Discurso durante a 195ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o custo Amazônia como empecilho para o pleno desenvolvimento da Região Norte.

Autor
Marcos Rogério (DEM - Democratas/RO)
Nome completo: Marcos Rogério da Silva Brito
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL:
  • Considerações sobre o custo Amazônia como empecilho para o pleno desenvolvimento da Região Norte.
Publicação
Publicação no DSF de 18/10/2019 - Página 55
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Indexação
  • COMENTARIO, CUSTO, REGIÃO AMAZONICA, ENFASE, ENERGIA ELETRICA, TRANSPORTE, MOTIVO, RESTRIÇÃO, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO NORTE.

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RO. Para discursar.) – Muito obrigado, nobre Presidente, Senador Wellington Fagundes, nosso Presidente, Líder da Frente Parlamentar da Logística e da Infraestrutura nacional e Vice-Presidente também da Comissão de Infraestrutura.

    Sras. e Srs. Senadores, aos que nos acompanham pelo sistema de comunicação do Senado Federal, nossa saudação.

    Discorri ontem desta tribuna sobre algumas peculiaridades da Região Amazônica, as quais precisamos considerar para reduzir as desigualdades regionais, um dos objetivos fundamentais de nossa República expressamente previsto na Constituição Federal. Precisamos tratar do tema Amazônia à luz de suas peculiaridades e desenvolver políticas específicas que visem ao seu desenvolvimento.

    Ontem, falei sobre a política energética. O custo da energia elétrica para a população da Amazônia, inclusive a do meu Estado de Rondônia, representa um verdadeiro paradoxo diante de nossa grande participação no Sistema Elétrico Nacional. Disse e repito: produzimos muita energia para ajudar o desenvolvimento nacional e pagamos uma das tarifas mais caras do Brasil, Sr. Presidente. A conta de luz em Rondônia, nos Estados do Norte, é algo assustador. Paga-se muito caro. Produz-se muito e paga-se caro pela energia que se consome.

    Hoje quero tratar de outros gargalos ou pontos de estrangulamento que impactam o custo Amazônia ou o risco Amazônia. O custo Amazônia se apresenta de maneira muito variada. O setor de infraestrutura nos dá um exemplo ilustrativo. Recentemente, teci algumas palavras a esse respeito num seminário do Instituto Legislativo Brasileiro e volto a mencioná-los aqui.

    Um caso típico de prejuízo para a Amazônia foi o que ocorreu com o terminal de grãos Barcarena, no Estado do Pará. Por causa de problemas de competitividade, 900 mil toneladas de grãos, só em 2018, deixaram de passar por Barcarena e foram escoadas pelo Porto de Santos, que é muito mais distante dos produtores rurais amazônicos. Os motivos são os mais diversos. Barcarena tem custos de praticagem, por exemplo, a manobra dos navios, de mais do dobro do que é praticado no Porto de Santos. Outro ponto: o escoamento por Barcarena paga impostos que não se pagam em Santos. E o transporte de cargas de um centro produtor, como o Município de Sinop, no Mato Grosso, até o Porto de Santos demora muito menos do que até Barcarena, três vezes menos. Para ser exato, são cinco dias até Santos versus 15 dias até Barcarena. Então, o produtor que tem de competir no mercado internacional, inclusive com concorrentes de países desenvolvidos, como os Estados Unidos, termina optando pela estrutura mais consolidada, a de um porto mais distante, o de Santos, mas que, apesar disso, é muito mais acessível.

    Sras. e Srs. Senadores, o caso do terminal de Barcarena é eloquente, porque mostra uma carência fundamental ao nosso desenvolvimento: a questão da competitividade exportadora. Vejam o quanto a infraestrutura e a política tributária podem impactar negativamente uma região. Estou dando esse exemplo do Pará, mas existem muitos outros em toda a Região Amazônica. Rondônia tem diversos gargalos nesse sentido. Um deles está ligado à área de livre comércio de Guajará-Mirim e reflete em todo o Estado de Rondônia.

    Mas não é só o exportador que sofre. Esses problemas repercutem sobre toda a economia. Pequenos, grandes, trabalhadores, consumidores urbanos, ribeirinhos, todos acabam sofrendo as consequências, todos, da quebradeira de coco ao marinheiro mercante. Todos padecem com as chagas da nossa infraestrutura e das distorções da política fiscal e tributária.

    Quanto à infraestrutura, a Região Norte é a que tem a maior proporção de estradas tidas como ruins ou péssimas no Brasil, segundo dados da Confederação Nacional do Transporte. A realidade é que todo mundo perde. Ninguém ganha com isso.

