Pronunciamento de Paulo Paim em 09/09/2019
Discurso durante a 159ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Breve comentário sobre o mandado de recolhimento de livros na 19ª Bienal do Livro, no Rio de Janeiro.
Relato de declarações de especialistas contrários a determinados pontos da reforma da previdência social em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH). Continuidade da leitura de voto em separado, de S. Exa., da proposta de reforma da previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
- Autor
- Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
- Nome completo: Paulo Renato Paim
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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EDUCAÇÃO:
- Breve comentário sobre o mandado de recolhimento de livros na 19ª Bienal do Livro, no Rio de Janeiro.
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PREVIDENCIA SOCIAL:
- Relato de declarações de especialistas contrários a determinados pontos da reforma da previdência social em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH). Continuidade da leitura de voto em separado, de S. Exa., da proposta de reforma da previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
- Publicação
- Publicação no DSF de 10/09/2019 - Página 18
- Assuntos
- Outros > EDUCAÇÃO
- Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
- Indexação
-
- COMENTARIO, CENSURA, RETIRADA, LIVRO, FEIRA, LOCAL, RIO DE JANEIRO (RJ), FATO, APOIO, DECISÃO JUDICIAL, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), LIBERAÇÃO.
- REGISTRO, COMENTARIO, DECLARAÇÃO, PARECER CONTRARIO, ESPECIALISTA, RELAÇÃO, DISPOSITIVOS, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), REFORMA, PREVIDENCIA SOCIAL, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS (CDH), ENFASE, DIREITOS, TRABALHADOR, APOSENTADO, PENSIONISTA.
- REGISTRO, VOTO EM SEPARADO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), REFORMA, PREVIDENCIA SOCIAL.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Senador Izalci Lucas, Senadores e Senadoras que estão no Plenário, Kajuru, Marcos, Presidente, eu confesso que fiquei perplexo com aquilo que aconteceu no Rio de Janeiro na 19ª Bienal do Livro 2019, porque simplesmente ocorreu algo que não víamos há décadas, há décadas: mandaram recolher os livros. Aí eu me lembrei, Presidente, de um filme que vi, em tempos difíceis, chamado A menina que Roubava Livros, e botei no meu Twitter, Presidente, o seguinte:
Censurar, calar a voz e a conjunção de ideias e pensamentos de um povo é sinal de estupidez humana e de delírios totalitários. Sabemos [muito bem] como isso tudo inicia... [mas não sabemos como termina]. O resto está nos [próprios] livros de História. É preciso ficar de olhos bem abertos, vigiar a liberdade e a democracia [é um dever de todos nós].
Repito, Sr. Presidente, quando começam a proibir a nossa juventude de ter acesso aos livros, lembro-me de tempos muito difíceis no mundo – no mundo. E não há como não me lembrar do nazismo. É lamentável que isso esteja acontecendo. Felizmente, um ministro do Supremo Tribunal Federal mandou liberar os livros para que os jovens tivessem acesso. Não podia deixar de iniciar a minha fala sem comentar essa questão da apreensão dos livros no Rio de Janeiro, que chamou mais atenção. Nunca tantos livros foram distribuídos e procurados pela juventude brasileira.
Sr. Presidente, volto ao tema que envolve a todos nós neste mês de setembro – e creio eu, no mês de outubro –: a questão da previdência. Tivemos hoje uma audiência pública marcante lá na Comissão de Direitos Humanos, onde todos os painelistas mostraram a sua enorme preocupação. Juristas, especialistas em previdência – em sua maioria, advogados – disseram que quanto mais leem essa reforma chamada de PEC nº 06 – há outra agora, que é a 33 –, cada vez mais ficam assustados com as contradições: uma coisa é dita de uma forma e já, no artigo abaixo, diz diferente; aí joga, segundo eles, para uma PEC chamada de 33, que não fecha com a PEC nº 6.
Eles alertaram a todos nós que essa forma atropelada de fazer uma reforma que vai atacar a nossa Constituição, que vai atacar o direito dos trabalhadores, de aposentados e de pensionistas, não leva a lugar algum.
