Fala da Presidência durante a 57ª Sessão Especial, no Senado Federal

Abertura da Sessão Especial destinada a homenagear os povos indígenas em razão do transcurso do Dia do Índio.

Autor
Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Fala da Presidência
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Abertura da Sessão Especial destinada a homenagear os povos indígenas em razão do transcurso do Dia do Índio.
Publicação
Publicação no DSF de 26/04/2019 - Página 6
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • ABERTURA, SESSÃO ESPECIAL, HOMENAGEM, DIA, POVO, COMUNIDADE INDIGENA.

    O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP) – Declaro aberta a sessão.

    Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.

    A presente sessão especial destina-se a homenagear os povos indígenas em razão do abril indígena, que se comemora no dia 19 de abril e no decorrer de todo este mês, nos termos do Requerimento nº 246, aprovado pelo Plenário do Senado, de autoria do Senador Telmário Mota e outros Senadores.

    Quero convidar com muita honra para integrar a Mesa desta sessão solene, o representante da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), o Vereador Otacir Terena; (Palmas.)

    Convido também o representante da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), Toya Machineri. (Palmas.)

    Façam-me a devida correção na pronúncia, por favor, parentes.

    Queria convidar também o representante da Apoinme, Cacique Marcos Xukuru, dos povos indígenas do Nordeste. (Palmas.)

    Convido também o Representante da Atiguaçu, da associação dos povos indígenas da região Centro-Oeste, Eliseu Lopes. (Palmas.)

    Com muita honra também convido o representante da Coordinadoria de las Organizaciones Indígenas de la Cuenca Amazónica, Tuntiak Katan. (Palmas.)

    Bienvenido.

    Convido todos os parentes, em sinal de respeito, a acompanhar o Hino Nacional brasileiro.

(Procede-se à execução do Hino Nacional.)

    O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP) – Parentes, diferentes povos aqui presentes, quero fazer uma saudação toda especial aos representantes presentes à mesa desta solenidade, ao mesmo tempo em que homenageio todos os diferentes povos indígenas aqui presentes, que ao longo desta sessão aqui destacaremos, povos reunidos de todo o Brasil, desde o meu querido Amapá e Roraima até o Rio Grande do Sul, que participam deste Abril Indígena.

    De acordo com os dados do Censo Demográfico de 2010, hoje nós somos no Brasil 896.917 parentes, cerca de 0,4% da população brasileira. Esse número dá uma dimensão do genocídio ocorrido ao longo dos últimos 519 anos. Nós éramos mais de 10 milhões quando os portugueses e os demais povos europeus aportaram aqui no continente.

    Segundo a Funai, nós somos hoje 225 povos dos mais distintos, além de referências de outros 70 vivendo em locais isolados e ainda não contactados. Entre todas as regiões do País, estão na nossa Amazônia 342 mil parentes e um menor grupo no sul, com 78 mil. Essa diversidade da Amazônia, de 342 mil parentes de 170 povos distintos, é uma das mais destacadas riquezas que nós fazemos questão de aqui assinalar.

    No meu Estado do Amapá, é com muito orgulho que nós somos galibis, karipunas, palikurs, tiryiós, kaxuyanas, wayanas, apalaís e waiãpys. (Palmas.)

    A história dos povos indígenas do Brasil, como já assinalei, e pelos números fica demonstrado, é uma história de resistência ao genocídio. Quando os portugueses aqui aportaram, cerca de 8 a 10 milhões de pessoas viviam neste território, que depois passou a ter a denominação de Brasil, a ter a simbologia que nós hoje conhecemos e que foi formado, que foi construído sobre o sacrifício dos povos originários.

    Como já dissemos, restamos apenas 896 mil. Já perdemos, ao longo desse século, centenas de etnias, línguas, costumes, religiões e culturas de incalculável riqueza. A luta dos povos originários é um exemplo de resistência para toda a humanidade.

    A Constituição de 1988 estabeleceu um dos mais simbólicos processos de redemocratização do País. Entrou, naquela Assembleia Nacional Constituinte, o discurso de Ailton Krenak, pintando o rosto com a tinta negra à base de jenipapo, enquanto denunciava a campanha anti-indígena e defendia as Emendas populares de nºs 39 e 40, em defesa dos direitos indígenas que, juntos, somavam 87.994 assinaturas.

    No fim, diversos avanços foram conquistados na Constituição de 1988. Os direitos dos povos indígenas estão expressos em capítulo específico. É o Título VIII – "Da Ordem Social" –, Capítulo VIII – "Dos Índios", com preceitos que asseguram o respeito à organização social, aos costumes, às línguas, às crenças e às tradições.

    O art. 231 da Constituição proclama, em alto e bom som:

    "Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens."

    Não é a vontade de qualquer governante nem mesmo aquele que hoje está de plantão que fará retroceder os direitos dos povos originários, que estão assinalados no texto da Carta Constitucional de 1988. O direito à demarcação dos territórios indígenas é um direito assegurado pela Constituição e que cabe aos agentes públicos, ao Poder Público, ao Governo cumpri-los.

