Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca do impacto da reforma trabalhista na Previdência Social.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Considerações acerca do impacto da reforma trabalhista na Previdência Social.
Publicação
Publicação no DSF de 19/02/2019 - Página 22
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • REGISTRO, EFEITO, REFORMA, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, PREVIDENCIA SOCIAL, COMENTARIO, ALTERAÇÃO, LICENÇA-MATERNIDADE, LICENÇA, PATERNIDADE, TRABALHO, GESTANTE, REMUNERAÇÃO, PRODUÇÃO, CRITICA, PREJUIZO, TRABALHADOR, REFORMULAÇÃO, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT).

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Sr. Presidente, Senador Kajuru, eu vou direto ao assunto, porque, em seguida, tenho uma consulta médica. Como eu já havia anunciado, todo dia eu vou tratar de um tema. Hoje eu vou tratar do tema: o impacto da reforma trabalhista na nossa previdência. Sr. Presidente, este tema, reforma trabalhista e previdência, é algo fundamental para o debate dessa questão da dita reforma, que chegará na quarta-feira e que está sendo anunciada a conta-gotas.

    A reforma trabalhista, que culminou na Lei nº 13.467, trouxe inúmeros prejuízos – ninguém tem dúvida – aos trabalhadores. Vamos dar só alguns exemplos: a prevalência do negociado sobre o legislado significa que quem tem força, nesse aspecto, é quem tem a caneta na mão. Eu me lembro sempre – sou oriundo do tempo do Fundo de Garantia – de que eu chegava à empresa, e o empregador dizia: "Olha, há dois sistemas: o da estabilidade e o do fundo. Qual tu preferes?" Digo: "Olha, eu quero estabilidade". "Então, não há vaga." Eu tinha que optar pelo Fundo de Garantia. Então, é uma negociação que não é uma negociação. Segundo – vamos a mais algumas modificações –, a prevalência também no aspecto da licença-maternidade e paternidade. As alterações permitem que a mulher grávida atue, trabalhe em área insalubre. Isso é delicadíssimo, vai levar doença à mãe e à criança. As férias poderão ser fracionadas, mas, nesse sistema da nova reforma, a maioria não terá nem férias devido à alta rotatividade e ao próprio trabalho intermitente ou trabalho terceirizado, como nós vemos aqui na Casa mesmo como é o rodízio com os terceirizados. A possibilidade de adoção de remuneração por produção, na qual nem o piso salarial da categoria fica assegurado, nem sequer o salário mínimo. Eu vejo nos jornais já estampado: emprego em tal região paga R$400, R$500, R$600. Aí diz o número de horas. Então, nem o salário mínimo. Consequentemente, se você não paga sobre o salário mínimo, o trabalhador, para contribuir para a previdência, vai ter que contribuir com a parte dele e com a parte do empregador, porque o empregador diz: "Olha, eu posso contribuir, mas faltam aqui R$200 para o salário mínimo". Como faz? Ele vai ter que pagar também. A rescisão contratual passa a ser efetivada sem a presença do representante sindical. Aí nós sabemos o que poderá acontecer se não há o advogado da parte mais fraca para acompanhar os cálculos. Estou-me referindo, inclusive, à arrecadação da previdência. O trabalhador poderá ser responsável pelas custas processuais em caso de perda de ação trabalhista. Enfim, fica aberta a possibilidade de terceirização em todas as áreas, inclusive, na atividade fim.

    Na realidade, a reforma trabalhista é um amplo conjunto de mudanças que visa desmontar a CLT – e já desmontou –, que durante décadas representou uma proteção para o trabalhador e para a previdência. Metade das ocupações hoje no mercado de trabalho brasileiro são informais, e a tendência é avançar a informalidade – disso todos nós sabemos. A legislação trabalhista, portanto, atinge hoje algo em torno de 50% dos trabalhadores que estão no mercado. Os outros 50% são informais, são todos informais. O informal não paga a Previdência.

