Discurso durante a 76ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Manifestação contrária ao Governo Federal e à forma como conduz o País, com destaque à falta de políticas públicas para a retomada do crescimento econômico.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA:
  • Manifestação contrária ao Governo Federal e à forma como conduz o País, com destaque à falta de políticas públicas para a retomada do crescimento econômico.
Publicação
Publicação no DSF de 21/05/2019 - Página 54
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA
Indexação
  • COMENTARIO, POSIÇÃO, ORADOR, CRITICA, GESTÃO, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, POLITICAS PUBLICAS, RETOMADA, CRESCIMENTO ECONOMICO.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para discursar.) – Sr. Presidente, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, pessoas que nos acompanham pela TV Senado, pessoas que nos acompanham pela Rádio Senado e pelas redes sociais, faço hoje uma constatação muito difícil e muito preocupante: a de que o Brasil está vivendo praticamente o ocaso de um Governo.

    O Presidente da República, ao longo de cinco meses da sua gestão, lamentavelmente não conseguiu produzir nada de útil que ajudasse o enfrentamento dos graves problemas do Brasil. Ao contrário, todos nós sabíamos das suas limitações intelectuais, psicológicas, do seu pouco conhecimento sobre a realidade do Brasil, da falta de um projeto que fosse capaz de fazer o Brasil retomar o crescimento econômico, gerar empregos, distribuir renda, mas confesso que nem o mais pessimista dos brasileiros imaginaria que, num espaço de cinco meses, viéssemos a viver um desastre tão amplo quanto este que estamos vivendo. O que vale é que o próprio Presidente da República reconhece as suas dificuldades em comandar uma nação.

    Ao longo desse período, o que nós estamos assistindo é a um agravamento profundo da situação do País, da crise econômica. Estamos vendo, de forma acelerada, o processo de desmoronamento econômico com o crescimento descontrolado do desemprego – são mais de 13 milhões de pessoas desempregadas, afora os que estão desalentados e afora os que estão na informalidade. E o pior é que não há uma única proposta do Governo, em caráter emergencial, que pudesse enfrentar esse drama do desemprego, como também não há proposta para enfrentar o crescimento da inflação, especialmente para a classe média e, mais especialmente, para os pobres deste País. É um bujão de gás a R$100, é um litro de gasolina a R$5, é uma carestia que já vai atingindo os lares de milhões e milhões de brasileiros. E o Governo parece não ter nada para apresentar na perspectiva de enfrentar esse tipo de problema.

    Temos que levar em consideração também, ainda, do ponto de vista desse Governo, é que, ao lado desse desmoronamento econômico... E ouso dizer que 2019 é um ano perdido. O que ele me lembra, o tempo inteiro, é do ano de 2015 quando houve uma verdadeira sabotagem econômica no Brasil e o País praticamente parou. E 2019 está parecendo uma cópia fiel de 2015, talvez até mais agravada, porque o Governo Dilma tentou, por várias formas, enfrentar os problemas naquele momento. Temos hoje um enorme descontrole político, um Governo que não tem um comandante, que não tem uma estratégia, que não tem uma linha, que não tem diálogo nem com a sociedade, nem com o Congresso Nacional, nem com o setor produtivo do Brasil, nem mesmo com a mídia, que, se não o apoiou, se mostrou satisfeita com a possibilidade da derrota do PT. E esse descontrole político é inaceitável para alguém que passou 28 anos no Congresso Nacional. É a demonstração cabal de que não conhece o sistema de poder político existente no Brasil, em particular o papel do Poder Legislativo.

    Não se trata aqui de cobrar que o Presidente da República faça negociatas, toma lá dá cá ou qualquer coisa assim, porque o Brasil já não suporta isso. Porém, imaginar que, numa democracia em que nós temos três Poderes, que servem como pesos e contrapesos uns diante dos outros, é possível governar sem dialogar, sem debater com o Congresso Nacional, nesse espírito que o move, de dizer o seguinte: "Eu fiz aqui o projeto; agora é com vocês"? Ora, nesse sentido parece que o Presidente vê o Congresso Nacional meramente como um homologador dos seus desejos ou, então, como uma força que deve assumir a responsabilidade por governar, o que não é verdadeiro.

