Discurso durante a 141ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Destaque para o 1º de dezembro, dia em que foi firmado o Laudo Suíço, sentença que estabeleceu, em definitivo, parte da área do estado do Amapá.

Autor
Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Destaque para o 1º de dezembro, dia em que foi firmado o Laudo Suíço, sentença que estabeleceu, em definitivo, parte da área do estado do Amapá.
Aparteantes
Guaracy Silveira.
Publicação
Publicação no DSF de 29/11/2018 - Página 58
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • REGISTRO, ANIVERSARIO, DATA, REFERENCIA, ASSINATURA, LOCAL, PAIS ESTRANGEIRO, SUIÇA, DOCUMENTO, OBJETO, DETERMINAÇÃO, AREA, ESTADO DO AMAPA (AP), TERRITORIO, BRASIL, RESULTADO, ENCERRAMENTO, CONFLITO, FRANÇA, ANUNCIO, LANÇAMENTO, LIVRO, AGRADECIMENTO, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, SENADO, MOTIVO, TRADUÇÃO, TEXTO.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP. Para discursar.) – Sr. Presidente, a data do próximo sábado desta semana é uma data das mais significativas para o meu Estado do Amapá, e talvez uma das menos referenciadas na historiografia, uma das menos referenciadas pelas próprias autoridades amapaenses.

    A data do próximo dia 1º de dezembro é a data em que foi firmado em Berna, com a intervenção do Barão do Rio Branco, o chamado Laudo Suíço, que estabeleceu em definitivo que a região acima do rio Araguari, uma região e uma área de conflito secular entre o Brasil e a França, era, em definitivo, território brasileiro.

    Faço questão de referenciar isto porque essa é uma história que merece ser lembrada aqui, no Plenário deste Senado, que merece ser lembrada pela história para as gerações que virão, no meu Estado do Amapá, e deve ser referenciada para todos os amapaenses, porque, se há uma razão para que nós amapaenses tenhamos orgulho, é sermos um dos poucos cantos do Brasil que é Brasil, porque lutou para ser Brasil. Essa é uma história que transcorre no começo do ano de 1895. Essa é uma história que mistura diplomacia, debate científico entre a França e o Brasil e embates militares ocorridos no decorrer do século XIX.

    O ano de 1895 é um ano que se inicia para o Brasil com ameaças imperialistas. Naquele ano, no começo do ano, a Inglaterra toma posse da chamada Ilha de Martim Vaz, na nossa costa litorânea, e essa ação do imperialismo inglês só é conhecida pela diplomacia brasileira quase seis meses depois. Este ano de 1895 é emblemático, porque é a data em que ocorre o mais grave conflito na luta pela conquista do território entre os rios Oiapoque e Araguari, e essa é uma disputa que ocorre desde pelo menos o século XVIII. A França demandava, no século XIX, boa parte do território do meu Estado do Amapá, uma extensa área que ocupava todo o Vale Amazônico, e, se prevalecessem as reivindicações francesas e se as reivindicações francesas do final do século XIX tivessem sido concluídas, se tivessem tido êxito, toda a região do Norte do Estado do Amapá acima do rio Araguari seria área de posse francesa. Toda a região também do norte e nordeste do Estado do Pará, da parte setentrional do Estado de Roraima e de parte do Estado do Amazonas, se essa reivindicação francesa tivesse triunfado, seria território francês.

    É na verdade uma área, Sr. Presidente, de quase 260 mil quilômetros quadrados, reivindicada pelos franceses no século XIX, mas que tem – e é importante aqui contar essa história – os seus antecedentes no século XVIII, com o Tratado de Utrecht. O Tratado de Utrecht, de 1713, devido à intervenção da coroa britânica, pressionando naquele momento o reino francês, garantiu que os limites entre o Reino de Portugal e o Reino da França fossem o rio naquele momento conhecido como Rio de Oyapock, ou Rio de Vicente Yáñez Pinzón, o atual Rio Oiapoque. Esta definição de 1713 não se sustentou, não foi mantida durante as lutas de expansão do Império Napoleônico.

