Discurso durante a 10ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a Conferência Ministerial para Promover um Futuro de Paz e Segurança no Oriente Médio ocorrida em Varsóvia, na Polônia. Críticas à atual política externa norte-americana com relação à República Islâmica do Irã. Comentários sobre o estreitamento das relações bilaterais entre Brasil e Irã.

Autor
Fernando Collor (PROS - Partido Republicano da Ordem Social/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL:
  • Considerações sobre a Conferência Ministerial para Promover um Futuro de Paz e Segurança no Oriente Médio ocorrida em Varsóvia, na Polônia. Críticas à atual política externa norte-americana com relação à República Islâmica do Irã. Comentários sobre o estreitamento das relações bilaterais entre Brasil e Irã.
Aparteantes
Eduardo Girão.
Publicação
Publicação no DSF de 20/02/2019 - Página 87
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL
Indexação
  • COMENTARIO, CONFERENCIA, REALIZAÇÃO, LOCAL, PAIS ESTRANGEIRO, POLONIA, OBJETIVO, PROMOÇÃO, PAZ, SEGURANÇA, ORIENTE MEDIO, CRITICA, POLITICA EXTERNA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), REFERENCIA, IRÃ, REGISTRO, APROXIMAÇÃO, RELAÇÕES INTERNACIONAIS, BRASIL, PAIS, RELIGIÃO ISLAMICA.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL. Para discursar.) – Exmo. Sr. Presidente desta sessão, Senador Elmano Férrer, Exmas. Sras. Senadoras, Exmos. Srs. Senadores, realizou-se em Varsóvia, na Polônia, entre 14 e 15 de fevereiro corrente, a Conferência Ministerial para Promover um Futuro de Paz e Segurança no Oriente Médio. Copatrocinado pelo Estados Unidos da América, o encontro na Polônia infelizmente excluiu dos seus debates um interlocutor incontornável na geopolítica daquela região: a República Islâmica do Irã, cujo apartamento naturalmente se desdobrou na ausência de outros parceiros imprescindíveis às discussões a que o evento se propunha.

    Vale ressaltar que, naqueles mesmos dias, realizava-se em Sochi, na Rússia, reunião entre os Presidentes russo, turco e iraniano justamente para discutir o processo de estabilização e paz na Síria, talvez este o maior desafio imediato no Oriente Médio. Os Estados Unidos já anunciaram a retirada de suas tropas do território sírio. Deverão, portanto, reorganizar o seu espaço de influência na região.

    Então, pergunto, Sr. Presidente, sobre a Conferência de Varsóvia: qual a seriedade de uma discussão sobre segurança e paz no Oriente Médio sem a participação de iranianos, sírios, libaneses, palestinos, turcos, russos, chineses? Quais os duvidosos interesses por trás de uma reunião mascarada de debate pela paz e pontuada por declarações de guerra?

    Sobre a República Islâmica do Irã, representante norte-americano afirmou, na oportunidade, que Teerã é atualmente "ameaça maior à paz e segurança no Oriente Médio".

    Na visão ingênua e equivocada da atual administração norte-americana, a paz no Oriente Médio não apenas poderia prescindir de negociações com o Irã, como passaria mesmo pela sua anulação no tabuleiro complexo da geopolítica regional. Claro está, portanto, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, que, como em tantos outros temas da agenda internacional, também em relação ao Oriente Médio, o governo do líder norte-americano erra na estratégia e no diagnóstico.

    Pois foi justamente na República Islâmica do Irã que se logrou o avanço mais relevante, no passado recente, para a redução das tensões e a construção de um ambiente de confiança na região.

    Como é de conhecimento de V. Exas., em julho de 2015, após extensas e complexas negociações lideradas pelo então Presidente Barack Obama, logrou-se a assinatura de um acordo histórico em torno do programa nuclear iraniano. Vejam bem, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, esse acordo nuclear foi assinado pelo Irã juntamente com Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia e China, ou seja, os cinco membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas com direito a veto; além deles, a Alemanha e também o aval da União Europeia, ou seja, um consenso absoluto! O acordo impôs condições rigorosas ao programa nuclear iraniano, e a Agência Internacional de Energia Atômica tem atestado o pleno cumprimento das exigências incluídas no pacto.

    No entanto, Sr. Presidente, em maio de 2018, a administração do atual líder norte-americano decidiu, unilateralmente e sem qualquer negociação com seus aliados históricos, abandonar o acordo e retomar o regime de sanções contra o Irã, num claro desrespeito pelos compromissos assumidos, pela segurança jurídica e, sobretudo, pelo amplo esforço de construção de um ambiente de segurança e paz na região.

    Decisões como estas, tomadas, aliás, em outros vários temas da agenda internacional, embasam a suspeita de que o Governo americano patrocina hoje um dos principais fatores de instabilidade e insegurança no mundo. Em que pese a atitude insensata norte-americana, o acordo sobre o programa nuclear iraniano contribuiu para destravar o interesse e o potencial de negócios até então contidos no Brasil em relação àquele país.

