Pela Liderança durante a 141ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca do Projeto de Lei do Senado nº 514, de 2017, que visa a descriminalizar o cultivo da cannabis sativa para uso pessoal terapêutico.

Autor
Eduardo Amorim (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SE)
Nome completo: Eduardo Alves do Amorim
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
SAUDE:
  • Considerações acerca do Projeto de Lei do Senado nº 514, de 2017, que visa a descriminalizar o cultivo da cannabis sativa para uso pessoal terapêutico.
Publicação
Publicação no DSF de 29/11/2018 - Página 42
Assunto
Outros > SAUDE
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, VOTAÇÃO, REJEIÇÃO, PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS), ASSUNTO, DESCRIMINALIZAÇÃO, CULTIVO, PLANTAS PSICOTROPICAS, OBJETIVO, TRATAMENTO MEDICO, MOTIVO, AUSENCIA, INCAPACIDADE, CONTROLE, GOVERNO, POSSIBILIDADE, PRODUÇÃO, MEDICAMENTOS, ORIGEM, LABORATORIO.

    O SR. EDUARDO AMORIM (Bloco Social Democrata/PSDB - SE. Pela Liderança.) – Sr. Presidente, colegas Senadores, senhoras e senhores ouvintes da Rádio Senado, espectadores da TV Senado, todos que nos acompanham pelas redes sociais, especialmente do meu querido Estado de Sergipe, ao longo do nosso mandato aqui nesta Casa e também na Casa vizinha, na Câmara dos Deputados, sempre procurei agir alicerçado, baseado, orientado pelo princípio da coerência, que norteou e norteia todas as minhas atitudes. Se muitas vezes votei a favor de um projeto do Governo, foi porque entendi que merecia ser aprovado para o bem do povo brasileiro. Mas houve, Sr. Presidente, muitas vezes em que discordei desse projeto, por não achá-lo ideal, nem condizente com o que o povo brasileiro precisa e merece.

    Pois bem, a semana passada, na Comissão de Assuntos Sociais, a CAS, pedi vista do PLS 514, de 2017, que altera o art. 28 da Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006, que visa descriminalizar o cultivo da Cannabis sativa, da maconha, para uso pessoal terapêutico. O projeto altera o §1º do art. 28, que diz – abre aspas: "Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequenas quantidades de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica, reservado o semeio, o cultivo e a colheita da Cannabis sativa para uso pessoal terapêutico, em quantidade não mais do que suficiente ao tratamento, de acordo com a indispensável prescrição médica" – fecha aspas.

    Hoje votei por sua rejeição por perceber primordialmente dois problemas.

    O primeiro diz respeito à incapacidade do Estado brasileiro de controlar o semeio, o cultivo e a colheita da Cannabis sativa para uso pessoal terapêutico. É difícil mesmo o Estado brasileiro controlar tudo isso, já que hoje em dia não consegue fazê-lo. O segundo é a impossibilidade de se dimensionar qual seria a quantidade suficiente para o uso do paciente.

    Sendo aprovado esse projeto, Sr. Presidente, cada casa, cada lar, cada família vai ter dentro da residência não só o plantio como um laboratório dentro de casa, quando na verdade o melhor caminho que eu entendo é a distribuição através do SUS ou a disponibilização através da Anvisa, quais os estabelecimentos onde deveria ser disponibilizado ou vendido, como muitos outros medicamentos ou drogas o são.

    Ao longo da minha vida profissional como médico, como especialista no tratamento da dor e, portanto, um pouco entendido em opioides e em receptores cerebrais, sei que é importante, sim, ter o medicamento à sua disposição, mas me preocupa fazer com que cada ambiente doméstico seja um laboratório produtor de psicotrópico e o descontrole que poderá vir de tal atitude.

    É importante frisar e esclarecer, Sr. Presidente, que não sou contra o uso medicinal da Cannabis e não estou indo de encontro aos interesses de milhares de pacientes. Como já disse, sou médico, dediquei-me por muitos anos à missão de salvar vidas e cuidar da dor dos outros, e de cuidar da dor dos meus pacientes.

    Entretanto, preocupa-me imensamente o fato de que, se o Estado não se tem mostrado capaz de conseguir erradicar plantações ilegais, com liberação parcial da maconha, será inviável fiscalizar as lavouras e, ainda por cima, distinguir o cultivo lícito das plantações ilícitas, além de verificar se a área plantada é compatível com a quantidade necessária a um determinado paciente. É muito complexo, Sr. Presidente.

    Sr. Presidente, vivemos em um País de dimensões continentais, com uma área superior a 8,5 milhões de quilômetros quadrados e uma população superior a 210 milhões de habitantes, o que incontestavelmente torna impossível o controle e a fiscalização.

