Discurso durante a 115ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre estudo da ONU e reportagem do jornal O Globo que, segundo S. Exª, demonstram a incompetência administrativa durante os últimos governos do País.

Registro sobre requerimento de informações encaminhado ao Ministro da Economia, com questionamentos sobre a predominância do sistema financeiro na economia nacional.

Autor
Alvaro Dias (PODEMOS - Podemos/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Comentários sobre estudo da ONU e reportagem do jornal O Globo que, segundo S. Exª, demonstram a incompetência administrativa durante os últimos governos do País.
ECONOMIA:
  • Registro sobre requerimento de informações encaminhado ao Ministro da Economia, com questionamentos sobre a predominância do sistema financeiro na economia nacional.
Publicação
Publicação no DSF de 09/07/2019 - Página 46
Assuntos
Outros > GOVERNO FEDERAL
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • COMENTARIO, ESTUDO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), MATERIA, JORNAL, O GLOBO, DIVULGAÇÃO, ASSUNTO, INCOMPETENCIA, GESTÃO, GOVERNO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ENFASE, CONTINUAÇÃO, SITUAÇÃO, MISERIA, POPULAÇÃO, PAIS, BRASIL.
  • REGISTRO, REQUERIMENTO, DESTINAÇÃO, MINISTRO, PAULO GUEDES, MINISTERIO DA ECONOMIA, ASSUNTO, SOLICITAÇÃO, INFORMAÇÃO, PREDOMINANCIA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.

    O SR. ALVARO DIAS (PODEMOS - PR. Para discursar.) – Sr. Presidente, Nelsinho Trad, Senador Telmário, Srs. Senadores, Sras. Senadoras, durante 15 anos, desta tribuna, procurei desmentir afirmações mistificadoras que procuravam escamotear a realidade vivida neste País. Em determinado momento, nós ouvíamos muito do marketing oficial petista, instalado no Palácio do Planalto, a afirmação de que estávamos vivendo o espetáculo do crescimento. E eu dizia: que espetáculo do crescimento é esse se o País cresce mais, apenas, do que o Haiti, onde mora a pobreza, a miséria, o infortúnio e a guerra? Todos os países do mundo, com exceção do Haiti, cresciam mais do que o Brasil. E o Presidente de então dizia que nós estávamos vivendo o espetáculo do crescimento. Uma falácia! E quantas vezes contestamos a afirmação de que o Governo retirava milhões de brasileiros da pobreza? Essa era uma afirmação reiterada.

    Agora, um estudo de profundidade realizado pela Organização das Nações Unidos diz quem estava com a verdade. Era o Governo? O marketing oficial do PT? Ou era um modesto Senador da oposição, que quase sempre isoladamente comparecia a esta tribuna para tentar recolocar a verdade?

    Não fico satisfeito, não é motivo de alegria verificar que a ONU (Organização das Nações Unidas) apresenta um estudo comprovando uma década e meia perdida, comprovando que perdemos, sim, uma década e meia, não só pela corrupção, mas também pela incompetência.

    Esse estudo revela que nós avançamos mais nas décadas de 70, 80 e 90 do que durante a era petista no Governo. Enfim, o País não crescia como se estivéssemos em um espetáculo de crescimento, e o Governo não retirava da pobreza milhões de brasileiros.

    Não precisaríamos nem mesmo desse estudo da ONU, porque, na verdade, os números oficiais existentes no Brasil o comprovam: são mais de 52 milhões de brasileiros abaixo da linha da pobreza; hoje, somos 62 milhões de brasileiros endividados; a metade dos brasileiros, mais de 100 milhões, vivem com menos de um salário mínimo, e, no Nordeste, 68% da população vive com menos de um salário mínimo; 15 milhões de brasileiros sobrevivem com até R$70 por mês; nós temos apenas 33 milhões de trabalhadores brasileiros com carteira assinada, para uma força de trabalho de mais de 90 milhões de pessoas; nós temos 100 milhões de brasileiros sem acesso ao saneamento básico; 17 milhões de brasileiros sem acesso à coleta de lixo; 35 milhões de brasileiros sem acesso à água tratada. Portanto, nós não vivemos esse utópico espetáculo do crescimento e não assistimos a essa empreitada heroica de se retirar da pobreza milhões de brasileiros. O que nós assistimos foi à falácia, foi à mentira, foi ao engodo.

    E, ainda ontem, Senador Nelsinho Trad, o jornal O Globo, em editorial sob título sugestivo – "O museu de obras públicas paralisadas no Brasil" –, mostra mais uma referência à incompetência que se consagrou, de forma absoluta, nos últimos mandatos neste País. São 14 mil obras paradas! Mas não é tudo, porque é com base em uma amostragem que o Tribunal de Contas da União pesquisou e constatou que, da amostragem verificada, pesquisada, 14 mil obras estão paradas, correspondendo a um investimento de R$144 bilhões. Não é pouco, R$144 bilhões, como V. Exa. dizia há pouco, é o PIB do Uruguai. Eu digo: é o PIB de vários países do mundo.

