Pela Liderança durante a 77ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre as crises enfrentadas pelo Presidente da República, Jair Bolsonaro, nos primeiros meses de Governo.

Autor
Renan Calheiros (MDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Reflexão sobre as crises enfrentadas pelo Presidente da República, Jair Bolsonaro, nos primeiros meses de Governo.
Publicação
Publicação no DSF de 22/05/2019 - Página 67
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • COMENTARIO, CRISE, GOVERNO FEDERAL, PRESIDENTE DA REPUBLICA, JAIR BOLSONARO, CONVOCAÇÃO, MANIFESTAÇÃO, POPULAÇÃO.

    O SR. RENAN CALHEIROS (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AL. Pela Liderança.) – Venho a esta tribuna, Sr. Presidente – e agradeço muito a V. Exa. –, para compartilhar uma reflexão.

    Srs. Líderes, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, definitivamente não torço contra o Brasil. Não falo na condição de oposição nem de situação. Quero fazê-lo rapidamente, Sr. Presidente, não como crítica ou apostando na velha fórmula do quanto pior melhor. Falo, modestamente, como um dos 80 Senadores e amparado em uma vivência de quem já presidiu esta instituição em tempos de graves crises. Falo com o propósito de iluminar o futuro para não, Sr. Presidente, Srs. Senadores, repetir os fracassos do passado.

    O sistema presidencialista impõe que Chefe de Governo seja uma figura pacificadora, que unifique o Brasil, e não aprofunde as divergências. A Presidência exige, Senador Otto Alencar, um cirurgião habilidoso, que estanque a hemorragia eleitoral e cicatrize as feridas. Democraticamente eleito, o nosso Presidente, infelizmente, tem sido fonte de estresse político e institucional permanente. Além da decepção, demonstra que está aquém da Nação brasileira.

    Em cinco meses, Sr. Presidente, Srs. Senadores, o Governo cultivou crises, recuos, demonizou a imprensa, deu vexames internacionais e demonstrou inaptidão para o cargo. A lógica da Presidência não pode e não deve ser o confronto entre os Poderes.

    Governos não são feitos para entrar em tempestades e fortes tormentas. Governos são feitos para voar em céu de brigadeiro, com previsibilidade e onde, Sr. Presidente, se enxergue o horizonte. A sustentação de Governos é muito semelhante à sustentação das aeronaves. São sustentações aerodinâmicas, forças múltiplas e governos, Senador Eduardo Braga, quando começam a enfrentar muitas forças aerodinâmicas contraditórias, como os aviões, caem por falta de sustentação. Isso não é uma previsão, apenas uma constatação histórica. Antes de ser um abacaxi, a Presidência da República exige racionalidade, discernimento, habilidade, lucidez, equilíbrio, diálogo, trabalho e projetos para o País.

    Estão previstas manifestações por parte de aliados do Governo para o próximo dia 26. Acho que, sinceramente, Sr. Presidente, vivemos hoje uma crise de representação tamanha que torna improvável uma mobilização em favor das instituições. Não existem, no mundo – não existem, no mundo! – manifestações a favor de governos. Guaidó tentou, fracassou; Maduro tentou e, em contrapartida, também fracassou. A campanha eleitoral já passou e agora é hora de governar, de unir a Nação. Esse é o desafio de todo Presidente eleito.

    Não estamos aqui para derrotar A ou B, a esquerda, o centro ou a direita. Estamos aqui para derrotar o desemprego, derrotar a estagnação econômica, a desigualdade social, o déficit, a criminalidade, erradicar o analfabetismo, a ineficiência e o anacronismo do Estado, sua pesada tributação, o insustentável modelo federativo, a falta de investimentos, de poupança e os problemas estruturais do Brasil. Se o Governo não está logrando êxito, não é criando uma falsa batalha no imaginário popular que conseguirá resolver os problemas. Pode ganhar tempo, mas isso não é a cura para a doença, é apenas uma efêmera anestesia.

