Discurso durante a 93ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da Operação Lava Jato e de cautela no exame dos fatos noticiados na imprensa envolvendo o Ministro Sérgio Moro e o Procurador Deltan Dallagnol.

Autor
Marcos Rogério (DEM - Democratas/RO)
Nome completo: Marcos Rogério da Silva Brito
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:
  • Defesa da Operação Lava Jato e de cautela no exame dos fatos noticiados na imprensa envolvendo o Ministro Sérgio Moro e o Procurador Deltan Dallagnol.
Publicação
Publicação no DSF de 11/06/2019 - Página 16
Assunto
Outros > CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Indexação
  • DEFESA, OPERAÇÃO LAVA JATO, CAUTELA, EXAME, FATO, NOTICIARIO, IMPRENSA, REFERENCIA, TROCA, INFORMAÇÕES, INTERNET, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), SERGIO MORO, RELAÇÃO, PROCURADOR.

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RO. Para discursar.) – Sr. Presidente, nobre Senador Izalci, Sras. e Srs. Senadores, os que nos acompanham pelo sistema de comunicação do Senado Federal, ninguém está acima da lei ou é imune a investigações. Essa é a premissa básica em relação aos fatos mais recentes envolvendo o ex-juiz Sergio Moro, hoje Ministro da Justiça, e membros do Ministério Público, integrantes da força-tarefa da Lava Jato, nomeadamente o Procurador Deltan Dallagnol.

    Todavia, Sr. Presidente, o rumo das explorações desses fatos é justamente o que preocupa quem está interessado em ver o Brasil firme no processo de combate intransigente à corrupção. Sim; é claro que, agora, voltarão à carga aqueles que se sentiram, direta ou indiretamente, prejudicados pelas condenações judiciais oriundas da Lava Jato, em que pese tenham sido muitas delas já confirmadas em segunda e até em outras instâncias, instâncias superiores, e profundamente perscrutadas quanto à sua legalidade formal no âmbito das cortes superiores – STJ e STF.

    Temos de ter claro tudo isto: que, a despeito de eventuais violações de preceitos éticos, os processos criminais se mostram hígidos. Não é possível misturar as coisas. Acredito que do próprio Supremo Tribunal Federal, de onde, segundo setores da imprensa, já se ouvem vozes no sentido da possibilidade de anulação de processos criminais, é preciso cautela, Sr. Presidente. Prefiro não acreditar que os membros da mais alta Corte do País, que também funcionam como juízes criminais em muitos casos, se arvorem tão cedo a dar declarações que coloquem em dúvida a licitude de processos penais, o que sabemos somente será possível se verificar à luz de cada ato inquisitorial, investigativo, de provimento cautelar, de instrução e, finalmente, de julgamento. Estou levando em consideração que a referência a eventuais posições tão madrugadoras de Ministros do Supremo sejam apenas especulações de setores da mídia que torcem para o enfraquecimento da Lava Jato, além, naturalmente, das alas políticas que não escondem esse posicionamento.

    O que o bom senso exige, Sr. Presidente, neste momento, é a defesa da integridade de uma operação que logrou desbaratar verdadeiras quadrilhas que saqueavam os cofres da Nação, o que está diametralmente distante de eventuais conversas entre membros do Ministério Público e o magistrado responsável pelo julgamento dos pedidos cautelares e a prolatação das próprias sentenças.

    Ademais, é preciso ter cautela na análise do conteúdo das conversas, primeiro, atestando a sua veracidade, segundo, considerando o contexto em que essas conversas aconteceram, o contexto em que foram feitas.

    Pelo teor divulgado até este momento, as instâncias adequadas para a análise quanto à ocorrência ou não de violações éticas são justamente o Conselho Nacional do Ministério Público e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), constituídos por força da nossa própria Constituição Federal.

    Outrossim, é de pleno direito das respectivas defesas, ao exame da concretude das falas e eventual influência ilícita em decisões, pugnar pela anulação in concrecto desse ou daquele ato judicial. Não é uma anulação a esmo, se for o caso, mas uma anulação pontual, analisando cada fala, cada contexto para se aferir eventuais excessos ou ilegalidades. Há um princípio basilar do direito, oriundo do sistema jurídico francês, pas de nullité sans grief, que, na tradução para o português, deixa bem claro qual é o seu objetivo: não há nulidade sem que haja prejuízo.