    Como todos sabemos, logo após a Revolução Francesa de 1789 e logo após a ascensão de Napoleão à frente do Estado francês, iniciaram-se as guerras expansionistas francesas. A Coroa Portuguesa, pressionada pela força francesa e sob a ameaça da invasão francesa, teve que ceder a vários tratados com a França sobre qual seria o verdadeiro limite francês no final do século XVIII e início do século XIX.

    Entre esses diferentes tratados, o primeiro, de 1797, restabelecia o domínio francês até o Rio Araguari. Um segundo tratado, chamado Tratado de Badajoz, esse de 1801, já estendia o limite francês mais adiante, até o atual Rio Carapanatuba.

    Mais adiante, um outro tratado, em 1802, o de Amiens, estabeleceu como definitivo o Rio Araguari como a extensão dos domínios franceses sobre o Território brasileiro – o território da colônia de Portugal de então e a área hoje do nosso Estado do Amapá.

    Só em 1815 – a partir de 1808, melhor dizendo –, com a invasão francesa de Portugal e com o refúgio da família real portuguesa no Brasil e a transferência do reino de Portugal para o Rio de Janeiro, é que há uma contraofensiva portuguesa, que invade o território da Guiana Francesa até Caiena, anexando a Guiana Francesa aos domínios de Portugal e aos domínios brasileiros.

    Em 1815, após a derrota das forças napoleônicas, restabelece-se o limite, restabelecem-se os limites do Tratado de Utrecht, de 1713, estabelecendo que o Rio Japoc ou rio de Vicente Yáñez Pinzón, o nosso atual Rio Oiapoque, seria de fato o divisor entre a Guiana Francesa e o Território brasileiro.

    Esse impasse não se resolve em 1815. Continua a haver, meu caríssimo Senador Guaracy, na França, uma série de pressões para que fosse restabelecido o território francês, conforme se tinha anteriormente no período napoleônico. Então, no final da década de 30 do século XIX, são as próprias tropas militares francesas que avançam sobre o território do Amapá, avançando o limite do Rio Japoc, do rio de Vicente Yáñez Pinzón, estendendo até o Rio Araguari os seus domínios.

    Devido à intervenção britânica novamente, as tropas francesas recuam, no ano 1840, para o limite anterior, ao Rio Oiapoque, Japoc ou rio de Vicente Yáñez Pinzón.

    Essas idas e vindas transcorrem em todo o século XIX até que, no ano de 1841, a região entre o Rio Araguari e o Rio de Vicente Yáñez Pinzón, o Rio Japoc ou o hoje nosso conhecido Rio Oiapoque, é definida como área de contestado, ou seja, toda essa região, uma área de mais de 70.000 quilômetros quadrados, a partir do ano de 1841, é estabelecida como área de contestado, disputada entre o Império do Brasil e a República Francesa.

    Essa área de construção de contestado dá espaço, inclusive, a diferentes aventuras. Uma dessas aventuras, Sr. Presidente, é a proclamação de uma república independente entre os Rios Araguari e Oiapoque, a República Independente do Cunani. A república independente chega a ser proclamada como república em Paris, por um aventureiro chamado Jules Gros, que reivindica o apoio militar francês para ocupar a área da república independente. A república independente passa inclusive a ter uma capital, denomina-se sua capital a Vila do Cunani, conhecida vila de todos nós, situada hoje no Município de Calçoene. Essa república independente chega a ter a emissão de selos, a emissão de moedas e um consulado reconhecido na França.

    Eu abro aqui esse parêntese para mostrar a dimensão de aventuras que teve a nossa região do Amapá durante todo o século XIX para anunciar aqui, em primeira mão – nós estaremos lançando posteriormente lá em Macapá –, que nós conseguimos. Poucas informações se tem sobre a existência dessa república independente no Norte do Brasil. Para se ter uma ideia, Senador Guaracy, que é um Senador, digamos assim, meio tocantinense, meio amapaense também, a única publicação que se tem sobre a existência dessa República Independente do Cunani é uma publicação em inglês feita por um alemão.

