Pronunciamento de Randolfe Rodrigues em 15/08/2019
Discurso durante a 136ª Sessão Especial, no Senado Federal
Sessão Especial destinada a comemorar os 40 anos da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), nos termos do Requerimento nº 168, de 2019, de autoria do Senador Lasier Martins e de outros Senadores.
- Autor
- Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
- Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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HOMENAGEM:
- Sessão Especial destinada a comemorar os 40 anos da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), nos termos do Requerimento nº 168, de 2019, de autoria do Senador Lasier Martins e de outros Senadores.
- Publicação
- Publicação no DSF de 16/08/2019 - Página 25
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM
- Indexação
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- SESSÃO ESPECIAL, DESTINAÇÃO, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO, FUNDAÇÃO, ASSOCIAÇÃO NACIONAL, JORNAL.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP. Para discursar.) – Sr. Presidente e autor desta sessão, desculpem-me todos e todas a chegada de afogadilho. Quero cumprimentar, em nome desse meu querido Paulo Tonet, os demais integrantes desta Mesa e homenagear a Associação Nacional de Jornais. Quis ainda o tempo... Aproveito, me permitam, antes: ao olhar o Plenário encontro a presença da nossa caríssima Senadora Ana Amélia. É uma honra enorme para todos nós, e foi de uma satisfação fantástica para mim ter convivido com V. Exa. no Plenário deste Senado. Queria então cumprimentar todos e todas integrantes desta Mesa.
Quis o tempo ainda, apesar dos atropelos de nossa agenda aqui no Senado, chegar a tempo, Presidente Lasier, de prestigiar a sessão proposta por V. Exa., em um momento em que a homenagem à Associação Nacional de Jornais pelos seus 40 anos tem um significado de diagnóstico de que é mais do que homenagear simplesmente a Associação Nacional de Jornais. Já foi discorrido aqui, eu já percebi e presenciei, a história da ANJ é a história da imprensa livre no Brasil. Os jornais foram a primeira manifestação de liberdade de imprensa desde a fundação dessa Nação no século XIX. Portanto, em um momento como este, é necessário reafirmar os valores de um Estado democrático de direito.
Em uma obra conhecida e atual, Como as democracias morrem, é dito que os primeiros sinais da morte de uma democracia são quando o direito de ir e vir é cerceado, a liberdade de expressão é coibida, as minorias são oprimidas e a imprensa é calada. Esses são os sintomas da morte de uma democracia. E sempre que começa a morrer, a primeira vítima do extermínio, do assassinato em curso de uma democracia é quando tentam limitar a liberdade de imprensa, é quando buscam ameaçar a liberdade de imprensa.
A imprensa livre é o pilar basilar de um Estado democrático de direito. Isso não é dito por mim nesta tribuna no dia de hoje, Senador Lasier; isso é dito por um dos fundadores da democracia moderna, um americano, Alexander Hamilton, que assim se pronunciava sobre um dos pilares centrais para a existência de uma democracia. Não é à toa que os Constituintes que nos antecederam e que passaram por estes Plenários preceituaram, no art. 5º da Constituição, em vários dispositivos, e não é à toa também que o art. 5º é na nossa Constituição... O que o art. 5º é? O art. 5º é nossa declaração de direitos, é nossa declaração de direitos individuais, coletivos. É nossa proclamação de direitos humanos. É por isso que o nosso art. 5º é tão vasto. É por isso que ele é a espinha dorsal do texto constitucional. É por isso também que na promulgação da Constituição o saudoso Ulysses Guimarães, em vários momentos, fez a referência à imprensa livre. É por isso e em decorrência disso também que o art. 5º, em três dispositivos, reafirma a independência, a liberdade da imprensa e a liberdade de sua atuação – inciso IV, inciso IX e inciso XIV. Nos três, fica basilarmente afirmado como se sustenta a liberdade de imprensa. No primeiro, manifesta que é livre a manifestação, e aí nesse aspecto o pleonasmo, a reafirmação não é à toa. Manifesta a liberdade da manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. No seguinte, manifesta que é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação. Mais adiante, assegura a todos o acesso à informação, resguardado o sigilo da fonte – o acesso à informação, resguardado o sigilo da fonte.
Em tempos atuais, nós não podemos esquecer esses princípios. Nós, legisladores, nós, Parlamentares, em tempos atuais, não podemos esquecer esses três princípios. Não se pode cair na polarização de por estar à direita ou estar à esquerda, porque tão condenável quanto o totalitarismo de direita são os totalitarismos de esquerda. Eles se completam na história humana. Ambos buscam, em primeiro lugar, exterminar estas pirâmides basilares da democracia: a liberdade de manifestação, a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa.
Não existe imprensa livre em Estado totalitário à esquerda. Não existe imprensa livre em regimes totalitários à direita. Foi por isso que, na promulgação e na proclamação da nossa Constituição, foi dito também por Ulysses, deste local, de um local similar, Senador Lasier, a este onde o senhor está sentado, que malditas todas as tiranias, aonde quer que elas ergam, onde quer que elas existam.
