Discurso durante a 204ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre a relevância de o Governo Federal possuir estratégia de investimento e incentivos nas áreas de ciência, tecnologia e inovação.

Autor
Izalci Lucas (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/DF)
Nome completo: Izalci Lucas Ferreira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CIENCIA E TECNOLOGIA:
  • Reflexão sobre a relevância de o Governo Federal possuir estratégia de investimento e incentivos nas áreas de ciência, tecnologia e inovação.
Aparteantes
Confúcio Moura.
Publicação
Publicação no DSF de 25/10/2019 - Página 17
Assunto
Outros > CIENCIA E TECNOLOGIA
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, GOVERNO, ESTRATEGIA, INVESTIMENTO, CIENCIA E TECNOLOGIA, INOVAÇÃO, INCENTIVO FISCAL, FINANCIAMENTO, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO E TECNOLOGICO (FNDCT).

    O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - DF. Para discursar.) – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, como todos sabem bem, eu tenho trabalhado pela agenda de ciência, tecnologia e inovação no nosso País, porque inevitavelmente entramos no século XXI falando de inovação. Essa palavra tomou conta do nosso dia a dia, mas às vezes parece que o discurso fica longe da prática.

    A gente já sabe que no mundo moderno, o desenvolvimento de uma nação vem da inovação. E eu tive o privilégio inclusive de ser o autor, colocando a inovação na Constituição. Inovação que nada mais é do que promover o desenvolvimento por meio da exploração, do uso e implementação de novas ideias, novos modelos, novos caminhos. As economias mais desenvolvidas tratam isso com muito rigor e investem quase 3% do PIB em pesquisa, desenvolvimento e inovação. Com base em dados fornecidos pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em 2017, os Estados Unidos investiram US$484 bilhões em pesquisa e desenvolvimento; a China, US$423 bilhões; já o Brasil, em 2016, o último dado disponibilizado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, investiu US$40 bilhões, menos de 10% dos países aqui citados.

    Olhando esses números, a gente se pergunta: e o Brasil? Temos estratégias de financiamento para pesquisa, desenvolvimento e inovação? Se sim, quais são? São perguntas importantes para começarmos a entender um pouco o nosso cenário, a estratégia e o desempenho do Brasil quando o assunto é inovação. O Brasil dispõe, sim, de instrumentos para financiamento da inovação, mas será que eles são acessíveis? Será que estamos usando os instrumentos corretamente? Será que eles são coordenados entre si, dentro de uma política pública de Estado para inovação? Como fazem países como China e Estados Unidos?

    Pois bem, hoje eu gostaria de falar do que temos e de como anda o fomento à inovação no Brasil. Começo pelos investimentos fiscais. Em 2005, foi promulgada a lei com o objetivo de dar impulso financeiro a essa área. Esse instrumento recebeu o nome de Lei do Bem, a Lei 11.196, de 2005, e cria concessão de incentivos fiscais às pessoas jurídicas que realizarem pesquisa e desenvolvimento de inovação tecnológica.

    No ano seguinte, veio o Decreto 5.798, de 2006, que regulamentou os incentivos fiscais às atividades relacionadas a essa Lei do Bem.

    Por fim, cinco anos depois, em 2011, a Receita Federal do Brasil aprovou uma instrução normativa para disciplinar esse conjunto de incentivos fiscais. A nova regulamentação parecia promissora, porém, a instrução da Receita discordava de várias coisas que estavam na Lei do Bem e também no seu decreto regulamentador. Quando não discordava, restringia absurdamente. O resultado foi que boa parte das empresas foram autuadas pela Receita Federal, pessoas que seguiram a lei, desde sua criação e regulamentação até 2011, isso porque estavam em desacordo com uma instrução normativa que não havia sido criada ainda. Imaginem a insegurança que isso gerou!

    Um marco regulatório, Sr. Presidente, não pode ser confuso, não pode gerar insegurança. Ele interfere diretamente na fluidez científica e tecnológica e exerce impacto direto sobre as condições de funcionamento de todo o ecossistema de inovação. Só que, no Brasil, o marco regulatório é complexo, às vezes fragmentado, às vezes com regras conflitantes e, por isso, de difícil interpretação.

    Esse é o primeiro ponto que eu quero destacar. A lei é muito boa, mas o que veio junto com ela parece que foi distorcendo a razão principal da sua concepção. A lei deve ser mantida, bem como suas iniciativas, entretanto, ela pode e deve ser melhorada.

    Passados quase 14 anos de sua promulgação, a gente pode começar a pensar em melhorias, aprender com os erros passados e observar problemas presentes, uma espécie de Lei do Bem fase 2, que mantenha o que a primeira lei, de 2005, tem de bom e aprimore o que é necessário.