    O Brasil detém um dos maiores índices de rotatividade no trabalho. Um dos principais efeitos da reforma trabalhista é o aumento da rotatividade, com o consequente aumento da informalidade e a redução para a previdência.

    Além disso, esse quadro mostra um horizonte sombrio. Para quem? Para o sistema previdenciário. E isso eu estou falando sem se fazer reforma alguma.

    O aumento da informalidade, a queda do emprego com carteira assinada, o crescimento do chamado processo de pejotização, bastante estimulado pela reforma, além de explícito incentivo à busca pela previdência privada vão impactar também e negativamente o sistema de hoje.

    O estudo recente – vou para um estudo agora – dos pesquisadores – vou dar os nomes – Arthur Welle, Flávio Arantes, Guilherme Mello, Juliana Moreira e Pedro Rossi, da Unicamp, calcula que cada migração do trabalhador do regime celetista para a pejotização – não falo nem sequer para a informalidade – representa uma perda anual em torno de R$4 mil para os cofres da previdência. Cada um, cada cidadão. Esse mesmo estudo estima que, ainda que se considere algum ganho proveniente de uma possível formalização de parte dos autônomos, as perdas previdenciárias com a reforma trabalhista, sobretudo com o estímulo à tão falada PJ, chegarão a R$ 30 bilhões/ano, só nisso.

    Trata-se de um duro golpe no sistema previdenciário, já tonto pela má gestão, pelos desvios – não vou repetir, porque V. Exa. citou há pouco tempo –, pelas sonegações, pela não cobrança de dívidas, pelas roubalheiras, corrupção, pela DRU e pelo próprio Refis.

    Há que se destacar também o efeito sobre a Previdência Social proveniente do chamado trabalho intermitente, ou seja, a reforma trabalhista permite que o trabalhador seja contratado por tarefas, fazendo com que seu rendimento mensal seja pífio. E é claro que não vai pagar a Previdência quem está no trabalho intermitente. Para fins de aposentadoria, a contribuição previdenciária desse trabalhador deverá ser complementada – eu já expliquei antes – por ele mesmo. Na prática, significa a isenção do empregador, que nesse caso não pagará nada. Seguramente, um grande número de trabalhadores não virá a ter condição financeira de arcar com esse ônus, fazendo com que esses indivíduos sejam escorraçados, afastados do sistema previdenciário, ainda que tenham contribuído somente em parte.

    Sr. Presidente, é um processo de exclusão, que poderá vir a atingir milhões de trabalhadores.

    Em resumo, a reforma trabalhista, Lei 13.467, bate negativamente à porta do sistema previdenciário ao reduzir as receitas, também pela tendência à informalidade. A precarização das relações de trabalho reduz o mercado formal, aumentando, por outro lado, consequentemente, a pobreza e a miséria da nossa gente.

    Mas o que eu aperto mais está aqui no fim ainda, sempre respeitosamente.

    Eu queria também dizer: se alguém colocar o nome de um Senador ou de um membro do Executivo, de um Deputado Federal ou de qualquer cidadão da sociedade dizendo que eu usei um termo inadequado, pode saber que é fake. Eu não autorizo ninguém a usar o meu nome para, naquela linha de V. Exa., desqualificar o adversário, não pela causa que ele defende, a que eu posso até ser contra, mas como um ataque pessoal. Jamais faço isso!

    E vou além ainda: sobre essas fake news eu vou fazer uma audiência pública. É algo vergonhoso! Eu recebi um hoje: "Paim recebe auxílio-moradia. Mora num apartamento, tem casa própria e recebe uma ajuda mudança". Eu não tenho nada disso! Não recebo nada disso!

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Kajuru. Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO) – O senhor abriu mão dos dois.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Abri mão de tudo!

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Kajuru. Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO) – Eu vi lá no Portal da Transparência.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Abri mão de apartamento, abri mão de auxílio-moradia, abri mão de recurso extra, mas, vejam bem, eu não estou aqui fazendo nenhuma crítica a alguém que, por um motivo ou outro, não abriu mão, porque a vida é assim. Eu já morei em apartamento; hoje não moro, não preciso. Então, não recebo nada disso, e o fake news, na maior cara de pau, diz que, do Rio Grande do Sul, só o Paim recebe.

