Questão de Ordem durante a Reunião Preparatória, no Senado Federal

Apresentação de Questão de Ordem, nos termos dos arts. 60 e 403 do Regimento Interno do Senado Federal, combinados com os arts. 2º, 5º, inciso LX, e art. 37, caput, da Constituição da República, acerca da pertinência da votação aberta e em dois turnos para a eleição do Presidente do Senado.

Autor
Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Questão de Ordem
Resumo por assunto
SENADO:
  • Apresentação de Questão de Ordem, nos termos dos arts. 60 e 403 do Regimento Interno do Senado Federal, combinados com os arts. 2º, 5º, inciso LX, e art. 37, caput, da Constituição da República, acerca da pertinência da votação aberta e em dois turnos para a eleição do Presidente do Senado.
Publicação
Publicação no DSF de 02/02/2019 - Página 14
Assunto
Outros > SENADO
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, QUESTÃO DE ORDEM, OBJETIVO, DEFESA, VOTO ABERTO, ELEIÇÃO, PRESIDENTE, SENADO, PROCEDIMENTO, PRIMEIRO TURNO, SEGUNDO TURNO.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (REDE - AP. Para questão de ordem.) – Sr. Presidente, apresento questão de ordem, nos termos do art. 60, combinado com o art. 403 do Regimento Interno do Senado Federal, bem assim com fundamento no art. 2º; art. 5º, inciso LX; e art. 37, caput, todos da Constituição da República.

    A presente questão de ordem, Sr. Presidente, se resume em dois eixos: primeiro, a defesa da votação aberta – que a eleição para Presidente do Senado seja pelo voto aberto –; segundo, que essa eleição se proceda em dois turnos de votação.

    Fundamento essa questão de ordem a partir dos seguintes argumentos, Presidente.

    O Regimento do Senado, uma resolução legislativa editada em 1970, no auge do regime autoritário, estatui, em seu art. 60, que "a eleição dos membros da Mesa será feita em escrutínio secreto". O seu texto é de clareza meridiana, para uma inteligência apressada da integridade da ordem jurídica vigente. Ocorre, Sr. Presidente, que a ordem jurídica vigente superou esse mandamento do Regimento, que não foi atualizado pela devida reforma do Regimento da Casa.

    Muito embora o Regimento de 1970 preveja in casu votação secreta, trata-se flagrantemente de disposição legislativa incompatível verticalmente com a Constituição de 1988, que elevou o princípio da publicidade à máxima potência, impondo-o como regra das decisões públicas (Constituição da República, Sr. Presidente, art. 5º, inciso LX, já citado anteriormente).

    A excepcionalização de tal imperativo constitucional só se faz legítima quando presentes e conjugados (1) a autorização constitucional expressa e (2) a justa causa subjacente, que se deduz da proteção à intimidade (igualmente direito fundamental, plasmado no art. 5, inciso X, da Constituição) ou ao interesse social (inciso LX, da Constituição da República). No caso em discussão, certamente uma deliberação sigilosa não estaria provida de justa causa e muito menos de previsão constitucional.

    Não há como entender diferentemente, na medida em que, em reverência ao princípio republicano, no tocante às votações no seio do Parlamento, o silêncio da Lei Maior somente pode ser interpretado como compulsoriedade de votação aberta, sendo que as hipóteses de votação secreta, justamente por serem exceção àquele princípio, é que devem estar claramente especificadas no texto da própria Constituição.

    A mesma questão, Excelência, foi decidida nos autos da Medida Cautelar em Mandado de Segurança n° 33.908-DF, da ilustre Relatoria do Ministro Edson Fachin, a qual tive a honra de impetrar junto ao Supremo Tribunal Federal.

    "Não há liberdade à Casa Legislativa em estabelecer, em seu regimento, o caráter secreto dessa votação", disse naquele momento S. Exa. o Ministro Fachin, ao conceder a ordem e determinar a votação em aberto.

    Em nova controvérsia em que se discutiam novamente medidas cautelares, nova decisão do Supremo Tribunal Federal foi prolatada pelo voto aberto.

