Discurso durante a 121ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração do dia Internacional de Erradicação da Pobreza, celebrado em 17 de outubro.

Autor
Rose de Freitas (PODE - Podemos/ES)
Nome completo: Rosilda de Freitas
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Comemoração do dia Internacional de Erradicação da Pobreza, celebrado em 17 de outubro.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Hélio José.
Publicação
Publicação no DSF de 17/10/2018 - Página 15
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, ERRADICAÇÃO, POBREZA.

    A SRª ROSE DE FREITAS (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - ES. Pronuncia o seguinte discurso.) – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, eu queria saudar a todos, dizer da importância do funcionamento do Congresso Nacional nesses dias em que ainda se definem as eleições no segundo turno e dizer que a democracia, reafirmada pelo resultado das urnas, que daqui a pouco conheceremos, deve ser a motivação que une todos os brasileiros, para celebrar sempre a liberdade das suas escolhas, em que campo nós estivermos, com as diferenças que nós possamos ter.

    Quero acreditar – e as revistas e os jornais constantemente estão mostrando – que todo esse debate que trava o Brasil, que toda essa contenda de ideias deve levar os brasileiros a algum lugar. Não vamos acreditar que estamos errando, que todos podem errar em conjunto, que alguns podem acertar, e nós não teremos que viver situações de conflito como esta que estamos vivendo neste momento, em que não sabemos ao certo o que que o povo brasileiro vai decidir a respeito de quem vai administrar, nos próximos anos, o Brasil.

    Eu subo a esta tribuna para falar um pouco, e, coincidentemente, refletindo sobre esta situação que nós estamos vivendo, do Dia Internacional de Erradicação da Pobreza.

    De acordo com dados do Banco Mundial, o número de pessoas vivendo em condições de pobreza extrema – isto é, o número de pessoas que sobrevivem com menos de R$8 por dia –, conforme critério utilizado pelo Banco Mundial, caiu, de 804 milhões, em 2013, para 736 milhões, em 2015. Para essa organização internacional, esse é o menor nível de extrema pobreza atingido em toda a história.

    Assim, de acordo com esses dados, Sr. Presidente, nós teríamos muito a comemorar neste Dia Internacional de Erradicação da Pobreza, mas talvez não seja bem assim, e essa é a razão pela qual assumo esta tribuna, para que possamos refletir juntos.

    O Ipea, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, em 2010, chegou a afirmar, por meio de comunicado, que o Brasil tinha condições de erradicar, até 2016, a extrema pobreza.

    Tínhamos, então, segundo a imaginação da época, as condições necessárias para acabar, em poucos anos, com a extrema pobreza do nosso País. E, como todos sabem e podem sentir, nós não conseguimos, infelizmente, atingir essa meta civilizatória. Pelo contrário, Sr. Presidente: a recessão econômica que vivemos entre 2015 e 2016, aliada talvez ao descaso por parte de nossas autoridades, dos nossos governantes, com esse imenso contingente de desvalidos, deixou como legado o aumento da extrema pobreza em nosso País.

    E, se tivéssemos, de fato, erradicado a extrema pobreza, teríamos razões de sobra para celebrar este 17 de outubro. A realidade, no entanto, Presidente, Sras. e Srs. Senadores, é que temos muitas razões para lamentar – 25 razões, para sermos precisos.

    De acordo com a notícia recente do jornal Valor Econômico, 25 das 27 unidades da Federação brasileira registraram o aumento do número de pessoas vivendo em condições de pobreza absoluta. Dos dez Estados em que houve o maior crescimento da pobreza, oito situam-se no Nordeste. Pior ainda: mudam-se os governos, mudam-se as propostas, alcançam-se decisões que são tomadas no quotidiano, mas a verdade é que o avanço da miséria é mais intenso no interior do Nordeste do que nas capitais da Região.

    Nos últimos anos, a extrema pobreza, Sra. Presidente, aumentou 9% nas regiões metropolitanas. Já no interior do Nordeste, seu avanço superou a marca de 11% da população. Esse retorno desproporcional da miséria, que afeta com mais intensidade justamente o Nordeste do País, dá muita margem à reflexão, neste momento sobretudo. Faz-nos pensar, Sr. Presidente, sobretudo na fragilidade das políticas públicas que visam a combater a pobreza.