    Acredito, colegas Senadores, que a maneira correta e responsável de cuidar dos pacientes que, efetivamente, precisem de substâncias extraídas da Cannabis para seus tratamentos, seja por intermédio do SUS – sim, o SUS deve disponibilizar, como disponibiliza inúmeros outros medicamentos, inclusive, a morfina ou tantos outros realmente muito mais poderosos, como prevê a Constituição Federal e a legislação sanitária brasileira –, que tem por obrigação prover seus usuários de assistência integral à saúde, a qual deve incluir assistência farmacêutica capaz de suprir os produtos essenciais para as necessidades dos pacientes. O SUS é baseado em vários princípios, dentre eles o da universalidade e o da integralidade, de tudo para todos.

    Sr. Presidente, a curto prazo, isso poderá ser feito por meio da importação em larga escala, em compras públicas de medicamentos, as quais poderão substituir a importação para uso individual, permitida com autorização da Anvisa.

    E aqui, cito como exemplo de produto importado, o Mevatyl, primeiro medicamento a base de tetrahidrocanabinol e canabidiol, que na forma de solução oral é indicado para o tratamento sintomático da espasticidade moderada e grave relacionada à esclerose múltipla. O medicamento, que é fabricado no Reino Unido foi registrado no Brasil por empresa localizada em São Paulo e aprovado pela Anvisa em janeiro de 2017.

    Já a médio e longo prazo, Sr. Presidente, o SUS pode incentivar, sim, a produção nacional em laboratórios públicos e privados, como tem ocorrido nos últimos anos. Como exemplo de incentivo à produção nacional, foi publicado na imprensa, em abril deste ano, que um laboratório da cidade de Toledo, lá no Paraná, por meio de pesquisas conduzidas em parceria com a Universidade de são Paulo, a USP de Ribeirão Preto poderá ser o primeiro laboratório brasileiro a produzir e vender, no Brasil, o extrato de canabidiol (CBD), usado no tratamento da epilepsia refratária.

    A matéria esclarece que o medicamento, já patenteado no Brasil e no exterior, está em fase final de testes clínicos, com previsão de ser disponibilizado no mercado até o final deste ano. Portanto, muito próximo.

    Dessa maneira, além de reduzir os custos com importação, a produção em laboratório promete garantir uma substância mais pura e completamente livre do THC, o princípio que causa o efeito psicoativo da maconha, portanto, efeitos indesejáveis para o tratamento.

    E vou além, Sr. Presidente: para baratear o medicamento, a parceria estuda também a produção em laboratório do canabidiol sintético, processo em que não há necessidade de se ter a Cannabis sativa em planta. O extrato é obtido a partir da estrutura molecular com técnicas bioquímicas e farmacêuticas, por meio das quais se criam artificialmente moléculas com a mesma eficácia, como fizeram, por exemplo, na década de 50, com a morfina. Nesse caso...

(Soa a campainha.)

    O SR. EDUARDO AMORIM (Bloco Social Democrata/PSDB - SE) – ... a expectativa é de que o produto esteja no mercado em três anos.

    Sr. Presidente, colegas Senadores, além de beneficiar as crianças portadoras de epilepsia refratária, doenças como esquizofrenia e mal de Parkinson são as patologias com estudos mais avançados em relação ao uso do canabidiol realizados pelos pesquisadores da USP.

    Sr. Presidente, finalizo afirmando que minha posição é por entender que, do ponto de vista sanitário e de segurança para o próprio paciente, a proposta mais adequada será a de exigir dos gestores do SUS, nas três esferas federativas, que tomem as medidas necessárias, juntamente com a Anvisa, para fornecer os produtos farmacêuticos à base de Cannabis sativa a todos os pacientes que assim necessitem.

    Portanto, Sr. Presidente, não sou contra o uso terapêutico e nem poderia ser. Boa parte da minha vida profissional, como já disse, foi cuidando de pessoas sobretudo com dor crônica ou dor aguda, e sei muito bem o que é isso. O que me trouxe até aqui foi a sensibilidade que tive diante de uma criança e da falta de medicamento de que ela precisava naquele momento.

    Sr. Presidente, o que me preocupa de verdade é fazer com que cada lar, cada residência seja um lugar de plantio e um laboratório descontrolado de fabricação de psicotrópico, quando, na verdade, nós temos um Sistema Único de Saúde que tem por obrigação ser universal e ser integral, de tudo e para todos, inclusive fornecendo os medicamentos básicos sem nenhuma fragilidade, Sr. Presidente.

    Não sou contra o uso terapêutico. Preocupa-me apenas o descontrole que poderá advir do uso doméstico e da fabricação doméstica de produtos como este, Sr. Presidente, quando, na verdade, repito e insisto em dizer que é obrigação do SUS, sim, disponibilizar a todos os pacientes, sem exceção.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/11/2018 - Página 42