Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao Presidente Jair Bolsonaro pela postura de S. Exª e da comitiva que o acompanha em missão oficial nos Estados Unidos.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Críticas ao Presidente Jair Bolsonaro pela postura de S. Exª e da comitiva que o acompanha em missão oficial nos Estados Unidos.
Publicação
Publicação no DSF de 20/03/2019 - Página 28
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, JAIR BOLSONARO, GRUPO, ACOMPANHAMENTO, MISSÃO OFICIAL, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), VISITA, AGENCIA, ESPIONAGEM.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para discursar.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Sras. Senadoras, os que nos acompanham pela TV Senado, pela Rádio Senado, os que nos acompanham pelas redes sociais, hoje, eu havia decidido não fazer críticas ao Governo Bolsonaro; queria falar um pouco sobre o Presidente Lula, sobre a perseguição que ele vinha sofrendo, mas, infelizmente, o Governo não permite que nós deixemos passar em brancas nuvens tantas coisas que vêm acontecendo.

    O meu sentimento, hoje, Sr. Presidente, é aquele chamado de vergonha alheia, quando a gente assiste a alguém cometer uma série de insanidades, de erros, de equívocos e nos envergonhamos por essas pessoas. Logicamente que eu também estou envergonhado como brasileiro, mas a vergonha alheia não poderia deixar de existir numa questão como essa.

    No início da ditadura militar, houve um jornalista que se caracterizou por, com muito humor, fazer uma oposição bastante criativa ao regime militar. Seu nome era Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta, que escreveu, entre outros livros, Garoto Linha Dura e duas edições de O Festival de Besteira que Assola o País – quer dizer, assolava naquela época. Se Stanislaw Ponte Preta, que era o seu apelido, estivesse vivo, certamente ele hoje teria muita coisa para escrever sobre o Brasil de Bolsonaro.

    Eu me lembro de que uma das coisas que ele caracterizou e falou muitas vezes foi de quando Juracy Magalhães, ex-interventor, ex-Governador da Bahia, ex-presidente da UDN, foi nomeado Embaixador do Brasil nos Estados Unidos e, no seu discurso de posse, em determinado momento, ele cunhou essa pérola em que ele dizia: "O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil". Lamentável sob todos os aspectos. E o que nós estamos assistindo desde ontem, com a visita de Bolsonaro aos Estados Unidos, é revivermos aquele momento de O Festival de Besteira que Assola o País.

    Vejam, por exemplo, a afirmação do Ministro da Economia, Paulo Guedes. Ele disse: "O Presidente ama os americanos; eu também. Adoro jeans, Coca-Cola, Disneylândia". Acho até que eles devem passar lá em Orlando, na Flórida, antes de chegarem, para baterem uma selfie com o Pateta, lá na Disneylândia, porque isso é uma vergonha para o nosso País. Um país cujo Presidente vai à maior potência mundial, levando um exemplo de política externa errática, sem afirmação da soberania nacional, sem compreensão do papel e da influência geopolítica que o nosso País tem no mundo, que poderia ser ainda muito maior se nós não estivéssemos presos a um discurso apequenado, a preconceitos, a profissões de fé, a equívocos os mais diversos.

    O Presidente começou agredindo os brasileiros que moram nos Estados Unidos. E não moram ilegalmente porque querem. E não estão lá porque querem usufruir do modo de vida americano, mas para lá foram para tentar sobreviver, para tentar garantir o sustento das suas famílias. Por isso, são perseguidos o tempo inteiro pela polícia americana, pelos agentes de fronteira, pelos agentes da justiça.

    E o Presidente deu também esta afirmação: "A grande maioria dos imigrantes em potencial não tem boas intenções nem quer o melhor ou fazer bem ao povo americano". Vejam que afirmação! Trata-se do Presidente da República falando sobre os seus compatriotas que vivem nos Estados Unidos e foram para lá, por exemplo, porque no Brasil não encontram espaço para sobreviver, não encontraram trabalho.

    Nestes últimos dois anos, por exemplo, quando houve o golpe e o Governo Michel Temer, inverteu-se um fluxo que havia, já em metade do Governo Lula, que era de as pessoas estarem vindo do exterior para o Brasil, os brasileiros que lá estavam. E, agora, por todos os meios, legais ou clandestinos, há gente querendo viver em outros países, e o Presidente da República diz uma coisa como essa. Assim como o Presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, o Deputado Eduardo Bolsonaro, que disse que os imigrantes ilegais em outros países eram uma vergonha para o Brasil.

    Nossa Senhora! Quanta bobagem que a gente observa num espaço de tempo tão curto.

    Vai o Presidente e, num jantar com a extrema direita americana, diz que o Brasil estava caminhando para o socialismo e que, agora, ele está promovendo uma reversão.

    Pelo amor de Deus!

