motivo delas largarem a escola.

    Eu gostaria de deixar uma sugestão para os candidatos a governador – eu fiz essa proposta na suplementar: que aqueles que possam se eleger se comprometam em fazer a sala de aula creche. Nas escolas onde há adolescentes que não vão à aula porque têm um bebê e não têm quem cuidar, o que custa esvaziar uma sala e transformá-la numa pequena creche, simples, otimizada, pagar uma pessoa para fazer isso, um primeiro emprego, um estágio de universidade? É uma opção. Não é a bala de prata, é uma opção. Então, se a gente não tiver vontade verdadeira, impulso verdadeiro e profundo para combater a desigualdade através da educação, isso não vai acontecer.

    O que nós vamos fazer com os jovens, meninos e meninas, que estão abandonando o ensino médio em 50%? Cinquenta por cento dos jovens do ensino médio estão abandonando a escola, principalmente no primeiro ano; no segundo, mais ou menos; no terceiro, estabiliza, são aqueles que querem ficar e estudar por algum dos motivos. A maioria quer trabalhar, mas não vê nenhum alento e nenhuma motivação para ir à escola. Não existem laboratórios, principalmente de informática, não existe um laboratório de Biologia, não existe um laboratório de Química. "Ah, mas um laboratório desse para todo o País!" São kits de laboratório que custam R$350, R$400 e que, comprados em grande quantidade, são muito mais baratos. Nós não precisamos ter os laboratórios de informática, uma sala para todo mundo; faz os carrinhos de informática, que vai levando nas salas de aula – já estão à venda em todo o mercado. As creches para as meninas.

    Por que não premiar todos os jovens que terminarem o ensino médio com a carteira de habilitação para aqueles que não podem pagar? A carteira de trabalho não é de graça para todos, inclusive para os ricos? E por que a carteira de habilitação não pode ser gratuita para os pobres? Sabe quanto custa uma carteira de motorista no meu Estado, Senador? R$2,9 mil. O senhor acha que essa turma que está na extrema pobreza vai tirar uma carteira de motorista algum dia na vida? Jamais, porque não tem dinheiro nem para comer, e a carteira de motorista, se ele souber dirigir, é um direito. É um dever do Estado habilitá-lo, se ele estiver em condições. Isso não é máquina de ganhar dinheiro. Carteira de motorista não é para ganhar dinheiro. O Estado tem a obrigação. Transformaram os DETRANs do Brasil em secretarias da Fazenda. Arrecadação total. Taxas e mais taxas. No Tocantins, é um absurdo, é um horror! Então, por que não? O Cadastro Único está aí, o CadÚnico. A gente sabe quem é pobre, a gente sabe quem é extremamente pobre. Carteira de habilitação tem que ser um direito. Eu vou protocolar um projeto de lei, estou preparando para protocolá-lo na Casa, para que nós possamos debater esse assunto da maior importância. Mas por que você está falando tanto em carteira de motorista? Para os homens, especialmente, a carteira de motorista é tão importante quanto é para as mulheres a casa própria. A carteira de motorista é autoafirmação. A carteira de motorista é mais do que isso, Senador: pode ser o primeiro emprego. Ele pode fazer um bico com sua carteira. Cobrar R$2,9 mil? Que direito o Estado tem de fazer isso, de impedir que um cidadão possa ter seu direito, com 18 anos, de aprender a dirigir e de ter sua carteira de motorista? Isso é uma blasfêmia!

    Então, eu digo que as mulheres estão em bastante desvantagem – desviei um pouco no geral. A gravidez na adolescência é um fato no Brasil. As meninas estão abandonando...

(Soa a campainha.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – Esse número é alto, maior do que o dos homens aqui. São filhos, casamento fora de hora, e a mulher não tem condições de deixar os filhos com ninguém. Por quê? Porque não há creche. Então, uma coisa leva à outra. A família está desagregada porque não há emprego. Gravidez na adolescência, drogas... Quer trabalhar, mas não tem emprego; quando tem, o salário é menor. Quando arruma um emprego, não há creche para deixar os meninos. Como faz? E a escola de tempo integral? Como a mulher vai arrumar um emprego de copeira, de cozinheira num restaurante, se tem que trabalhar o dia todo e a aula dos filhos termina ao meio-dia? Ou se há aula das 13h às 18h? Vai deixá-los pela manhã com quem? Ser pobre neste País não é fácil, não, gente; é muito duro ser pobre aqui. Há países no mundo em que as pessoas com renda mais baixa são mais bem tratadas.

