Fala da Presidência durante a 82ª Sessão Especial, no Senado Federal

Sessão Especial destinada a comemorar o aniversário de 20 anos do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM).

Autor
Eduardo Braga (MDB - Movimento Democrático Brasileiro/AM)
Nome completo: Carlos Eduardo de Souza Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Fala da Presidência
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Sessão Especial destinada a comemorar o aniversário de 20 anos do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM).
Publicação
Publicação no DSF de 28/05/2019 - Página 8
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • SESSÃO ESPECIAL, COMEMORAÇÃO, INSTITUTO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, SEDE, TEFE (AM), RIO AMAZONAS.

    O SR. PRESIDENTE (Eduardo Braga. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AM) – Declaro aberta a sessão.

    Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos.

    A presente sessão destina-se a comemorar o aniversário de 20 anos do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, nos termos do Requerimento nº 255, de 2019, do Senador que vos fala e de outros Senadores.

    Convido para compor a Mesa o representante do Ministério da Ciência e Tecnologia, nosso sempre Deputado Julio Semeghini.

    Convido também o Deputado Federal do Estado do Amazonas, Deputado Capitão Alberto Neto, para compor a Mesa dos trabalhos.

    Convido o Diretor-Geral do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, João Valsecchi do Amaral, para compor a Mesa; a Presidente do Conselho de Administração dos Moradores e Usuários da Reserva de Amanã e Pesquisadora Titular do Museu Paraense Emílio Goeldi, a Sra. lma Célia Guimarães Vieira; e o Presidente da Central das Associações dos Moradores e Usuários da Reserva Amanã, Sr. Edvan Feitosa.

    Quero também aqui registrar a presença do nosso General Villas Bôas neste ato, representando o General Augusto Heleno, Chefe do GSI da Presidência da República.

    Vamos agora ouvir o Hino Nacional.

    Convido a todos para, em posição de respeito, acompanharmos o Hino Nacional e, em seguida, o Hino do Amazonas, executados pela Banda do Exército.

(Procede-se à execução do Hino Nacional.)

(Procede-se à execução do Hino do Amazonas.)

    O SR. PRESIDENTE (Eduardo Braga. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AM) – Antes de passarmos aos discursos, vamos assistir à exibição de um vídeo institucional do Instituto Mamirauá, para que todos que nos acompanham pela TV Senado e pelas mídias da TV Senado e do Senado da República possam conhecer um pouco desse importante projeto.

(Procede-se à exibição de vídeo.)

    O SR. PRESIDENTE (Eduardo Braga. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AM) – Senhoras e senhores, eu quero cumprimentar, mais uma vez, o representante do Ministério da Ciência e Tecnologia, o nosso Deputado Julio Semeghini Neto, o nosso Diretor-Geral do Instituto do Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, Sr. João Valsecchi do Amaral, a Presidente do Conselho de Administração dos Moradores e Usuários da Reserva de Amanã e Pesquisadora Titular do Museu Paraense Emílio Goeldi, Sra. Ima Célia Guimarães Vieira, o Presidente da Central das Associações dos Moradores e Usuários da Reserva Amanã, Sr. Edvan Feitosa, cumprimentar o nosso Deputado Federal Alberto Neto, o nosso General Villas Bôas, as senhoras e os senhores aqui presentes.

    A questão da sustentabilidade deixou de ser, há muito tempo, uma preocupação exclusiva dos círculos acadêmicos ou dos grupos especializados na defesa do meio ambiente. A preservação da natureza e, por extensão, do próprio Planeta que habitamos é tema prioritário dos governos, empresas e famílias do mundo inteiro. Qualquer cidadão minimamente atento discute hoje com sua família posturas e atitudes sustentáveis – o que comprar, de quem comprar, o que consumir e o impacto desse consumo para a vida na Terra.

    Qualquer empresa moderna plenamente inserida no capitalismo global e ávida por crescer e progredir sabe que, se não respeitar parâmetros mínimos de preservação ambiental, estará fora do mercado, não conseguirá vender no mercado interno e, menos ainda, no de exportação, pois cada vez mais consumidores do mundo inteiro exigem produtos com certificação de qualidade ambiental.

    Qualquer governo sério e comprometido hoje em dia não pode se dar ao luxo de ignorar o debate sobre o meio ambiente e não pode sobrepor outras agendas à agenda ambiental.