    Um exemplo a ser citado diretamente é que os benefícios da atual legislação só são aplicados às empresas com regime de tributação pelo lucro real, ou seja, aquelas que calculam os impostos sobre seu lucro efetivo. Bem, a gente sabe que o número reduzido das empresas que atuam pelo lucro real é mínimo. As usuárias da Lei do Bem estão próximas de 1,5 mil; as pequenas, em sua esmagadora maioria, atuam pelo Simples. Com isso, há grande chance de as chamadas startups ficarem de fora. Essas são as empresas que lidam diretamente com inovação e pesquisa, mas que não podem se valer do principal incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento do País. É um paradoxo.

    A lei trouxe um benefício para estimular as pequenas a interagirem com as grandes empresas, por meio de isenção de impostos na nota fiscal que a pequena irá emitir ao prestar serviço de pesquisa, desenvolvimento e inovação para uma grande empresa que usufrua da Lei do Bem. Porém, como as empresas que atuam no Simples já se beneficiam de um benefício tributário, não podem usufruir do outro. Isso torna o benefício da Lei do Bem inaplicável às pequenas empresas.

    Outro ponto, se a empresa surgiu com proposta inovadora, realiza pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica, a gente precisa dar segurança, precisa garantir a essa empresa a manutenção dos incentivos fiscais da Lei do Bem de maneira automática, que seja automático. Não tem por que ter tantas ressalvas para isso. Nesse tipo de empresa, inovar é sobreviver. Ela precisa estar sempre pesquisando, se diferenciando, senão ela não sobrevive, independente do benefício que o Estado possa dar.

    A Receita Federal precisa avaliar melhor como de fato funcionam as atividades dessas empresas. É necessário que seja feita uma revisão na Instrução Normativa nº 1.187, de 2011, desta vez sem entrar em conflito com a Lei do Bem e também com o Decreto nº 5.798, de 2016. O foco precisa ser a segurança jurídica das atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação. Com essa atividade crescendo de maneira sustentável, nós conseguimos gerar mais arrecadação para o Estado, mais emprego, mais desenvolvimento econômico e social.

    A gente não pode deixar que a falta de compreensão emperre todo o sistema. Caso isso ocorra, nós vamos ficar sempre comprando tecnologia de fora, sem gerar pesquisa, sem inovar e, sobretudo, sem gerar divisas.

    Agora, falando com mais foco no financiamento à inovação, a gente sabe que essa é a base de sustentação para o crescimento econômico. Como eu disse no início, não há dúvida disso por parte de qualquer nação, principalmente porque os resultados são muito abrangentes e se desdobram em efeitos multiplicadores para a sociedade. É ela que se beneficia com o progresso tecnológico, justamente por isso o Estado precisa participar. É preciso agir em duas frentes conjuntas: a primeira, por meio de fontes diversas de financiamento; a segunda, destinando recursos públicos para o Sistema Nacional de Inovação. Nesse sentido, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) foi criado há 50 anos para financiar inovação e desenvolvimento científico e tecnológico do País. De sua criação até aqui, a gente se pergunta se ele já atingiu a sua maturidade, mas foi justamente nos últimos anos que o fundo sofreu um revés muito forte. Com os contingenciamentos sistemáticos faltou verba. A Finep, financiadora de inovação e pesquisa, exerce a função de secretaria executiva do fundo. Os cortes orçamentários fizeram com que a Finep ficasse 2016 e 2017 sem fazer chamadas públicas para financiamento de projetos. Os editais foram retomados em 2018, mas muito timidamente.

    Isso fez com que, aos poucos, as empresas deixassem de contar com o apoio do Estado para projetos de maior risco. Esse é justamente o caso dos projetos inovadores e de desenvolvimento tecnológico.

    Sras. e Srs. Senadores, os países mais desenvolvidos, como os Estados Unidos, a China, o Japão, a Alemanha e a Coreia, gastam pelo menos 2% do PIB em pesquisa e desenvolvimento. Isso é muita coisa! São os países mais ricos do mundo. O PIB deles é grande, então o dispêndio é proporcional.

    Quando a gente olha para o Brasil, a gente investe um pouco mais de 1,2% do nosso PIB. Se a gente não conseguir um pouco mais e se for mantido apenas 1,2% do nosso PIB, dificilmente nós vamos ocupar um espaço tecnológico à altura da nossa posição na economia mundial. Essa proporção precisa chegar a pelo menos 2%. Precisamos efetivamente investir o que é arrecadado.

    O FNDCT se alimenta de recursos dos fundos setoriais, que vêm de obrigações das empresas, mas, nos anos mais recentes, não tem sido usado para sua finalidade, que é o fomento à ciência e tecnologia e inovação.

