Discurso durante a 104ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Leitura de carta do ex-Presidente Lula dirigida à nação, em que alega sua inocência criminal e sua candidatura à Presidência da República.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATIVIDADE POLITICA:
  • Leitura de carta do ex-Presidente Lula dirigida à nação, em que alega sua inocência criminal e sua candidatura à Presidência da República.
Aparteantes
José Medeiros.
Publicação
Publicação no DSF de 05/07/2018 - Página 53
Assunto
Outros > ATIVIDADE POLITICA
Indexação
  • LEITURA, CARTA, AUTORIA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ASSUNTO, DEFESA, DEMOCRACIA, ALEGAÇÕES, INOCENCIA, CRIME, ANUNCIO, CANDIDATURA, DISPUTA, CARGO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Obrigada, Sr. Presidente, Srs. Senadores.

    Eu pedi esse espaço aqui – enquanto nós estamos esperando os Senadores virem fazer a votação, no plenário, da indicação do Itamaraty – para ler a esta Casa e deixar aqui registrado nos Anais a carta que o Presidente Lula nos dirigiu ontem. Não só à direção do Partido, mas a toda Nação brasileira.

    O Sr. José Medeiros (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - MT) – De novo?

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) –

Carta em defesa da democracia.

Meus amigos e minhas amigas, chegou a hora de todos os democratas comprometidos com a defesa do Estado democrático de direito repudiarem as manobras de que estou sendo vítima, de modo que prevaleça a Constituição e não os artifícios daqueles que a desrespeitam por medo das notícias da televisão.

A única coisa que quero é que a força-tarefa da Lava Jato, integrada pela Polícia Federal, pelo Ministério Público, pelo Moro e pelo TRF4, mostre à sociedade uma única prova material [de que cometi algum crime]. Não basta palavra de delator nem convicção de PowerPoint. Se houvesse imparcialidade e seriedade no meu julgamento, o processo não precisaria ter milhares de páginas, pois era só mostrar um documento que provasse que sou o proprietário do tal imóvel no Guarujá.

Com base em uma mentira publicada pelo jornal O Globo, atribuindo-me a propriedade de um apartamento em Guarujá, a Polícia Federal, reproduzindo a mentira, deu início a um inquérito; o Ministério Público, acolhendo a mesma mentira, fez a acusação; e, finalmente, sempre com fundamento na mentira nunca provada, o Juiz Moro me condenou. O TRF4, seguindo o mesmo enredo iniciado com a mentira, confirmou a condenação.

Tudo isso me leva a crer que já não há razões para acreditar que terei justiça, pois o que vejo agora no comportamento público de alguns Ministros da Suprema Corte é a mera reprodução do que se passou na primeira e na segunda instâncias.

Primeiro, o Ministro Fachin retirou da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal o julgamento do habeas corpus que poderia impedir minha prisão e o remeteu para o Plenário. Tal manobra evitou que a Segunda Turma, cujo posicionamento majoritário contra a prisão antes do trânsito em julgado, já era de todos conhecido, concedesse o habeas corpus. Isso ficou demonstrado no julgamento do Plenário, em que quatro dos cinco Ministros da Segunda Turma votaram pela concessão da ordem.

Em seguida, na medida cautelar em que minha defesa postulou o efeito suspensivo ao recurso extraordinário, para me colocar em liberdade, o mesmo Ministro resolveu levar o processo diretamente para a Segunda Turma, tendo o julgamento sido pautado para o dia 26 de junho. A questão posta nesta cautelar nunca foi apreciada pelo Plenário ou pela Turma, pois o que nela se discute é se as razões do meu recurso são capazes de justificar a suspensão dos efeitos do acórdão do TRF4 para que eu responda ao processo em liberdade.

No entanto, ao apagar das luzes da sexta-feira, 22 de junho, poucos minutos depois de ter sido publicada a decisão do TRF4 que negou seguimento ao meu recurso, o que ocorreu às 19h05, como se estivesse armada uma tocaia, a medida cautelar foi dada por prejudicada e o processo, extinto, artifício que, mais uma vez, evitou que o meu caso fosse julgado pelo órgão judicial competente. A decisão foi divulgada às 19h40.

Minha defesa recorreu da decisão do TRF4 e também da decisão...

(Soa a campainha.)

    A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) –

... que extinguiu o processo da cautelar. Contudo, surpreendentemente, mais uma vez, o relator remeteu o julgamento deste recurso diretamente ao Plenário. Com mais esta manobra, foi subtraída, outra vez, a competência natural do órgão a que cabia o julgamento do meu caso. Como ficou demonstrado na sessão do dia 26 de junho, em que minha cautelar seria julgada, a Segunda Turma tem o firme entendimento de que é possível a concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário interposto em situação semelhante à do meu. As manobras atingiram seu objetivo: meu pedido de liberdade não foi julgado.

Cabe perguntar: por que o relator, num primeiro momento, remeteu o julgamento da cautelar diretamente para a Segunda Turma e, logo a seguir, enviou para o Plenário o julgamento do agravo regimental, que pela lei deve ser apreciado pelo mesmo colegiado competente para julgar o recurso?

As decisões monocráticas têm sido usadas para a escolha do colegiado que momentaneamente parece ser mais conveniente, como se houvesse algum compromisso com o resultado do julgamento. São concebidas como estratégia processual e não como instrumento de Justiça. Tal comportamento, além de me privar da garantia do juiz natural, é concebível somente para acusadores e defensores, mas totalmente inapropriado para um magistrado, cuja a função exige imparcialidade e distanciamento da arena política.

Não estou pedindo favor; estou exigindo respeito.

Ao longo da minha vida, e já conto 72 anos, acreditei e preguei que mais cedo ou mais tarde sempre prevalece a justiça para pessoas vítimas da irresponsabilidade de falsas acusações. Com maior razão no meu caso, em que falsas acusações são corroboradas apenas por delatores que confessaram ter roubado, que estão condenados a dezenas de anos de prisão e em desesperada busca do beneplácito das delações, por meio das quais detêm a liberdade, a posse e a conservação de parte do dinheiro roubado. Pessoas que seriam capazes de acusar a própria mãe para obter benefícios.

É dramática e cruel a dúvida entre continuar acreditando que possa haver justiça e a recusa de participar de uma farsa.

Se não querem que eu seja Presidente, a forma mais simples de conseguir é ter a coragem de praticar a democracia e me derrotar nas urnas.

Não cometi nenhum crime. Repito, não cometi nenhum crime. Por isso, até que apresentem pelo menos uma prova material que macule minha inocência, sou candidato à Presidência da República. Desafio meus acusadores a apresentarem essa prova até o dia 15 de agosto deste ano, quando minha candidatura será registrada na Justiça Eleitoral.

Luiz Inácio Lula da Silva.

Curitiba, 3 de julho de 2018.

    Obrigada, Sr. Presidente.

DOCUMENTO ENCAMINHADO PELA SRª SENADORA GLEISI HOFFMANN.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

    Matéria referida:

     – Carta em defesa da democracia.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/07/2018 - Página 53