Discurso durante a 200ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Relato de impressões de S. Exa. com relação à política e à economia chinesa em comparação ao Brasil.

Ponderação sobre a possibilidade da aprovação da reforma da previdência aprofundar a desigualdade social do País.

Considerações sobre a Operação Lava Jato como uma ação que supostamente enfraqueceu as instituições e a democracia brasileira.

Autor
Rogério Carvalho (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: Rogério Carvalho Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Relato de impressões de S. Exa. com relação à política e à economia chinesa em comparação ao Brasil.
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Ponderação sobre a possibilidade da aprovação da reforma da previdência aprofundar a desigualdade social do País.
CONSTITUIÇÃO:
  • Considerações sobre a Operação Lava Jato como uma ação que supostamente enfraqueceu as instituições e a democracia brasileira.
Aparteantes
Telmário Mota.
Publicação
Publicação no DSF de 22/10/2019 - Página 25
Assuntos
Outros > ECONOMIA
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Outros > CONSTITUIÇÃO
Indexação
  • REGISTRO, COMPARAÇÃO, POLITICA, ECONOMIA, PAIS ESTRANGEIRO, CHINA, BRASIL, COMENTARIO, GESTÃO, DILMA ROUSSEFF, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, EXPOSIÇÃO.
  • REGISTRO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), REFORMA, PREVIDENCIA SOCIAL, AUMENTO, DESIGUALDADE SOCIAL.
  • REGISTRO, OPERAÇÃO LAVA JATO, SERGIO MORO, PREJUIZO, ORGÃOS, PAIS, DEMOCRACIA.

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE. Para discursar.) – Obrigado, Sr. Presidente Alvaro Dias.

    Eu quero cumprimentar o Senador Izalci. E está aqui o Senador de Roraima.

    Eu venho à tribuna no dia de hoje, Senador Eduardo Girão, porque tenho ficado muito aflito com o que tenho visto no Chile, país que foi adotado como a referência da boa economia, da estabilidade, do crescimento sustentado para toda a América Latina e para todos aqueles que defendem o modelo em que o Estado, em tese, tem uma presença menor na economia.

    Recentemente, eu fui, a convite do Senador Chico Rodrigues, do DEM, a uma viagem à China, organizada pela Embaixada da China – e eu agradeço o Senador Chico Rodrigues por me incluir na comitiva liderada por ele –, e vi, naquele país, algo que me chamou bastante a atenção.

    Um país para poder ter um projeto exitoso de futuro precisa, acima de tudo, ter um Estado forte. E Estado forte não necessariamente é um Estado que intervém na economia, mas um Estado que está presente na vida das pessoas, um Estado que tem planejamento de longo prazo, um Estado que consegue ter um projeto de nação, de sociedade que envolve e que mobiliza todos os setores do País.

    E uma coisa que me chamou a atenção na China é que eu não vi bolhas. Eu não vi a bolha do Ministério Público, eu não vi a bolha do Judiciário, eu não vi a bolha dos agrupamentos dos grupos econômicos, a bolha do mercado financeiro. Eu não vi um conjunto de bolhas amontoadas, cada uma querendo submeter o interesse público ao seu interesse. Eu vi um país onde só há uma bolha, a própria China, e onde o interesse público, do povo chinês e da China, prevalece sobre todos os demais interesses. Qualquer que seja o grupo, do tamanho que ele for, com o poder econômico que tenha, está submetido ao interesse da China e ao do povo chinês. Isso me chamou bastante a atenção e de forma muito profunda.

    Do outro lado, nós temos um outro Estado, liberal, que não é um Estado que tenha um regime político de um determinado tipo; do outro lado, nós temos os Estados Unidos, que também têm um Estado forte, onde também os interesses do Estado americano e do povo americano não estão submetidos aos interesses das várias corporações, como temos visto em países como o Brasil.

    Eu trago aqui a reflexão de que nós precisamos, de alguma forma, reencontrar qual é o interesse público do nosso País, qual é o interesse que deve submeter os interesses das diversas corporações que se apropriaram do nosso País, que tomaram conta do nosso País. As corporações do mercado financeiro, que hoje são as mais poderosas, que hoje são as que definem como vai ser a nossa previdência, que hoje são as que definem o que é importante para o País, tornaram o Brasil refém de uma agenda.

    Essa agenda dizia que, primeiro, o Brasil precisava andar e que, para andar, precisava trocar a Presidente. E aí é urdido um golpe, é criado um crime, retiram a Presidente, mas, antes de tudo, paralisaram o País. Paralisaram o País e depois disseram: "Para poder o País andar, é preciso tirar a Presidente". Tiraram a Presidente, e vemos a paralisia econômica do nosso País. Depois, dizem que a responsabilidade é do Governo do PT. Não! A responsabilidade criminosa é de quem parou o Brasil e fez o Brasil refém! E ali, para poder soltar o Brasil, tinham que tirar a Dilma.