Sr. Presidente, com essa visão, é que venho mais uma vez à tribuna, sendo que esse meu pronunciamento faz parte do meu voto em separado, que não pude ler todo ele na CCJ devido à falta de tempo, mas acabei lendo uma parte e vou continuar na tribuna lendo segmentos da página que parei. Eu parei na pág. 51. Digo aqui: segundo a Anfip, a seguridade social foi superavitária até 2015. Entre 2005 e 2017, foi gerado pela seguridade social um superávit médio de R$43 bilhões. É usual o modelo tripartite de financiamento.
Quando observados – porque alguns falaram em outros partidos – os países da OCDE, percebe-se que a seguridade... Na Alemanha, por exemplo, o governo financia 33,6%; no Brasil, o Governo não financia nada, quem garante a previdência é a contribuição de empregado e de empregador e, assim mesmo, houve superávit. Em países como a Dinamarca, o governo chega a financiar 75,6%; o Governo brasileiro não financia nada.
Poderíamos lembrar ainda que não faz sentido, sobretudo diante de profundos impactos das mudanças produtivas do mundo do trabalho, que a previdência seja financiada exclusivamente por contribuições advindas dos trabalhadores e empregadores, como é no Brasil.
Nesse sentido, cabe não apenas, conforme já mencionado, adotar medidas pelo lado da receita, com revisão, por exemplo, de desonerações, desvinculações, é necessário que se faça o bom combate à sonegação, mas também a discussão sobre novas fontes de financiamento da seguridade e da própria previdência.
O exposto vale, sobretudo, para o caso brasileiro, cujo sistema tributário é profundamente regressivo, inclinado à taxação do consumo, e não da renda e do patrimônio.
Para dar apenas um exemplo, caso se revogasse a isenção tributária concedida à distribuição de lucros e dividendos, aplicando-se a cota de 20%, estima-se, com base nos dados do IRPF, ganho anual em torno de R$50 bilhões para a nossa previdência. Não sei por que isso não é aceito.
As receitas não-tributárias seriam também centrais numa estratégia voltada a garantir o equilíbrio financeiro da seguridade social no longo prazo. Especialmente – podia aqui lembrar –, o pré-sal teria um papel central, financiando a seguridade direta ou indiretamente, via políticas que têm impacto sobre ela (como é o caso da educação, conforme citei anteriormente).
Sr. Presidente, sob determinadas condições, pode-se estimar uma participação governamental de R$3,8 trilhões em todo o pré-sal ao longo de algumas décadas. Contudo, as medidas fiscais recentes demonstram mais uma vez o ímpeto governamental em cortar despesas e renunciar a receitas estratégicas para financiar o sistema de proteção social – o que seria mais justo. No caso do pré-sal, a Lei nº 13.586, de 2017, permite o abatimento das importâncias aplicadas pelas petroleiras da base de cálculo do lucro real e da CSLL. Apenas considerando o abatimento dos royalties, há uma perda (novamente, sem trazer o valor presente) superior a R$1 trilhão ao longo do período de exploração da área.
Ademais, diante da EC 95, a ampliação da receita é esterilizada pelo teto de gastos. Portanto, como a despesa já está programada no teto, o aumento de arrecadação não pode reverter em ampliação das bases de financiamento da seguridade social até 2036. Por isso, esse debate da EC 95 está no ar e não há como não enfrentarmos esse debate.
A combinação de renúncias tributárias e redução das despesas em relação ao PIB (teto de gastos) é ilustrativa da maneira como a questão da sustentabilidade da seguridade social é tratada desde a gestão anterior. No receituário neoliberal, a questão central não é discutir os ajustes necessários para assegurar uma base de financiamento compatível com um sistema de proteção social inclusivo, e não exclusivo. O ponto é desconstruir a seguridade e suas políticas (entre elas, a previdência) para reduzir as despesas sociais, excluindo parcela substantiva da população, especialmente aquela que não dispõe de capacidade contributiva, e ampliando – infelizmente –desigualdades.
Por essa razão, uma reforma da previdência baseada apenas, Sr. Presidente, em corte de despesas gerará maior desigualdade. Os dados aqui apresentados mostram que a sustentabilidade previdenciária (e, de forma mais geral, da seguridade) não requer apenas um viés de redução de valores e redução de quantidades de benefícios.