    Nem mesmo os problemas econômicos são mais importantes que as questões de sustentabilidade, visto que sem um planeta habitável não há economia, não há empresas, não há quem possa ganhar ou gastar dinheiro, não há consumo. Isso, portanto, significa que economia e sustentabilidade são temas que devem caminhar lado a lado. Sem um planeta viável, todas as outras questões perdem seu sentido.

    É nesse contexto que quero parabenizar as iniciativas da sociedade civil no sentido de promover, de verdade, o respeito ao meio ambiente e às pessoas que lá vivem. Há muita gente abnegada trabalhando duro em várias frentes, sempre com foco na preservação ambiental e na sustentabilidade.

    Várias organizações sociais vão se destacando nessa luta, e uma delas merece, nesta data, todas as nossas homenagens. Receba meu abraço, nosso abraço o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá.

    Criado em 1999, o Instituto Mamirauá é uma organização social fomentada e supervisionada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, e não é por acaso que responde a esse Ministério. Os 20 anos do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá nos fazem relembrar que, da inquietude do zoólogo José Márcio Ayres com a preservação de uma espécie animal exclusivamente amazônica, nasceu um projeto pioneiro, por assegurar a comunidades locais o protagonismo na conservação da biodiversidade.

    Apoiado por pesquisadores e cientistas presentes na sede da organização, em Tefé, no nosso Amazonas, milhares de pescadores, extrativistas e caboclos ressignificam, todos os dias, a relação com a natureza. Eu costumo chamar de a releitura entre o homem e a natureza.

    Da exploração predatória dos recursos para garantir a sobrevivência de suas famílias, eles passaram a priorizar o manejo florestal e de espécies, o turismo de base comunitária e o desenvolvimento de tecnologias de acesso à água potável e ao saneamento básico, entre outras louváveis iniciativas sustentáveis.

    Um depoimento que vimos há pouco, no vídeo institucional, ilustra o quanto tem sido bem-sucedida a conjugação dos sabores tradicionais com a ciência. Percebendo os sinais de esgotamento da fauna aquática, o pescador Jorge de Souza Carvalho, da comunidade de São Raimundo do Jarauá, nos explica, com a simplicidade característica do homem do interior, que não haveria outra alternativa para ele senão adotar as recomendações científicas para garantir o estoque de peixes nos rios, especialmente de pirarucus.

    Entre os anos de 80 e 90, a população dessa espécie, que é a maior de água doce do mundo, chegando a medir 3m e a pesar 200kg, reduzia-se a olhos vistos, em virtude da pressão por recursos pesqueiros exercida pelos grandes centros urbanos, como a capital amazonense, Manaus.

    Essa política de incentivo à produção se consolidou com o surgimento de tecnologias como o motor a propulsão e a produção de gelo em escala.

    Pesados, compridos e com uma constituição respiratória que os obriga a se expor com mais frequência na superfície dos rios, os pirarucus se tornaram presas fáceis diante de pescadores pressionados a atender um mercado em franca expansão.

    Não é difícil de se presumir que o tamanho médio dos peixes capturados e comercializados começou a diminuir ao longo do tempo, obrigando o País a instituir as primeiras restrições para a pesca da espécie, até que, em 1996, a captura do pirarucu foi totalmente proibida no Amazonas.

    Ciente da importância econômica da pesca para os amazônidas, o Instituto Mamirauá intensificou as pesquisas que serviram de subsídio para a retomada da exploração comercial e, principalmente, sustentável do pirarucu.

    Engraçado é que muitos não sabem que, no Estado do Amazonas, cem mil pessoas sustentam suas famílias em função da pesca, não apenas do pirarucu, mas da pesca. E, em que pese nós detenhamos uma grande reserva de água doce do Planeta, ainda a nossa atividade econômica da pesca é de subsistência de manejo ou explorada com as tecnologias ainda do século passado.

    Em 1999, começava o projeto de manejo com regras muito claras, entre elas, o respeito ao tamanho mínimo do pescado a ser capturado e a interrupção da atividade durante o período reprodutivo.