    Caros colegas, minhas companheiras, no Nordeste, as transferências de renda do Bolsa Família e do INSS, com o Benefício de Prestação Continuada, representam, combinadas, mais de 25% da renda da Região. Um quarto da renda, Sra. Presidente, é muita coisa! Configura-se, dessa forma, um sistema de dependência econômica e de assistencialismo, dependência esta que merece ser repensada.

    É óbvio que eu não estou aqui pregando que se deva acabar com esses importantes e cruciais sistemas de transferência. Nada disso! Transferências de renda como o Bolsa Família são importantes, são necessárias e devem continuar, mas temos que encarar a realidade: em algum momento, temos que dar dignidade a esses brasileiros e brasileiras. Dar dignidade significa dar emprego, educação, renda própria, tudo isso que a senhora tão bem falava, na sua caminhada política, ao lado do ex-Governador Alckmin.

    Entre os anos de 2004 e 2013, o PIB brasileiro cresceu, em média, 4% ao ano. No mesmo período, as vendas do varejo, setor que tradicionalmente ocupa muita mão de obra de baixa qualificação, cresceram em ritmo bem mais acelerado, atingindo crescimento superior a 8% ao ano. Quando essa onda de consumo estourou, quando veio a crise, esses empregos de baixa qualificação deixaram de existir. Assim, nós concluímos que a erradicação da miséria não se alcançará, como ficou evidente durante a última crise econômica, por meio dos mecanismos que todos os Governos usaram e ainda usam.

    Acabar com a miséria passa necessariamente pela construção do emprego, pelo investimento, pela oportunidade. É preciso, portanto, rediscutir, quem sabe reformular nossos sistemas de combate à miséria. Temos que, aos poucos, converter os importantes programas de transferência de renda em ferramentas que fomentem a qualificação, a inserção no mercado de trabalho e o empreendedorismo, com vistas, Sra. Presidente, a criar as condições necessárias para acabar com os ciclos de manutenção e de recrudescimento de episódios da pobreza.

    Enquanto isso, eu volto a destacar, não podemos abrir mão dos programas – ninguém aqui está pregando isso –, dos programas essenciais para os mais desvalidos. Afinal, sem eles, a miséria seria maior ainda.

    Portanto, infelizmente, temos que reconhecer, como pontuou a matéria veiculada pelo jornal Valor Econômico: a pobreza extrema cresceu em todas as unidades da Federação. E eu quero dizer quase todas, inclusive no meu querido Estado do Espírito Santo, pois em 2014, Sra. Presidente, eram 2,6% das famílias capixabas que viviam abaixo da linha de pobreza extrema; ao final de 2017, esse percentual havia subido para 4,4%.

    Contamos, no meu Estado, com o trabalho desempenhado pelo Instituto Jones dos Santos Neves, que publica, todos os anos...

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - ES) – ... um documento intitulado "Perfil da Pobreza no Espírito Santo", importante para ser estudado pelos Parlamentares e pelos governantes. E, de acordo com esse instituto, nobres colegas Parlamentares, Senadores e Senadoras, 46% das famílias capixabas inscritas no Cadastro Único, que subsidia os programas sociais do Governo Federal, encontram-se em situação de pobreza – não há nenhum Governo que possa pensar em qualquer tipo de desenvolvimento se não tiver esses dados na mão e analisá-los –, vivendo com renda domiciliar per capita inferior, Presidente, a R$129. São 164 mil famílias, portanto, vivendo, no meu Estado, em condições de extrema pobreza. Sessenta mil crianças e adolescentes integram essas famílias. Famílias que perderam casas, famílias que moram em abrigos, famílias que moram nas ruas.