Reformas da previdência guiadas pelo ideário formal do Governo, como as apresentadas a partir de 2016, visam reduzir despesas atingindo os mais pobres, gerando exclusão previdenciária, de modo que as despesas primárias possam caber no teto de gastos, tão condenado e não aplicado em nenhuma parte do mundo.
Alternativamente, a sustentabilidade financeira da previdência e da seguridade deve ser discutida à luz de seu papel de garantir, repito, inclusão e não exclusão. O envelhecimento populacional não determina a necessidade de exclusão do acesso à proteção social. Pelo contrário, eventuais ajustes devem ser integrados a uma estratégia de sustentabilidade, para tornar o sistema mais igualitário.
Como foi dito hoje de manhã lá na Comissão, eu faço aqui, digamos, o bom desafio, desafio qualificado e equilibrado. Eu pergunto: homens e mulheres com mais de 55 anos, onde eles conseguem emprego? Se alguém souber, me digam, porque estou indicando para lá alguns milhares.
Então, você não tem de olhar somente a idade e não olhar o tempo de contribuição. É impossível. Um cidadão com mais de 55 anos, se ficar desempregado, ele não vai atingir nem a idade nem o tempo de contribuição e não vai se aposentar. E, se ele se aposentar por invalidez sem contribuir os 40 anos, vai se aposentar, se ficar em torno de 20 anos, exatamente com 60% daquilo que ele teria de direito pela lei atual. Perde 40% se ele tiver qualquer problema e tiver que ir para a aposentaria por invalidez um dia depois que a reforma for promulgada.
Sr. Presidente o texto aprovado pela Câmara dos Deputados tem um resultado fiscal estimado na ordem de R$933,5 bilhões em dez anos, que será mais de R$4,5 trilhões em 20 anos. Quem pagará essa conta se ela retira 80% dos mais pobres?
A proposta penaliza, de forma muito mais drástica, os trabalhadores de baixa renda e os segurados no Regime Geral da Previdência Social, INSS, os quais responderão, como eu dizia, efetivamente, por 81% do resultado fiscal esperado nos primeiros dez anos, segundo o próprio Ministério da Economia.
Os servidores civis da União, em especial os ativos, por sua vez, tratados ardilosamente como privilegiados pelo atual Governo e também pelo anterior, pela sua campanha de comunicação pela aprovação da PEC, serão responsáveis por 17% desse resultado fiscal, o que, porém, apresenta uma elevada oneração per capita, em termos de elevação de contribuições e redução de direitos para os atuais segurados.
Sr. Presidente, a situação é grave. Portanto – para não repetir números e números –, do ponto de vista social, a reforma retira direitos, restringindo acesso e reduzindo o valor do benefício – estão aqui todos os dados, número por número. Economicamente, o texto da PEC segue orientado pela mesma lógica equivocada, para a qual a reforma da previdência é de natureza fiscal, com foco somente na redução das despesas públicas, tendo como vista o teto de gastos, a formosa EC 95/2016.
Vale lembrar que mesmo sendo aprovada a PEC, não haverá espaço fiscal nos próximos anos para ampliar o investimento público diante do teto de gastos, de novo, engessado pela EC 95/2016.
Essa lógica, Sr. Presidente, fiscalista achatará o valor dos benefícios, que, no caso do INSS, são, em média, de R$1.335 e deverão convergir, em boa medida, sabem para quanto? Para somente um salário mínimo, em torno de R$1 mil. Haverá impacto sobre o consumo das famílias, que responde por cerca de dois terços do PIB, o que prejudica ainda mais uma economia com quase 30 milhões de pessoas subutilizadas, estagnadas em razão da insuficiência de demanda.
Sr. Presidente, vamos ver aqui a reforma da previdência e a desigualdade.
Como afirma o Prof. Marcelo Neri, ex-Secretário de Assuntos Estratégicos, em A escalada da Desigualdade, divulgada pelo Centro de Políticas Sociais, da Fundação Getúlio Vargas, houve uma escalada de desigualdade social nos últimos quatro anos, e o País vive hoje o ciclo mais longo de aumento da desigualdade de sua história. Segundo Neri, a concentração de renda cresce no País há 17 trimestres, e nem mesmo em 1989, que constitui o pico histórico da desigualdade brasileira, houve um movimento de concentração de renda por tantos períodos consecutivos.
