Discurso durante a 195ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Citação de texto do ex-Comandante do Exército Villas Bôas, publicado em suas redes sociais, sobre o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que decidirá sobre a possibilidade de prisão após a condenação em segunda instância.

Críticas ao Supremo Tribunal.

Autor
Alvaro Dias (PODEMOS - Podemos/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Citação de texto do ex-Comandante do Exército Villas Bôas, publicado em suas redes sociais, sobre o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que decidirá sobre a possibilidade de prisão após a condenação em segunda instância.
PODER JUDICIARIO:
  • Críticas ao Supremo Tribunal.
Publicação
Publicação no DSF de 18/10/2019 - Página 15
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • LEITURA, TEXTO, AUTORIA, VILLAS BOAS, GENERAL DE EXERCITO, ASSUNTO, JULGAMENTO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), PRISÃO, CONDENAÇÃO, SEGUNDA INSTANCIA.
  • CRITICA, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), INCOERENCIA, ALTERAÇÃO, JURISPRUDENCIA, LEITURA, VOTO, MINISTRO, GILMAR MENDES, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, FOLHA DE S.PAULO, AUTORIA, PROCURADOR DO ESTADO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ASSUNTO, DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO.

    O SR. ALVARO DIAS (PODEMOS - PR. Para discursar.) – Presidente, Senadora Juíza Selma, é uma honra ocupar a tribuna tendo V. Exa. na Presidência desta sessão.

    Eu inicio o meu pronunciamento citando o ex-Comandante do Exército Villas Bôas, que é um exemplo de superação, que resiste à doença com muita bravura e que mantém, preserva a sua responsabilidade cívica ao opinar sobre acontecimentos do interesse nacional.

    "Villas Bôas fala risco de 'convulsão social' antes de julgamento sobre segunda instância" – essa é a manchete do jornal O Estado de S. Paulo de hoje, que diz:

Na véspera do início do julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de três ações que contestam a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, o ex-comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, afirmou, pelo Twitter, que houve "grande esforço para combater a corrupção e a impunidade" e que o País tem de seguir este caminho, sob risco de ocorrer uma "convulsão social". Ele não citou diretamente o julgamento que a Corte fará nesta quinta-feira.

"Experimentamos um novo período [diz ele] em que as instituições vêm fazendo grande esforço para combater a corrupção e a impunidade, o que nos trouxe – gente brasileira – de volta a autoestima e a confiança. É preciso manter a energia que nos move em direção à paz social, sob pena de que o povo brasileiro venha a cair outra vez no desalento e na eventual convulsão social", escreveu Villas Bôas logo após ter recebido visita do presidente Jair Bolsonaro em sua casa.

    E ele citou Ruy Barbosa.

Citando Rui Barbosa, ele disse que, "de tanto triunfar as nulidades, de tanto prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto".

Na véspera do julgamento de Lula, em abril do ano passado, o general repudiou a impunidade e acrescentou [que] o Exército estaria ainda "atento às suas missões institucionais", sem detalhar o que pretendeu dizer com a expressão.

    Na verdade, o que pretende o General Villas Bôas é alertar o Brasil, é, sobretudo nesta hora, alertar o Supremo Tribunal Federal.

    Nestes dias, desta tribuna, acabei manifestando também o temor de que a revolta pudesse sacudir o povo deste País e empurrá-lo na direção do Supremo Tribunal Federal. Afirmei, obviamente, com o objetivo de alertar, e não de estimular, e não de sugerir. Alertei, sim, que a revolta popular poderia colocar fogo no Supremo Tribunal Federal. O mesmo objetivo do General Villas Bôas: o objetivo dele é patriótico. Excluam a minha participação neste alerta, se desejarem, já que sou político – e político, muitas vezes, deixa de ter autoridade em razão do desalento que há em relação à nossa classe. Os partidos políticos, as instituições públicas de natureza política, os partidos políticos e os políticos, de modo geral, desmoralizados quase sempre, desacreditados. É por essa razão que nós trouxemos hoje o depoimento de um ex-Comandante do Exército, já que o Exército mantém, preserva elevada respeitabilidade no País, para alertar a sociedade sobre os danos que poderão ser causados por uma eventual infeliz decisão do Supremo Tribunal Federal, que começa, no dia de hoje, a debater essa questão e não é a primeira vez.

    O que espanta é ver a incoerência que se observa: a posição de ontem não é a de hoje. A de ontem era enfática – isso da parte de alguns dos ministros –, posição enfática na defesa da prisão em segunda instância. E hoje, em razão de circunstâncias, de interesses localizados, ao sabor destas conveniências, há a contradição da mudança radical de posição. E a veemência de ontem na defesa da prisão em segunda instância é a veemência de hoje contra ela.

