Discurso durante a 42ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Esclarecimentos sobre posicionamento de S. Exª a favor da CPI da Toga e da análise de pedido de impeachment do Ministro Gilmar Mendes. Críticas ao controle externo do Poder Judiciário.

Autor
Jorge Kajuru (PSB - Partido Socialista Brasileiro/GO)
Nome completo: Jorge Kajuru Reis da Costa Nasser
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Esclarecimentos sobre posicionamento de S. Exª a favor da CPI da Toga e da análise de pedido de impeachment do Ministro Gilmar Mendes. Críticas ao controle externo do Poder Judiciário.
Publicação
Publicação no DSF de 04/04/2019 - Página 18
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, POSIÇÃO, ORADOR, DEFESA, ABERTURA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), JUDICIARIO, ANALISE, PEDIDO, IMPEACHMENT, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), GILMAR MENDES, CRITICA, CONTROLE, PODER PUBLICO.

    O SR. JORGE KAJURU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO. Para discursar.) – Brasileiros e brasileiras, V. Exas., nossos únicos patrões, peço humildemente à Pátria amada atenção a este pronunciamento que eu preparei de cabeça erguida, de forma equilibrada. Porém, tenho certeza, Presidente da sessão, Vice-Presidente da Mesa, nossa orgulhosa reserva moral das Minas Gerais, Senador Antonio Anastasia, saiba que qualquer outro Parlamentar deste País minimamente independente adoraria fazer este pronunciamento.

    Quem luta pela causa justa não está sujeito a derrotas. Mesmo quando o tempo de nossa breve existência se torna insuficiente para construirmos a vitória de nossas ideias, ou quando a morte ameaça interromper nosso bom combate, a causa justa e necessária se eterniza no coração, nas mentes e nas jornadas de outros sonhadores que nos sucedem. Como seu empregado público, digo, brasileiros e brasileiras: outros quixotes destemidos empunharão nossa bandeira e a carregarão contra as tempestades até o colo das gerações futuras. Por isso meu lema, Presidente Anastasia, é lutar e lutar e lutar sempre!

    Quando me dispus a enfrentar o dragão do Judiciário brasileiro, sem lanças e sem escudos, desafiei a sua face simbólica mais conhecida e perversa. Eu, armado apenas da verdade. Assinei – e fui o primeiro – o requerimento da CPI da Toga e acolhi como pertinente a abertura – também fui o primeiro a assinar – do processo de impeachment do Ministro Gilmar Mendes. E o fiz com a mesma indignação que nosso povo dedica a uma Justiça injusta, que não se cumpre, que tarda e falha.

    Para comprovar as suas gravíssimas deficiências, não é necessário sequer analisar as denúncias de corrupção, venda de sentenças, abuso de autoridade, ativismo judicial ou advocacia administrativa. Basta constatar a vergonha que deveria cobrir um País que teve, em 2016, pasmem, um número de presos sem condenação maior do que o de condenados: 292 mil presos sem condenação, para 275 mil condenados. Pessoas jogadas nas masmorras, imundas em todos os sentidos. Cenas dantescas se repetem diariamente, cenas de horror, espancamentos, estupros, assassinatos, decapitações; o holocausto de uma guerra acobertada pela hipocrisia da Justiça ou pela falta da Justiça. Nossas prisões são navios negreiros estacionados em todos os cantos do Brasil, carregados de corpos, de crimes, de doenças, de gritos de dores inaudíveis.

    Senhoras e senhores, a quem o povo, com seu sagrado voto, encarregou de fiscalizar isso? Pergunto. De legislar sobre isso? Pergunto. De corrigir isso? Pergunto. A nós, a nós Parlamentares deste Congresso Nacional.

    Pois bem, como diria o genial imortal Suassuna, pois bem, quando fiz minha a voz indignada da Pátria amada – foi minha a voz indignada de uma Pátria amada – na defesa da CPI da Toga e do impeachment do Ministro Gilmar Mendes, recebi muito apoio popular, de todo o País, mas também algumas críticas, Presidente Anastasia.

    E hoje aqui quero respondê-las, com equilíbrio, aos que me acusaram de colocar em risco a estabilidade democrática, de instigar um conflito entre Poderes e de facilitar pretextos para retrocessos golpistas e antidemocráticos. (Risos.)

    Permita-me a risada.

    Lamentavelmente, os que assim pensam não aprenderam com a história. A história não cansa de nos ensinar que a democracia se torna vulnerável quando as instituições perdem o respeito do povo, quando elas viram-se de costas para os interesses da maioria e se transformam em bunkers de privilégios.

