Discurso durante a 45ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre as manifestações que ocorreram no domingo, dia 7 de abril, em apoio à Operação Lava Jato, ao pacote anticrime e outras mudanças na legislação brasileira.

Indignação com os atrasos de R$ 2,4 bilhões de prestações devidas ao BNDES pelos países Cuba e Venezuela, como consequência dos empréstimos celebrados pelo Governo brasileiro. Preocupação com a situação diplomática na fronteira do Brasil com a Venezuela.

Autor
Alvaro Dias (PODE - Podemos/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA:
  • Considerações sobre as manifestações que ocorreram no domingo, dia 7 de abril, em apoio à Operação Lava Jato, ao pacote anticrime e outras mudanças na legislação brasileira.
POLITICA INTERNACIONAL:
  • Indignação com os atrasos de R$ 2,4 bilhões de prestações devidas ao BNDES pelos países Cuba e Venezuela, como consequência dos empréstimos celebrados pelo Governo brasileiro. Preocupação com a situação diplomática na fronteira do Brasil com a Venezuela.
Publicação
Publicação no DSF de 09/04/2019 - Página 24
Assuntos
Outros > SEGURANÇA PUBLICA
Outros > POLITICA INTERNACIONAL
Indexação
  • COMENTARIO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, APOIO, OPERAÇÃO LAVA JATO, PROJETO, COMBATE, CRIME, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO FEDERAL.
  • PROTESTO, ATRASO, PAGAMENTO, PRESTAÇÕES, EMPRESTIMO, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, VENEZUELA, DEBITOS, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), APREENSÃO, SITUAÇÃO, DIPLOMACIA, FRONTEIRA.

    O SR. ALVARO DIAS (Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PODE - PR. Para discursar.) – Sr. Presidente Izalci Lucas, Srs. Senadores, Sras. Senadoras, Senadora Rose de Freitas, eu quero proclamar aqui, Presidente Izalci, mais uma vez, a minha admiração por aqueles brasileiros que se dispuseram a ir para as ruas do País no dia de ontem.

    Sem dúvida, é a demonstração de que nasce uma nova sociedade no Brasil: mais presente, mais responsável, exercitando, na sua plenitude, a cidadania, com lucidez, com indignação, porque certamente o País só mudará a partir da presença dos brasileiros na vida pública, no dia a dia da nossa atividade.

    Deixe-me desligar aqui, Presidente, porque está incomodando.

    Eu repito: é motivo de admiração sim; afinal, há muito desinteresse pela atividade pública no Brasil. Nós tivemos anos de alienação coletiva. A impressão que se tinha é que uma anestesia geral fora aplicada na sociedade brasileira para que dormisse diante dos descalabros administrativos e dos escândalos de corrupção. E, a partir de 2013, nós tivemos o acordar de uma Nação, que, indignada, revoltada, passou a exigir mudança, sobretudo no mundo da política deste País.

    Neste domingo, tivemos a reedição desse espetáculo de brasileiros. Não importa quantos estiveram nas ruas. Sabidamente multidões foram às ruas, milhares de pessoas em muitas cidades brasileiras, carregando bandeiras importantes, como do fim do foro privilegiado, do combate à corrupção em todas as escalas, do apoio implacável à Operação Lava Jato, do apoio à proposta de prisão em segunda instância e, especialmente, do apoio àquilo que chamam de pacote – pacote anticrime, antiviolência e anticorrupção –, que, na realidade, trata-se do desejo de aprimoramento da legislação criminal no Brasil como forma de conter esse processo de corrupção. Muitas vezes, imagina-se um processo incontornável, um processo que jamais será contido. Há aqueles que imaginam que a corrupção é inevitável, que não é possível sequer reduzir os índices de corrupção no País. Obviamente, nós não somos ingênuos a ponto de acreditar que é possível acabar com a corrupção. Isso, certamente, seria um sonho de verão. No entanto, é possível, sim, reduzir os índices de corrupção, adotando alterações na legislação para que ela se torne mais vigorosa, instrumentalizando o Estado brasileiro, porque não basta aprovar projetos de lei no Congresso Nacional e gerar a falsa expectativa de que, com eles, nós estamos resolvendo os problemas nacionais.