    E ainda essas mulheres pobres, sem escola, muitas grávidas na adolescência, quando arrumam emprego, ainda podem trabalhar em local insalubre, porque a reforma trabalhista aprovada aqui, votada inclusive por mulheres, permite que o patrão possa colocar grávidas em trabalho insalubre. Quando Ciro Gomes disse isso lá na CNI, foi criticado. Eu quero saber quem é que tem coragem de criticar isso em público? Ele foi vaiado por isso ao criticar que moças, mulheres grávidas podem trabalhar em lugar insalubre. Ponham sua filha lá, vocês que votaram; coloquem a sua filha grávida em lugar insalubre, dentro de uma câmara frigorífica com não sei quantos graus abaixo de zero, trabalhando no frigorífico. Ponham sua filha grávida lá dentro. A filha dos outros pode, a filha do pobre pode; agora, a sua, a de quem votou, nunca vai chegar lá dentro.

    Michel Temer fez um compromisso de mandar uma MP corrigindo as distorções, as aberrações e as excrescências. Nós estamos esperando aqui até hoje. Eu nunca vi essa MP. Todo mundo votou com este compromisso...

(Soa a campainha.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – ... de que o Líder Jucá é um homem que tem palavra. Por isso, ele é o Líder de todos os governos até aqui. Cadê a palavra, Senador Jucá? Cadê a MP que o senhor prometeu aqui, no dia de votar a reforma trabalhista – o senhor que é candidato lá em Roraima? Cadê a MP que o senhor ia trazer do Governo? Empenhou sua palavra para tirar oito pontos imorais da reforma trabalhista. Há muita coisa boa nela, muita coisa moderna, mas há barbaridades que precisam ser corrigidas, especialmente contra as mulheres.

    Quero lembrar ainda que a Meta nº 1 do Plano Nacional de Educação não tem sequer custo, viu, Senador Requião? Se perguntar quanto vai se gastar para poder fazer as creches e cumprir a meta para a gente colocar no Orçamento de forma responsável – estou discutindo isso agora na Comissão de Educação –, ninguém sabe. Então, a Meta 1 é: 50% das crianças de zero a três, até 2024, têm que estar nas creches. Já pensou? Imagine! No meu Estado, há 74 creches abandonadas, que não foram terminadas, e assim é no Brasil inteiro: há centenas, milhares de creches abandonadas perdendo a obra, e a meta... Cadê a meta? É a Meta 1 do Plano Nacional de Educação!

(Soa a campainha.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – E as mães que se danem, porque não têm como trabalhar, não têm onde deixar seus filhos. Gravidez e filho viraram um peso, porque elas têm que trabalhar e comer e não têm como deixar as crianças.

    Então, a creche é uma das maiores emancipações que uma mulher pode ter – é ela ter sossego, tranquilidade, para deixar o seu filho bem cuidado e poder ir à luta pela sua família. A creche é o primeiro ponto. Aí, sim, ela precisa estudar e trabalhar.

    Quero ainda terminar minhas palavras falando de um programa que saiu agora. Ele é o top 10 do ridículo. Eu li na coluna de Marcelo Garcia, que é um especialista em assistência social, foi ministro, secretário do Rio de Janeiro muitos anos, Presidente do Conselho Nacional de Assistência Social, um especialista, sobre o cofrinho da família.

    O Ministério do Desenvolvimento Social, agora, está fazendo as oficinas do cofrinho, pegando mulheres pobres do Minha Casa, Minha Vida, fazendo oficina, montando um cofrinho, para elas aprenderem a poupar, Senador Requião, porque elas estão muito gastadeiras. Elas estão gastando demais – as mulheres do morro, da favela, do interior, que moram nas roças, que moram nos assentamentos, nos povoados...

(Soa a campainha.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – O Ministério do Desenvolvimento Social acha que vocês estão gastando muito.

    E as coitadas que moram nas favelas, que têm que bancar traficante, para poder ter sossego e ficar dentro da sua casa? Uma mulher que paga R$95 pelo gás. No Tocantins e em Brasília, o gás está R$95. A energia subiu 14% no Brasil todo, em média. A alimentação, disparado – o preço de alimento.

    Olha, gente, fora de brincadeira: mandar uma mulher dessa poupar, Senador Requião, é deboche. É deboche. E essas mulheres ainda ficam se sentindo culpadas: "Meu Deus, será que eu não poupo? Será que eu estou sendo irresponsável? Será que eu tenho que poupar?" Quer dizer, é tratar pobre como se fosse criança. Isso é um instrumento de infantilizar pobre: mexer com caixinha e fazer cofrinho.