    Eu já trouxe, nos últimos dias, vários exemplos com documentos do Supremo Tribunal Federal. Foram vários os julgamentos, especialmente três, com relatores diversos e com decisão unânime da Corte, com uma jurisprudência que se consagrou exatamente na unanimidade de ministros do Supremo Tribunal Federal, que deram respaldo ao parecer de relatores vários. Eu citei Carlos Velloso, citei Ellen Gracie, citei o próprio Gilmar Mendes, o Celso de Mello... Em várias oportunidades, nós tivermos julgamento desta matéria.

    E hoje eu trago outro voto, este do ano de 2003. No ano de 2003, o voto do Ministro Gilmar Mendes, tratando da prisão em segunda instância. Diz ele:

Quanto ao [...] argumento defendido no presente habeas corpus, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é uníssona no sentido de que a interposição do recurso especial ou recurso extraordinário não impede a prisão do condenado, porque desprovidos de efeito suspensivo. Nesse sentido, são expressivos os precedentes [...].

    Aí ele cita vários precedentes. Como eu disse antes, cita o voto da Ellen Gracie, cita o do Ministro Néri da Silveira, cita o do Ministro Nelson Jobim. Eu citei o voto do Celso de Mello, do Carlos Velloso.

    Nós sabemos que esse assunto não é novo, mas o que é preciso considerar? Noticiou-se que cerca de 170 mil ou próximo de 170 mil presos seriam libertados com esta decisão do Supremo. O número certamente é exagerado, mas não importa o número. Agora, o Conselho Nacional de Justiça revela que seriam 4.895 beneficiados se, eventualmente, o Supremo Tribunal Federal decidir que não deve haver prisão após condenação em segunda instância – 4.895. É pouco? Não, é muito, mas o número não importa. Fosse um, fossem dois, fossem três, isso é atraso. Veja o mundo, olhe os países mais avançados do mundo. Vá além dos países mais avançados, não precisa ser Estados Unidos, Inglaterra ou França; vá a todos os países do mundo. E nós verificaremos que a prisão ocorre em primeira ou em segunda instância, sem prejuízo dos recursos. Preso e recorrente. Não há, não há nenhum obstáculo a recursos que podem ser interpostos em razão da condenação e prisão em segunda instância.

    O Roberto Livianu, que é um brilhante Procurador do Estado de São Paulo, também escreve artigo, publicado hoje na Folha de S.Paulo, em que destaca: grau duplo, sim; quádruplo, não. É contra a realidade universal permitir que, em liberdade, o réu, o criminoso, o marginal, o corrupto, o ladrão, o pedófilo, o sequestrador, o narcotraficante, o assassino possa se defender em liberdade, mesmo condenado em segunda instância. Creio que é anticivilizatório. Isso contraria o interesse da família que quer viver em paz, longe do risco da violência e da criminalidade. É um estímulo ao crime e à impunidade. Seria, se essa decisão ocorrer, um estímulo ao crime e à impunidade.

    Imaginem: hoje são 196 mil presos cautelares. Nas prisões do Brasil, temos 196 mil presos por condenação em segunda instância ou prisões provisórias. Desses, 4.895 seriam beneficiados. Só da Operação Lava Jato, cem foram condenados no Tribunal Federal da 4ª Região. Esses também seriam libertados. Mas eu pergunto: e os que ainda não foram condenados? E daqui por diante? A prevalecer essa jurisprudência, se a alteração ocorrer e essa nova jurisprudência pretendida por alguns ministros do Supremo prevalecer, daqui por diante quantos serão beneficiados? Além dos 4.895 indicados hoje pelo Conselho Nacional de Justiça, quantos ainda não julgados em segunda instância seriam beneficiados?

    E nós temos um exemplo da celeridade da Justiça nos tribunais superiores, sobretudo no Supremo Tribunal Federal. Basta um exemplo: em cinco anos da Operação Lava Jato, cinco anos e meio, apenas uma autoridade com foro privilegiado foi condenada, enquanto, em primeira instância, 285 ações com condenação, que chegam a quase 3 mil anos de prisão. Essa é a diferença. E quantos anos levaremos para que esses 196 mil que poderão recorrer às instâncias superiores possam ser julgados? E o Supremo Tribunal Federal terá quadros suficientes e, sobretudo, terá recursos humanos suficientes para julgar tantas ações que serão levadas ao Supremo Tribunal Federal? O que nós queremos? Desejamos uma legislação criminal que combata o crime, a violência e a corrupção no País ou uma suave legislação criminal, que proteja o crime e os criminosos, os corruptos e os corruptores? É esta a definição que se espera do Supremo Tribunal Federal: que política criminal desejamos para o Brasil?

