Discurso durante a 110ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre a importância do combate à violência contra a mulher e manifestação pelo aumento da participação feminina na política.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Reflexão sobre a importância do combate à violência contra a mulher e manifestação pelo aumento da participação feminina na política.
Publicação
Publicação no DSF de 08/08/2018 - Página 53
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, COMBATE, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER, REGISTRO, CRESCIMENTO, SOCIEDADE, PARTICIPAÇÃO, FEMINISMO.

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PSB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu não poderia iniciar a minha fala sem lamentar a decisão pessoal da Senadora Marta Suplicy. Por quê? Porque a presença da Senadora Marta Suplicy no Parlamento brasileiro foi marcada realmente pelas bandeiras que ela aqui falou: a luta pela igualdade social, a luta de combate à discriminação às minorias, a luta em defesa das mulheres brasileiras contra a violência, contra a discriminação à mulher.

    Portanto, Senadora Marta, embora tenhamos posicionamentos políticos diferentes em diversos momentos, eu estou naquela bandeira neste período agora que é nenhuma mulher a menos na política. Nenhuma mulher a menos na política. A clareza desse momento que nós estamos enfrentando de crise no País nos demonstra que o caminho a seguir é trazer mais as mulheres à política.

    E a saída de V. Exª, com todo o legado que trouxe e que traz à nossa luta, é realmente um momento de se lamentar. O que não quer dizer que V. Exª não vá continuar a luta. E é com a certeza de que isso vai acontecer que, vamos dizer assim, eu me conformo, porque, pela sua atuação, pela sua história política, eu tenho convicção de que V. Exª não se afastará da luta em defesa dessas bandeiras, que caracterizaram a sua participação na política institucional brasileira e que serviram de motivação e de conquistas para as mulheres do nosso País.

    Uma delas é a conquista da política de cotas no Brasil – e nós enfrentamos agora um momento tão crucial de maneira tão especial –, que finalmente conquistamos. Talvez sem um acordo ou participação direta do Parlamento brasileiro, os 30% do fundo eleitoral para que as mulheres possam participar da política... Talvez não, com a certeza da contrariedade de todos os partidos políticos e de todas as direções partidárias.

    Até digo que o meu Partido tem uma tolerância maior no seu Presidente, mas isso não corresponde, sem dúvida nenhuma, a uma posição de maioria do nosso Partido. Tenho certeza de que Capi concorda comigo. É claro que os Parlamentares veem com muita expectativa isso tudo, mas, na hora h, na hora de realmente garantir que as mulheres ocupem este espaço e neste momento tenham a possibilidade de ter recursos financeiros para a sua campanha, há sempre uma grande reação – muitas vezes silenciosa, porque é a vergonha. Hoje há o constrangimento de tomar uma posição contra a mulher.

    Esse já é um legado da nossa luta, a luta de tantos anos que nós travamos neste País, para que a mulher tenha o seu espaço na política, para que a mulher brasileira seja considerada uma cidadã de direitos e deveres iguais aos homens na sociedade brasileira. Nós já demos esse legado. É constrangedor aquele político que vota contra a mulher, é constrangedor se pronunciar contra os direitos da mulher, embora, lá no cantinho, saibamos a dificuldade com que cada um deles aceita esse avanço que nós estamos tendo na sociedade brasileira, tão pequeno para as necessidades do desenvolvimento da melhoria da qualidade de vida da mulher em nosso País.

    E é, portanto, também o momento em que eu assumo a tribuna, para registrar, Senadora, a passagem dos 12 anos da Lei Maria da Penha, essa que é a lei – a Lei 11.340, de 7 de agosto de 2006 – mais importante no que diz respeito à luta da mulher contra a violência. É uma lei que foi conquistada, que teve aprovação, sem dúvida, de todos os homens da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, mas que foi, como todas as outras leis que dizem respeito à conquista das mulheres na sociedade brasileira, inspirada e conseguida com o esforço denodado das mulheres Parlamentares. A presença da mulher no Parlamento tornou possível uma Constituição que este ano faz 30 anos, que é uma Constituição que nos dá uma condição de cidadania igualitária, uma lei, como a Lei Maria da Penha, que acaba com aquele velho discurso que todas nós ouvíamos na nossa infância: em briga de marido e mulher, não se mete a colher. E a filosofia que estava por trás disso é justamente a de fortalecimento da cultura do machismo e da cultura da violência.