    A economia brasileira, Presidente Davi Alcolumbre, está derretendo. Estamos à beira da bancarrota, da depressão. O desemprego é superlativo. A falta de articulação política e a incapacidade de dialogar congelaram o País. O Governo, diretamente ou através de porta-vozes destrambelhados, fabrica crises diariamente numa chacrinha digital primária. É um Titanic à procura de um iceberg todos os dias.

    O negacionismo, Senador Kajuru, é outro entrave. Além de disparates como o nazismo de esquerda, apologia a ditadores sanguinários, premiações inexistentes, golden shower, o próprio Presidente e os seus gostam de ofender o povo brasileiro. Nos Estados Unidos insultou imigrantes e aqui enxovalhou estudantes ao chamá-los de imbecis e idiotas na semana passada, depois de o Ministro rebaixar as universidades a redutos de balbúrdia.

    Com apenas cinco meses, a multidão chacoalhou as ruas em mais de 30 cidades em defesa da educação sem tutela ideológica. A educação, definitivamente, não é formada por imbecis. Fazem conta muito melhor do que o despreparado Ministro da Educação, que é um economista.

    Os estudantes, Sr. Presidente e Srs. Senadores, representam o futuro desta Nação e merecem, no mínimo, respeito. Jair Bolsonaro ganhou a eleição presidencial, não uma vaga no Olimpo. Ele e seus oráculos não são semideuses, oniscientes e onipresentes.

    Na esfera política, não construiu uma maioria estável, e isso, todos sabem, é sinônimo de crise. Não adianta terceirizar o problema e atribuir os insucessos ao Parlamento. A nova política, pelos erros e crises sucessivas, já parece balzaquiana e desgastada. Os resultados: derrotas em série, Ministros convocados a contragosto e medidas provisórias ameaçadas. Com esse quadro caótico, há chance de se votar alguma reforma de que o País precisa?

    Penso que as chances diminuíram porque o Governo envelheceu precocemente e nutre um certo desprezo pelo Parlamento e por outras instituições democráticas. Exemplo pedagógico está no acordo pré-datado para premiar com a próxima vaga ao Supremo Tribunal Federal o Juiz que agora é Ministro da Justiça. Vai premiar exatamente quem tirou seu principal adversário do páreo eleitoral.

    Quero ainda, Sr. Presidente, antes de encerrar – e mais uma vez agradeço a V. Exa....

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Um aparte, Senador.

    O SR. RENAN CALHEIROS (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AL) – ... fazer a defesa de que manifestação nenhuma deve ser feita para intimidar o Ministério Público. Nenhuma. Quem diria que, a essa altura da minha vida, eu atuaria como advogado do Ministério Público. Eu advogado do Ministério Público! Sou advogado sim. Acho que ele não deve ser intimidado jamais. Eu o critiquei veementemente pela falta de isenção do ex-Procurador Rodrigo Janot, pela política que fez o Procurador Deltan Dallagnol, pelos excessos de Marcelo Miller, por atitudes descabidas como prender para investigar, Senador Humberto, por vazamentos seletivos, abusos de coercitivas e tantas medidas que foram tomadas. E eu, modestamente, denunciei. É preciso respeitar a lei. Eu jamais intimidei o Ministério Público; questionei, critiquei, cobrei, reclamei. Por isso, Sr. Presidente, Srs. Senadores, propus uma legislação para punir o abuso de autoridade. Politicamente, subi à tribuna, fiz manifestações, fiz petições cobrando responsabilidades. Essa é a maneira democrática de exercer a divergência, garantir a premissa de direito de defesa, de presunção de inocência e até mesmo de fazer a prova negativa de falsas acusações, como fiz.