    Não há dignidade política que possamos proclamar em nossa tarefa cotidiana, neste Congresso, se não tivermos capacidade de analisar, oferecer saída, para que a gente possa tirar essas famílias da miséria. Famílias que não são capazes, dada a sua condição de miséria, de fornecer as referências necessárias, para que essas 60 mil crianças e adolescentes consigam vislumbrar um futuro melhor e consigam ter, pelo menos, esperança. E, sem esperança, sem esperança não há futuro.

    As consequências desse estado de desalento, as consequências dessa falta de perspectiva são literalmente letais. O Espírito Santo ostenta hoje a segunda maior taxa de homicídio de jovens no País, perdendo apenas para o Amapá.

    Sras. e Srs. Senadores, no Brasil inteiro, quase 15 milhões de pessoas vivem hoje em condições de extrema pobreza. Isso não é vergonhoso? Isso não é assustador? Isso não é inadmissível? Esta Casa, como sempre digo – estou dentro dela –, não pode ficar indiferente a essa tragédia. A voz surda das urnas, que renovaram este Senado, é de descontentamento, Sra. Presidente. Este Senado reflete a opinião, o desencantamento, a desesperança da população brasileira. Certamente não há mais espaço no Brasil do século XXI para brasileiras e brasileiros vivendo na miséria.

    O Sr. Hélio José  (Bloco Maioria/PROS - DF) – Sra. oradora...

    A SRª ROSE DE FREITAS (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - ES) – E sabemos todos: crianças e adolescentes que se criam nesses ambientes, Senador Hélio José, extremamente frágeis se tornarão, infelizmente, adultos com menores, bem menores, ou quase nenhuma oportunidade de vida.

    Pois não, Senador Hélio José.

    O Sr. Hélio José  (Bloco Maioria/PROS - DF) – Sra. Senadora Rose de Freitas, primeiro, meus cumprimentos a V. Exa. e a S. Exa. a Senadora Ana Amélia, Presidente da sessão.

    Eu queria concordar com V. Exa. O Espírito Santo é um Estado que sofreu muito com o desastre de Mariana, que sofreu muito com uma série de outras questões, que superou algumas dificuldades importantes com relação à segurança pública, vividas naquele período de chumbo, como a senhora sabe, recentemente, e que agora demonstrou toda essa situação que a senhora coloca.

    Eu quero aqui só ser testemunha do esforço de V. Exa. no sentido de sempre trazer as questões do glorioso Estado do Espírito Santo, de que pelo menos eu gosto tanto, pelo ensopado, pela moqueca capixaba, pelas praias maravilhosas e por esse povo bonito e bacana e elegante que é o povo do Espírito Santo, bem representado aqui por V. Exa.

    Queria só, em rápidas palavras, concordar com a senhora, dizer que a urna, a gente gostando ou não gostando do resultado, é a voz do povo, a voz da democracia. E nós estamos aqui para encaminhar e apoiar a voz da democracia, mas temos nossas opiniões. E eu quero falar que concordo com as opiniões de V. Exa.

    Muito obrigado a senhora pelo referido aparte.

    Muito obrigado.

    A SRª ROSE DE FREITAS (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - ES) – Eu agradeço a V. Exa.

    E, concluindo, eu queria apenas acrescentar que é necessário estancar essa verdadeira sangria. Para essa sangria, Sra. Presidente, nós devemos propor saídas. Essa sangria representa, sobretudo, uma vergonhosa condição brasileira.

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - ES) – Que o Presidente da República inicie, em 1º de janeiro, o seu mandato com um olhar para a questão da pobreza deste País, que prospera, que cresce diante dos nossos olhos.

    Senador Cristovam Buarque, é um prazer, eu quero dizer a V. Exa., receber um aparte, no meu discurso, de V. Exa.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – Senadora Rose, eu estava escutando o seu discurso pela Rádio e decidi vir aqui fazer um aparte. Felizmente, não é todo dia que tem discurso com tanta profundidade e sensibilidade, porque, se fosse todo dia, eu ia ficar triste de estar me despedindo do Senado. Mas, como é raro isso, essa razão eu não vou ter para ter a saudade.