    Na verdade, a legislação é fundamental. Ela é essencial, deve ser aprimorada. O rigor maior é uma exigência da atualidade, mas nós sabemos que, sem a instrumentalização do Estado brasileiro adequadamente e sem um Poder Judiciário que responda às expectativas da Nação no exercício da sua atividade, cumprindo rigorosamente a legislação, porque é notório que, muitas vezes, legislamos mal, mas tantas vezes legislamos bem... Quase sempre a legislação é interpretada ao sabor de conveniências e de circunstâncias. Por isso, o Legislativo é parte fundamental, porque elabora a legislação, mas, certamente, nós não podemos gerar a falsa expectativa de que, legislando, estaremos resolvendo os problemas do País, se não houver a correta interpretação da legislação vigente e se não se estabelecer sobretudo um cenário de seriedade imbatível no Poder Judiciário para que os julgamentos possam se dar de forma célere, evidentemente, porque a sociedade também não suporta a lentidão dos procedimentos, mas sobretudo de forma competente para que a justiça derrote a impunidade em todas as circunstâncias. Queremos, portanto, aplaudir aqueles que foram para as ruas num domingo de descanso.

    Aproveito o ensejo para abordar outra questão que tem relação estreita com as causas sustentadas pela população quando vai para as ruas do País. A Imprensa nesta semana divulga que Cuba e Venezuela atrasam R$2,4 bilhões de prestações devidas ao BNDES como consequência dos empréstimos celebrados para a construção do Porto de Mariel em Cuba. Na Venezuela, tivemos empréstimos para várias alternativas, como a construção do metrô de Caracas, a construção da hidroelétrica no interior do país, etc., o que importa dizer que esses recursos são retirados dos contribuintes brasileiros, do caixa do povo brasileiro.

    O Governo brasileiro, de 2008 a 2014, transferiu aos cofres do BNDES cerca de R$716 bilhões, R$378 bilhões com origem no Tesouro nacional. Ocorre que o Governo brasileiro não tinha essa disponibilidade no seu caixa. Esses recursos foram tomados junto ao mercado, com o pagamento de taxas de juros da ordem e 13%, 14%. Foram transferidos ao BNDES. A partir de 2007, em função de uma alteração autorizada por decreto presidencial no Estatuto do BNDES, facilitando a concessão de empréstimos aos chamados campeões nacionais e a essas nações supostamente amigas do Governo brasileiro, esses recursos foram transferidos com contratos de empréstimos celebrados com taxas de juros da ordem de 3% a 6%. Aos países estrangeiros, taxas de 3%, 4% por intermédio de empresas empreiteiras que construíram obras nessas nações. A pretexto de transferir tecnologia, esses empréstimos privilegiados foram concedidos. Eu disse que do Tesouro Nacional foram R$378 bilhões. Mas antes afirmara que o Governo da União transferiu R$716 bilhões. O restante veio do FAT e do FGTS. FAT e FGTS são recursos dos trabalhadores brasileiros. E aí se torna mais grave a ação governamental, ao transferir bilhões de reais dos trabalhadores brasileiros ao BNDES para a concessão desses empréstimos, com taxas de juros privilegiadas, com carência, com prazo de carência, com taxas privilegiadas e com insegurança absoluta – empréstimos inclusive sigilosos.

    O que me traz à tribuna é exatamente o detalhe da informação prestada pela imprensa. A imprensa disse: "economistas alertaram". Não foram os economistas que alertaram. O Senado Federal alertou. Desta tribuna, nós alertamos que esses empréstimos eram empréstimos de risco e que não cabia ao Brasil celebrar empréstimos sigilosos como celebrou.

    O BID, o BIRD, grandes bancos que celebram empréstimos com nações jamais celebram empréstimos sigilosos, e, sim, com transparência.

    Lançamos mão do acesso à informação, da Lei de Acesso à Informação, pedimos as informações, e as alegações eram que esses empréstimos eram sigilosos em respeito à legislação daqueles países. Foi quando eu disse ao Luciano Coutinho, na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, quando aqui esteve, que o Governo preferia respeitar a legislação de outros países e desrespeitar a nossa Constituição, porque a transparência e a publicidade dos atos públicos são da Constituição do País.

    Apresentei também projeto para impedir o sigilo bancário nessas operações celebradas por bancos públicos entre nações, a exemplo do que ocorre – repito – com o BID, com o BIRD, que são grandes bancos públicos com origem nos Estados Unidos e que, quando celebram esses empréstimos, dão publicidade a eles.

    Quando governei o Paraná, por exemplo, e celebrei contratos de empréstimos com o Banco Mundial, com o BIRD e com o BID, esses empréstimos foram divulgados, amplamente divulgados – valores, objetivos, prazos de carência, taxas de juros e possibilidade de retorno, a relação custo/benefício do investimento que se faria, assegurando o retorno para o cumprimento dos compromissos assumidos com aquelas instituições financeiras.

    Isso é publicizar os atos da Administração Pública, que é uma exigência constitucional.

    No caso do Brasil, nos últimos anos, isso não se deu.

