Discurso durante a 19ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à Proposta de Emenda à Constituição nº 6, de 2019, acerca da reforma da previdência, por concluir que o texto prejudica o trabalhador.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Críticas à Proposta de Emenda à Constituição nº 6, de 2019, acerca da reforma da previdência, por concluir que o texto prejudica o trabalhador.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/2019 - Página 49
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • CRITICA, PROPOSTA, REFORMA, PREVIDENCIA SOCIAL, MOTIVO, REDUÇÃO, DIREITO, PREJUIZO, CLASSE, TRABALHADOR.

  SENADO FEDERAL SF -

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11/03/2019


    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, a minha fala no dia de hoje terá como foco o sistema de capitalização, que consta na PEC 06/2019, da reforma da Previdência.

    Depois de alguns dias lá no meu estado, o Rio Grande do Sul, eu estou de volta a esta Tribuna para falar de um assunto que está mexendo com as emoções de todos. Como a gente diz, está na boca do povo: a reforma da Previdência.

    Nos jornais, nas rádios, nas emissoras de televisão, no Facebook, no Twitter, no Instagram, enfim, nas redes sociais, nas paradas de ônibus, nas padarias, refeitórios de fábricas, colégios de ensino secundário e nas universidades o que se fala e se comenta é a reforma da Previdência.

    As pessoas estão se dando conta e estão procurando informações sobre o assunto. Elas estão muito preocupadas. Essa é a impressão que eu tenho. Pois tenho conversado muito com trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, com professores, com policiais, com metalúrgicos, terceirizados, aposentados, com pais e mães, com estudantes. Paim, o que vai acontecer? - as pessoas me perguntam. E é uma pergunta generalizada, espraiada em toda a sociedade.

    Ainda ontem no aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, antes de embarcar aqui para Brasília, o seu Antônio, aposentado, que estava indo para São Paulo, me questionou sobre o que estávamos fazendo contra, segundo ele, abre aspas, "este absurdo que é a reforma da Previdência, nos moldes que o Governo Federal está pregando", fecha aspas. Estamos estudando detalhadamente a PEC 06, resistindo e querendo dialogar, respondi.

    Cada vez mais chegamos à conclusão que essa proposta tem o objetivo de explodir a Seguridade Social, acabar, para ser mais direto, liquidando com a ideia de que a aposentadoria é um direito sagrado, e levando as pessoas a recorrer a planos privados de previdência.

    E o pior, eu disse ao seu Antônio, é que eles querem que a população acredite que sem a reforma o sistema vai quebrar. Isso é enganar a sociedade, ludibriar a consciência e a inteligência das pessoas.

    O foco real, privatização, é de uma crueldade jamais vista.

    O Governo está optando em reduzir os direitos sociais dos setores mais pobres da população. Há 50 milhões que vivem na extrema pobreza hoje no Brasil. Ou seja, uma injustiça como nunca vista antes no País. Por que eu digo isso, senhoras e senhores?

    Porque o Governo Federal cria uma enorme onda de barreiras e critérios, injustos obviamente, para que os trabalhadores e as trabalhadoras não se aposentem ou, se conseguirem se aposentar, recebam do INSS um salário de miséria que vai matar à míngua o beneficiado.

    Hoje, são 35 milhões de beneficiados diretos, incluindo a assistência social. Indiretamente, colocando mais dois membros por família, isso significa 100 milhões de pessoas beneficiadas pela previdência pública.

    Tirando em miúdos, como a população fala: a proposta fixa em 62 anos de idade para a mulher se aposentar e 65 anos para o homem, ambos com 40 anos de contribuição para ter 100% do benefício.

    Isto, observem bem, aumenta de acordo com o aumento da expectativa de vida do IBGE. Se daqui cinco anos a expectativa aumentar um ano, a idade mínima da mulher passa para 63 e a do homem para 66. Daqui a pouco vão querer que as pessoas tenham 80, 90 anos para se aposentar.

    A proposta de reforma da Previdência que está aí rompe com o modelo de proteção social que o País vem colocando em prática e garantindo há mais de 100 anos.

    Esse modelo é para aquelas pessoas que mais precisam, são condições mínimas de sobrevivência, para se poder viver. Não é investimento, é proteção social.

    A Constituição Cidadã de 1988 instituiu a Seguridade como um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da Sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à Saúde, Previdência Social e Assistência Social. E isso tudo é ancorado pela solidariedade do sistema.

    Saiba, seu Antônio, ainda continuando a nossa prosa, mas, falando agora para a dona Maria, o jovem Pedro que está com 15 anos, para milhões de brasileiros e brasileiras que estão com a pulga atrás da orelha e que estão vendo a coisa feia, sem perspectiva, que, infelizmente, a proposta de reforma que está aí é uma proposta para excluir a população do sistema de seguridade, de proteção, de igualdade e de justiça para um sistema de seguro individual, o chamado regime de capitalização.

    A capitalização é o ponto central da reforma da Previdência.

    Ela acaba com o sistema solidário. Com um pacto social que tem levado dignidade às pessoas, a milhões de brasileiros.

    Hoje, uma geração trabalha para pagar benefícios da geração anterior. E, ainda, essa mesma geração atual paga pela manutenção dos benefícios pagos as pessoas da mesma geração que estão impossibilitados de trabalhar, em virtude de doença, maternidade e etc.

