Discurso durante a 47ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Indignação com a persistência do trabalho escravo no Brasil.

Autor
Paulo Rocha (PT - Partido dos Trabalhadores/PA)
Nome completo: Paulo Roberto Galvão da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Indignação com a persistência do trabalho escravo no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 11/04/2019 - Página 54
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • CRITICA, MOTIVO, SITUAÇÃO, CONTINUAÇÃO, TRABALHO ESCRAVO, PAIS, COMENTARIO, JORNADA DE TRABALHO, ABUSO, REALIZAÇÃO, EMPRESA, INDUSTRIA, EMPRESA RURAL.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA. Para discursar.) – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, aqueles que estão nos assistindo e nos ouvindo, eu queria dedicar este pronunciamento, em que vou tratar sobre trabalho, aos nossos auxiliares mais íntimos que tratam do dia a dia das nossas vidas. São os chamados terceirizados, são aqueles que nos tratam bem lá dentro dos nossos gabinetes, com cafezinho etc. Queria dedicar-lhes este pronunciamento. É para vocês aprenderem a lição que nós já aprendemos há algum tempo de que só unidos e organizados conquistamos aquilo que queremos. Foi exatamente a reação de vocês, nos corredores da Casa, do próprio patrão, que fez com que outros Senadores se mobilizassem para colocar em pauta um projeto que vem fazer justiça. Por isso, os trabalhadores têm de continuar assim: de cabeça erguida, unidos e organizados para conquistar o Brasil que nós queremos.

    Parabéns a vocês! (Palmas.)

    Presidente Paim, o que vou falar aqui tem muito a ver com nós dois nessa luta desde a Câmara Federal.

    Hoje venho falar sobre a questão do trabalho escravo, e não me venham dizer que é coisa de trabalhador radical ou de petista. A realidade, ainda, é nua e crua, apesar das leis que nós já aprovamos aqui. A realidade do trabalho escravo no Brasil traz para nós a necessidade de denunciarmos permanentemente esse crime hediondo. Para mim especialmente, pois já em 1995, quando eu era Deputado Federal e V. Exa. era Presidente da Comissão do Trabalho, apresentei duas propostas que se tornaram leis no País e que são utilizadas até hoje para combater o trabalho escravo: a Lei 9.777, de 1988, oriunda de um projeto de lei de minha autoria; e a Emenda Constitucional nº 81, baseada na PEC apresentada por mim, que logramos aprovar para criminalizar o trabalho escravo no Brasil.

    Hoje, senhoras e senhores, essa prática nefasta se ramifica de diversas maneiras: grandes empresas submetem pessoas a jornadas de trabalho abusivas, em condições precárias; fazendeiros, no interior dos nossos Estados, insistem em manter trabalhadores em condições sub-humanas. Chegamos a ter pessoas tratando os seus semelhantes em condições análogas à de escravo, traficando crianças, mulheres, homens, para serem subjugados a esse tipo de trabalho. Tudo isso precisa ser continuamente denunciado e combatido pela sociedade.

    Segundo dados do Ministério do Trabalho, de 1988 até abril deste ano, mais de 52 mil pessoas foram libertadas do trabalho escravo e de trabalho análogo ao de escravo. No mesmo período foram libertados, no meu Estado, mais de 12,4 mil pessoas.

    Aqui vem a comprovação disso que eu estou falando. Foi uma outra coisa que nós fizemos através de processo do próprio Governo: a publicação da lista suja.

    Em decorrência da legislação avançada, que ajudei a construir em 2003, foi lançada a lista suja das empresas que praticam esse tipo de crime. Assim, o Governo Federal deixa de contratar o serviço dessas empresas, e o cadastro era e ainda é utilizado para análise de risco por investidores. Além disso, há empresas brasileiras e internacionais que evitam fechar negócios com esse tipo de empregadores.

    Essa lista era divulgada pelo Ministério do Trabalho, que, infelizmente, foi extinto pelo atual Governo. A nova lista suja do trabalho escravo, divulgada em 3 de abril de 2019, pelo Ministério, agora, da Economia, traz mais 48 empregadores. Ao todo, eles submeteram 485 pessoas a condições abusivas e precárias, ou seja, ao trabalho escravo. Com as novas inclusões somadas às que já existiam, agora são 187 empregadores flagrados explorando mão de obra.

    É um absurdo um País democrático ter em sua biografia empresários com essa prática em pleno século XXI! Nessa relação, Minas Gerais é a primeira colocada, com 42 empregadores, enquanto que o meu Estado, o Pará, aparece em segundo lugar, com 25 empregadores. Não podemos aceitar isso!

    Algumas empresas que constam nessa lista suja haviam sido denunciadas em reportagens pela ONG Repórter Brasil. Por uma questão de ética não citarei os nomes das empresas nem das pessoas que foram encontradas em situação deplorável, mas vou relatar algumas das situações absurdas em que homens e mulheres foram encontrados em condições subumanas.

    Em 2017, encontraram costureiros em situação de escravidão – trabalho escravo não acontece só escondido no interior do nosso País, vemos isso em plena luz nas grandes cidades, é este o caso – cumprindo jornadas superiores a 12 horas diárias, além de dormirem em locais de trabalho sob condições insalubres, com colchãozinho no chão.

    Em outro caso denunciado, imigrantes das Filipinas afirmaram terem sido submetidas a condições análogas à escravidão como empregadas domésticas. Uma das mulheres disse que sentia fome e chegou a se alimentar com comida feita para cachorro, para quem cozinhava pedaços de carne. Elas disseram que foram parar no hospital após sentirem tonturas e vômitos devido à falta de alimentação adequada e ao trabalho sem descanso.

    Esses casos foram amplamente divulgados pela mídia e denunciados pelo Ministério Público. O Pará, infelizmente, também registra inúmeros casos absurdos – os que acabei de relatar. Em um dos mais recentes, uma ação de fiscalização encontrou 38 homens e mulheres em condições precárias em um garimpo instalado para a extração do ouro na Floresta Nacional no Município de Itaituba. Segundo os responsáveis pela operação, os 30 garimpeiros e 8 cozinheiras trabalhavam em condições desumanas. Eles estavam alojados de forma inadequada, em barracões de lona, sem estrutura sanitária, cumpriam longas jornadas e trabalhavam para pagar a conta da cantina, de suprimentos...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – ... ficando assim com uma dívida eterna impagável com os seus empregadores e exploradores.

    É preciso uma atuação perene e constante do Estado para coibir esse tipo de trabalho. É preciso, ainda, que novas medidas sejam adotadas, como a divulgação em todos os meios de comunicação para conscientizar a sociedade a rejeitar essa tal prática. A sociedade moderna não deve tolerar conviver com esse tipo de abuso.

    O atual Presidente disse, em alto e bom som, que queria relativizar esse tipo de legislação porque trazia situações para os exploradores. Ora, se o proprietário não quer perder as suas terras, é simples: basta deixar de explorar e escravizar os trabalhadores ou lhes dar condições dignas para trabalharem, para produzirem, para ajudarem a produzir nessas propriedades.

    Não podemos deixar que as tentativas de retrocesso ameacem colocar mais pessoas em condições de escravidão.

    Portanto, peço a atenção dos nobres colegas para esse tema tão importante. Convoco todos os democratas deste Parlamento e os cidadãos de consciência do País a lutarem pela dignidade e o respeito aos direitos humanos.

    Falo e faço denúncia disso com veemência, porque nós estamos em época de retrocesso e de ameaça de perdas e de conquistas no nosso País!

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/04/2019 - Página 54