    O Presidente da República, com certeza, sabe o que é o socialismo. Deve saber o que é o comunismo. E, aí, dizer que o Brasil marchava para o socialismo ou para o comunismo é uma... Na verdade, ele fez mais uma fake new, inventou mais uma mentira. Disse na frente do "astrofilósofo" – mistura de astrólogo com filósofo autodidata – o escritor Olavo de Carvalho que, portanto, estava dando um novo rumo para o Brasil, que marchava para o socialismo. E disse que a França era socialista, porque as fronteiras da França estavam e estão abertas. Defendeu o muro da vergonha de Trump, o muro entre o México e os Estados Unidos. Utilizou a velha retórica simplista para, mais uma vez, se colocar automaticamente alinhado aos Estados Unidos no tema da Venezuela, elogiando a capacidade bélica dos Estados Unidos. Ainda bem que o porta-voz da Presidência, o Gen. Rêgo Barros, depois deu uma declaração à imprensa dizendo que não há hipótese de o Brasil se envolver numa intervenção armada na Venezuela, apesar disso ser o desejo de Trump e do seu amigo Bolsonaro.

    Mas, Sr. Presidente, o pior fato mesmo acontecido nessa viagem, uma vergonha para o Brasil, uma vergonha para a cidadania brasileira, uma vergonha para a nossa democracia...

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – ... para a América Latina, foi o Presidente da República fazer uma visita a uma agência de espionagem dos Estados Unidos, a CIA. Ele, o Ministro da Justiça Sergio Moro, o filho do Presidente e mais uma reca de xeleléu foram à CIA, uma agência de espionagem que espiona o Brasil há décadas, que foi responsável pela implantação da ditadura mais sanguinária da América Latina, que foi a ditadura de Pinochet. É como se viesse um presidente de outro país e fosse visitar o serviço secreto de algum órgão do Governo brasileiro. E disseram que foram discutir a situação da Venezuela. Pelo amor de Deus!

    Ministro Sergio Moro, o senhor que conquistou uma reputação – tenho muitas divergências em relação ao conceito que muita gente tem sobre o senhor, como nós, do PT, temos também –, o senhor, pelo menos, conquistou uma reputação. Respeite o povo brasileiro, tenha compostura como Ministro da Justiça! Sair do Brasil para fazer visita à CIA, nos Estados Unidos, é uma coisa profundamente lamentável.

    Ia ser secreta, é porque o filho do Presidente ficou tão feliz que não conseguiu conter a sua emoção e terminou ele mesmo divulgando, no seu Twitter, que o Presidente ia visitar a CIA. Sinceramente, não dá para a gente acreditar no que está vendo.

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Houve ataques à China nesse jantar – a China que é o maior parceiro comercial do Brasil, com quem nós temos um superávit na balança comercial de US$32 bilhões por ano –, que foi atacada pelo Ministro da Economia, foi atacada pelo Ministro das Relações Exteriores, pelo Presidente. Ainda bem que a Ministra da Agricultura pensou no que isso podia representar e ali manifestou uma posição diferenciada, porque o Brasil vende muitos produtos agrícolas para a China.

    Completaram a subserviência entregando aos Estados Unidos o uso da Base de Alcântara, sem qualquer contrapartida importante... 

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Vou concluir, Sr. Presidente.

    ... e dispensando americanos, japoneses, canadenses e australianos da exigência de visto para ingressarem no nosso País. 

    Em contrapartida, os Estados Unidos não deram nada, a não ser mais um bonezinho de Trump para 2022. Mas em contrapartida para o Brasil nada!

    Vá o brasileiro querer ir para os Estados Unidos, tem que pagar uma taxa elevadíssima, tem que se submeter a várias visitas aos consulados, às vezes, tem que ir para outro Estado. Quando chegam aos Estados Unidos, os estrangeiros são tratados como se fossem terroristas em potencial. E o Brasil vai lá e entrega para eles o direito de virem ao nosso País sem precisar de visto.

    E ainda diz: "Imagine se um americano vai querer vir ao Brasil e ficar trabalhando aqui". Quer dizer, isso é exatamente o que Nelson Rodrigues chamava do complexo de vira-latas – esse é o autêntico complexo de vira-latas. E este Governo encarna mais do que qualquer outro, Sr. Presidente, esse complexo de vira-latas.

    Não é por acaso que hoje a hashtag que está em primeiro lugar no Brasil é #vergonhadebolsonaro. E eu quero dizer que tenho vergonha, também, de ter no meu País um Governo como este, que faz essa verdadeira matutada – lá no Nordeste a gente chama quem faz isso de matuto, é um capiau.

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Chega aos Estados Unidos e fica embasbacado – embasbacado!

    Lamento, Sr. Presidente, é muito pouco para um País com a relevância e a importância que o Brasil tem.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/03/2019 - Página 28