    Alguém aqui, neste cenário, neste Senado, e no outro cenário, que é a Câmara, é capaz de afirmar que, nesses 30 anos desde a Constituição de 1988, a legitimidade democrática das instituições se fortaleceu? Pergunto. Pois a realidade me diz o contrário: me mostra a diminuição crescente do prestígio popular da democracia.

    Portanto, aqueles que, a pretexto de não criar atrito entre os Poderes, temendo ataques à democracia, estão ajudando a criar o caldo de cultura favorável aos propósitos antidemocráticos. Estes, que se arvoram cautelosos e sábios, só têm olhos para os de cima e se esquecem dos de baixo e cometem um erro fatal a meu ver, humildemente. Quando acordarem – quando acordarem –, será tarde.

    É por isso que conclamo, com todas as minhas forças, V. Exas., Senadores e Senadoras, a resgatarmos já o princípio da soberania popular. É preciso estendê-lo a todas as instâncias do sistema de Justiça neste País, sob pena de omissão criminosa deste Legislativo.

    O Senado da República aproveita agora a energia que se liberou com a proposta da CPI da Toga e o pedido de impeachment de Gilmar Mendes e legisla para superar as lacunas no nosso Judiciário ou, tenho certeza, seremos responsáveis por abafar a justíssima aspiração popular deste País.

    Reafirmo meu compromisso com essas inadiáveis mudanças. E que comecemos buscando desfazer a miscelânea que se estabeleceu quanto ao papel do Supremo.

    O acúmulo de funções de Instância Revisora Superior e Corte Constitucional tem se mostrado robustamente inadequado. O STF concentra poder demais e eficiência de menos. Revisando decisões das sentenças de instâncias inferiores, interpretando a Constituição à revelia da letra da lei e legislando, o STF pisoteia a soberania do Legislativo. Além disso – para concluir –, temos que redefinir os critérios e competências para a composição do STF e, sem temor, definir a norma aplicável à destituição dos ministros que o compõem. Não é possível que continuem sendo nomeados exclusivamente pelo Executivo, reserva moral do Estado do Paraná, Senador Flávio Arns. Isso, penso, é uma distorção grave. É necessário democratizar esse processo.

    E, por fim, outro tema incontornável é a questão do controle externo do Judiciário, que foi muito mal resolvido pelo Constituinte de 1988 e também pela Emenda Constitucional nº 45/04, que institui o Conselho Nacional de Justiça, o famoso CNJ. Nesse caso, Pátria amada, é perfeitamente cabível dizer que a emenda ficou pior que o soneto – a emenda ficou pior que o soneto! –, meus únicos patrões. Na verdade, o CNJ foi criado como órgão de juízes destinado à proteção de juízes. Ou não? Criou-se, assim, um verdadeiro círculo de ferro do corporativismo e da impunidade. O País necessita urgentemente de um órgão assentado na soberania popular, que seja capaz de julgar e punir juízes e ministros das Altas Cortes, dentro do respeitado devido processo legal.

    Concluo: como não enfrentar, Senador Antonio Anastasia, a polêmica questão de uma lei necessária para coibir o abuso de autoridade em todos os Poderes, inclusive no Judiciário? Aqui coloco interrogação ou coloco o quê? Exclamação? Não. Interrogação? Para mim, exclamação.

    A rejeição do Judiciário à ação fiscalizadora republicana vem de longe, é um tipo de reivindicação da condição de casta superior acima do povo, um tipo de privilégio indefensável, irresponsável, corporativo, baseado no "julgamento interpares" – entre aspas. V. Exa., conhecedor jurídico, entendeu bem. Esse tipo de poder, sem controle, inevitavelmente acaba se chocando com a soberania popular e se transformando – ele, sim – em algoz da democracia.

    A sociedade democrática exige que os princípios republicanos imperem em todos os Poderes: no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. Aqueles que hoje derem as costas a essa exigência ouvirão as batidas do tempo nas portas de suas consciências amanhã, quando o arbítrio bater à porta de suas casas.

    Encerro: voltarei a esse tema brevemente, apresentando um conjunto de proposições destinadas a estabelecer formalmente esse debate aqui, no Senado Federal.

    Agradecidíssimo pelo tempo, pela tolerância, Presidente desta sessão, estimado Antonio Anastasia, e aqui, de forma emocionante, entendo eu que, depois de cinco dias preparando este pronunciamento, saio desta tribuna de cabeça erguida.

    Agradeço.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/04/2019 - Página 18