    Nós chegamos a um ponto em que a sociedade brasileira pode ter essa lei, e, a partir daqui, as novas, as crianças, jovens, meninas que vão chegando à idade adulta terão essa proteção e essa cultura já assegurada na sociedade brasileira. Mas isso quer dizer que acabamos com a violência? Não, quer dizer que nós conseguimos 195 mil ações de proteção à vida da mulher nesse período, de denúncias com garantias para que a mulher tivesse o seu direito assegurado.

    O Instituto Brasileiro de Segurança Pública, Senador Capiberibe, no ano passado, fez uma pesquisa em que 29% das mulheres brasileiras que foram entrevistadas afirmam ter sofrido algum tipo de violência física ou verbal, o que equivale a 16 milhões de mulheres. Com ameaça de apanhar, ou seja, de ser espancada, 5 milhões de mulheres. Aquelas que foram ou espancadas, ou chutadas, ou tomaram soco, ou um empurrão, 4,4 milhões de mulheres brasileiras. Uma pesquisa em 2017.

    E sabemos que o agressor da mulher não é alguém que vai passando na rua, ela vai andando e sofre esse tipo de violência, às vezes num ambiente mais isolado, escuro. Não é como a violência urbana nas grandes cidades ou nas pequenas, hoje, no Brasil. Não. É uma violência doméstica. Ela é marcada pela agressão dos seus companheiros, pela agressão do seu namorado, do ex-namorado, do marido, do ex-marido. E esse traço da vida da sociedade brasileira não podemos mais tolerar. As mulheres brasileiras não podem tolerar, os homens brasileiros não podem tolerar, a sociedade brasileira não pode tolerar como algo normal. E isso se aprofunda quando votamos aqui. E muita gente achava: "Olhe, é uma bobagem a mais desse movimento de mulheres: o feminicídio, a caracterização da penalidade do tipo penal de feminicídio."

    E hoje ligamos as televisões esta semana e, chocadas, assistimos às cenas de violência de um homem forte, grande, atlético espancando a sua mulher a um limite inimaginável. Parecia um filme desses a que assistimos de criação, e não a realidade.

(Soa a campainha.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PSB - BA) – O espancamento, Senador, depois concluído com o corpo daquela mulher no chão. Depois ele carrega o corpo, depois ele limpa o elevador, depois a polícia o prende e ele continua afirmando que ela se suicidou, até que a perícia possa confirmar que ela, antes de estar no chão, já estava morta, asfixiada, sufocada pelas suas próprias mãos. Este é o cotidiano da vida da mulher.

    Aí nós olhamos assim: "Esse crime aconteceu no Paraná", mas abrimos o jornal hoje e, em Brasília, outro "suicídio" – entre aspas – de mulher que vai se colocando com a mesma característica. Os vizinhos ouviram os gritos da briga, da violência. E é possível... E já está sendo procurado o seu marido – que sumiu também – e provavelmente é outra "briga" – entre aspas – na qual a sociedade não deveria "meter a colher" – entre aspas –, como era no passado, em que termina com o feminicídio.

    Não, os 12 anos da Lei Maria da Penha têm que ser um período, um dia de compromisso, Senador Paim – que tanto destaque tem na luta dos direitos humanos no Brasil –, de que não vamos nos calar um dia sequer contra a violência que se abate sobre a maioria da população brasileira, que somos 52% da população. Somos 38% de famílias que são dirigidas por mulheres. E agora, no Censo da Agricultura, passamos a ter já quase um terço das propriedades rurais que são dirigidas por mulheres em dois Estados da Federação, em Pernambuco e na Bahia, que têm características de grande participação da agricultura familiar nas propriedades rurais nesses Estados.

    Então, cresce a cada dia a participação da mulher e a sua importância na economia.

    É inadmissível que a gente possa continuar convivendo com a normalidade dessa cultura machista e cultura da violência contra a mulher. Já assistimos a Parlamentares na Câmara dos Deputados fazerem proselitismo em torno do estupro, da violência contra a mulher. Já assistimos no Parlamento brasileiro a diversos momentos em que essa questão da caracterização da condição feminina foi tratada como desqualificadora da mulher.

(Soa a campainha.)

    A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PSB - BA) – Agora, portanto, termino, meu querido companheiro da luta pelos direitos humanos, Senador Paim, dizendo que, neste período eleitoral, em nome da luta contra a violência sobre a mulher brasileira: nenhuma mulher a menos na política!

    Nós vamos também fazer um levantamento da participação política das mulheres nesta eleição. Que os 30%, tão rejeitados pelos partidos políticos, façam realmente com que mudemos a cultura da participação política na sociedade brasileira.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/08/2018 - Página 53