    E é bom destacar, Juíza Selma, com a sua experiência no mundo jurídico, que estava implícito, estava no inconsciente coletivo o conceito de que Justiça no Brasil só alcançava pobre e, especialmente, negro. Só pobres iam para a cadeia. E a Operação Lava Jato, sobretudo com a consagração dessa jurisprudência de prisão em segunda instância, alterou esse conceito, e nós passamos a verificar que o povo brasileiro ressuscitou as suas esperanças de uma nova Justiça ao ver os barões da corrupção e políticos renomados do País algemados na direção dos presídios brasileiros. Essa foi a mudança histórica que ocorreu no Brasil nos últimos anos, certamente o marco de um novo rumo para esta Nação e, sobretudo, a certeza de que estávamos caminhando para uma nova Justiça.

    É por essa razão que não podemos admitir retrocessos dessa natureza. Será, sem dúvida nenhuma, um prejuízo insanável. Não só o comprometimento dos resultados da Operação Lava Jato está em xeque. Na verdade, está em jogo o futuro da política de combate à corrupção no Brasil. Dos países vinculados à ONU – são 193 –, apenas o Brasil ainda não consagrou na sua legislação a prisão em primeira ou segunda instância.

    E aí vem também, Juíza Selma, Major Olimpio, Senador Heinze, a responsabilidade do Congresso. O Congresso já deveria ter aprovado a legislação. Não estaríamos vivendo esse impasse. Não estaríamos vendo esse confronto de aspirações nacionais se chocando contra a resistência de alguns ministros do Supremo que não querem o combate à corrupção para valer. Se nós tivéssemos votado projetos... Eu cito um de minha autoria, mas temos também projeto, por exemplo, do Senador Oriovisto. O meu é mais antigo. É o Projeto nº 13, de 2018, que está com o Relator na Comissão de Constituição e Justiça desde o dia 17 de abril deste ano. Quando o Brasil discute o combate à corrupção, medidas anticrime, antiviolência, anticorrupção, o Congresso fica paralisado. O Congresso resiste a mudança. O Congresso impede o avanço da legislação criminal, para nos colocarmos entre os países do Primeiro Mundo em matéria de Justiça. Preferem o atraso, o que é retrógrado.

    Não, Sra. Presidente Juíza Selma, e é oportuna e simbólica a presença de V. Exa. na presidência desta sessão do Senado Federal. Nós temos que trabalhar contra essa conspiração que há, que envolve parcelas dos três Poderes, para fazer prevalecer a impunidade sobre a justiça. E nós queremos destacar: não confundam o discurso forte contra medidas adotadas pelo Supremo ou o anúncio de medidas que possam ainda ser adotadas, sobretudo as decisões monocráticas que já foram adotadas em relação ao Coaf, em relação à Receita Federal, em relação a delator, se fala antes, se fala depois, nas alegações finais, e agora a prisão em segunda instância, não confundam isso com um ataque à instituição. Nós não atacamos a instituição. A instituição tem que ser preservada. Nós que as integramos, Parlamentares ou magistrados, Parlamentares no Legislativo e magistrados no Judiciário, nós somos passageiros, transeuntes, provisórios, substituíveis; as instituições, o Legislativo e o Judiciário, são permanentes, definitivas, insubstituíveis, essenciais ao Estado democrático de direito. Nós defenderemos sempre as instituições, defenderemos sempre o Poder Judiciário, especialmente, nesta hora, o Supremo Tribunal Federal, mas não podemos concordar com retrocessos.

(Soa a campainha.)

    O SR. ALVARO DIAS (PODEMOS - PR) – E por isso temos o dever de combater, sim, ministros que eventualmente possam adotar posição que contrarie o interesse nacional, e esse é o nosso objetivo.

    Hoje trouxe apenas este exemplo: o Ministro Gilmar Mendes, como relator, enfático, incisivo defensor da prisão em segunda instância, e hoje, ao que se anuncia, é um adversário da prisão em segunda instância.

    A Constituição não mudou, quem mudou foi o Ministro. A Constituição é a mesma. Não há nenhum óbice constitucional à prisão em segunda instância. Não está escrito na Constituição do Brasil que o condenado em segunda instância não deve ser preso. Portanto, se não houve mudança do Texto Constitucional...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O SR. ALVARO DIAS (PODEMOS - PR) – Eu vou concluir agora.

    Repito: se não há mudança no Texto Constitucional e há mudança no voto do Ministro, há razões subjacentes que não podem ser consideradas por nós republicanas. Certamente, há razões que levam a mudança do voto à suspeição. Nós repudiamos essa mudança, em nome do povo brasileiro, que quer coerência e que quer, acima de tudo, a responsabilidade no campo da ética para a construção da Nação que todos nós merecemos.

    Muito obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/10/2019 - Página 15