    Então, R$144 bilhões foram os investimentos da União nas obras paradas, de um total de R$725 bilhões – R$725 bilhões foram os investimentos do Governo da União durante dez anos em obras no País. Trinta e sete por cento destas obras estão paralisadas, correspondendo a um investimento de R$144 bilhões. A maior parte tem origem no PAC. Vocês se lembram da propaganda oficial sobre o PAC. Vocês se lembram da mãe do PAC! Até tivemos a mãe do PAC... A ex-Presidente Dilma Rousseff, quando ainda Chefe da Casa Civil, foi denominada de mãe do PAC.

    Foram 663 obras do PAC, sendo que 127 estão paradas – 127 obras do PAC estão paradas. E como disse o Tribunal de Contas, o próprio Tribunal de Contas afirma, pode ser muito mais, porque as obras estão pulverizadas em todos os Estados brasileiros. Não existe um cadastro das obras e, por esta razão, o Tribunal de Contas trabalha por amostragem. Então, buscou pesquisar, se não me falha a memória, um número de 38 mil obras que seriam realizadas no País e encontrou 14 mil delas nessa amostragem paralisadas. Portanto, pode ser muito mais do que isso, o número de obras pode ser bem superior e os valores também muito superiores aos R$144 bilhões aqui destacados.

    E qual a razão da paralisação destas obras? Muitas delas são paralisadas por imposição judicial, já que superfaturadas. O sobrepreço ou o superfaturamento alcança deste lote 1,3 mil obras. Há falta de projetos, especialmente projeto executivo, que é essencial para evitar os aditivos, que levam o preço das obras à estratosfera. Foram 1.158 obras sem projeto, mais 749 obras com falha na composição dos custos.

    Portanto, são várias as razões da paralisação destas obras, não apenas a falta de recursos. Faltou dinheiro, a obra para, mas há casos em que a paralisação se dá em razão de irregularidades. Aí, há uma imposição de natureza judicial para a paralisação destas obras.

    A conclusão é a seguinte, Senador Izalci Lucas, que agora preside a sessão: não foi apenas corrupção. É evidente que a corrupção é uma causa essencial das mazelas vividas nesse País: assaltaram os cofres públicos, arrombaram o caixa nacional. Obviamente, desarrumaram as finanças públicas, fragilizaram o Tesouro Nacional, debilitaram o patrimônio deste País, que foi dilapidado, que foi pilhado pela sede, pelo apetite de enriquecimento ilícito de muitos daqueles que assumiram o poder no País e, de outro lado, em nome de um projeto de poder de longo prazo.

    O Brasil foi, literalmente, assaltado. E nós estamos vivendo as consequências desse assalto.

    Mas não foi só o assalto, o roubo, a corrupção. Foi também a incompetência. A incompetência administrativa se consagrou de forma absoluta nos últimos mandatos no Brasil. E a população é que sofre: sofre com a violência, sofre com a ausência de qualidade, especialmente no serviço de saúde pública que é oferecido à nossa gente, levando à morte milhares de brasileiros em corredores de hospitais abarrotados, sem atendimento, e na educação, que está em retrocesso. Aliás, esse estudo da Organização das Nações Unidas revela também o fracasso do sistema educacional brasileiro nos últimos anos.

    Enfim, a corrupção, que se somou à incompetência de gestão, levou o País a esta crise monumental, que está a exigir de quem governa e de quem representa a população no Legislativo a responsabilidade histórica de contribuir – e todos juntos contribuirmos – para que possamos encontrar os caminhos que nos levem a um futuro melhor.

    Eu ainda, Sr. Presidente, aproveito os minutos que me restam para abordar outro tema que considero, agora, essencial.

    Se queremos retirar o País da crise em que se encontra, nós não podemos ignorar a perversidade do sistema financeiro, que sobrou, que folgou, que prosperou, que avançou, especialmente pela competência dos seus artífices e, sobretudo, pela generosidade dos governantes, porque, se nesse estudo da ONU se revela o empobrecimento do povo brasileiro, de outro lado, revela também o enriquecimento de setores privilegiados, especialmente os banqueiros e os grandes empreiteiros de obras públicas, muitos dos quais, atualmente, estão com a Polícia Federal e o Ministério Público nos seus calcanhares em razão da Operação Lava Jato.

    Em razão, sobretudo, dessa predominância do sistema financeiro na economia nacional, que é uma das causas do subdesenvolvimento dos últimos tempos, nós estamos encaminhando ao Ministro Paulo Guedes um pedido de informações sobre auditorias, se o Banco Central realiza auditorias nas metodologias utilizadas pelos bancos para calcularem os seus custos com o crédito, para definirem seus respectivos spreads e, consequentemente, as suas taxas de juros. As taxas de juros são praticadas na estratosfera da economia brasileira.

    Nós tivemos, recentemente, uma pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, a CNC. Nessa pesquisa, revela-se que o percentual de famílias endividadas alcançou 62,7% em abril. São 62,7% de endividados no País. Apurou, também, que o cartão de crédito foi apontado por 77,6% dos entrevistados como a principal fonte de dívida, e na sequência aparecem os carnês, com 15,3%, e financiamentos de carro, com 10%.