    Faça-me o favor. Se não tem o que fazer, não atrapalha o que já foi construído até aqui, em 20 anos. Não é de governo Dilma ou de Lula não. É desde Fernando Henrique.

    A proteção social no Brasil vem em franco desenvolvimento, e foi destruída nesses dois anos, porque, para construir, precisa de 20; para destruir, não precisa mais que um mês, seis meses. Em dois anos, acaba com tudo.

    Este Governo acabou, destruiu com 20 anos de política de proteção social no País. Destruiu. E agora vem me trazer cofrinho.

    O próximo governo vai ter muito trabalho para recomeçar o Brasil e rever, imediatamente, essa humilhação do cofrinho da família. Sr. Ministro e Presidente da República, vão ensinar outras pessoas da sua família a fazer cofrinho, as pessoas ricas, apoderadas, que têm contas recheadas...

(Soa a campainha.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – ... dinheiro em malas, dinheiro em apartamentos. Agora, ensinar pobre a poupar... Faça-me o favor: isso é desumano.

    Então, em favor da educação, quero me aliar a Malala. Ela nem precisa me conhecer, e eu não preciso conhecê-la pessoalmente, para levantar esta bandeira: educação para as mulheres, para a sua emancipação, para a sua independência, por uma questão de justiça e nada mais.

    Senador Requião, gostaria de fazer um aparte?

    O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/MDB - PR) – Um aparte, Senadora, não dirigido exclusivamente para V. Exª. É um aparte que eu gostaria que fosse ouvido pela população do Tocantins. Quando cheguei ao Senado, acreditava-se que a minha oposição ao que eu pensava sobre economia, aos princípios que eu defendia, teriam como antagonista V. Exª. Realmente, nós tínhamos e temos algumas divergências, mas, a cada dia que V. Exª ocupa a tribuna, que fala nas comissões, eu vejo muito mais identidade entre as nossas formas de pensar e de atuar do que divergências. Eu acredito, Senadora, como acreditam...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/MDB - PR) – ... a nossa Igreja Católica e o Papa Francisco, que nós temos uma grande oposição, hoje, à barbárie do capital, ao capital financeiro que se opõe ao trabalho e ao capital produtivo, a esse liberalismo econômico, "financeirizado", que se opõe e que, para nós, origina uma recomendação de uma aliança entre o capital produtivo e o trabalho. A exploração do trabalho é um dado fundamental da política que nós vivemos hoje, e a Senadora se insurgiu contra isso, mostrando que é detentora de uma visão fraterna do mundo. A fraternidade é essencial. Nós estamos vendo, com o fim da CLT, com as mulheres trabalhando em locais absolutamente sem...

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – Insalubres.

    O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/MDB - PR) – ... sem condições de sanidade, de salubridade, votada pelo Plenário do Senado, pela Câmara, nós estamos vendo uma volta à barbárie. A orientação da Ponte para o Futuro do atual Governo brasileiro é de exploração do trabalho, mas de ausência absoluta da fraternidade. As pessoas que estão fora do mercado de trabalho são tratadas como lixo. Não existem mais políticas compensatórias; é exploração absoluta. E a Senadora Kátia Abreu tem-se insurgido contra isso. Eu diria à população do Tocantins, aos nossos eleitores...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/MDB - PR) – ... que a sua sensibilidade e a visão fraterna que tem da sociedade e do mundo são hoje indispensáveis no Senado da República. Temos algumas divergências quanto à orientação global da economia. Eu me suporto mais nas ideias do Keynes, eu sou um nacionalista, vamos dizer, populista, porque, para mim, o populismo é exatamente a obediência às necessidades e exigências do povo, e o resto é submissão ao mercado. A Senadora Kátia Abreu não se submeteu ao mercado. Tem tomado, com coragem, posições, que podem originar críticas pela direita econômica, mas que são fundamentais e indispensáveis para fazerem o Senado e o Congresso Nacional pensarem um pouco mais sobre o que está acontecendo no mundo, as migrações que são rejeitadas pelos países, a marginalização completa das populações que não estão integradas no mercado de trabalho. Suas atitudes têm significado, na minha leitura, sensibilidade e fraternidade.

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – Obrigada, Senador.