    Quero saudar o Acampamento Terra Livre nesta sua 15ª edição. Tem sido o ATL um dos principais instrumentos de organização e defesa dos direitos dos povos indígenas, assim como um importante espaço de trocas culturais entre as diferentes etnias brasileiras.

    Ontem, tive a honra de estar no ATL, acompanhado dos queridos colegas Senadores Fabiano Contarato e Eliziane Gama. Estive também acompanhado de uma comissão de outros Parlamentares de diferentes partidos, liderados, com muita honra, pela querida Sonia Guajajara e também pela primeira mulher Parlamentar indígena desses 519 anos de história, que é a minha irmã Joenia Wapichana, para mim, com muito orgulho, companheira da Rede Sustentabilidade. (Palmas.)

    Estive também, com muito orgulho, neste ato acompanhado pela querida Senadora Marina Silva, que é uma referência da luta dos povos da floresta no Brasil e no mundo.

    Marchamos ao som dos guerreiros dos diferentes povos, marchamos ao som dos guerreiros para pedir paz e para pedir respeito aos povos indígenas.

    Quero destacar, como já aqui assinalei, a eleição de Joenia Wapichana. Joenia é a primeira Deputada indígena do Brasil. Não poderia vir em melhor hora a presença de Joenia nos tapetes verdes e azuis deste Congresso Nacional. Quis o destino e o povo de Roraima que, em um momento de crise e de ataque aos direitos de todos vocês, os povos indígenas tivessem aqui no Parlamento uma representante, uma representante que, além de ser digna de representar os povos originários do Brasil, é a primeira advogada indígena, para liderar todos nós na luta suprapartidária em defesa dos povos originários.

    Quero também aqui, como porta-voz de Joenia, de alguns companheiros e companheiras Senadores e Senadoras deste Parlamento, de Marina e de tantos outros, denunciar as ações do atual Governo Federal. Desde a redemocratização do Brasil, nunca um Governo lançou tantos ataques aos povos indígenas como o Governo do Sr. Jair Bolsonaro. O momento é de grave ameaças e retrocessos. A consequência final que eles assim pretendem caminha a passos largos para o aumento da violência e o derramamento do sangue dos nossos indígenas. Não iremos tolerar isso. Não iremos nos omitir. A resistência de vocês na atuação junto conosco nos inspirará. Denunciamos em alto e bom som as ações do Governo Bolsonaro. Denunciamos a extinção da Sesai. A Sesai é uma conquista originária, é uma conquista fundamental de todos os povos originários.

    Quero, ao mesmo tempo, destacar que, com a luta e a organização de vocês, foram possíveis algumas centrais vitórias. Nossa primeira vitória, a partir da pressão de fora para dentro do Parlamento, garantiu o recuo do Governo Bolsonaro em sua proposta inicial de extinção da Secretaria Especial de Saúde Indígena. A atenção básica de saúde especializada é uma conquista fundamental que precisa ser mantida. A outra medida contra os povos originários é a Medida Provisória nº 870, de reorganização da estrutura organizacional e administrativa do Governo.

    A Fundação Nacional do Índio é o órgão indigenista oficial do Estado brasileiro. Ela foi criada em plena ditadura militar pela Lei nº 5.371, de 5 de dezembro de 1967. Sua missão é coordenar e executar as políticas indigenista do Governo Federal, protegendo e promovendo os direitos dos povos indígenas. O lugar na Funai foi, na sua origem, por conquista dos povos e não pode ser em lugar diferente no Ministério da Justiça. O lugar da Funai é como um instrumento de defesa da organização dos povos originários. As competências sobre demarcação e licenciamento ambiental de empreendimentos com impacto sobre terras indígenas, na Medida Provisória nº 870, passaram, lamentavelmente, para o Ministério da Agricultura, que tem como público-alvo o agronegócio, setor com o qual existem históricos conflitos com os povos originários. Em outras palavras, como ontem assinalei na atividade junto com vocês, é colocar a raposa dentro do galinheiro. E pior, não se pode brincar com licenciamento ambiental, como se não bastassem as tragédias de Mariana e Brumadinho como um alerta para que esse tipo de flexibilização não ocorra no nosso ordenamento jurídico.

    Eu quero aqui anunciar a todas e todos vocês que ontem, em audiência com seus representantes junto com o Presidente do Senado Federal, Senador Davi Alcolumbre, a quem eu quero agradecer e saudar, e depois com o Presidente da Câmara, recebemos o compromisso dos dois Presidentes das Casas, assumidos junto com a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas, liderados pela querida Joenia Wapichana, recebemos o compromisso dos Presidentes das Casas de que a MP 870 não passará na sua forma original e será garantido e assegurado que a Funai esteja no lugar de onde ela nunca deveria ter saído. (Palmas.)

    Contará esse compromisso com a vigília permanente dos Parlamentares, Senadores e Deputados, repito, liderados por Joenia, aqui no Congresso Nacional.

