Discurso durante a 73ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Alerta para o aumento da exploração sexual de crianças e adolescentes.

Considerações sobre o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, celebrado no dia 18 de maio de 2019.

Autor
Zequinha Marinho (PSC - Partido Social Cristão/PA)
Nome completo: José da Cruz Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Alerta para o aumento da exploração sexual de crianças e adolescentes.
HOMENAGEM:
  • Considerações sobre o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, celebrado no dia 18 de maio de 2019.
Publicação
Publicação no DSF de 16/05/2019 - Página 127
Assuntos
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • REGISTRO, AUMENTO, EXPLORAÇÃO SEXUAL, CRIANÇA, ADOLESCENTE, COMENTARIO, NECESSIDADE, COMBATE, CRIME.
  • REGISTRO, DIA NACIONAL, ABUSO, EXPLORAÇÃO SEXUAL, CRIANÇA, ADOLESCENTE.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SECRETARIA DE REGISTRO E REDAÇÃO PARLAMENTAR - SERERP

COORDENAÇÃO DE REDAÇÃO E MONTAGEM - COREM

15/05/2019


    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Sras. Senadoras e Srs. Senadores, a exploração sexual de crianças e adolescentes é uma das maiores chagas do país. Fruto da histórica omissão dos poderes públicos e da complacência de parcela da nossa sociedade, a tragédia que se abate, diariamente, sobre milhares de jovens, depõe contra os fundamentos da nação e envergonha os brasileiros de bem.

    A espantosa incidência desse tipo de mazela, em praticamente todo o território nacional, indica que o nosso processo de desenvolvimento humano ainda se assenta em terreno irregular e movediço. Afinal, em países prósperos e fraternos, crianças não são abandonadas à própria sorte e a população não aceita tal estado de coisas com naturalidade ou cinismo.

    O fato de sustentarmos alguns dos mais elevados índices mundiais na exploração sexual e no abuso de menores corrobora tal percepção e expõe uma fratura em valores que nos deveriam ser muito caros, como a igualdade, a liberdade e a justiça. Por isso, o combate a essa prática se tornou um imperativo moral do Brasil e de sua gente.

    Nesse contexto, cerrar fileiras nessa luta deixou de ser uma possibilidade e se tornou uma obrigação para todos nós. E como o problema cresce em ritmo geométrico, afirmo que esse engajamento coletivo precisa ser acompanhado de senso de urgência, sem margem para indolências, tergiversações e desculpas.

    A velocidade que impusermos ao enfrentamento dessa ignomínia, neste instante, será determinante para evitar que as vexaminosas estatísticas sobre o tema continuem ganhando corpo e que nosso tecido social se decomponha por completo.

    Não uso palavras tão duras, Sr. Presidente, por sensacionalismo ou para suscitar polêmica. Muito pelo contrário. Trago o tema à baila, tão somente, porque, ao longo de toda a minha militância política, travei contato direto com essa problemática e pude observar as suas nefastas consequências. E a minha experiência ensina que a inércia de hoje pode se transformar a comunidade disfuncional de amanhã.

    Se não quisermos ser coniventes ou vistos como desidiosos, precisamos enfrentar o problema de frente. Nesse sentido, uma boa forma de começar é jogando luzes sobre o tema, expondo aquilo que, confortavelmente, muitos prefeririam esconder.

    Não por acaso, escolhi o púlpito do Senado Federal para reportar muito do que testemunhei. Para mim, há um forte simbolismo em vocalizar o sofrimento anônimo das crianças amazônidas do alto de um dos mais proeminentes espaços de poder da República.

    A verdade, caros colegas, é que, após todos esses anos percorrendo a vastidão do Pará, acabei conhecendo, de perto, o sofrimento dos jovens, a dor dos seus parentes e os impactos socioeconômicos deletérios decorrentes da corrupção desses menores. Vi sonhos destruídos, famílias dilaceradas e comunidades vulnerabilizadas.

    O meu Estado, como de resto, todo o Brasil, é pródigo em tristes, grotescas e recorrentes histórias envolvendo a prostituição infantil. Nesse emaranhado de dolorosos relatos, um dos mais aviltantes exemplos que posso trazer à colação é o das "meninas balseiras". Convencionou-se chamá-las assim porque elas costumam subir a bordo das balsas que cruzam os rios da Amazônia para a oferta de serviços sexuais.

    Na região do Marajó, por exemplo, essa é uma cena comum. Crianças se prostituem dentro das embarcações e o fazem em troca de alguns trocados, roupas, combustível e, até, alimentos. E, pasmem, Sras. e Srs. Senadores, existem notícias de meninas de até 9 anos envolvidas nessa abjeção.