    Em Rondônia, passamos o constrangimento de, todos os anos, ver piorar, por exemplo, a BR-364 e sofrer os mesmos reparos de sempre, que somente acumulam irregularidades na pista. Isso torna o tráfego sofrível e extremamente perigoso. Perdemos muitas vidas todos os anos e temos mutilações, danos materiais. Enfim, já disse e repito: precisamos duplicar a BR-364 ou, no mínimo, construir a terceira faixa nos pontos de maior fluxo. Isso é uma medida urgente.

    Eu falei do setor de transportes, mas esse não é o único segmento em que a infraestrutura na Amazônia é deficiente, e mais deficiente do que no restante do Brasil. Nossa comunicação também precisa ser aprimorada. A internet banda larga na Região Norte tem melhorado, mas ainda é a mais lenta e mais instável do País. A cobertura do sistema de telefonia móvel 4G ainda é inferior, em termos relativos, à das outras regiões do País.

    Passando para outra área: o saneamento básico. A desigualdade regional ainda é mais gritante. As seis cidades do Brasil com o pior sistema de saneamento básico estão na Amazônia Legal: Macapá, Manaus, Santarém, Belém, Ananindeua e Porto Velho, a capital do meu Estado.

    É óbvio que todos esses problemas terminam por solapar o desenvolvimento na Amazônia, e o fazem, Sr. Presidente, direta e indiretamente, onerando quem produz e minando a qualidade de vida de quem trabalha na região.

    Esse último aspecto é essencial. Fica muito mais difícil trabalhar quando estamos preocupados com a água que nossos filhos bebem em casa ou quando o ônibus que tomamos para ir ao trabalho fica preso num buraco na estrada.

    Sras. e Srs. Senadores, outro ponto que eu gostaria de destacar hoje, nesta minha fala sobre o custo Amazônia, está relacionado ao regime jurídico de produção, sobretudo à questão da terra.

    Não é novidade para ninguém que existe uma situação de caos fundiário na Amazônia, mas o que muitas vezes soa como novidade, porque ninguém fala, é o lado do produtor rural nessa história. Oitenta por cento da propriedade numa área de floresta na Amazônia precisa ser destinada a reserva legal, conforme o Código Florestal. A disparidade é gritante, é absurda. Para se ter uma ideia, em outros Estados do País, uma área similar de vegetação nativa precisa ter apenas 20% de reserva legal. Pouco se fala desse contraste, sobretudo nos debates recentes sobre mudanças climáticas. Para muita gente, nosso esforço passa batido. A pecha que nos lançam, infelizmente, é de que somos predadores ambientais.

    Agora, além desses 80% de reserva legal, tem também a questão das terras indígenas. Noventa e oito por cento das terras indígenas estão na Amazônia, 2% em todas as outras regiões somadas.

    Essa desproporção precisa ser considerada no momento de se definir as políticas regionais. Quer dizer, o bônus fica nas regiões desenvolvidas e o ônus todo com a Região Amazônica. A explicação tradicional para isso é de que o Brasil foi colonizado pelo litoral. Mas há um certo anacronismo aqui: esquece-se do fato de que o Brasil hoje em dia é bem distinto do Brasil dos tempos da colonização. Na atualidade, a Amazônia Legal conta com mais de 20 milhões de habitantes. Ou seja, mais de 10% da população nacional está lá na Amazônia, está nos Estados da Amazônia Legal. Houve um significativo deslocamento populacional para a Amazônia, o que exige a busca de alternativas para um atendimento digno e o oferecimento de oportunidades para essas populações.

    Sem dúvida, esse arranjo territorial, que ignora os incentivos econômicos, que menospreza a realidade demográfica, é um dos fatores responsáveis pelos gargalos que todos nós amazônidas enfrentamos. A questão se agrava com a insegurança jurídica, tão comum, infelizmente, em nosso País.

    Ainda sobre a questão indígena, temos o problema da confusão jurídica quanto à demarcação de suas terras. Existem ambiguidades entre o que diz a Constituição Federal e o Estatuto do Índio, o que traz insegurança para a própria população indígena. As consequências são bem claras. Além do conflito fundiário propriamente dito, temos outro componente importante do que eu chamo de risco ou custo Amazônia, que é a judicialização quase que permanente, que traz grande impacto econômico para o País.

    Nesse fronte, índios e produtores submetem-se a um perverso jogo de empurra-empurra jurídico, um quadro que nós, na Amazônia, conhecemos muito bem, testemunhamos isso no dia a dia. Como resultado, é nos tribunais, justamente onde se devia afirmar a paz social, que a questão fundiária na Amazônia segue seu rastilho de pólvora. Isso não beneficia ninguém, muito menos o indígena que, mesmo nos casos em que quer e poderia produzir, continua à míngua, excluído socialmente. Há muita gente que faz discurso para o índio, mas não cuida do índio, não valoriza o índio, não respeita o índio.