    Nos últimos anos, os dois países, Brasil e Irã, têm experimentado um claro processo de estreitamento da relação, tanto do ponto de vista econômico-comercial quanto político-parlamentar. Brasil e Irã têm hoje um comércio bilateral, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, superior a US$2,2 bilhões, com um superávit extremamente favorável ao Brasil, porque do Irã importamos apenas US$40 milhões – dados de 2018 – e exportamos US$2,2 bilhões.

    Como relações desequilibradas dificilmente são duradouras, estão em curso iniciativas para promover certa equiparação das nossas trocas comerciais, sempre atentos aos interesses do setor privado brasileiro, onde há oportunidades de importações de produtos iranianos nos setores de químicos, petroquímicos e fertilizantes.

    Com o comércio bilateral mais equitativo, poderemos explorar alternativas de uso de moeda local nas trocas comerciais, o que facilitará as transações financeiras, sobretudo frente às sanções impostas pelos Estados Unidos, que dificultam o relacionamento bancário do Irã com a comunidade internacional.

    Quanto à ampliação e à diversificação de nossas exportações para o grande mercado iraniano e reconhecendo também o seu potencial, o Conselho de Ministros da Camex, aqui do Brasil, aprovou, no ano passado, mecanismos de financiamento de exportações brasileiras de bens de maior valor agregado e de serviços no valor de 1,2 milhões de euros, em parceria com o BNDES. Tal iniciativa abrirá as portas para a venda de grandes volumes de equipamentos médico-hospitalares, equipamentos e serviços para a indústria de petróleo e gás, implementos agrícolas, ônibus e caminhões, entre outros setores industriais. Isso significa emprego e renda para brasileiros, Sr. Presidente, negócios e trocas de tecnologias para as nossas empresas, além de um maior conhecimento mútuo entre os nossos povos.

    Também nossos Parlamentos estão hoje mais próximos. O Grupo Parlamentar Brasil-Irã tem desenvolvido um trabalho de promoção de negócios e contatos entre os dois países. Eu mesmo, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, tive a oportunidade de visitar o país em novembro do ano passado, na qualidade de Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional daqui do Senado da República.

    Depois de testemunhar as consequências desastrosas da guerra na Síria e o drama humano dos refugiados nos países vizinhos, particularmente no Líbano, mantive encontro com autoridades do governo e do parlamento iranianos. Todos os meus interlocutores enfatizaram o apreço profundo que mantêm pelo Brasil e manifestaram o reconhecimento da posição importante que ocupamos na comunidade internacional, com destaque para a capacidade da nossa diplomacia de fazer a diferença nas negociações internacionais mais desafiadoras.

    A assinatura da Declaração de Teerã, em 2010, com vistas a contribuir para a solução do dossiê nuclear iraniano, foi uma prova da amizade da qual o governo iraniano não se esquece.

    Como visitei o Irã logo após as eleições gerais de outubro de 2018, meus interlocutores manifestaram igualmente vivo interesse em manter o processo de adensamento das relações bilaterais com o novo Governo. Após o resultado das eleições de outubro último, o Presidente do Irã encaminhou mensagem de felicitação ao presidente eleito, desejando-lhe saúde e sucesso e manifestando o desejo de desenvolvimento na relação entre o Brasil e o Irã. O Ministro das Relações Exteriores do Irã realizou visita ao Brasil em abril de 2018, acompanhado de ampla delegação empresarial. Em retribuição, diversos Ministros do novo Governo no Brasil já foram convidados a realizar visita oficial ao Irã, igualmente acompanhados de empresários brasileiros interessados nas inúmeras oportunidades oferecidas por aquele amplo mercado.

    Entendo que ambos os países poderão se beneficiar sobremaneira de uma interlocução mais frequente entre governos, parlamentos, empresários e sociedade civil, a fim de identificar pontos de convergência que nos inspirem e guiem nesse momento de instabilidade mundial.

    Quero deixar claro, por fim, Sr. Presidente, Elmano Férrer, Sras. e Srs. Senadores, que tenho clareza da enorme complexidade de um tabuleiro geopolítico de interesses poderosos e urdiduras muitas vezes insondáveis. E é justamente por isso que defendo, sim, atenção e discernimento persistentes na defesa do interesse brasileiro em nosso envolvimento nas questões afetas àquele Oriente.

    Concordo com as palavras do nosso Ministro das Relações Exteriores proferidas durante a Conferência. Disse ele: "o Brasil está pronto para contribuir com os esforços de paz no Oriente Médio". Dentro da melhor tradição da diplomacia brasileira, entendo que temos o compromisso de colocar o soft power do Brasil à disposição dos esforços sérios e consistentes da comunidade internacional para a busca de consensos e solução política dos conflitos.