    A parceria entre a ciência e o saber tradicional só acumula resultados exitosos nos últimos 20 anos. Houve aumento médio de 427% dos estoques de pirarucu e faturamento total de mais de R$23 milhões para pescadores e pescadoras envolvidas.

    A filosofia que impulsionou o manejo do peixe símbolo da grandiosidade amazônica repete-se em dezenas de outros projetos – aí está, talvez, uma das principais virtudes do projeto Mamirauá.

    Pioneiro, inspirou a criação de um novo modelo de reservas na Amazônia, principalmente na Amazônia Ocidental: as reservas de desenvolvimento sustentável. Quando Deus e o povo do Amazonas me deram a oportunidade de governar o Amazonas, nós fizemos com que essa experiência fosse replicada em várias outras reservas, introduzindo as boas práticas e introduzindo um novo conceito de uma economia baseada na responsabilidade social e ambiental do interior da Amazônia, o que proporcionou ao Amazonas, por exemplo, ter a credibilidade para, ao ter uma boa relação com a natureza, ao saber valorizar a árvore em pé durante aquele período, implementar um gasoduto que levasse, 800km floresta adentro, gás natural para a substituição de combustíveis menos amigáveis do ponto de vista ambiental, gerando uma energia mais limpa e mais barata.

    Portanto, a credibilidade é a relação da valorização do homem e da natureza; é setor e fator primordial num Estado com as características do Amazonas e num país que tem as bênçãos de possuir um patrimônio tão grande como o patrimônio da Amazônia brasileira. Entretanto, outros aspectos são fundamentais.

    A filosofia que impulsionou o manejo do peixe, símbolo da grandiosidade amazônica, repete-se em dezenas de outros projetos, como já dito, pesquisas e iniciativas criadas pelo instituto que impactam diretamente na qualidade de vida dos que decidiram fazer da floresta o seu lugar no mundo.

    A mortalidade infantil nas populações beneficiadas pelas ações do Mamirauá, por exemplo, caiu em mais de 67%. Quase 400 estudantes se formaram no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica e 200 mulheres e meninas participaram de ações de empreendedorismo, de igualdade de gênero e liderança.

    Os resultados para a natureza são, com certeza, imensuráveis – mas eu queria dizer que os resultados para as pessoas humanas que lá vivam talvez sejam mais importantes e mais imensuráveis ainda. Preservar a Amazônia é defender um delicado equilíbrio do qual nossas vidas e futuras gerações dependem. Eu acrescentaria que não apenas as futuras gerações dependem, a dignidade humana daqueles que são os verdadeiros guardiões deste patrimônio depende muito de sabermos valorizar esses resultados e compreender o momento e o desafio em que o Brasil vive.

    José Márcio Ayres, o pesquisador que inspira o instituto, faleceu em 2003, aos 49 anos. Podemos dizer que ele se foi cedo demais, sem ver o quanto contribuiu para o desenvolvimento sustentável da Amazônia.

    Seu legado, no entanto, não tem qualquer vínculo com a finitude. Está presente em cada avanço da instituição que ajudou a criar. Esperamos que esse progresso não encontre fronteiras.

    Em 2018, o Mamirauá recebeu o Prêmio José Reis, concedido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por promover a inclusão social com protagonismo das comunidades sediadas na Amazônia.

    Outra grande atuação do Instituto Mamirauá ocorre no turismo sustentável pela Região Amazônica. É um trabalho tão bem executado que atraiu a atenção de entidades internacionais, como a World Travel & Tourism Council, organização sediada em Londres, que indicou o Instituto Mamirauá como um dos concorrentes ao prêmio WTTC Tourism for Tomorrow Awards, no ano de 2018, ao lado de iniciativas similares e relevantes em vários países do mundo.

    Nesses 20 anos de existência, o Instituto Mamirauá conquistou o nosso respeito com muito trabalho e dedicação à causa ambiental, ajudando a inserir o tema na ordem do dia do Amazonas e do Brasil.

    Cabe a nós, agora, reconhecer e louvar a importância dessa instituição que veio para ficar e que, tomara, ainda nos reserve várias décadas de luta pela preservação da casa de todos nós: o Planeta Terra.

    Viva o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá!