    Depois, disseram que, para poder o Brasil se libertar dos interesses dessa bolha corporativa, era preciso fazer uma reforma trabalhista. E aí entregam os direitos dos nossos trabalhadores. E há a diminuição de emprego, o subemprego, diminuição da renda média do trabalhador, com a economia afundando, diminuição da arrecadação do sistema geral de previdência, pois há menos trabalhadores com carteira assinada, porque a regra mudou, o modelo de contratação mudou. E aí a gente faz, e nada se resolve.

    E agora o Brasil precisa resolver outro problema, porque ele continua refém – continua refém – e, para poder se libertar, precisa fazer a reforma da previdência. E a reforma da previdência que propuseram era uma reforma com capitalização, igual ao modelo chileno, em que nós estamos vendo, 40 anos depois, na população aposentada, que 80% da população ganham um salário mínimo ou menos. Isto é o retrato da população aposentada do Chile: redução da renda drasticamente e concentração de riqueza. E aí é a reforma da previdência.

    Nessa reforma, ao contrário do que disseram, que se aplicaria para quem entrasse no sistema, para os novos, eu quero chamar a atenção de todos os brasileiros e brasileiras que estão em casa para o seguinte fato: não há período de transição. Se a reforma da previdência, que vai ser votada amanhã na Comissão de Constituição e Justiça e depois neste Plenário, for aprovada, quando promulgada – e deve ser promulgada um ou dois dias após a aprovação aqui no Senado –, ela vai impactar a vida dos brasileiros a partir da sua promulgação. E ela vai impactar, porque o modelo e o modo de cálculo do benefício previdenciário foram modificados e serão aplicados imediatamente.

    Hoje, quando o trabalhador contribui pelo menos por 15 anos, quando completa a idade mínima para se aposentar, sendo o homem com 61 anos e 15 anos de contribuição, consideram-se somente 80% das maiores remunerações, 20% das menores remunerações são eliminadas, e com a média das 80 maiores remunerações é feito o cálculo do benefício previdenciário. Com a reforma da previdência, são todas as remunerações! Se você começou a trabalhar cedo, ganhando pouco, se formou, se qualificou e passou a ganhar mais, você vai incluir toda a remuneração, e, portanto, a sua média e o seu benefício previdenciário de cara já serão menores. Além disso, aplica-se aí um redutor a 60%. Portanto, um trabalhador que tinha a expectativa de ganhar em torno de R$2 mil vai ganhar em torno de R$1,1 mil, no máximo R$1,2 mil, de benefício, levando a maior parte do benefício previdenciário para próximo do salário mínimo. E só é assim, porque as duas Casas conseguiram um dano menor, que foi evitar que houvesse pessoas recebendo menos do que o benefício do salário mínimo.

    Pois nós estamos aqui diante de uma cobrança dessa bolha que submete o povo brasileiro e o interesse público do País ao interesse de uma corporação que quer pegar a riqueza da previdência. porque essa mesma reforma da previdência, Telmário Mota, pega 40% dos benefícios não previsíveis e transfere para o mercado privado fazer o gerenciamento. Essa mesma reforma da previdência privatiza 100% dos fundos complementares de previdência.

    Essa mesma reforma da previdência, portanto, é a bolha do mercado financeiro submetendo o interesse público.

    Eu quero dizer que nós, Senadores e Senadoras, que hoje vivemos este momento histórico, vamos ver lá na frente que o que está se produzindo de desigualdade social neste momento da história do Brasil, vai estourar daqui a alguns anos com uma maior ameaça à estabilidade, à democracia e à vida social pacífica do nosso País, porque não há ameaça maior a uma sociedade, a um povo, do que o aumento da desigualdade social.

    Vou passar aqui para o Senador Telmário Mota, um aparte.

    O Sr. Telmário Mota (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - RR. Para apartear.) – Senador Rogério, eu quero primeiro parabenizar os sergipanos por colocar V. Exa. aqui nesta Casa neste momento em que o Brasil quer caminhar em busca de um fortalecimento como País. A gente anda, anda, e volta a ser um País colonial.

    Hoje V. Exa. estava falando de um país, que é o Chile. Há décadas ele e a Venezuela eram a Suíça da América do Sul: dois países com desenvolvimento, crescimento, padrão de vida financeira e cultural acima da média dos demais países da América do Sul. Veja a Venezuela – inclusive daqui a pouco vou falar disso –, afundada nessa crise socioeconômica e sofrendo retaliações porque os Estados Unidos olham para a América do Sul como olham para o seu quintal e querem impor a sua política de nos tornar meros consumidores.