    Eu não quero saber se os outros recebem ou não, mas eu não recebo nada disso. Eu quero que... Bom, só falta eu abrir mão do meu salário, porque do resto eu já abri mão de tudo. Isso para ver o que é a maldade que vai no fake news. É uma covardia! É uma covardia!

    Mas, enfim, vamos em frente.

    Mais uma vez, vamos observar o seguinte: os encargos sociais incidem sobre um percentual do salário. Se os salários são menores, a arrecadação cai.

    Contribuições esparsas. Já que o trabalhador somente contribui quando está trabalhando, há um impacto negativo na receita do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. O valor arrecadado para os encargos sociais é muito menor do que o de um trabalhador contratado pelo regime da CLT. Então, cai a arrecadação do Fundo de Garantia e também da previdência.

    Mais uma vez, eu lembro que as alíquotas do modelo denominado Simples – e eu não sou contra – são mais baixas e sem a parte patronal, na maioria dos casos.

    Mas, enfim, o Governo pretende apresentar, na próxima quarta, uma proposta de reforma da previdência. Portanto, oficialmente, não temos nada aqui na Casa ainda.

    Fala-se em uma idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, com contribuição de 40 anos. Não são 40 anos! Sabem quantos são? São 49 anos! Eu não quero citar nomes, mas o que eles fizeram? Pegaram a proposta de reforma da previdência do Governo anterior – não vou citar nomes –, e o Governo atual a está encaminhando para cá. São 49 anos de contribuição e 65 anos de idade.

    Eu vou explicar agora, até porque alguém pode dizer: "Mas como 49 anos?"

    Pois bem, da mesma forma, fala-se em capitalização, ou seja, sistema de poupança individual, que já foi adotado e não deu certo. Os exemplos estão aí. Foi adotado no Chile, e o Chile está voltando atrás. Já está no Parlamento de lá uma proposta. Não deu certo! Não é possível que a gente só olhe para os sistemas que o mundo adota, mas o que deu certo a gente não copia, só copia o que deu errado. No Chile, a maioria dos aposentados ganha meio salário mínimo. É o país onde mais há idosos se suicidando. Isso já foi dito por muitos e eu repito. Não deu certo no Chile, não deu certo no México, não deu certo na Colômbia nem no Peru.

    Conforme aqueles que defendem essa proposta, não teremos mais contribuição. Poxa, se o sistema é de capitalização, é uma poupança individual. Esqueçam! Não haverá mais contribuição sobre o lucro, sobre o faturamento, loteria, PIS/Pasep, Cofins, jogos lotéricos, contribuição sobre a folha de pagamento, que é 20% do empregador, e quando alguém compra ou vende um bem. Sabem o que significa isso? Abrir mão de 75% da receita da Previdência.

    Como eu vou chegar para alguém e dizer: "Olha, a Previdência está quebrada. Só que, daqui para frente, vai dar certo. Sabe por que vai dar certo? Porque eu vou abrir mão de 75% da arrecadação e vou ficar com 25%, que são os 10% do empregado". Eu não sou matemático nem advogado, mas essa conta até eu faço. Como eu vou dizer que vai dar certo e abrir mão de 75%?

    É claro que muitos empregadores pensam: "Bom, se eu não vou pagar nada, melhorou, não pago Cofins, não pago lucro, não pago faturamento, não pago sobre a folha os 20%". Eles podem até ver isso com empatia, mas vai ser uma loucura se isso passar no País.

    Vamos para os finalmentes. Vamos para os finalmentes.

    Agora, eu vou explicar a história de que não são 40 anos, mas 49 anos de contribuição. Aqui eu explico. Nessa situação, eu citei aqui: 40 anos de contribuição; 65 anos, homem; 62 mulher, para aposentar. Mas vamos considerar o seguinte: o camarada começou a trabalhar com 16 anos. Só pode se aposentar com 65 anos. Então, você pega: 16 anos para 65 anos, 49 anos.