    O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/MDB - PR) – E eu diria que, apesar de algumas divergências que certamente mantemos até hoje, eu, se fosse eleitor no Tocantins, não perderia a oportunidade de trazê-la de volta ao Senado da República, Senadora. Era o que queria deixar registrado...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/MDB - PR) – ... nesta quinta-feira em que estamos aqui, numa solidão incrível, no Senado da República, com alguns Senadores que estão preocupados em dirigir a sua palavra através da nossa TV e da nossa Rádio ao Brasil. Parabéns, Senadora. Teria, sem sombra de dúvida, o meu voto nas próximas eleições ao Senado, no Tocantins. E é o que eu recomendaria às pessoas que pensam como eu penso. A visão fraterna e a solidariedade são essenciais para a política do Brasil e do mundo, e estas não lhe faltam, Senadora.

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – Muito obrigada, Senador Requião. Suas palavras me emocionam, de verdade, porque eu tenho muito orgulho do senhor. Eu acho o senhor um dos Senadores mais preparados desta Casa, experiente, como governador do Paraná, Senador da República, uma pessoa extraordinária. E confesso que, no passado, tinha muito preconceito contra o senhor. Era aquela coisa de ouvir dizer, aquela coisa de ouvir falar. E a gente se deixa levar, às vezes, por impressões de terceiros e comete grandes injustiças. E eu já lhe disso isto pessoalmente, que não fiz injustiça física ou verbal contra o senhor. Mas, no pensamento, na alma, eu tinha preconceito contra as suas ideias. E, depois que eu o conheci, isso acabou totalmente. E eu lhe pedi até desculpas, embora o senhor nem soubesse disso, por essa injustiça. O senhor é um homem preparado...

(Soa a campainha.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – ... um homem que administrou o Paraná e, por isso, está nos primeiros lugares nas pesquisas lá, mas, graças a Deus, vai voltar para o Senado, porque acho que aqui o senhor é muito importante. Então, a sua opinião para mim é superimportante. Para mim, o senhor traduziu exatamente o que eu penso, o que eu sinto.

    Quando passei pela CNA, algum tempo atrás, e foi uma experiência maravilhosa para mim, porque pude desempenhar um trabalho muito grande naquela casa, de ativismo, de protagonismo, de humanismo, no sentido de tentar mudar um pouco as visões a respeito das invasões, da fragilidade daqueles que querem terra. Não se trata de defender invasões, mas de defender apenas o desejo de quem quer ter terra. Se a gente compreender esse desejo, evitará invasões, inclusive.

(Soa a campainha.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – A compreensão evita a invasão. Agora, se você, de forma truculenta, apenas se colocar contra, vai criar o constrangimento e vai criar o conflito. Então, foram exatamente esses pensamentos que eu tentei levar, à época, para a CNA.

    Fizemos um trabalho com as escolas esquecidas da zona rural, escolas paupérrimas, que não podem nem ser chamadas de escolas. Fizemos uma pesquisa junto com a Fundação Montenegro, do Ibope, que participou gratuitamente dessa pesquisa. Criamos o programa "O campo na classe média", porque a pobreza no campo é enorme. Eu já discuti isso na CNA, há quase oito anos, ou seja, que essa pobreza no campo é inadmissível. Nós temos uma concentração muito alta, de 6 a 8% de produtores considerados grandes, em renda, e não em tamanho de terras. Nós temos quase que 75% de produtores que estão pobres...

(Interrupção do som.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – ... nas classes D e E, e apenas 12% na classe média rural, ao contrário das cidades, em que 50% estão na classe média. Discutimos isso com profundidade.

    Depois, quando me tornei Ministra da Presidente Dilma, eu apresentei esse projeto para ela. Nós iriamos apresentá-lo em todo o campo brasileiro, em todos os Estados, mas, infelizmente, não houve tempo e não foi possível.

    Então, eu sempre digo e fiz uma entrevista à revista Veja, logo depois do impeachment, nas páginas amarelas, e disse que eu não mudei de lado, eu sou a mesma pessoa. Eu acredito no trabalho, eu acredito no mercado, eu acredito no mercado internacional, no emprego... Mas ele não resolve tudo. Achar que o mercado é solução mágica para tudo.... Ele não é. A médio e longo prazo, poderá ser, mas, no curto prazo, o mercado que tanto critica...