Entre os fatores explicativos da piora na desigualdade e na melhoria da concentração na mão de 10%, e conforme a situação vai para o 1% mais rico, está o aumento do desemprego, que atinge hoje mais de 12 milhões de pessoas, em torno de 13 milhões. Na mesma toada, o Coeficiente de Gini, que mede o nível de desigualdade dos países segundo renda, pobreza e educação, segue tendência de alta desde o quarto trimestre de 2014, quando estava em 0,6003, até o segundo trimestre de 2019, quando alcançou 0,6291.
No mesmo período, a renda dos mais pobres caiu 17,1%...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... enquanto, a renda dos 10% mais ricos aumentou 2,55%. Os pobres perdem 17%, os mais ricos ganham em torno de 3%. E ainda, Sr. Presidente, 10,11% do 1% mais rico também só faturaram. Do final de 2014 até 2017, o aumento de pobreza foi de 33%, passando de 8,38% a 11,18% da população brasileira, com um acréscimo de 6,27 milhões de novos pobres às estatísticas sociais.
Ademais, Presidente, tampouco será jogando os idosos na pobreza, retrocedendo a situação vivenciada há 20 anos atrás, que se contornará a elevada taxa de pobreza entre as nossas crianças, até porque são os idosos, os mais velhos que sustentam as nossas crianças com o benefício que tinham até a presente discussão. Essa chaga social, porém, há de ser enfrentada com políticas específicas, entre elas, programas como o Bolsa Família e o Brasil Sem Miséria, indicando alternativas relevantes.
No Brasil, a taxa de famílias com idosos que recebem aposentadorias é relativamente alta, se comparada a outros países em desenvolvimento, notadamente na América Latina, mas inferior à de países como Uruguai, Polônia e Hungria.
Sr. Presidente, graças a essas políticas, como o Benefício de Prestação Continuada...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... a taxa de pobreza entre idosos do Brasil, segundo a OCDE, é a segunda mais baixa da América Latina – para onde vamos, agora não sei –, apenas abaixo da do Uruguai, e menos da metade da existente no Chile, onde a reforma da previdência em 1981, na época do ditador Augusto Pinochet, gerou uma verdadeira tragédia social, que os governos vêm tentando superar desde 2011, pelo menos, com o restabelecimento de direitos previdenciários mais amplos.
Também não será eliminando o direito à aposentadoria que se resolverá o problema do elevado nível de desemprego; pelo contrário, vai aumentar. Se não há empregos para jovens, haverá para idosos que serão obrigados...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... a continuar trabalhando até os 65 anos de idade? Serão postos para a rua na perspectiva de contrato dos mais jovens.
Eu vou indo para o final, Sr. Presidente. Nos países da OCDE, onde a atual taxa de desemprego é a metade da que existe aqui no Brasil, há uma grande disparidade de taxas de emprego entre grupos de idade. Enquanto, nos países da OCDE, a média de emprego entre pessoas na faixa de 25 a 54 anos é de 78,43%, na faixa de 55 a 64 anos ela cai para 61,36%. Ademais, as taxas de emprego variam significativamente segundo o nível educacional, conforme demonstra o gráfico.
Nota: "baixo" indica a educação até nível secundário...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... incompleto; "médio", secundário completo/superior curto; e "alto", nível universitário/bacharelado.
Ao extinguir – aí eu termino, Sr. Presidente, esta última parte – a aposentadoria por tempo de contribuição e estabelecer como 65 anos, estabelecendo como única alternativa, a aposentadoria por idade, com tempo de contribuição mínimo de 15 anos para a mulher e 20 anos para o homem para os futuros segurados e 15 anos para os atuais segurados, mas com idade mínima de 62 e 65 anos, a PEC fixa regra que, além de penalizar as mulheres de forma mais aguda, considera adequadas idades que, no cenário socioeconômico brasileiro, não se justificam, porque não há onde trabalhar depois dos 55 anos.
Sr. Presidente, eu agradeço a V. Exa...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Isso faz parte do meu voto em separado, de que amanhã eu continuo a leitura.
Obrigado, Presidente.