    Para concluir, Sr. Presidente, os problemas de infraestrutura e de regulamentação que eu mencionei hoje exemplificam os desafios que o setor produtivo enfrenta na Região Amazônica. A infraestrutura deficiente nos coloca para trás na concorrência com outras regiões do País e com outros países do mundo. As restrições fundiárias instigam conflitos e geram desemprego, embaraços à produção, problemas.

    Faço votos para que nós aqui no Legislativo, especialmente aqui no Senado Federal, consigamos dar uma solução política para essas questões, o que passa pela destinação de recursos para investimentos em infraestrutura e serviços e pela definição de um tratamento fiscal e tributário diferenciado que reconheça essas características, essas dificuldades, essas peculiaridades que só se encontram na Amazônia. Que seja justo ao considerar nossas peculiaridades para reduzir as desigualdades. Esse é um esforço que deve unir a todos, todos nós. Não pode ser uma política de disputa de guerra, porque somos Estados irmãos e, sobretudo, mesmo quem está em outros Estados que não aqueles estados da Amazônia Legal, têm preocupações com essa região, sofre pressões em razão do que acontece na Região Amazônica.

    Então, eu queria trazer, na tarde de hoje, essa reflexão acerca do custo Amazônia. Mais recentemente a Amazônia se tornou o tema de debate na ONU. Agora no Vaticano, em razão da abordagem do tema, novamente se discute o que acontece na Amazônia. O interessante é que quem discute, quem faz esses debates todos não conhece a Amazônia, não vive na Amazônia, não conhece a nossa gente, não conhece a nossa realidade econômica, não conhece a nossa realidade social. É um discurso, é uma retórica baseada no egocentrismo, que ignora o homem, que ignora o fator essencial do meio ambiente. Não existe meio ambiente sem o homem. O centro do universo, o centro do meio ambiente é o homem. E, às vezes, quer se fazer um debate em que exclui o homem da equação. Se o homem, o indivíduo, for excluído da equação desse debate, esse será um debate inexistente, não existirá. Então, é um debate que nós temos que revisitar periodicamente, refletir periodicamente, porque, no caso da Amazônia, mais de 20 milhões de brasileiros estão lá.

    E o lema, quando os brasileiros foram para a Amazônia, caro Presidente, era: "Integrar para não entregar". Havia um estímulo, por parte do Governo Federal, para que brasileiros de muitos cantos do País fossem para a Amazônia, desenvolvessem, plantassem, colhessem, prosperassem naquela região, porque era um mecanismo de integração e de proteção, inclusive da soberania nacional.

    Hoje essas pessoas são tratadas como se fossem criminosas, hoje são tratadas como se fossem inimigas da selva, inimigas dos rios, inimigas da Amazônia – e não são. São pais de famílias, homens e mulheres, que escolheram viver nesse canto do País, desenvolver essa região, produzir nessa região – e produzem muito. Nós produzimos muito lá. E, a cada dia que passa, com mais tecnologia, com mais inovação tecnológica, com mais informação, com mais instrução, estamos produzindo mais e com mais qualidade.

    Nos próximos 50 anos, o mundo vai precisar de mais alimentos. Segundo a ONU, nós vamos precisar, porque vai crescer a população, saindo dos 7 bilhões para mais de 9 bilhões, nos próximos 50 anos... São as estimativas que a ONU apresenta. E eles vão dizer que, para essa nova população, para esse novo momento, nós vamos ter que aumentar a nossa capacidade de produção de alimentos em, pelo menos, 70%.

    E a pergunta que fica é: a América do Norte vai conseguir produzir alimentos para atender à demanda do Planeta, com as terras que tem, com a expertise que tem? Não, não vai. A Europa vai conseguir fazer isto: dar respostas à necessidade de alimentos para o mundo? Não. Quem é que vai ser o celeiro de alimentos para o mundo? Será o Brasil e, dentro do Brasil, de modo muito especial, os Estados da Região Norte, o Estado de Rondônia, o Estado do Acre, Amazonas, Roraima e os demais. É de lá que virá o alimento para abastecer o mundo.

    Portanto, faço esse discurso, esse pronunciamento, no dia de hoje, para que continuemos refletindo sobre esse cenário, que é um cenário que interessa a todos nós brasileiros.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.

    Eram esses os registros que eu gostaria de fazer no dia de hoje.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/10/2019 - Página 55