    Nesse sentido, defendo, igualmente, esforços incansáveis na construção de um arranjo estável de segurança e paz duradoura no Oriente Médio, o que só será possível – insisto – por meio de negociações abrangentes e inclusivas com todos os atores relevantes na região.

    Tenho confiança de que a diplomacia brasileira continuará dando prova de sua capacidade histórica de defesa do interesse brasileiro, com sabedoria, sensatez, visão estratégica e respeito aos princípios constitucionais da nossa atuação internacional, no que sempre contará – não tenho dúvida – com o acompanhamento atento e o apoio corajoso deste Parlamento.

    Era o que tinha a dizer.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.

    O Sr. Eduardo Girão (Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PODE - CE) – Senador Fernando Collor, concede-me um aparte?

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL) – Por gentileza, com a aquiescência de S. Exa. o Sr. Presidente Elmano Férrer.

    O SR. PRESIDENTE (Elmano Férrer. Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PODE - PI) – Concedido.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL) – Muito obrigado a V. Exa.

    Senador Girão.

    O Sr. Eduardo Girão (Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PODE - CE) – Eu queria lhe dar os parabéns porque eu tenho acompanhado a sua dedicação – que não é de hoje, é de outras legislaturas também – aos assuntos internacionais do Brasil, com muito esmero e com muito cuidado. O senhor comandou a Comissão de Relações Exteriores por mais de uma vez e eu tenho conhecimento do trabalho dedicado de receber, de visitar as autoridades desses países, representando bem o Brasil.

    Então, eu queria dizer que aprendi muito. Quero depois esse texto para me aprofundar. É um assunto em que tenho interesse. Quero dizer que o senhor está de parabéns pela dedicação, pelo trabalho e por se aprofundar cada vez mais nesse assunto. Parabéns!

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL) – Muito obrigado a V. Exa., Senador Girão, que muito honra esta Casa com a sua presença e a sua participação ativa e altiva em todos os debates que aqui se travam.

    V. Exa. vai cada vez mais honrar o Senado da República com a sua atuação. Muito obrigado pelas suas palavras, que incorporo, com muita alegria e satisfação, ao meu discurso.

    O SR. PRESIDENTE (Elmano Férrer. Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PODE - PI) – Senador Fernando Collor, nesta oportunidade, em função do discurso que V. Exa. acaba de pronunciar aqui no Senado, gostaria de ressaltar a forma altaneira, com conhecimento profundo das relações internacionais, como V. Exa. se houve na condução, por duas vezes, da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Sei que V. Exa. trouxe para esta Comissão a experiência e a vivência de um chefe de Estado, como V. Exa. foi.

    De outra parte, nós acompanhamos o esforço de V. Exa. à frente da Comissão de Relações Exteriores, na busca da paz entre as nações, mas sobretudo nas relações internacionais com vistas ao comércio, à importação e à exportação, de como V. Exa. também se houve em momentos importantes da nossa história que certamente V. Exa. traduziu aqui com esse pavio de pólvora que existe no Oriente Médio e em outras nações desses dois continentes, sobretudo o Oriente Médio, na África. E V. Exa. sempre buscou a paz e o entendimento entre as nações. V. Exa. prestou relevantes serviços ao País. Em continuidade ao esforço de V. Exa., quando escancarou as fronteiras do nosso País, um momento histórico do mundo, com a queda do Muro de Berlim, foi histórico o papel de V. Exa.

    Eu queria colher essa oportunidade para ressaltar esse aspecto do governo de V. Exa. É uma contribuição que V. Exa. deu, e continua preocupado com as relações internacionais e com a paz mundial, ao trazer aqui esse discurso que traduziu essa reunião recém-realizada lá em Varsóvia. Eu queria parabenizar V. Exa. pelos relevantes serviços que V. Exa. continua prestando ao nosso País.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL) – Muito obrigado a V. Exa., Senador Elmano Férrer, que preside para a honra de todos nós esta sessão, pelas suas habituais e generosas palavras, das quais eu não sou merecedor, mas eu as recolho como fruto das palavras de um homem com a experiência de V. Exa., com a visão de mundo que V. Exa. possui para com um pronunciamento que acabo de fazer, manifestando minha preocupação em relação às tensões mundiais que nos afligem sim, na medida em que, tanto na área do comércio como na área – essa ainda mais importante – da paz mundial, ela nos traz à reflexão da importância da participação da diplomacia brasileira para concordar com todas as iniciativas verdadeiramente sérias, iniciativas verdadeiramente plausíveis, para que nós possamos ajudar, com o exercício do nosso soft power, na consecução desses nossos objetivos: a paz no mundo.

    Muito obrigado a V. Exa., Presidente Elmano Férrer.

    O SR. PRESIDENTE (Elmano Férrer. Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PODE - PI) – Parabéns, Presidente.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL) – Obrigado a V. Exa.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/02/2019 - Página 87