    E o resultado é que o Governo tem uma única tecla na qual ele bate o tempo inteiro. O que fazer com a inflação? Aprova a reforma da previdência. O que fazer com o desemprego? Aprova a reforma da previdência. O que fazer com a falta de crescimento econômico do País? Aprova a reforma da previdência. E em tudo o que vai se somando como dado negativo da economia, o Governo diz: "Está assim porque não se aprovou a reforma da previdência".

    Ora, o Brasil, inclusive, está começando a viver uma situação de fuga de investidores e, muito em breve, pode viver uma situação de fuga de capitais. E não é porque não foi aprovada a reforma da previdência; é porque nenhum investidor vai aplicar recursos num País em que a gente tenha um Governo que não tem rumo, que não sabe o que fazer no dia seguinte, cujo próprio Presidente da República, ao invés de seduzir os que querem trabalhar no Brasil, diz que investir no Brasil é um esporte de altíssimo risco. São essas coisas que podem fazer com que nós tenhamos um distanciamento ainda maior dos investidores estrangeiros e nacionais.

    Por outro lado, quais são as condições para que se possa fazer uma economia crescer? De um lado, o investimento privado, que, como eu disse aqui, está começando a querer distância do Brasil. De outro lado, o investimento público. E o que é que está acontecendo no Brasil com o investimento público? Com esse discurso de que o Estado não pode atuar na sociedade, não temos obras de infraestrutura, não temos ações que induzam o investimento privado, e o que termina acontecendo é que, sem investimento público, o investidor privado também não investe.

    As famílias... O consumo das famílias, que é uma outra vertente para ajudar o crescimento da economia, vislumbra hoje uma população endividada. Quem tem emprego tem medo de comprar qualquer coisa com medo de perder o emprego e não poder pagar, e quem não tem aí é que não pode fazer qualquer tipo de investimento na área do consumo. Então, o País está caminhando não para uma estagnação – estagnação nós já estamos vivendo –, mas está caminhando para uma recessão profunda, que não será apenas uma recessão técnica – três meses de crescimento negativo do PIB –, mas uma recessão real, e, ao mesmo tempo, para o agravamento da crise social.

    Não é preciso consultar estatística do IBGE ou de quem quer que seja; basta olhar a rua, as pessoas que estão vivendo na rua, a quantidade de pessoas que estão esmolando pelo Brasil afora. É esse o Brasil que nós estamos vivendo agora, neste momento. E o pior: o Presidente da República, ao invés de fazer uma autocrítica, de dizer: "Olha, eu estou errado. Tenho que fazer alguma coisa para acertar, vou mudar", ao invés disso, ele terceiriza a responsabilidade dele – e de forma perigosa! Este País levou décadas para reconquistar a democracia, décadas para que o povo pudesse ter o direito de se organizar, de falar o que pensa, de poder ter liberdade, e vem um Presidente da República, que fica no WhatsApp e no Twitter fazendo retuitagem, repostagem de discursos perigosíssimos para o Brasil de um cidadão que ao escrever um texto... De um lado, parece que o Presidente está querendo renunciar, ou pelo menos ameaçando que vai renunciar. E essa história já não deu bem no Brasil: quando o Jânio Quadros fez isso, tinha o objetivo de dar um autogolpe; não teve força para dar esse autogolpe e não teve como voltar atrás na ideia de renunciar. E renunciou. E, depois disso, instabilidade política, até que chegamos ao Golpe de 1964. Então, de um lado, passa a ideia de que ele pode renunciar – vejam que tragédia! – cinco ou seis meses depois de assumir o poder no País. E a outra ideia que passa é a de que ele quer jogar a população contra os Poderes constituídos.