    Essas contribuições que eu estou falando aqui são direcionadas para um fundo único destinado ao pagamento dos benefícios já concedidos. Isso é um sistema que distribui renda. Esse é o sistema atual que querem acabar.

    Vários países implantaram o sistema de capitalização: Chile, Peru, Colômbia, México. Não deu certo.

    No Chile, o modelo de previdência privada falhou. Quase 40 anos após a reforma da Previdência, os valores das aposentadorias são baixos, o que equivale a meio salário-mínimo. Quase metade dos aposentados vivem abaixo da linha da pobreza. Temos notícias que muitos se suicidaram. Triste, é muito triste. É isso que nós queremos para o Brasil?

    Portanto, eu digo aqui, os dois movimentos que a proposta de reforma do Governo Federal pretende: o fim do sistema solidário e a migração para o sistema de seguro, privado, pago, de planos de capitalização.

    Saiba, seu Pedro, que está com 15 anos, a capitalização da Previdência é como uma poupança pessoal que você terá que fazer quando começar a trabalhar. Você terá que depositar todos os meses um percentual do seu salário para conseguir se aposentar no futuro.

    Agora, se você ficar muito tempo desempregado, fazendo bicos ou totalmente sem renda, nunca conseguirá se aposentar ou se aposentará recebendo até metade do salário mínimo do País. Isso é muito cruel. Ah, só para lembrar, a rotatividade no emprego aumentou em muito após a reforma trabalhista, e tende a aumentar ainda mais.

    Ainda pela proposta, o valor que o trabalhador e a trabalhadora terão que descontar, contribuir para o sistema, mês a mês, são previamente definidos, mas o valor a ser definido é incerto, porque varia de acordo com o valor da contribuição ao longo do tempo, do tempo de contribuição e da rentabilidade, além do custo de administração do fundo.

    Em português bem claro: o segurado não sabe qual o valor do benefício que terá direito. E, assim, seu Antônio, dona Maria, jovem Pedro, o planejamento pessoal e familiar fica totalmente prejudicado. Ninguém sabe o que vai acontecer. O próprio Governo não explica. Ele joga tudo para lei complementar, que é gravíssimo, um cheque em branco.

    Há muitos conflitos nessa questão da capitalização. Entre eles, a não obrigatoriedade de contribuição dos empregadores.

    O texto afirma apenas que há possibilidade de contribuições patronal e do trabalhador, dos entes federativos e do servidor. É vedada a transferência de recursos públicos.

    Isso significa perda de arrecadação para o atual sistema de repartição e compromete o pagamento dos atuais aposentados e pensionistas e dos que venham a se aposentar pelo atual modelo.

    Há outra questão, que é o custo de transição de um regime para outro, do solidário para o de capitalização.

    Se a nova geração deixar de contribuir para o atual regime passando a capitalizar sua conta pessoal, quem pagará os benefícios dos que atualmente recebem benefícios (aposentados, pensionistas, outros) e dos que vierem a aposentar pelo atual regime de repartição?

    Em matéria publicada no Globo.com, em 12 de janeiro, especialistas estimam perda de arrecadação superior a 400 bilhões porque, uma vez feita a mudança para o sistema de capitalização, os trabalhadores passariam a contribuir para sua aposentadoria individual, deixando de pagar os benefícios dos trabalhadores que já estão aposentados.

    Lembro que o Governo estima economizar ao longo de 10 anos 1,1 trilhão. Mas a CPI da Previdência mostrou que nos últimos 30 anos mais de 4 trilhões de reais foram pelo ralo da Previdência: sonegações, desvios, desonerações...

    Passados alguns dias da apresentação da proposta, especialistas do mercado financeiro afirmaram que, com os ajustes da proposta pelo Congresso Nacional, a capacidade de economia será desidratada e deve reduzir o impacto fiscal para o patamar de R$600 a 800,00 bilhões.

    Mas a questão aqui é outra. Não podemos cair na imperfeição, no simples olhar do mercado e do sistema financeiro. Eles enxergam somente números e gráficos...

    Nós, reconhecemos vidas, lágrimas, bocas, sorrisos, suor, mãos calejadas.

    O Governo não economizará, pelo contrário, essa economia que eles tanto falam levará milhões de brasileiros e brasileiras para os cruéis cenários de miséria e pobreza.

    Sr. Presidente, afinal, o que de fato, está por traz da reforma da Previdência? É isso que as pessoas estão perguntando. O Brasil quer saber. Milhões de antônios, marias e pedros querem respostas.

    A Previdência solidária dá dignidade ao ser humano. Dá luz aos sonhos, desperta a esperança, liberta a alma, encanta o espírito, nutre a paz social, apoia a causa da existência maior: a vida.

    Para finalizar, quero informar que, hoje pela manhã, a Comissão de Direitos Humanos do Senado debateu a reforma da Previdência e o impacto na vida dos trabalhadores e trabalhadoras rurais.

    Cito, está aqui neste plenário, a coordenadora da Fetraf-Sul (Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar - RS), Cleonice Back, que também é minha primeira suplente. E, na sua pessoa, eu parabenizo a todos que estiveram lá, passando suas impressões sobre a reforma da Previdência. Já a minha segunda suplente, Reginete Bispo, em breve estará aqui em Brasília falando sobre Previdência Social, discriminações e racismo.

    Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/2019 - Página 49