    Outro ponto a ser examinado, Srs. Senadores, diz respeito à tradição jurídica de proximidade entre promotores, procuradores e magistrados. Isso também vem do direito francês, da figura dos procuradores do rei, os chamados magistrados em pé. Seria ingênuo de nossa parte considerar que, de forma absoluta, funciona a igualdade entre acusação e defesa, à medida que a acusação é um órgão do Estado, assim como é o juiz.

    Para as medidas cautelares, por exemplo, é de toda evidência que o Ministério Público precisa ter acesso, primeiro, ao magistrado, buscando convencê-lo da necessidade de decisões-surpresa, sem a ouvida dos investigados. Ou alguém pleiteia algo diferente disso? Isso faz parte das prerrogativas do Estado, e não necessariamente do promotor ou procurador. É o Estado lato sensu que precisa dispor de meios eficazes para combater os crimes punidos mediante ações penais públicas incondicionadas, para os quais são demandados expedientes apuratórios que não podem ser levados ao conhecimento prévio dos suspeitos de práticas criminosas.

    Seguramente, não é isso que pretendemos censurar, sob pena de estarmos defendendo o afrouxamento do poder de investigação do Estado. A quem interessa o afrouxamento do poder de investigação do Estado? A quem interessa a impunidade? Se realmente queremos repensar, de forma objetiva, até que ponto pode haver essa aproximação entre promotor e juiz, precisamos repensar nosso modelo jurisdicional e estabelecer critérios objetivos para essa relação institucional.

    Vejam, Srs. Senadores, como sempre reclamam os advogados, especialmente os tribunos, a diferença começa sobre a posição do promotor e do juiz nos tribunais: o promotor, sempre assentado ao lado do juiz, o que não ocorre com a defesa. É a tradição. É assim que funciona.

    O que estou dizendo é que os fatos trazidos à baila precisam ser considerados sob um espectro mais amplo, sob pena de estarmos exercendo uma injusta e precipitada censura.

    Finalmente, não podemos considerar a envergadura da Lava Jato, sua abrangência, sua complexidade. A Lava Jato é maior que seus integrantes. A Lava Jato está acima dos seus integrantes. Eles não são perfeitos, podem falhar.

    É notório que Polícia Federal, Ministério Público e Judiciário terminam tendo uma necessária aproximação ao longo das operações, especialmente em uma época em que havia uma clara disposição de se atacar a Operação Lava Jato. A quem queremos enganar? Quem quer ser enganado nesse processo todo? Ou não é isso a clara evidência que nós vimos ao longo desse processo?

    Sim, quando forças contrárias poderosas se levantaram contra a Operação Lava Jato, não é de se ignorar que os atores desse processo possam ter se unido mais intensamente para preservar as investigações e atingir a finalidade comum, que era fazer justiça aos casos concretos. Isso é o que, mais do que tudo, precisa ser considerado. Eventuais prejuízos aos acusados precisarão ser considerados à luz de cada ato investigativo ou judiciário.

    E aqui – repito, com clareza –, havendo prejuízo às partes, havendo excesso, seja no campo ético, seja no campo da legalidade, dentro das esferas competentes, dos espaços próprios, é preciso fazer esse enfrentamento, é preciso fazer essa análise, mas não me parece adequado, não me parece razoável, não me parece do interesse público, muito pelo contrário, querer atacar e colocar a marca de desonesta na Operação Lava Jato, que é, Sr. Presidente, com toda a vênia, uma conquista da sociedade brasileira, que se viu, ao longo dos tempos, ao longo dos últimos anos, sem esperança, desapontada, entristecida, decepcionada não só com a política, mas também com aqueles que formam o próprio Estado, que fazem parte das instituições de controle do Estado, como o próprio Judiciário.

    Por isso, eu disse no início e concluo repetindo: ninguém está acima da lei ou é imune às investigações. O que não podemos é explorar os fatos contra o interesse de todo o País, que estava e está cansado de tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra e de tanto ver crescer a injustiça, como já dizia Ruy Barbosa. Precisamos, definitivamente, deixar para trás os tempos em que os poderes se agigantavam nas mãos dos maus, sob pena de a sociedade brasileira voltar a desanimar-se da virtude, rir da honra e ter vergonha de ser honesto.

    Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, a Lava Jato representou e representa um sopro de esperança nas instituições. A Lava Jato representa uma conquista da sociedade no enfrentamento a criminosos, sejam eles quem forem, estejam eles onde estiverem. Com a estatura que tem, com o poder que tem, a Lava Jato mostrou ao Brasil que é possível enfrentar o crime organizado, institucionalizado, sistêmico, na defesa do interesse nacional, na defesa do interesse público, na defesa da probidade da administração. Ou não é disso que estamos a falar? Ou não é disso que estamos falando?

    Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, prefiro me filiar, prefiro me associar aos que defendem a probidade, prefiro me associar aos que defendem investigação, prefiro me filiar àqueles que defendem um Estado puro, limpo, afastado de todo tipo de suspeita. Isso não significa dizer que ignoro a gravidade daquilo que estamos a ter conhecimento neste momento. Não estou aqui levianamente, e não poderia fazê-lo, sob pena de ir contra aquilo que defendo ao longo da minha vida, a desconsiderar a gravidade do que estamos vendo noticiado hoje. O que estou fazendo aqui é uma análise, é uma avaliação de que não podemos, neste momento, a par de alguns recortes e informativos do vazamento de que ainda não se sabe a extensão, não se sabe a profundidade, condenar toda uma operação que deu ao Brasil, repito, as condições de voltar a acreditar, de voltar a ter esperança.

    Sr. Presidente, não há democracia que sobreviva num ambiente de desesperança. Não há democracia, não há Estado de direito que consiga prevalecer, sobreviver num ambiente de permanente desconfiança. Repito: a Lava Jato é um sopro de esperança para os brasileiros.

    Na última eleição, todos nós que aqui estamos fomos às ruas e sentimos exatamente isto: o cidadão brasileiro, desesperançado, revoltado, frustrado, distante da política em razão justamente do que viu ao longo dos anos. Mas também pôde ver, nesses últimos tempos, dentro de setores do Judiciário, dentro de setores do Ministério Público, dentro da Polícia Federal, uma ação concreta de enfrentamento e combate à corrupção. E os brasileiros voltaram a ter esperança.

    Então, não temos, neste momento, o direito de, mesmo reconhecendo a gravidade dos fatos noticiados, mesmo reconhecendo aqui eventualmente algum deslize no campo ético...

    A eticidade faz parte dos princípios que devem nortear a Administração Pública. Fala-se muito, dentro do que está estabelecido no 37 da Carta de 1988, da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da eficiência; e nem sempre se fala da eticidade, da economicidade. Entre os princípios também da Administração Pública, está a eticidade. O ato deve cumprir o Limpe constitucional, mas não afastar a eticidade. A ética é o ingrediente fundamental! E há quem defenda a presença dela, no 37 da Constituição, dentro do escopo do que vem a ser o princípio da moralidade. Mas não podemos, em nome dessa constatação, em nome desse enfrentamento, diminuir o tamanho, a importância da Operação Lava Jato. A Operação Lava Jato é uma conquista dos brasileiros. A Operação Lava Jato é um avanço da cidadania. A Operação Lava Jato é uma operação de resgate da dignidade dos brasileiros.

    É por isso que eu prefiro me associar aos de boa-fé, aos de boa índole, aos probos que atuaram e ainda atuam nesta importante força-tarefa chamada Lava Jato.

    E repito: a Lava Jato é maior do que os seus integrantes. Seus integrantes são humanos e, como seres humanos, podem até falhar. E não estou aqui, por antecipação, fazendo juízo valorativo em relação à conduta deles, porque, do que li até agora, embora se tenha alardeado muita coisa, não vi, de forma clara, de forma evidente, qualquer tipo de direcionamento mais profundo que viesse a colocar em risco a higidez do processo. É óbvio que é algo que ainda está em curso e é preciso dar tempo ao tempo, mas, como disse e repito, nós temos as instâncias próprias para apurar as condutas daqueles que estão no Ministério Público – o Conselho Nacional do Ministério Público – e no Judiciário – o Conselho Nacional de Justiça.

    Por ora, continuo firme na defesa da Lava Jato, na defesa das instituições, porque não há democracia forte com instituições fracas. Ou nós defendemos as instituições, o seu papel, a sua relevância, ou, então, fracassamos como modelo democrático.

    Sr. Presidente, era o que tinha para a tarde de hoje.

    Mais uma vez, ressalto aqui minha confiança de que aquilo que a Operação Lava Jato, aquilo que o então Juiz Sergio Moro fez como juiz federal, confirmado pelo Tribunal Regional Federal, confirmado pelo STJ, confirmado pelo Supremo Tribunal Federal, certamente não estará, neste momento, sendo colocado em segundo plano em razão de algumas publicações.

    É bom dar tempo ao tempo, mas prefiro presumir justamente a segurança dos atos praticados, das decisões praticadas no âmbito da Lava Jato.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/06/2019 - Página 16