    Muitas vezes, Sr. Presidente, Srs. Senadores, se é atacado e acusado injustamente. Hoje mesmo, a Ministra Cármen Lúcia arquivou – está publicado no Diário Oficial – a décima terceira investigação contra mim. Fiz tudo no campo do questionamento, não através da intimidação, tudo dentro do processo legal. Não faremos contra o MP o combate antidemocrático que muitas vezes ele se acostumou a fazer contra a política que um dia eu representei sentado aí na cadeira em que V. Exa. está, Sr. Presidente. Nós não podemos perder a nossa prerrogativa moral perante a história. Se eles se desviaram dos seus limites, criminalizaram a política generalizadamente, muitos com culpas, outros não, se perseguiram e cometeram abusos, nós não podemos praticar a perseguição inquisitorial contra o Ministério Público, que criamos, fortalecemos e para o qual garantimos recursos e tudo o que significava autonomia para cumprir esse papel.

    Tinham, Sr. Presidente, todos sabem hoje, um projeto próprio de poder, inclusive de financiamento pela própria Lava Jato, através de uma fundação ilegal. Nós iremos aqui, Senador Randolfe Rodrigues, trazê-los para a luz, e não irmos juntos com eles para os porões.

    Com um cenário político adverso, adotam-se – e todos estão observando – práticas da mais velha política. O Governo passou a usurpar os poderes do Congresso, editando decretos da ditadura para piratear as atribuições do Parlamento, como aconteceu no recente édito que liberou as armas. E agora um novo e inacreditável decreto publicado hoje, que abre a possibilidade de a população comprar fuzis.

    Tenho convicção de que a Justiça se encarregará de travar as comissões autoritárias do Executivo. Com o desdobramento das investigações e das supostas ligações com milicianos, começam os sinais de descontrole.

    Para se contrapor ao protesto do dia 15 de maio, ressuscita-se a paranoia conspiratória de Jânio Quadros, que, com apenas sete meses de governo, procurou se escorar nas ruas, uma fantasia de forças poderosas contra a sua gestão, as conhecidas forças ocultas. O texto divulgado pelo Presidente da República, com referência a conchavos e ingovernabilidade, é, Sr. Presidente e Srs. Senadores, análogo à carta renúncia de Jânio e embute a mesma perversão. Responsabilizar o Congresso, o Supremo Tribunal Federal, a imprensa e outras instituições pelos fracassos do governante, como todos sabem, é antidemocrático e temerário, é enredo da velha política, da política velhaca. Mais explícito, o Presidente, num cacoete golpista, culpou a política como sendo o grande problema do Brasil.

    Imperioso, Sr. Presidente e Srs. Senadores, lembrar que Bolsonaro acumula 28 anos de mandato e tem três filhos políticos e uma ex-mulher. Somados, todos os mandatos da família superam 50 anos vivendo às custas da política que tenta demonizar. Quem gosta de ver o circo pegar fogo é piromaníaco. Os verdadeiros democratas não podem passivamente permitir que a centelha se transforme em um grande incêndio. A verdade – ensinou-nos Francis Bacon – é filha do tempo, não da autoridade, e a mentira é um epitáfio da democracia.

    O Governo deveria se abster de convocar ou apoiar atos para se proteger de um delírio. Outros Presidentes tentaram e malograram. O momento exige grandeza para distensionar e não convulsionar ainda mais ou apostar na ruptura.

    Eu, de minha parte, gosto da institucionalidade, da normalidade republicana e estarei, Sr. Presidente, entre os democratas sempre.

    Presidente Bolsonaro, o Senhor é a voz que individualmente tem mais condições de comandar aqueles que o admiram. Faço um apelo ao Senhor Presidente da República para que peça àqueles que o admiram moderação, equilíbrio e diálogo. Manobras arriscadas podem ser feitas, mas precisam ser feitas pelos pilotos exímios, não devem acontecer sem a devida tarimba. O Brasil não pode ser vítima de manobras arriscadas, e a democracia, Sr. Presidente, Vossa Excelência sabe muito bem, também não.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/05/2019 - Página 67