     Nós tivemos o prazer de receber essa publicação, ter acesso aos originais desse autor alemão, Wolfgang Leo Maar, ter autorização dele para traduzir essa publicação para o português e fazer o lançamento aqui no Brasil. É esta obra aqui que nós traduzimos. E eu queria fazer aqui o registro e o meu agradecimento ao competente serviço de tradução do Senado Federal por ter traduzido toda essa obra para o português. É o único documento existente no Brasil...

(Soa a campainha.)

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP) – ... que conta a aventura da existência de uma república independente na Amazônia, na Região Norte, na parte setentrional do Amapá.

    Nós faremos em breve o lançamento deste livro.

    Este livro, que tem o título Os Selos Postais da República do Cunani, demonstra um pouco do que ocorreu, e muitos brasileiros – eu diria, inclusive, muitos conterrâneos amapaenses – não sabem as epopeias aventureiras que ocorreram na região entre o Rio Araguari e o Rio Oyapock, o rio de Vicente Yañez Pinzón, o nosso hoje conhecido Rio Oiapoque.

    Nós devemos – e eu quero aqui concluir, Sr. Presidente –, na verdade, a consolidação dessa área como Território nacional a três brasileiros e a um fato.

    Após a proclamação da República do Cunani, seguiu-se a disputa pelo ouro nessa região durante toda a década de 60, 70 e 80 do século XIX. No ano de 1861, um brasileiro – e esse é o primeiro brasileiro quero assinalar – chamado Joaquim Caetano da Silva, nome do nosso museu histórico, publicou em Paris a sua obra de dois volumes: L'Oyapoc et L'Amazone, definindo, anunciando e dizendo que o rio de Vicente Yáñes Pinzón, que o Rio Yapoque era o rio que estava acima do Araguari, e não aquele rio que era reivindicado pelos franceses, que era definido pelos franceses como o Rio Araguari.

    Esta obra é fundamental para o feito heroico de um outro diplomata brasileiro, que hoje é patrono do nosso Itamaraty, o Barão do Rio Branco. Foi baseado na obra de Joaquim Caetano da Silva que o Barão do Rio Branco, no dia 1º de dezembro, na Conferência Helvética da Suíça... A sentença final declaratória por parte do Estado suíço considera as argumentações do Barão em nome do Estado brasileiro como verdadeiras e confirma que os limites entre o Brasil e a Guiana Francesa, entre o Brasil e a França, são na verdade o Rio Oiapoque, o rio de Vicente Yáñes Pinzón, aquele definido no Tratado de Utrecht, de 1713, e não aquele que estava sendo reivindicado pelos franceses, como seria atualmente o Rio Araguari.

    E, para isso ocorrer, foi fundamental, foi decisivo que os conflitos que ocorreram nessa região tivessem um marco. E este marco é o dia 15 de maio de 1895. Nesta data, uma missão de corsários franceses invade a Vila do Espírito Santo do Amapá, tem embate com tropas brasileiras, lideradas por Francisco Xavier da Veiga Cabral, o nosso Cabralzinho, e realiza uma chacina, matando 95 homens, mulheres, crianças e idosos na Vila do Espírito Santo do Amapá. Esta chacina e a reação de Cabralzinho às tropas lideradas pelo corsário francês Lunier, ecoam na imprensa internacional e pressionam o Estado francês a sentar-se com o Estado brasileiro na Conferência Helvética cinco anos depois, garantindo a posse dessa região entre o Rio Araguari e o Rio Oiapoque para o Brasil.

    Eu queria, antes de concluir, Senador Cidinho, querido Presidente, se V. Exa. me permitir, só ouvir rapidamente o Senador Guaracy, que, como já disse, é o nosso Senador tocantinense, mas que tem pés fincados também no meu Estado do Amapá.

    O Sr. Guaracy Silveira (DC - TO) – Ou um Senador amazônico, não é?

    Senador Randolfe, brilhante o seu pronunciamento, com os seus dados históricos.