    Os direitos indígenas e a Funai estão sob a competência do Ministério da Justiça desde 1990, portanto é uma questão lógica. As terras indígenas são 13% do Território nacional. E aqui, às vezes, vêm alegar para nós o seguinte: "Há muita terra para índio". Nós aqui respondemos: "Há pouca terra para índio porque toda esta terra pertencia a eles quando os europeus aqui chegaram". (Palmas.)

    A continuidade da política de demarcação não é vontade de qualquer governante. É vontade do povo brasileiro e de um processo civilizatório de redemocratização expresso na Constituição de 1988.

    O Decreto 9.759, recente, de 11 de abril de 2019, é outra ameaça aos direitos dos povos indígenas. Ele extingue todos os órgãos colegiados criados por decretos ou portarias de toda a Administração Federal. Entre os órgãos extintos, está o CNPI (Conselho Nacional de Política Indigenista), que exerce a função fundamental de criar ponte de diálogo entre lideranças indígenas de todo o País e os órgãos que implementam a política indigenista. Destaco que a bancada da Rede no Congresso Nacional já apresentou um projeto de decreto legislativo para sustar o Decreto 9.759, do Sr. Jair Bolsonaro.

    Destaco ainda a nova lei de licenciamento ambiental. O Senhor Presidente da República anuncia que quer um novo projeto de mudança das regras para o licenciamento ambiental. Aqui tramita, por exemplo, um projeto absurdo que visa reduzir as unidades de conservação e ameaçar os próprios territórios indígenas. Destaco para vocês que, com o apoio e a mobilização de todos vocês e com a atuação da Frente Parlamentar Indígena neste Congresso Nacional, não permitiremos que um atentado como esse ao meio ambiente, aos povos originários seja aprovado.

    Vocês proclamam, mais uma vez, nesse 15º ATL, uma palavra de ordem que ressoa em nossos ouvidos há, pelo menos, 519 anos. As gerações dos nossos ancestrais já proclamavam a necessidade de garantir a demarcação das terras indígenas. "Demarcação já!", como já disse, é uma proclamação constante, desde os nossos antepassados. Que seja um legado conquistado para as gerações que virão, porque assim está, como já disse, consagrado na Constituição.

    Apenas 57% dos povos indígenas moram em terras indígenas oficialmente reconhecidas. Ao contrário dos brancos, para os indígenas, a relação com a terra é indissociável à própria vida. É nas terras indígenas que o nosso meio ambiente, bem universal da humanidade, está preservado em toda a diversidade e riqueza dos nossos rios e florestas milenares. A demarcação de terras indígenas reconhece o direito de coletividade da terra como forma de garantir a sua reprodução social, física e cultural.

    Afirmo aqui o compromisso da Bancada da Rede Sustentabilidade no Congresso, liderada nessa agenda pela querida Joenia Wapichana. Afirmo aqui o compromisso da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas para, junto com Marina e tantos outros, assumirmos o compromisso de batalhar em defesa da demarcação imediata das terras indígenas.

    Se o Presidente da República, por um lado, diz "nenhuma demarcação a mais", nós juntos diremos: "Todas as demarcações adiante. Demarcação já!". (Palmas.)

    Meus queridos e minhas queridas, sejam bem-vindos meus parentes aqui presentes! Sejam bem-vindos!

    Poucas vezes o Plenário do Senado Federal, esses tapetes azuis estiveram tão bem ocupados como por vocês. (Palmas.)

    Esta terra pertence a vocês. Este País foi constituído especialmente sobre o sangue de vocês, sobre o genocídio de muitos parentes de vocês. É por isso que é um direito civilizacional, é um direito da Constituição do Brasil como Pátria. A Pátria de verdade não está nas palavras vazias dos governantes. A Pátria de verdade está na luta de vocês, está na resistência ao genocídio de vocês; a Pátria de verdade está nos símbolos que vocês externam; a Pátria de verdade está no ATL, que ocupou a Esplanada dos Ministérios, mesmo que os senhores do poder e do Governo não o quisessem. Viva o ATL! Viva a luta pela demarcação! Vivam os povos originários do Brasil! (Palmas.)

    Ato contínuo, quero também convidar para compor a Mesa Kretan Kaingang, representante dos povos indígenas do Sul do Brasil. (Palmas.)

    E o Daran, representante dos povos indígenas do Sudeste.

    Com a presença do Kreta e do Daran...

(Intervenção fora do microfone.)

    O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP) – Kretan. Obrigado. Em wajãpi, diríamos i'ete.

    Com a presença do Kretan e do Daran, nós temos na Mesa os representantes dos povos indígenas das cinco regiões do Brasil. Então, a partir do consenso aqui da Mesa, ato contínuo, quero convidar o Vereador Otacir Terena, da Associação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), para se pronunciar, Articulação dos Povos Indígenas do Brasil.

    Terena, onde você quiser: se quiser falar aqui, se quiser utilizar a tribuna, fique à vontade.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/04/2019 - Página 6