    Mas eu não podia deixar de vir aqui para tentar trazer, mais uma vez, aquilo que me trouxe para esta Casa: é tentar descobrir por que...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) – ... o Brasil continua com essa pobreza. E para mim não há outra razão a não ser o desprezo à educação da nossa população na infância, por duas razões: só a educação, especialmente nos tempos atuais da economia do conhecimento, permite aumentar o bolo de todos que se chama Produto Interno Bruto. Não há como aumentar esse Produto Interno Bruto per capita, por pessoa, sem educação, que traz produtividade, eficiência, competitividade, inovação. E um PIB grande só é distribuído se a educação for igual para todos, Senador. Não há como distribuir a renda sem distribuir antes o conhecimento. Antes de chegar ao bolso, a renda chega à cabeça, porque, antes de entrar o dinheiro no bolso, o conhecimento tem que entrar na cabeça. É a partir daí que vem o emprego de qualidade. É a partir daí que vem a renda. É a partir daí que vem a consciência até mesmo para lutar pelos direitos. Só a educação é capaz de trazer um país rico na totalidade e com essa riqueza distribuída entre os seus habitantes.

    O seu discurso força uma reflexão de por que no Brasil persiste o quadro de pobreza: porque o Brasil não produz tanto quanto deveria por pessoa – a renda per capita é baixinha – e porque a pouca renda que a gente produz para todos é mal distribuída. Isso vem da baixa educação de todos e da desigualdade de como a educação se distribui.

    Eu fiz questão de vir aqui fazer este aparte para a senhora, dizendo que é bom ouvir um discurso com essas duas coisas que lhe falei: sensibilidade e profundidade. Seu discurso merece ser impresso e distribuído para que nossos colegas ouçam sua preocupação e sua reflexão.

    Muito obrigado por esse discurso, Senadora.

    A SRª ROSE DE FREITAS (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - ES) – Senador Cristovam, se me permite a Presidente, eu queria dizer que talvez a gente não tenha tantas oportunidades já que o povo de Brasília esqueceu o tamanho de V. Exa., como V. Exa. se agiganta diante da luta não só contra a pobreza, mas a favor da educação, portanto a favor do desenvolvimento, da justiça social e de tudo mais que a gente fala há tanto tempo e que parece ficar meio carcomido nos tapetes desta Casa quando as pessoas se esquecem de olhar para fora deles e enxergar este Brasil, que deveria estar todos os dias diante dos nossos olhos.

    Uma coisa também é certa – o Senador Hélio José também vai estar distante desta Casa, um combativo companheiro, que lutou muito aqui dentro; foi um D'Artagnan –: quem vencer essas eleições, no próximo dia 28, tem a sua tarefa principal de pauta já encomendada. Essa tarefa, Srs. Senadores e Sra. Senadora, é fundamental: formular, implantar, com máxima urgência, políticas realmente eficazes de combate à extrema pobreza. Não tem como mentir mais, não tem como esconder os dados, os números. Não adianta maquiar nenhuma política pública. Não adianta dizer que esse Ministro da Educação vai ser mais moderno que o outro, vai ser mais competente.

    Nós precisamos colocar a educação como tarefa fundamental. Todos nesta Casa deveriam ser militantes, Sra. Presidente, pela educação. A pobreza pode ser estudada...

(Soa a campainha.)

    A SRª ROSE DE FREITAS (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PODE - ES) – ... ou por que a educação não chega até lá. E só se sai da pobreza através da educação.

    Portanto, eu queria dizer que continuarei aqui nessa luta pelos próximos quatro anos. Eu quero continuar dedicando o meu mandato a acabar com essa nódoa que esta Nação tem, a acabar com a miséria e tornar o Brasil mais justo. E, para isso, temos que ter educação. E é justiça que todos nós, mulheres principalmente e homens de bem, como o Senador Cristovam, como o Hélio José, que todos nós queremos que haja no Brasil: a justiça através das políticas sociais capazes de tirar esse contingente de pessoas dessa extrema pobreza.

    Era o que eu tinha a dizer, Sra. Presidente.

    Muito obrigada pela tolerância.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/10/2018 - Página 15