    Com esses juros cobrados pelos bancos instalados no Brasil, muito dificilmente uma pessoa, com essa modalidade de dívida, conseguirá saneá-la no curto prazo. O endividamento, certamente, se prolongará no tempo.

    Essa liberdade absoluta para os bancos cobrarem juros estratosféricos em todas as modalidades de crédito faz parte da paisagem financeira do Brasil nos últimos 25 anos, sem que ações concretas e eficientes por parte dos Governos que se sucedem sejam adotadas para melhorar o ambiente de crédito para os brasileiros. Não se tem notícia de uma auditoria consistente, realizada na contabilidade dos bancos, para aferir a razoabilidade das taxas de juros cobradas, que, se não constituírem, estão entre as maiores taxas de juros cobradas em todo o mundo.

    As empresas do setor financeiro no Brasil, inclusive as instituições fiscalizadoras do sistema financeiro, resistem, inexplicavelmente, à instituição da prática de auditoria externa. Quem pede a realização de auditoria dos mecanismos de gestão da dívida pública logo é tachado de radical. O mesmo ocorre com relação à verificação dos cálculos que fundamentam a taxa de spread informado pelos bancos.

    Importante ressaltar que a auditoria constitui uma ferramenta que permite o exame ou verificação objetiva das atividades e operações de uma organização. O objetivo desse exame é analisar a conformidade dessas atividades e operações em relação a determinadas regras e normas, aos objetivos definidos para o setor ou instituição e aos princípios contábeis aceitos. Uma auditoria permite identificar qualquer tipo de desvio que possa vir a requerer uma ação corretiva. Uma auditoria realizada pelo Banco Central no exercício de sua função e obrigação fiscalizadora ou por empresa de contabilidade contratada constituiria uma auditoria externa independente, cujo objetivo seria emitir um parecer sobre a regularidade, legalidade e razoabilidade das operações financeiras da organização objeto da auditoria.

    A prática da auditoria ajuda a instituição reguladora e fiscalizadora a lidar com a complexidade das atividades reguladas, que devem ser fiscalizadas, especialmente no mercado de crédito, o que fortalece a transparência e confiança nas empresas e nos órgãos fiscalizadores.

    O Banco de Portugal há décadas mantém parcerias com as maiores empresas de contabilidade do mundo, que realizam as auditorias das instituições financeiras, inclusive nas atividades do próprio Banco de Portugal. Recentemente, o Banco de Portugal trocou a Price, auditora parceira desde 1998, pela empresa Deloitte, que superou propostas da auditoria Ernest&Young.

    Em Portugal e em vários outros países do mundo, as instituições financeiras e a imprensa não classificam a prática de auditoria como perigosa; ao contrário, é relatada como atividade natural, necessária e desejada. É por essa razão que nós estamos insistindo com esse tema.

    Com base nos argumentos que expusemos aqui, estou solicitando informações relacionadas à atividade de fiscalização, atribuída ao Banco Central do Brasil, contemplando alguns questionamentos. O primeiro deles é se, recentemente, o Banco Central publicou um estudo sobre concentração, concorrência e custo do crédito. O estudo cita quatro publicações no campo reservado às referências bibliográficas, mas, em nenhum momento, menciona a realização de uma auditoria nas metodologias utilizadas pelos bancos para calcularem seus custos com o crédito para definirem seus respectivos spreads.

    A pergunta é: o Banco Central do Brasil já auditou essas metodologias em algum momento? Quando? Quais os bancos foram auditados e quais foram os resultados?

    Aí temos mais algumas indagações, Sr. Presidente. Eu peço a V. Exa. – não quero extrapolar o tempo – para considerar como lido esse requerimento, que já encaminhei ao Ministro Paulo Guedes, buscando essas informações para que nós possamos continuar debatendo aqui, no Senado Federal, as altas taxas de juros praticadas no Brasil, especialmente o lançamento de títulos públicos sem transparência e as operações compromissadas que também são realizadas sem qualquer transparência.

    Uma auditoria do tribunal de contas que solicitamos faz algumas sugestões, entre elas a instituição de um conselho de gestão fiscal, além do uso do registro eletrônico para que a sociedade brasileira possa conhecer as implicações do nosso endividamento com a exposição dos números referentes a dívidas contraídas por Municípios, Estados e pela União, explicitando os prazos, prazos de carência, taxas de juros, valores, perspectivas de retorno e também colocando plataforma para que os leilões de títulos públicos possam se realizar de forma transparente sem essa suposição existente de que os chamados dealers seriam beneficiados nessas transações realizadas pelo Governo brasileiro por intermédio do Banco Central, especialmente quando se trata das chamadas operações compromissadas.

    Enfim, Sr. Presidente, eu peço a inserção nos Anais do Senado Federal da íntegra deste requerimento que estou encaminhando ao Ministro da Economia, Sr. Paulo Guedes.

    Muito obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/07/2019 - Página 46