Discurso durante a 134ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao suposto reflexo negativo causado pela reforma trabalhista.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Críticas ao suposto reflexo negativo causado pela reforma trabalhista.
Publicação
Publicação no DSF de 15/11/2018 - Página 9
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFORMA, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, PREJUIZO, EMPREGO, RELAÇÃO DE EMPREGO, RETIRADA, DIREITOS, COMENTARIO, ESTATISTICA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), DESEMPREGO, REGISTRO, REDUÇÃO, NUMERO, RECLAMAÇÃO TRABALHISTA.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para discursar.) – Sr. Presidente, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, os que nos acompanham pela TV Senado, pela Rádio Senado e pelas redes sociais!

    Sr. Presidente, há um ano o Presidente Michel Temer encaminhou ao Congresso Nacional e viu ser aprovada a chamada reforma trabalhista, que aniversariou no último dia 11. Essa proposta alterou mais de cem itens da Consolidação das Leis do Trabalho, a chamada CLT, com a promessa de melhorar o ambiente de negócios, de gerar empregos e impulsionar o mercado.

    Passado um ano, a constatação a que se chega é que aquela proposta só gerou estagnação do emprego formal, precarizou as relações de trabalho, lançou brasileiros na informalidade e produziu queda no volume de ações trabalhistas por medo dos trabalhadores de serem responsabilizados na Justiça pelas reclamações que eventualmente pudessem não se manifestar ou se materializar como adequadas.

    Nós dissemos o tempo inteiro que essa reforma foi nefasta em todos os aspectos: retirou direitos e conquistas históricas dos trabalhadores e lançou o Brasil no enorme cenário de incerteza e de instabilidade jurídicas; só serviu a facilitar a vida dos patrões e dos empresários e ao discurso de Temer, que, como ele próprio disse, gostaria de passar para a história como um Presidente reformista. Na verdade, as reformas que realizou foram todas profundamente negativas para o povo brasileiro.

    Por essa reforma, o trabalhador perdeu parte do seu horário de almoço; o trabalho intermitente – aquele em que o trabalhador fica em casa à disposição do seu patrão, que o chama no momento que entende necessário, e ele só recebe por aquilo que efetivamente trabalhou – transformou um ser humano numa peça de mobília ao dispor do empregador, de forma que, remunerado miseravelmente por uma hora de trabalho, um funcionário de uma rede de lanchonetes, por exemplo, não consegue, ao final de uma jornada de cinco horas, comprar o próprio lanche que vende com o que recebe de remuneração; gestantes e lactantes foram jogadas no trabalho insalubre, com risco à própria saúde e à saúde do seu filho. Somente no dia de ontem, depois de quase um ano, foi aprovada, na Comissão de Assuntos Sociais, uma proposta que procura resolver essa grave injustiça e esse grave risco à saúde de mães e filhos.

    Os ministros de Temer diziam, naquela época, que valia a pena eliminar direitos, porque a reforma trabalhista geraria até 6 milhões de novos postos, 2 milhões dos quais já nos primeiros dois anos. As estatísticas, Sr. Presidente, desmentem totalmente essa previsão. Um ano depois, o que há é um completo fiasco. Entre novembro de 2017 e setembro deste ano, foram criadas 372,7 vagas formais, segundo dados do Caged, do Ministério do Trabalho. De acordo com o IBGE, o índice de desemprego era 12%, em novembro de 2017, e, em setembro passado, foi de 11,9%. Portanto, nenhuma alteração nesse quadro, nada melhorou.

    Os últimos dados indicam que 13 milhões de brasileiros seguem em busca de um trabalho. O IBGE indica que, enquanto nada muda em relação ao emprego com carteira, o que cresce é o emprego informal, e há um desalento recorde. O número de desalentados, trabalhadores que desistiram de procurar um emprego, é de 4,8 milhões de brasileiros, uma alta de 13,2% em relação ao mesmo período do ano passado, ou seja, somente a tragédia social do desamparo nas relações trabalhistas é o que avança.

    É o caso também do trabalho intermitente, que já descrevi aqui o que significa. O saldo das vagas criadas nessa modalidade, quando o trabalhador recebe apenas pelas horas efetivamente trabalhadas, foi de 35,9 mil. Já o saldo relacionado ao trabalho em regime de tempo parcial, quando um trabalhador cumpre no máximo 30 horas de trabalho semanal, foi de 18,7 mil. Somados, ambos representam 14% das contratações feitas no período. Em janeiro de 2018, essas duas modalidades correspondiam a 5% das vagas criadas, o que mostra claramente um crescimento de adesão a esse tipo de contrato que explora violentamente o trabalhador. Ou seja, ao invés de produzir empregos com mais qualidade, ao invés de produzir empregos com carteira assinada, o que essa reforma está gerando é pura e tão somente os empregos precarizados, os empregos nessas modalidades em que a exploração é extremamente violenta contra o trabalhador.

    Já o número de ações na Justiça despencou totalmente. A Constituição brasileira definia, determinava, a CLT determinava que não havia custo para que o trabalhador pudesse reclamar os seus direitos na Justiça. E, com essa reforma trabalhista, quando o trabalhador não consegue produzir as provas na sua alegação, ele é responsável por pagar as custas do processo e da parte que foi acionada. Portanto, só no período de dezembro de 2017, pouco depois de essa reforma trabalhista ter sido aprovada e sancionada, até setembro deste ano, o volume de reclamações caiu 38%.

