Discurso durante a 15ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Destaque à importância do voto proferido pelo Ministro Celso de Mello referente à criminalização da homofobia.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Destaque à importância do voto proferido pelo Ministro Celso de Mello referente à criminalização da homofobia.
Publicação
Publicação no DSF de 27/02/2019 - Página 68
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • APOIO, DECISÃO, MINISTRO, CELSO DE MELLO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), OBJETIVO, PUNIÇÃO, CRIME, HOMOFOBIA.

  SENADO FEDERAL SF -

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26/02/2019


    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, senhoras e senhores Senadores, as páginas da história são escritas a partir de acontecimentos, de fatos, de ações, na acumulação de conhecimento. Mas, também, a partir de grandes discursos. Homens e mulheres, governantes, filósofos, cientistas, revolucionários, poetas, artistas, gente do povo.

    Na Grécia antiga, nas praças, no senado romano, nos parlamentos modernos, nas tribunas, nos tribunais, nas assembleias constituintes, nos teatros, nas telas de cinema, nas ondas do rádio, na internet.

    Consagrados vultos lembro aqui: Sócrates, Cláudio, Camões, Galileu, Padre Vieira, Danton, José Bonifácio, Abraham Lincoln, Joaquim Nabuco, Gandhi, Dolores Ibarruri, Tancredo Neves, Pepe Mujica.

    Charles Chaplin, abre aspas, "Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Desejamos viver para a felicidade do próximo. Por que temos de odiar e desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos", fecha aspas.

    Ao ser condenado à prisão perpetua, Nelson Mandela proferiu um dos mais eloquentes discursos da sua vida. "Acima de tudo, nós queremos direitos políticos iguais, porque sem isso nossa impotência será permanente. Acolhi o ideal de uma sociedade livre e democrática, onde todas as pessoas vivem juntas em harmonia e com igualdade de oportunidades".

    Herbert de Souza, o Betinho, ao pregar a solidariedade mundial, assim disse: "Utopia? Sim, e que pode se transformar em realidade. Afinal nascemos para isso, para superar os limites e as situações que nos desumanizam e encontrar os caminhos da nova humanidade, aquela que construímos com a nossa ação, da cidadania, da democracia.

    Sr. Presidente, tomo a liberdade de registrar aqui o voto do Ministro do STF Celso de Mello sobre a criminalização da homofobia, concluído na quarta-feira, dia 20 de fevereiro, considerado por muitos como um voto histórico, abre aspas "uma voz firme na defesa dos direitos das minorias, do relevo e importância da Constituição e seus dizeres e das prerrogativas e competências do Supremo Tribunal Federal".

    Foram 155 páginas em que declarou a mora inconstitucional do Congresso Nacional em criminalizar homo-transfobia e, por isso, o Ministro Celso de Mello defendeu interpretação conforme a Constituição enquanto não houver legislação específica do próprio Legislativo para equiparar a prática à de racismo.

    A marginalização imposta aos integrantes dos grupos LGBTs foi duramente criticada pelo Ministro como sendo uma afronta à própria democracia: "Democracia esta que requer igualdade. Vulnerar populações por aspectos da própria existência é uma ofensa frontal ao Estado Democrático de Direito", afirmou.

    A questão da homossexualidade, conforme Celso de Mello, surgida em um momento no qual ainda não se debatia o tema, tem assumido, em nosso País, ao longo de séculos de repressão, de intolerância e de preconceito, graves proporções que tanto afetam as pessoas, marginalizando, estigmatizando e privando-as de direitos básicos, em contexto social que lhes é claramente hostil e vulnerador do postulado da essencial dignidade do ser humano.

    Celso de Mello faz, no voto, um resgate histórico das perseguições sofridas por este grupo, lembra ele casos recentes de violências, traz dados de mortes de ódio... E aqui, Sr. Presidente, eu lembro que o Brasil é o país onde mais se assassina homossexuais no mundo. O País registrou 445 casos de assassinatos em 2017. Entre 2008 e junho de 2016, 868 travestis e transexuais perderam a vida de forma violenta.

    Ele conceituou o racismo e ressaltou a amplitude do conceito, sendo entendido como uma lógica de exclusão e intolerância.

    Chegando às conclusões da reflexão que promoveu, Celso de Mello fez a defesa da competência e, mais do que isso, do dever do Supremo em acolher o tema e conhecer da demanda: "É por isso que se pode proclamar que o Supremo Tribunal Federal desempenha as suas funções institucionais e exerce a jurisdição que lhe é inerente de modo compatível com os estritos limites que lhe traçou a própria Constituição”.

    Prossegue o Ministro, abre aspas, “(...) portanto, reconhecer que a prática da jurisdição constitucional quando provocada por aqueles atingidos pelo arbítrio, pela violência, pelo preconceito, pela discriminação, e pelo abuso não pode ser considerado, ao contrário do que muitos erroneamente supõem e afirmam, um gesto de indevida interferência da Suprema Corte na esfera orgânica dos demais poderes da República", fecha aspas.

    Sr. Presidente, mais uma vez quero parabenizar o voto do Ministro Celso de Mello.

    Por décadas, séculos, o povo brasileiro tem sofrido: intolerância, preconceito, racismo, perseguição, marginalização.

    Ataques aos direitos básicos, sociais, civis, trabalhistas, ataques à nossa Constituição Cidadã passam a ser rotineiros, em um cenário de total desrespeito as diferenças.

    O País não suporta mais o discurso fragmentado e vazio, posições binárias que só incentivam o ódio e a violência, de uns contra os outros, eles contra nós, num mundo dividido em bem e em mal, em sagrado e profano, entre cruz e espada, entre éticos e corruptos.

    Temos que romper essa barreira, atravessar esse mar tempestuoso, frio, gelado, contrário à verdadeira condição humana, pois ela separa sonhos e esperanças.

    Somos de carne e osso, temos alma, choramos, rimos, somos gente. Nascemos para ser livres, livres como os ventos que abrem caminhos e cortam quietudes nas varandas em fins de tarde.

    Não chegaremos a lugar algum com os vícios das masmorras, com cenários pintados em rubro sangue. O nosso País e a nossa gente são muito maiores do que as discórdias e as inverdades.

    Queremos temperança, equilíbrio, respeito, queremos aço templado na forja do de um pais justo. Somos pedra, fogo e luz que encanta e canta canções e poetiza as suas inquietudes.

    Esse é o Brasil que queremos, um país democrático, que assegure a liberdade, a igualdade e a fraternidade, pois só assim é que esta terra existirá como nação. E a partir do momento que cada um de nós entender que todos somos irmãos.

    E se somos todos irmãos, devemos cantar o amor, desde as profundezas da nossa alma, dos escaninhos do coração. Para que o ódio e a violência, se temos o amor?

    Amor que Carlos Drummond de Andrade assim rabiscou:

“Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar?

Amar e esquecer, amar e malamar, amar, desamar, amar? Sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso, sozinho, em rotação universal, senão rodar também, e amar?

Amar o que o mar traz à praia, o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha, é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto, o que é entrega ou adoração, e amar o inóspito, o cru, um vaso sem flor, um chão de ferro, e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta, distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas, doação ilimitada a uma completa ingratidão, e na concha vazia do amor a procura medrosa, paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.”

    Sr. Presidente, peço, respeitosamente, que registre nos Anais desta Casa o voto do Ministro Celso de Melo sobre criminalização da homofobia.

    Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/02/2019 - Página 68