Discurso durante a 165ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à decisão do Presidente da República de demitir o Secretário da Receita Federal Marcos Cintra.

Preocupação sobre a possibilidade de recriação da CPMF sem a existência de uma reforma tributária.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA:
  • Críticas à decisão do Presidente da República de demitir o Secretário da Receita Federal Marcos Cintra.
ECONOMIA:
  • Preocupação sobre a possibilidade de recriação da CPMF sem a existência de uma reforma tributária.
Publicação
Publicação no DSF de 13/09/2019 - Página 30
Assuntos
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • CRITICA, DECISÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, JAIR BOLSONARO, DEMISSÃO, SECRETARIO, RECEITA FEDERAL.
  • APREENSÃO, POSSIBILIDADE, RECRIAÇÃO, IMPOSTOS, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), AUSENCIA, REFORMA TRIBUTARIA.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para discursar.) – Sr. Presidente, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, pessoas que nos acompanham pela Rádio Senado, pela TV Senado, pelas redes sociais, primeiramente liberdade e justiça para o Presidente Lula. Lula Livre!

    Mas, Sr. Presidente, nós assistimos nessa quarta-feira a mais um ato de fanfarronice do Governo Bolsonaro. O Presidente da República mandou demitir o Secretário da Receita Federal em razão de uma fala de seu adjunto sobre a volta da CPMF. Foi um ato patético porque o Presidente foi às redes sociais se ufanar de ter demitido um servidor de segundo escalão. Fez isso para serenar a péssima recepção por parte do Congresso, do mercado e da sociedade dessa ideia de taxar os brasileiros por saques, depósitos e operações de débito e crédito.

    Quero dizer que eu não sou necessariamente contrário a um tipo de imposto que arrecade em cima da movimentação financeira. Já, inclusive, apoiei a implementação da CPMF em outros momentos. No entanto, a adoção isolada dessa proposição como mais um imposto a ser cobrado da população sem estabelecer parâmetros de como isso deva ocorrer e fora de um contexto de uma reforma tributária, esse imposto representa uma extorsão dos mais pobres, um novo imposto numa época de extrema crise, em que o desemprego explode e a renda do trabalhador cai. Uma medida descabida, para escalpelar a população, enchendo os cofres do Governo com dinheiro, sem qualquer destinação conhecida – porque a antiga CPMF ao menos tinha os seus recursos destinados ao financiamento da saúde e ao financiamento da seguridade social.

    No caso atual, no caso desse Governo, representa um estelionato eleitoral, já que o Presidente, quando candidato, repetiu inúmeras vezes que jamais criaria novos impostos. Mas vai criar. A ideia de servidores da Receita Federal não caminha com as suas próprias pernas. É preciso que haja a anuência, o estímulo, a autorização do Presidente da República para que essa discussão se faça. Essa discussão está sendo gestada no comando do Governo, razão pela qual a demissão do Secretário da Receita foi, acima de tudo, um gesto de fraqueza do Presidente da República, especialmente do seu Ministro da Economia. Paulo Guedes já cansou de dizer que quer a CPMF de volta, e demitiu um servidor que compartilha das mesmas ideias que ele, para não perder a própria cabeça. Jogou um subordinado na fogueira.

    A CPMF é uma política desse Governo, isolada da própria reforma tributária, e, se depender do Presidente e do Ministro da Economia, ela vai voltar como um imposto a mais. Ela virá onerar pesadamente a vida dos brasileiros para fazer caixa a um Governo de néscios, que só sabe equilibrar o orçamento cortando investimentos e aumentando a arrecadação por meio de novos impostos. O povo é visto sempre como algo a ser espoliado, e não incluído na solução de redinamização econômica.

    Então, essa história de que o Secretário da Receita caiu por causa da CPMF é uma imensa balela. Ele jamais cairia por defender uma ideia que não é apenas sua, mas é fundamentalmente de Guedes e do Presidente da República. Marcos Cintra caiu por um motivo só: ele não entregou ao Presidente da República o que ele queria, a blindagem. Ele não quis, ou não conseguiu, botar rédea numa Receita que está agindo alinhada ao Ministro Sergio Moro e aos procuradores da Lava Jato e que vem ameaçando, entre outros, pessoas próximas ao Presidente da República, ameaçando com uma devassa.

    Do mesmo jeito que vasculharam arbitrariamente a vida de dezenas de agentes públicos – muitos dos quais autoridades, como ministros do Supremo Tribunal Federal –, auditores da Receita também têm avançado sobre os interesses de Bolsonaro, de seus familiares e amigos, ameaçando descobrir e revelar supostas atividades financeiras escusas, cujo potencial seria o de chantagear o Presidente e torná-lo refém desse grupelho, comandado por Sergio Moro, que opera nas sombras do Estado.

    E há um fato extremamente grave: temos informações seguras de que registros da Receita Federal sobre investigações realizadas ilegalmente pela Lava Jato no início da operação estão sendo intencionalmente apagados, destruídos, para evitar investigações que apontem a responsabilidade de pessoas por esses crimes.

    Portanto, foi por essa razão que o Secretário da Receita foi demitido, foi por isso que ele perdeu o cargo. A CPMF foi somente a cortina de fumaça para degolá-lo e colocar no seu lugar alguém da confiança do Presidente que possa aparelhar a Receita Federal, a exemplo do que ele tem feito com outros órgãos de Estado, como o Coaf e até a Polícia Federal, e lhe garantir a blindagem que deseja, além de utilizar essas instituições para perseguir adversários. É a tônica do Estado totalitário, do Estado despótico, cujo Governo se apropria das instituições para projetos políticos.

    Então, eu quero dizer que repudiamos vivamente a criação de um novo imposto fora do debate global da reforma tributária para espoliar a população brasileira e, sobretudo, a apropriação do Estado de direito pelo Presidente da República e seu grupo político, que estão disputando esse aparelhamento numa queda de braço com Sergio Moro e a organização que opera dentro da Lava Jato. Pelo bem da democracia, que percam os dois.

    Aqui no Congresso, e recorrendo ao Supremo Tribunal Federal sempre que necessário, como hoje o fizemos, demandando ao Supremo que proíba o apagamento de registros de investigações ilegais feitas a partir da Lava Jato dentro da Receita Federal, nós ofereceremos uma ampla resistência a essa nefasta guerra travada nas sombras dos órgãos do Estado que ameaça, sobretudo, a própria democracia brasileira.

    Obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/09/2019 - Página 30