    Dessa forma, mais recentemente, Sr. Presidente, S. Exa. o Ministro Marco Aurélio, honrando a toga que traja e desprezando os temores e a subalternidade do compadrio, deferiu o pedido, determinando que a votação fosse aberta. Disse S. Exa. o Ministro Marco Aurélio: ''Prevalece, como direito inalienável dos cidadãos, a submissão dos atos de exercício de poder, tanto do Executivo como do Judiciário e do Legislativo, à luz meridiana, dogma do regime constitucional democrático. Constitui fator de legitimação das decisões governamentais, indissociável da diretriz que consagra a prática republicana do poder, o permanente exercício da transparência" – letras de S. Exa. o Ministro Marco Aurélio.

    Como bem anotou o "pai fundador" da democracia americana, Alexander Hamilton, nos multicitados Artigos Federalistas, "o princípio republicano requer que o senso deliberado da comunidade governe a conduta daqueles a quem ela confia a administração de seus assuntos" – deve ser o mais transparente possível, evitando-se, assim, incompatibilidade frontal e absurda entre o senso deliberativo da comunidade e eventuais conluios político-partidários.

    O voto aberto, Sr. Presidente, não é questão de fulanização, de favorecer uma ou outra candidatura: é imperativo da República, que qualifica o Senado enquanto instituição fundamental e o reconcilia com os anseios da sociedade. Só defendem o voto secreto aqueles que acham que a medida das ações Parlamentares não pode ter a transparência necessária, como assim explicita a Constituição. Além dessa questão de ordem pelo voto aberto, Sr. Presidente, ato contínuo, apresento a segunda questão de ordem, sustentando aqui a necessidade de que a eleição do Presidente da Casa se proceda em dois turnos de votação.

    Quanto à votação em turno único ou em dois turnos, o art. 60 do Regimento Interno igualmente prevê que "a eleição dos membros da Mesa será feita em escrutínio secreto, exigida maioria dos votos, presente a maioria da composição do Senado". A leitura literal do dispositivo poderia levar à errônea compreensão de que o quórum necessário para ser eleito Presidente do Senado Federal é de maioria simples, podendo ser eleito Presidente um Senador com maiorias muito precárias, de pouco mais de uma dúzia de votos. Essa controvérsia nunca veio a debate, pois é tradição da Casa eleger por Presidente o indicado pela maior bancada, ou, ainda, haver apenas dois candidatos.

    Entretanto, o cenário atual é de múltiplas candidaturas, sendo possível que o Senador com mais votos tenha não só menos da metade dos votos da Casa, como um número muito aquém desse quórum, trazendo instabilidade indesejável para um início de candidatura e inviabilização do correto andamento dos trabalhos.

    É com base nisso, Sr. Presidente, que arguo a necessidade de V. Exa. decidir as duas questões de ordem que ora apresento. A primeira sobre o voto aberto, destacando que, mais uma vez, o que a Constituição da República estabelece é o voto secreto como exceção. Ora, esta Casa já consagrou o voto aberto como princípio de todas as votações. Não seria de bom sentir a eleição, neste momento, do Presidente do Congresso Nacional, do Presidente do Senado, o quarto posto na hierarquia da República, ser um ato escondido dos cidadãos e cidadãs brasileiros que votaram por um novo tempo no Congresso Nacional, tanto aqui no Senado quanto na Câmara. Portanto, é com base na Constituição, com base em decisões já prolatadas pelo Supremo Tribunal Federal que rogo a V. Exa. que decida, se for o caso, ad referendum do Plenário, pela votação aberta.

    Além disso, submeto também a questão da votação em segundo turno, porque a situação que estamos vivendo, repito, era uma situação não prevista em Regimento. Não será de bom tom que nós tenhamos eleito um Presidente que não tenha a maioria institucional da maioria dos membros da Casa. Traria uma instabilidade institucional indevida.

    Veja, Sr. Presidente, a Constituição da República de 1988 trouxe o fundamento do segundo turno nas eleições para Prefeitos de cidades com mais de 200 mil habitantes, para Governadores de Estado e do Distrito Federal e para Presidente da República. A eleição para Presidente da Câmara, Casa congênere, irmã da nossa, que junto conosco compõe o nosso Parlamento bilateral, o Congresso Nacional, será em dois turnos de votação. Não é de bom sentir que, em uma eleição com vários candidatos, possa ser eleito aquele que não tenha a maioria absoluta e, portanto, possa ter as condições de ter estabilidade institucional para liderar e dirigir esta Casa.

    São as questões de ordem que submeto à análise de V. Exa. e, logo em seguida à análise de V. Exa., caso seja necessário, para ad referendum do conjunto do Plenário, com a quebra dos interstícios regimentais para apreciação.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/02/2019 - Página 14