    Antes de finalizar e passar a palavra aos demais participantes desta homenagem, eu gostaria de dizer algumas das minhas experiências pessoais. Eu conheço Mamirauá, não apenas de livro, não apenas de filme, mas por estar lá, por visitar, por levar a minha família ao Mamirauá. Lembro quando tive oportunidade de levar as minhas filhas ao Mamirauá. Minha filha mais nova, a Bianca, ainda muito jovem, teve a oportunidade de ter experiências que ela lembra até hoje. Uma delas a de conhecer um jacaré que atendia pelo nome. Chamado – poucos podem acreditar nisso – por uma senhora, ele vinha próximo ao flutuante, ao terminal central da pousada, e – como a senhora está fazendo – dava um tchauzinho e uma boa abocanhada num pedaço de peixe que estava à sua espera.

    Além disso, uma trilha que passava por um afluente de um igarapé, um pequeno rio com árvores e pássaros de todas as espécies, era, sem dúvida nenhuma, algo a se mostrar. A despesca do pirarucu, que é uma prática importante hoje na sobrevivência, talvez seja um dos momentos mais bonitos de captura de um peixe que eu já tenha visto ao longo da minha vida.

    O importante é a relação com que esses produtos da natureza têm com a melhoria de renda e a melhoria da qualidade de vida do povo que lá vive. Eu não acredito em modelo de desenvolvimento que não leve, em primeiro lugar, o fator da qualidade de vida daqueles que lá vivem. Eu sempre digo que não peça para uma mãe valorizar um pirarucu ou uma castanheira ou um peixe-boi se a sua filha ou o seu filho estiver chorando com fome, porque eu não conheço uma mãe que deixa de priorizar a alimentação, a saúde e a felicidade do seu filho e da sua família em detrimento de qualquer outra espécie. Portanto, é preciso saber respeitar os amazônidas, saber respeitar aqueles que verdadeiramente cuidam, preservam e desenvolvem um manejo sustentável daquela região. É preciso que todos os brasileiros, até mesmo a comunidade internacional, possam ter essa compreensão.

    Dou esse testemunho porque conheço praticamente todos os rincões do meu Estado e boas áreas, inúmeras áreas da Amazônia brasileira. Tive e tenho a oportunidade de estar presente em vários lugares e ver o quanto é importante ainda rompermos esta fronteira da valorização da relação homem-natureza, fazendo com que não só os produtos da natureza, os produtos sustentáveis tenham valor econômico, mas, principalmente, a valorização daqueles que lá vivem, lá trabalham, lá educam os seus filhos e lá querem ter perspectivas de vida melhor.

     Por fim, quero dizer que o Amazonas não seria 97% ou 98% conservado se não tivesse um projeto macroeconômico que pudesse financiar tudo isso. Na realidade, a criação da Zona Franca de Manaus teve uma finalidade, lá na década de 60, que era integrar o Brasil. Hoje, a principal finalidade, o principal resultado apresentado pela Zona Franca de Manaus não foi o da integração; foi o da conservação do maior patrimônio que o povo brasileiro possui. O que nos diferencia do Estado do Pará não é que os paraenses sejam mais ou menos responsáveis pelo meio ambiente, não, é que o princípio macroeconômico e o projeto macroeconômico do Estado do Pará foram construídos em cima da mineração, do agronegócio, da pecuária, do tratamento e do uso da terra. Enquanto que o Amazonas, por uma decisão do Estado brasileiro, teve como macroeconomia a utilização de tecnologias e de indústrias não degradadoras do meio ambiente. Isso, nos últimos 52 anos, possibilitou ao Amazonas conservar, preservar e preparar o Brasil para um novo passo adiante, porque, com as nossas tecnologias do século XXI, tenho certeza, o Brasil será capaz de desenvolver atividades econômicas na Amazônia com muito mais respeito à natureza e muito maior valorização do ser humano.

    Dito isso, parabéns ao Instituto Mamirauá, parabéns aos trabalhadores, parabéns à população que vive naquela região, parabéns aos cientistas e a todos aqueles que horam a memória do Márcio, fazendo com que nós possamos ter um binômio de respeito para com as pessoas e para com a natureza.

    Parabéns mais uma vez!

    Vamos aos próximos oradores. (Palmas.)

    Eu passo a palavra ao representante do Instituto Mamirauá, o Sr. João Valsecchi do Amaral.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/05/2019 - Página 8