    E é óbvio: se nós temos ao mesmo tempo um processo de enfraquecimento das reclamações, do trabalho sindical, se, a partir de então, aquilo que é acordado vale mais do que aquilo que a lei prevê, a chance desses trabalhadores de perderem nas suas reclamações cresceu de forma muito forte, muito intensa. Os tribunais receberam 1,4 milhão de casos novos contra 2,2 milhões no mesmo período do ano anterior, ou seja, os trabalhadores estão desistindo de buscar os seus direitos, estão desistindo de buscar a Justiça para o seu trabalho. Isso por um motivo simples: o medo de perderem a briga, como eu disse, e de serem punidos por isso.

    O trabalhador que reivindica o pagamento de horas extras, por exemplo, não tem acesso ao cartão de ponto. Antes, podia ingressar com uma reclamação apresentando apenas uma estimativa. Com a reforma, passou-se a exigir que o trabalhador peça o valor exato pretendido e, consequentemente, a produção antecipada de prova, para obrigar a empresa a fornecer os dados. Outro absurdo é o elevado número de acordos extrajudiciais, que nos preocupam, porque a maioria não é razoável, tendo-se em conta que ocultam renúncias de direitos ou induzem o trabalhador a erro. Elas vêm sendo homologadas sem qualquer critério, tudo em prejuízo do trabalhador.

    O Cenário para os próximos anos parece ser sombrio. Principalmente, Sr. Presidente, porque o Presidente da República recentemente eleito defende claramente a retirada de mais direitos e a intensificação da precarização das relações de trabalho em todo o País. Ele diz que o trabalhador brasileiro precisa optar entre ter direitos e não ter trabalho e emprego e ter emprego e não ter direitos. Essa é uma equação absolutamente equivocada. No mundo inteiro, essas duas coisas caminham concretamente juntas.

    No Brasil, onde a parte que corresponde à renda salarial já é baixa, onde as condições de trabalho são mais precárias, onde o trabalhador tem um tempo de vida laboral mais limitado por conta dessas condições, sem dúvida, essa avaliação, essa alternativa que coloca o Presidente da República, é absolutamente equivocada.

    Agora, não se sabe o que ele pretende fazer com o Ministério do trabalho, Ministério que completou 88 anos e que sempre foi um espaço importante na trincheira da defesa do trabalhador e, obviamente, do empresário também. Não se sabe se esse Ministério será incorporado a outro, se será fatiado, se vai manter o status de Ministério, se vai perder algumas de suas atividades, mas o importante é que isso representa uma contradição no mesmo momento em que o desemprego caminha e cresce a passos galopantes. Quando nós temos a retomada do trabalho escravo por diversos segmentos, especialmente na área rural, acreditamos que é um grande equívoco acabar com o Ministério do Trabalho. É um equívoco grande, também, a substituição da Carteira de Trabalho pela chamada carteira verde e amarela. Na verdade, o que é essa carteira de trabalho verde e amarela que irá, segundo o Presidente eleito, substituir a atual?

    Em vez de garantir ao trabalhador direitos como salário mínimo, hora extra, vale-transporte, aviso prévio, seguro-desemprego, repouso semanal remunerado, salário-família, 13° salário, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, licença-maternidade, licença-paternidade, auxílio-doença, adicional noturno e insalubridade e aposentadoria, que estão na carteira de trabalho atual, a carteira de trabalho verde e amarela do Presidente eleito garantiria apenas três direitos: o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, as férias remuneradas e o 13° salário, que o Vice-Presidente eleito já disse que também quer acabar.

    Ou seja, Sr. Presidente, de muito pouco serviu a reforma trabalhista de Temer a não ser aprofundar as condições precárias de trabalho e o abismo entre ricos e pobres no nosso País. E todo esse contexto de terror deve aumentar com a assunção do novo Presidente da República, cujo compromisso de governo é com os empresários e não com os trabalhadores.

    E é por essa razão, Sr. Presidente, que os movimentos sociais, os movimentos sindicais já começam a se organizar, a se articular, para fazerem frente – não só fazerem frente a essa reforma que hoje vige no nosso País, e, com isso, tentar revogá-la ou revogar pontos cada vez mais nefastos na constatação do dia a dia da implementação dessa reforma – e também para resistirem fortemente à tentativa de retirada de novos direitos, que é a pretensão do futuro Governo. Será por meio da articulação desses movimentos, será por meio das suas mobilizações, será por meio inclusive das greves, comandadas por todas as centrais sindicais que se colocaram, na verdade, contra a eleição do Sr. Jair Bolsonaro, que haveremos de resistir contra esse retorno do Brasil a uma situação anterior a de 1988 e, em alguns casos, anterior até à entrada em vigor da Consolidação das Leis do Trabalho.

    Portanto, um ano depois de aprovada essa legislação, os trabalhadores e as trabalhadoras do Brasil nada têm a comemorar. Os empresários também muito pouco têm a comemorar, já que, como eu disse no início, uma das pretensões era que isso estimulasse o crescimento do País, que isso estimulasse os investimentos. E, no entanto, nada disso aconteceu.

    E, como o que se espera do novo Governo, pelas suas próprias palavras, é um aprofundamento da política econômico-social que foi implementada pelo Governo desastroso de Michel Temer, esse quadro certamente não melhorará.

    O que nós lamentamos é que se tente, como vêm fazendo o novo Presidente e alguns dos seus futuros ministros, atribuir ao PT uma herança maldita para justificar o que eles já sabem: que serão fracassos anunciados. Tentam colocar uma cortina de fumaça e fazer a população esquecer que, há dois anos, nós estamos sendo governados por Michel Temer. E, se herança maldita há, essa herança maldita é aquela que está sendo deixada para o novo Governo pelo atual Presidente, Michel Temer.

    Quero acreditar, Sr. Presidente, que, com a força da mobilização social, com a luta dos trabalhadores, nós iremos finalmente fazer com que essa reforma seja efetivamente revogada e os avanços na derrubada de direitos dos trabalhadores não sejam efetivamente consolidados no novo Governo.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/11/2018 - Página 9