    Veja o Chile, que não foi por esse outro viés, foi pelo viés neoliberal, entrando nessa crise que V. Exa., com muita propriedade, expõe. Então, é a hora de fortalecer muito mais ainda essa aliança do Mercosul. A Europa se uniu para se proteger. Uma vez ou outra querem quebrar o pires, mas eles sentem necessidade de mantê-lo intacto para esfriar o café. E a gente permite com facilidade intervenções das grandes nações mundiais.

    Então, V. Exa. traz à baila uma reflexão da maior importância para essa discussão do fortalecimento dos países sul-americanos.

    Quero parabenizar V. Exa..

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE) – Obrigado, Senador Telmário Mota.

    Eu quero, na linha do que fazer para que a gente não viva a ameaça futura de tamanha desigualdade, fortalecer as nossas instituições.

    Há uma confusão quando a gente fala de Estado forte com Estado que intervém na economia. Nós precisamos de um Estado forte, e um Estado forte pressupõe instituições altivas, instituições fortes: um Congresso forte, o Executivo forte, o Judiciário forte, os demais órgãos fortes, mas todos submetidos à lei, porque em um País onde o Estado é forte, ninguém está acima da regra, ninguém está acima da lei, nem aqueles que são guardiões da lei podem agir fora da lei.

    Eu estou chamando atenção para o fato de que nós viramos reféns, e essa condição de reféns se ampliou quando nós nos desentendemos, quando nossas instituições perderam a mão, quando nossas instituições, aqui, perderam a capacidade de respeitar a coisa mais sagrada de uma sociedade, que é o seu regramento democrático construído coletivamente.

    Isso aconteceu através da ação operosa, mas fora da lei, do Juiz Sérgio Moro, que enfraqueceu todas as instituições, que deu os elementos para cassar a Presidente Dilma; que fez condução coercitiva de um ex-Presidente sem autorização e sem a solicitação do Ministério Público; mandou a Polícia ir à casa dele sem autorização do Ministério Público – agora, está revelado pelo The Intercept –; que, em conluio com o Ministério Público e com a Polícia Federal, mexeu com as entranhas da República, derrubou uma Presidente, fragilizou a nossa economia, quebrou a maior empresa do Brasil, quebrou a indústria da construção civil do Brasil, nos fragilizando e nos tornando cada vez mais reféns – reféns do discurso de que é preciso fazer a reforma trabalhista; reféns do discurso de que é preciso fazer uma reforma previdenciária, que retira dos mais pobres; reféns da necessidade dita agora de que a gente precisa entregar todo o nosso patrimônio para que a gente possa se libertar.

    Esse é um legado daqueles que brincam com uma institucionalidade, ou com a institucionalidade de um país; daqueles que não se submetem ao regramento legal, constitucional de um país e que agem fora da lei em nome da lei, seja lá quem for.

    Por isso, Sras. e Srs. Senadores, fica aqui o desafio de a gente construir uma Nação forte, um Estado forte. Estado forte é, acima de tudo, aqueles que representam cada instituição respeitarem a lei, fazerem cumprir a lei dentro da lei, coisa que não fizeram.

    Nós vamos pagar um preço pelas desigualdades sociais, decorrentes da fragilização do Estado brasileiro, que se tornou refém de várias bolhas de interesses econômicos e de outras naturezas. E ao nos fazer reféns, retiram nossas riquezas; concentram nossas riquezas e produzem a ameaça com uma grande desigualdade já sentida, medida.

    Se nós pegarmos o índice Gini, que mede a concentração de riqueza, em 2016, 2017, 2018 e 2019, o Brasil voltou a concentrar riqueza, coisa que vinha desconcentrando desde o final de 2002. De 2002 até 2014, a gente desconcentrou riqueza; de 2015 para cá, a gente começa a concentrar riqueza. E é fruto da ação temerária de quem não respeita as instituições, que fragilizou o nosso Estado, que fragilizou a nossa capacidade de lidar, com altivez, com o mundo, para defender os nossos interesses, e tornou-nos reféns de diversos segmentos corporativos globais e nacionais, tornando o Brasil refém e produzindo grande desigualdade, que vai produzir a ameaça da nossa teia, da nossa estrutura social.

    Por isso, amanhã nós temos um grande embate, e espero que a gente tomado por um amor maior, que seja o maior, pelo nosso País, pelo nosso povo. E que a gente consiga corrigir essa que é uma grande atrocidade com os mais pobres do nosso País, que é essa tal de reforma da previdência.

(Soa a campainha.)

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE) – Obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância. E que o Brasil consiga encontrar o seu caminho de País forte, de Estado forte, como a China e outros países que estão conseguindo se consolidar no mundo.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/10/2019 - Página 25