    O mais revoltante é perceber que, apesar de se tratar de um fenômeno frequente, raramente há ações coordenadas de enfrentamento e, praticamente, inexistem sanções aplicadas pela justiça aos corruptores, ainda que pequenos avanços já possam ser vislumbrados.

    Em 2014, por exemplo, um termo de ajustamento de conduta levou à instalação de câmeras de segurança para que crianças e terceiros não acessem algumas embarcações. Uma medida tímida, mas cujos efeitos iniciais provam que o cuidado do Estado pode mudar o destino de muitas crianças.

    Por infortúnio, os nossos problemas não se resumem ao Marajó. Em Altamira, constatou-se um crescimento exponencial nos casos de prostituição envolvendo menores, ao longo da última década; em função do afluxo de novos moradores ligados à construção de belo monte. Um episódio que, certamente, servirá de exemplo e demandará muita reflexão quando da instalação, em cidades de pequeno e médio portes, de novos projetos dessa monta, no futuro.

    Na região do Baixo Tocantins, por seu turno, a prática ganhou força devido ao enorme tráfego de caminhões nas estradas locais. Tal configuração ensejou a massificação do consumo de drogas pelos jovens corrompidos, a multiplicação do número de casos de gravidez precoce e de doenças sexualmente transmissíveis e, até, o tráfico humano para fora do País. Aliás, essa é uma marca da prostituição infantil: ela sempre abre portas para outras vicissitudes.

    Sr. Presidente, em todos esses casos, a pobreza, a inércia de parte dos poderes públicos e a generalizada degradação familiar criaram os cenários perfeitos para a proliferação de casos de exploração de crianças e adolescentes. Tal constatação evidencia que o Pará só terá condições de vencer esse desafio se concatenar políticas públicas e esforços da sociedade civil em diversificadas frentes. E isso também vale para o Brasil, como um todo.

    Afinal, em nível nacional, a situação, tampouco, é alentadora. Estudos internacionais e locais atestam aquilo que, empiricamente, já éramos capazes de deduzir: o nosso País não consegue proteger, integralmente, as suas crianças. Senão, vejamos.

    Segundo um recente trabalho publicado pela revista britânica The Economist, o Brasil não oferta, em nível satisfatório, programas de prevenção contra abusadores em potencial e falha na coleta de dados sobre violência sexual contra jovens. Em consequência dessas duas lacunas, não enfrenta o desafio da subnotificação, não prepara os jovens para lidar com situações dessa natureza e não assegura o caráter pedagógico que a punição desses criminosos propiciaria.

    Prova disso é que os dados conhecidos, ainda que incompletos, já são bastante alarmantes. Segundo um levantamento do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), com base em dados de 2011, 70% das vítimas brasileiras de estupro são crianças e adolescentes.

    Os números compilados pelo Disque 100 são ainda mais chocantes. Segundo o canal criado para relatar casos de violação de direitos humanos, o Brasil somou mais de 175 mil casos de exploração de crianças e adolescentes entre 2012 e 2016, o que representa quatro casos por hora! Por fim, como corolário dessa verdadeira distopia nacional, recorro à impressionante estimativa da Unicef, segundo a qual mais de 250 mil crianças e adolescentes são vítimas de algum tipo de exploração sexual no Brasil.

    São números contundentes. Porém, ao se deparar com essas informações, sei que muitos pensam se tratar de um problema restrito aos grotões, aos pequenos municípios do interior. Ledo engano.

    Na maior cidade do hemisfério sul, São Paulo, o problema também assume contornos preocupantes. De acordo com dados da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social, em 2018, mais de 43 mil pessoas, entre vítimas e familiares, foram atendidas pelo Programa Local de Proteção a Jovens Vítimas de Abuso e Exploração. Como se vê, o opróbrio não faz distinção geográfica.

    Sras. e Srs. Senadores, esta é uma semana especialmente simbólica para todos aqueles que, como eu, acreditam que o Brasil deve dar prioridade ao enfrentamento desse problema. No dia 18 de maio, celebra-se o Dia Nacional de Combate à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, como disposto pela Lei n° 9.970, de 2000.

    Trata-se de uma oportunidade singular para refletirmos sobre as causas desse vergonhoso fenômeno e avaliarmos a evolução de nossos esforços de combate a esse mal, ao longo dessas quase duas décadas. Acredito que estamos avançando, mas a passos lentos.

    Historicamente, as políticas públicas costumam se materializar a partir da pressão popular. Em um país com tantas premências, é necessário que consigamos instigar a sociedade a colocar esse problema na Ordem do Dia. Os governos e as pessoas precisam ficar desconfortáveis com o que ocorre Brasil afora. Esse desconforto pode mudar a vida de milhões de meninos e meninas. Ajamos!

    Era o que eu tinha a dizer.

    Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/05/2019 - Página 127