    Nós ingressamos, posteriormente, com um mandado de segurança junto ao Supremo Tribunal Federal, na expectativa de obtermos as informações sigilosas. A Justiça determinou que essas informações fossem reveladas. A partir daí o BNDES passou a utilizar a sua plataforma na internet para a divulgação desses empréstimos.

    Eu faço, portanto, referência a esse fato porque aqui se cumpriu o dever: alertou-se o Governo que o Governo não receberia. Aliás, em relação à usina Abreu e Lima, também ocorreu algo semelhante. Nós sabemos que Hugo Chávez fez da Venezuela sócia do Brasil na usina Abreu e Lima e, em determinado momento, ele afirmou que não estava cumprindo os compromissos da Venezuela, porque a obra era superfaturada, e os recursos que viriam da Venezuela não vieram para a construção da usina Abreu e Lima.

    Então, essa relação do nosso País no plano financeiro, especialmente com concessões que são feitas obviamente para se estabelecerem relações diplomáticas eficientes entre nações, deve levar em conta o interesse nacional.

    Obviamente, nós vivemos num país com demandas não atendidas, as dificuldades econômicas são conhecidas, as desigualdades sociais se avolumam, porque o Poder Público não consegue cumprir o seu dever e, no entanto, muitas vezes, nós fazemos cortesia com o chapéu dos brasileiros para agradar nações com as quais nos relacionamos diplomaticamente.

    Eu tenho defendido aqui uma tese, não sei se a defendo corretamente. Acho que é bom sempre expor ideias para que elas possam ser contestadas, debatidas, até para que nos convençam, a fim de que possamos mudar de opinião, mas eu tenho defendido que o nosso País não deveria avançar no relacionamento no campo econômico, financeiro, comercial com nações não democráticas, com nações que esmagam os seus povos na pobreza, na miséria, no infortúnio, adotando a postura da violência, da prepotência. Não importa se da direita, se da esquerda. Importa que a relação seja no campo dos direitos humanos, do respeito aos direitos humanos, mas especialmente levando em conta os interesses nacionais.

    Senador... (Pausa.)

    O.k.

    Eu vou concluir, Sr. Presidente, já que o meu tempo se esgota, reafirmando: eu não creio que seja adequado para o Brasil alimentar regimes autoritários com financiamentos privilegiados, com taxas de juros na bacia das almas, enquanto nós praticamos aqui as mais elevadas taxas de juros do mundo. Não, não creio que seja esse o caminho que indicaria a maioria dos brasileiros.

    Ainda agora nós continuamos vivendo problemas na fronteira com a Venezuela, porque o Governo interrompe relações diplomáticas ou tumultua as suas relações diplomáticas. O que prevalece é uma situação de insegurança absoluta, porque não basta dizer: "O Governo brasileiro está rompendo relações diplomáticas com o Governo Maduro, porque não concorda com o regime ditatorial lá implantado". Não basta dizer que o Governo interrompe relações diplomáticas. É preciso ver quais são as consequências desse gesto. É preciso ver quais são os interesses dos brasileiros que estão sendo comprometidos em razão desse impasse diplomático entre os dois países.

    Eu presenciei nesse fim de semana e quero destacar aqui a liderança de um caminhoneiro de Manaus, Josué, que, encaminhando informações e vídeos na faixa de fronteira, nos permitiu interceder junto ao Governo, especialmente ao Ministro Onyx Lorenzoni, para que ele pudesse adotar providências e resolver questões que envolviam brasileiros retidos no lado venezuelano, enquanto caminhões da Venezuela passavam por passagem clandestina, sem fiscalização, sem aduana, sem a Receita Federal. Passavam buscando mercadorias numa transação supostamente ilegal e desonesta.

    Enfim, são consequências de uma situação diplomática complexa, que provoca essa insegurança, obviamente com consequências muitas vezes imprevisíveis, alcançando o interesse de trabalhadores brasileiros – nesse caso, caminhoneiros que ficaram lá retidos no lado da Venezuela no fim de semana.

    Depois, a passagem clandestina, uma delas pelo menos, foi interrompida, foi bloqueada pelo Exército, e outras duas estavam ainda abertas e deveriam ser bloqueadas, isso em razão da denúncia que, de lá, chegou ao Governo do nosso País, para que adotasse essas providências.

    Enfim, concluindo, Sr. Presidente, essas questões internacionais que dizem respeito ao interesse do povo brasileiro não podem ser tratadas sem levar em conta os regimes. Eu repito e concluo desta forma: o Brasil não deveria estabelecer negociações no campo financeiro e econômico com nações ditatoriais.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/04/2019 - Página 24