    Aproveito para me somar nas honras e nas homenagens que faz ao Barão do Rio Branco, porque não foi só nas divisas estendendo do Araguari até o Oiapoque, com mais de 70 mil quilômetros quadrados, mas também nas divisas com a antiga Guiana Inglesa, nas divisas com a Venezuela, Colômbia, na Cabeça do Cachorro, no Amazonas, no Estado do Acre, que foi totalmente incorporado pela Nação brasileira, e parte de Rondônia.

    O Barão do Rio Branco foi um dos maiores gigantes que esta Nação gerou, porque não se derramou uma gota de sangue e aumentamos o nosso Território em, talvez, em 300 mil quilômetros quadrados, pela ação diplomática inteligente do Barão do Rio Branco.

    É um homem que precisava ser muito mais memorizado, muito mais honrado pela história brasileira. Nós tínhamos até o Território de Rio Branco, que deixou de ser Rio Branco para ser Roraima.

    É um homem que merece toda a reverência da história brasileira, da política brasileira, pelo gigantismo. Poucos fizeram tanto para o Brasil quanto o Barão do Rio Branco.

    Parabéns pelo seu pronunciamento, Senador Randolfe.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP) – Obrigado, Senador Guaracy.

    É por isso, inclusive, que resolvi ocupar a tribuna: nós estamos na semana que antecede 1º de dezembro. O dia 1º de dezembro, inclusive para nós amapaenses, é pouco lembrado, mas é uma das datas mais significativas – deveria e deve ser – para o Amapá.

    Aliás, destaco no calendário três datas centrais para o Amapá: a nossa transformação em Território Federal, em 13 de setembro; a elevação a Estado, com a promulgação da Constituição, em 5 de outubro; e 1º de dezembro, porque foi a data em que nós nos incorporamos em definitivo ao Brasil e resolvemos as controvérsias que existiam de uma disputa de quase dois séculos com o Estado francês.

    Somo-me, Senador Guaracy, ao que V. Exa. destaca. O Barão do Rio Branco é o diplomata do Amapá, é a nossa referência diplomática. É o diplomata da Questão de Palmas – que não é Palmas, no Tocantins – com a Argentina, que assegurou a posse da região oeste de Santa Catarina.

    O Sr. Guaracy Silveira (DC - TO. Fora do microfone.) – A Região do Contestado.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP) – Exatamente.

    É o diplomata do Acre, que não matou. O nome da capital é, inclusive, o nome de Rio Branco. É o diplomata do Acre, que resolveu as questões do Acre. É o diplomata, também, de Roraima. Ou seja, não é à toa que a atuação do Barão do Rio Branco faz todas as homenagens devidas ao nosso Ministério das Relações Exteriores, ao nosso Itamaraty.

    Há uma questão similar aí que une a atuação do Barão. Há dois Estados brasileiros, o Acre e o Amapá, destaco sempre, que estão no Brasil porque lutaram para integrá-lo. São dois Estados brasileiros que poderiam ter cedido à luta, poderiam ter cedido à cobiça e à sedição estrangeira, seja à sedição francesa, seja à resignação contra o Estado, em relação ao Estado boliviano.

    A expansão das fronteiras do Acre foi feita pelas foices e machados de Plácido de Castro, pelos conflitos lá ocorridos com os soldados da borracha, com os primeiros brasileiros que para lá se expandiram. Foi no Amapá, a partir da resistência aos corsários, liderados por Cap. Lunier, a chacina de mais de 95 pessoas na Vila do Espírito Santo do Amapá.

(Soa a campainha.)

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/REDE - AP) – Todas essas duas situações, todos esses dois conflitos que resultaram em derramamento de sangue brasileiro, no Acre e no Amapá, foram resolvidos, depois, com a vitória brasileira e com a intervenção diplomática do Barão do Rio Branco.

    Concluo, Sr. Presidente, dizendo que é por isso que destaco a data de 1º de dezembro. É um canto do Brasil que está no País porque dedicou sangue para ser Território brasileiro. Para isso ser concretizado, houve a atuação central desses três personagens: Francisco Xavier da Veiga Cabral, do Barão do Rio Branco e de Joaquim Caetano da Silva.

    Muito obrigado, Sr. Presidente. Muito obrigado, Senador Guaracy, pelo aparte. 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/11/2018 - Página 58