(Soa a campainha.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – ... o Bolsa Família, que critica as questões sociais... O que é que eu digo para 200 mil famílias, no Tocantins, que estão na extrema pobreza? Eu sei o que eu vou dizer: "Ó, o mercado disse que é para vocês esperarem, que daqui a pouco o mercado chega aí, para dar-lhes um emprego". Quer dizer, o mercado não tem essa obrigação. Não estou dizendo que tem essa obrigação. Quem tem é o Estado! Então, enquanto o emprego não chega até elas, enquanto o mercado não chega até elas, eu digo o quê? E o remédio? E a comida? E a casa? E a moradia? E os filhos, que estão viciados em drogas? Vão tratar onde? Então, o Estado brasileiro precisa atuar. É assim no mundo inteiro.

    Então, eu não mudei quanto aos meus princípios. Sou contra invasões de terra, sou contra o conflito agrário, sou a favor do direito de propriedade, sou a favor da segurança jurídica, do Estado de direito.

    Agora mesmo houve um discurso aqui, criticando o tal Ministro Favreto. Não ouvi dizer nada sobre o Moro. Não, o Moro não erra; o Moro é um santo! Gente, pelo amor de Deus: nem para o mar, nem para a terra. Então, nós temos que tratar as coisas com seriedade. Estado de direito é uma coisa muito séria. Nem Favreto nem Moro podem descumprir o Estado de direito. Eu concordo com isso. O Ministério Público não pode agredir o Estado de direito.

    Então, nós estamos muito parciais no Brasil. Nós estamos perdendo o princípio geral. O princípio só vale para os meus. Para os contra mim, o princípio é um pouco esquecido.

    Então, se a fraternidade, a sensibilidade e a solidariedade é ser de esquerda, eu quero avisar a todos que eu sou fraterna, sou uma pessoa sensível, sou mãe, sou mulher, avó, sou solidária ao próximo, sou solidária às pessoas mais pobres, mas nem por isso sou de esquerda. Eu também acredito no mercado, acredito na livre iniciativa.

(Soa a campainha.)

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – Mas, se nós não colocarmos o nosso coração a prova... Nós viemos aqui para isso neste mundo. O dinheiro não pode ser a atividade fim; o dinheiro é atividade meio. E nós trocamos os lugares. O dinheiro é instrumento para alegria, felicidade e paz no mundo. Não: nós colocamos o dinheiro como foco, e por isso fazemos guerra, matamos, gente morre de fome, tudo, e nada tem importância. Eu não tenho culpa se há gente que pensa assim. Eu não penso assim. Dinheiro, para mim, não é atividade fim; dinheiro é atividade meio. É instrumento para trazer felicidade. Quando eu digo felicidade, é paz. Só há paz sem pobre e sem fome.

    Muito obrigada, Sr. Presidente, pela paciência. Fico muito contente...

    O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/MDB - PR) – Senadora, V. Exª está repetindo as palavras do Papa Francisco Bergoglio.

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – E eu nem sabia...

    O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/MDB - PR) – O dinheiro é bom, quando ele é investido numa indústria, quando ele produz bens, quando ele dá empregos e garante salário decente e a vida das pessoas e das famílias. Mas ele não pode se colocar duma forma superior à felicidade dos homens. A Bíblia já diz isso, desde as suas primeiras versões: "Não se pode servir a Deus e a mamon." E mamon, em hebraico, não é nem o diabo, nem outro deus; mamon é singelamente dinheiro. E o Papa diz isso: o dinheiro tem que servir à sociedade, e não a sociedade servir ao dinheiro e à acumulação. Eu acho que é aí que as nossas visões de mundo, com algumas pequenas diferenças, porque eu acho que o mercado tem que ter, de certa forma, em determinado momento, a intervenção do Estado... Eu acho que, numa crise econômica, é o Estado que tem que investir, porque o capital não vai investir...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Roberto Requião (Bloco Maioria/MDB - PR) – ... se não houver quem compre o que produz. É o Estado que tem que investir no momento da recessão, como aconteceu na recuperação da Alemanha, dos Estados Unidos, do Japão. Nós nos encontramos na fraternidade e na solidariedade, e isso é indispensável para uma política sã para o País. É a rejeição de toda a barbárie que nós estamos vivendo. Parabéns, Senadora.

    A SRª KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - TO) – Obrigada, Senador Requião. É exatamente isso. Quem não quiser dar importância às pessoas e ao seu sofrimento, que espere a barbárie.

    O Senador Requião disse: submissão ao mercado ou submissão ao povo. Ele está corretíssimo. Se eu sou submissa ao povo, eu sou populista, mas, se eu sou submetida 100% ao mercado, está tudo certo? Então, eu prefiro dizer que eu sou submissa ao povo e respeito e sou parceira do mercado.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/07/2018 - Página 31