    Vejam vocês: hoje, lá no Rio de Janeiro, na Firjan, o Presidente da República declara que o problema do Brasil é o que ele chamou de classe política. O que ele está querendo dizer na verdade quando fala isso? Ele está falando não é contra os políticos, mas contra a democracia. É contra a democracia! Que Governo é esse que convoca ou manda convocar manifestação para atacar o Congresso Nacional, para atacar o Supremo Tribunal Federal? Dizer que, em cinco meses, o Presidente não fez nada porque não deixaram? Mas o que foi que ele propôs fazer? O que ele propôs ao Brasil, a não ser sandices? Liberar arma para todo mundo ter em casa e andar armado, cortar recursos da educação, cortar recursos da saúde, fazer debate ideológico o tempo inteiro, quando o povo está querendo resposta para os seus problemas. Como querer atribuir ao Supremo ou ao Congresso Nacional impedir que ele fizesse qualquer coisa quando ele não propôs nada?

    Portanto, temos que estar em estado de alerta. Isso não vai acabar bem. Já tivemos outros episódios na história em que isso aconteceu. Nosso colega, o Senador Fernando Collor, que foi Presidente da República, aprendeu grandes lições: naquele momento, movido por esse sentimento de confronto, na época do impeachment, convocou a população para usar verde e amarelo porque queriam golpeá-lo, derrubá-lo, e, no final das contas, isso foi um fracasso e terminou acontecendo o processo de impeachment naquele momento.

    Não pode... O Presidente da República tem que assumir a sua responsabilidade de governar o Brasil. O nosso Brasil não merece o que ele está fazendo! O Brasil não pode aceitar a brincadeira que está sendo feita por esse Governo! Não podemos! E este Congresso Nacional tem que levantar sua voz para impedir que isso aconteça. O País parado, os indicadores econômicos os piores possíveis, o Governo sem base de sustentação, a desigualdade crescendo violentamente, o Brasil caminhando para uma depressão econômica; um Governo que tem 5 meses, mas, como se diz lá no Nordeste, o clima é de fim de feira. O sentimento é o de que o Governo não existe mais. E essa ideia de confrontar as instituições é muito ruim para a democracia.

    Então, Sr. Presidente, nós precisamos fazer este alerta ao Presidente: ainda há tempo. Ele ainda pode rever os seus conceitos, as suas ideias, as suas ações e as suas proposições. Se não o fizer, o establishment, as elites deste País, a grande mídia, os empresários, os banqueiros... Haverão de retirá-lo ou ele terá que enfrentar a força das ruas.

    Que inabilidade desse Presidente! Retira bilhões de reais da educação, compromete o futuro de milhões e milhões de jovens que querem estudar, que querem ter uma perspectiva de fazer o ensino básico, de fazer uma universidade, de fazer pesquisa depois de formados e, quando a população se levanta, quando os estudantes vão às ruas, ele classifica essas pessoas de idiotas inúteis, de imbecis. Isso é linguagem que use o Presidente da República para tratar pessoas que estão ali para lutar pela educação em nosso País?

    Entendo, Sr. Presidente, que ou o Presidente da República muda a sua ação como Presidente, assume o seu papel de Presidente eleito da República Federativa do Brasil, ou, então, que ele dê passagem a quem quer e a quem sabe governar. O que o povo brasileiro não pode é continuar a assistir, dia a dia, de forma triste, de forma ridícula, a um astrólogo, lá dos Estados Unidos, autointitulado filósofo, a brigar com um filho do Presidente, o filho a brigar com o ministro, o ministro a brigar com não sei quem. Onde é que nós vamos parar? E a resposta para os problemas do dia a dia da Nação? E a resposta...

(Soa a campainha.)

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Vou concluir, Presidente.

    E a resposta para quem ainda está numa fila para buscar o emprego? Porque boa parte nem vai mais. É disso que nós estamos precisando. E era isso que eu queria registrar no dia de hoje.

    Espero que essa manifestação que vai acontecer no domingo aconteça com a mais ampla liberdade, mas que não venha a ter como centro o ataque à democracia, o ataque à liberdade no Brasil e o fortalecimento da ideia de que se a democracia não faz aquilo que Bolsonaro quer, Bolsonaro acaba com a democracia. Não pense ele que vai ser fácil!

    Muito obrigado, Sr. Presidente.

(Durante o discurso do Sr. Humberto Costa, o Sr. Styvenson Valentim deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Elmano Férrer.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/05/2019 - Página 54