    Quem é que começa mais cedo? O filho do pobre. Eu sei, porque – não dou exemplo para ninguém – comecei com oito anos. Que isso não seja exemplo para ninguém. Lugar de criança é na escola. Mas era trabalhar ou passar fome. Fábrica Atílio Bovo, Caxias do Sul, fábrica de vaso. Eu ia, todos os dias, fazer os bolinhos de vaso, jogava aquele bolinho em cima de uma tábula redonda, ele tocava com o pé, porque eu o via fazer. Eu fazia o bolinho de barro, jogava lá em cima, ele fazia o vaso. Era uma forma de ele me ajudar. Era um vizinho. Inclusive, eu o elogio. Era Atílio Bovo, falecido. Era uma forma de ele me ajudar. De tarde, eu ia para a aula, claro.

    Mas digamos que, se começou com 16 anos, para chegar a 65 anos, ele vai ter de contribuir 49 anos. E ainda se ele não perder o emprego no período. Senão, ele vai ter uma série de problemas. Mas digamos que estou pegando o melhor dos mundos: ele sempre trabalhou. São 49 anos de contribuição.

    Essa proposta, o Governo anterior mandou para cá, e o Congresso não quis nem saber. "Se vier para cá, nós vamos derrotar." Daí ele desistiu. Interviu no Rio, porque, se interviesse no Rio, era um motivo constitucional para não haver a reforma da previdência.

    Então, que fique muito claro isto: que esse debate vai longe aqui. Eu quero ver alguém me explicar sobre quem começou mais cedo a trabalhar, sobre como vai se aposentar antes dos 65 anos.

    Estou falando sobre aquilo que eles divulgaram. Vamos além.

    Sem contar que a própria lei da reforma trabalhista, como eu já disse aqui, causa um déficit enorme. Aí, sim, diminui e muito a receita da Previdência.

    Enfim, Presidente, eu termino, porque está tudo escrito aqui, mas eu falei de improviso nessa linha, porque eu disse que vou ao médico e realmente vou.

    Este debate da previdência tem que ser feito exaustivamente. Veja bem: eu não sou contra, Senadores e Senadoras, que a gente construa um entendimento. Todos os governos anteriores – todos – fizeram reforma, e todos nós aprovamos, mas, mediante a sabedoria do Executivo e do Legislativo, construímos uma alternativa. Eu não sou contra que a gente chegue a um patamar comum de entendimento e que vá. Ora, tem de cobrar, não pode mais meter a mão na seguridade.

    Há uma PEC aqui minha, o chamado Projeto nº 15, em que eu digo o seguinte: "Fica proibido destinar para outros fins os recursos da seguridade". Leia-se, saúde, assistência e previdência. Vamos assumir alguns compromissos, executar os devedores. Que se aplique essa PEC daqui para a frente. Por exemplo, vamos parar com essa tal de DRU, com esse tal de Refis. Sabem o que os grandes empresários me diziam na Comissão que eu presidia, na CPI? "Paim, não é justo. Nós pagamos em dia, vira uma concorrência desleal. E o malandro não paga nada. É claro que o produto dele chega mais barato ao mercado do que o meu, porque o picareta, o malandro não paga." E são trilhões, trilhões. Se pegarmos hoje só a dívida ativa junto à União, é mais que R$1 trilhão. A previdência dá 650. Mas não tem essa, vamos cobrar esse R$1 trilhão dos grandes devedores. É dinheiro que entra para ajudar em outras áreas, como saúde, educação, segurança.

    Presidente, eu peço que considere na íntegra o meu pronunciamento.

    Eu só não concedi nenhum aparte, porque tenho que correr agora para o médico. Tenho hora marcada com o médico. E médico é médico, não é?

    Obrigado, Presidente. Obrigado, Sras. e Srs. Senadores.

DISCURSO NA ÍNTEGRA ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR PAULO PAIM.

(Inserido nos termos do art. 203 do Regimento Interno.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/02/2019 - Página 22