Senador Lasier, estou convencido de que nos tempos atuais esses princípios aqui ditos, da nossa Constituição, têm que ser de atuação nossa para serem fiscalizados. Ao jornalista é garantido o sigilo da fonte; ao jornalista é garantida a liberdade de escrever o que quiser sobre quem quiser, sem a maldição da censura. Da mesma forma, Sr. Presidente, é na própria Constituição, mais adiante, no art. 220, que se diz: "A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição [...]". Não sofrerão qualquer restrição.
Permitam-me dizer: para mim é lamentável quando o mais alto mandatário da Nação edita uma medida provisória, independentemente do conteúdo de sua medida provisória. Tem o Senhor Presidente da República a prerrogativa de editar medidas provisórias, e cabe a nós, o Congresso Nacional, apreciá-las. Mas é lamentável quando, na edição de uma medida provisória, o Presidente da República diz que aquela medida provisória é dedicada a silenciar os jornais, é dedicada a retaliar a imprensa livre, porque ele não concorda com o que uma imprensa livre fala, como uma imprensa livre atua.
Sr. Presidente, somente neste ano, esta é a terceira sessão em homenagem a diferentes meios de comunicação de que participo aqui no Plenário do Senado. A primeira foi uma homenagem à Folha de S.Paulo – aqui estive, fiz um pronunciamento parecido com este. A segunda, de minha iniciativa, com muita honra, mesmo sendo atacado à direita e à esquerda, foi em homenagem à Rede Globo de televisão e ao seu aniversário – o fiz também pela necessidade de afirmar a imprensa livre. A terceira é esta, em homenagem à Associação Nacional de Jornais, aos 40 anos.
Por que faço questão de estar nesta tribuna nessas três sessões seguidas? Porque é necessário reafirmar a liberdade de imprensa, porque é necessário defender a imprensa livre, e isso não é tarefa de Parlamentar de esquerda nem de Parlamentar de direita; isso é tarefa de quem defende a democracia, de quem é legislador, de quem está neste Parlamento designado pelo voto dos seus representados. Seja qual for o regime que se pretenda autoritário tem que receber de qualquer um que tenha compromisso com a democracia ou que tenha sido trazido para cá pelo voto popular a mais alta reação contra qualquer um dos seus desvios autoritários.
Tenho muita honra do meu partido, a Rede Sustentabilidade, ter ingressado com mais uma, e eu digo com muita honra, porque muitas vezes nós também somos questionados de diversas formas por que movemos tantas ações no Supremo Tribunal Federal – porque eu ainda acredito no Supremo Tribunal Federal como Corte, como guarida da Constituição, como garantidor dos direitos individuais e coletivos, como assegurador da liberdade de imprensa –, ingressamos com mais uma ação de descumprimento de preceito fundamental contra essa medida provisória editada pelo Presidente da República, em que o seu mérito poderia ser debatido, mas não pode ser debatido e aceito o ataque que ele faz à imprensa livre. Não pode ser debatido e aceito o ataque que ele faz como retaliação à atuação da imprensa livre. Isto, qualquer medida de retaliação à liberdade de imprensa por qualquer um que tenha compromisso com a democracia, deve receber o repúdio, a reação à atuação. Nós a fizemos, movemos essa ação, não provocado por nenhum dos senhores, das senhoras, não provocado pela Associação Nacional de Jornais, não provocado por nenhum meio de comunicação, mas pela consciência, e a fizemos pela consciência democrática.
Se curvarmos a coluna às ameaças ao Estado de direito, à ordem democrática... Este filme nós já assistimos, Senador Lasier, ao longo da história. E é um filme que tem que ser banido de nossas memórias. Assistimos se erguer, em 1964, um regime de exceção, um regime que se propunha a fazer uma transição rápida para uma democracia, para, no ano seguinte – era assim que era proclamado –, já ter novas eleições para Presidente da República. Vimos se instaurar, no seio do Brasil, um regime totalitário de 20 anos – vimos. Primeiro, foram os jornais, primeiro foi a imprensa, que foi calada naquele período; depois, foi a liberdade de expressão, que foi banida; em seguida, foi a liberdade de manifestação; por fim, foi a tortura e a morte nos porões do arbítrio.
Nós nunca sabemos como começa uma ditadura, mas sabemos como ela termina. Por termos na memória a lembrança de como começa uma ditadura, por sabermos as experiências de outros países, como se instauram as ditaduras – está aí o exemplo da Venezuela –, por sabermos como se estabelecem ditaduras em outros locais, não podemos aceitar, não podemos admitir qualquer ameaça a qualquer um desses pilares basilares do Estado democrático de direito, da democracia.
Estou aqui, Senador Lasier, permita-me, com todo o respeito à Associação Nacional de Jornais, mas esta sessão, que ela seja mais uma manifestação deste Congresso Nacional, em que nenhum desses pilares – e o primeiro deles, a imprensa livre – seja abalroado, seja ofendido, porque, se ela o for, a democracia será e a democracia sendo, repito, não sabemos como uma tirania começa, sabemos como ela termina.
É dever histórico defender as instituições democráticas ontem, hoje e sempre. (Palmas.)