    Investimento em inovação é diferente de gastar com tecnologia já existente, que dá retorno imediato. As atividades de pesquisa, às vezes, demoram uma década para dar retorno ou, às vezes, mais tempo ainda. Por isso, é fundamental assegurar recursos estáveis.

    Não é possível deixar pesquisadores e empresas sem previsão. Não dá para interromper projetos achando que um, dois ou três anos depois retomaremos do ponto em que paramos. Isso não existe em projetos de ciência, tecnologia e inovação. Se, no meio do caminho, você falha com o financiamento, com a subvenção, a inovação morre na gestação. Então, precisamos definir prioridades e garantir que os recursos não sejam alocados de maneira pulverizada, estabelecer foco, mecanismos de avaliação de projetos em andamento e reavaliar as dotações orçamentária transversais.

    Se a gente observar onde os países desenvolvidos focam seus recursos, seus esforços em pesquisa, podemos ver nitidamente que são em áreas de interesse próprio. Os Estados Unidos focam mais em energia e defesa. A China, em eficiência produtiva, porque é exportadora de bens de capital e tem despontado também em inteligência artificial, de olho nessa indústria do futuro. A Coreia foca em produção de manufaturados, e por aí vai. O Brasil precisa assegurar recursos destinados a projetos voltados para as suas áreas estratégicas e pesquisas com foco em nossas prioridades.

    A experiência mundial demonstra que não há crescimento econômico sustentável sem o uso criativo do conhecimento orientado à geração de novos produtos, serviços e processos. É por meio da inovação que poderemos enfrentar os desafios dessa nova revolução industrial em curso mundo afora. Por isso, é essencial que os alicerces do nosso sistema de inovação sejam construídos com instituições fortes, regras claras, leis descomplicadas e sistemas de financiamento robustos e adequados. É disso que precisamos urgentemente.

    Srs. Senadores e Sras. Senadoras, essas duas agendas – de incentivos fiscais e de instrumentos de financiamento à inovação – merecem nossa máxima atenção. Vamos debatê-las em profundidade nos encontros da Frente Parlamentar Mista de Ciência, Tecnologia e Inovação. Portanto, nós temos muito trabalho pela frente.

    Senador Confúcio.

    O Sr. Confúcio Moura (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - RO. Para apartear.) – Senador Izalci, o senhor aborda um tema extremamente interessante e muito importante para o nosso País.

    Se a gente comparar bem – eu não tenho aqui as estatísticas –, veremos que nós não estamos bem classificados no critério inovação e pesquisa. Prova disso é que nossos pesquisadores não conseguem se distinguir em premiações internacionais importantes, a não ser, como eu ressalto sempre aqui, aqueles como o Dr. Hildebrando, na área de doenças tropicais, a Dra. Celina Maria Turchi, na área do zika vírus e microcefalia, em que ela foi genial, e outros tantos que há por aí e que têm se esforçado bastante na área da pesquisa científica.

    Na área de inovação com as empresas, o que o Estado dá de incentivo ele recebe de volta. Ele dá o incentivo e recebe muito mais, muito mais.

    Aqui, de vez em quando, eu solto umas palavras que, às vezes, são mal interpretadas: a empresa é o próprio Estado. Não é a figura do empresário capitalista, não. A empresa, uma vez crescendo, gera empregos; a empresa, crescendo, paga impostos; a empresa, crescendo, compra e vende, movimenta o comércio. É muito importante isso! A gente não pode ser contra o empresário, nem o micro, nem o médio, nem o pequeno, nem o grande empresário, enfim, todos são importantes para um país.

    V. Exa. aborda um tema profundo, importantíssimo, e tenho observado que os seus discursos estão sempre nesse viés, o que demonstra uma coerência maravilhosa no que V. Exa. defende aqui no Congresso Nacional. V. Exa. defende a pesquisa, briga pelas bolsas, briga pelo aumento das bolsas para os pesquisadores... O quanto V. Exa. brigou aqui contra os contingenciamentos e para a liberação das bolsas, quando os pesquisadores pararam as suas pesquisas. Então, V. Exa. bateu, bateu, até que conseguiu resolver a parada. Então, isso é de uma nobreza enorme, é grande o que V. Exa. aborda aqui. Muitas vezes, as pessoas não valorizam, mas, nas entrelinhas, o seu discurso não será em vão; ele terá ecos em muitos cantos.

    Nós vamos inclusive precisar de uma audiência com esse Ministério... Por que uma resolução é maior que uma lei? Por que o Presidente sanciona uma lei de incentivo, a Lei do Bem, e vai lá o Secretário da Receita e faz uma resolução contra a lei? Vejam bem, é a lei contra a lei; é o Governo contra o Governo. Então, é um paradoxo interessante.

    Eu parabenizo o seu discurso.

    E muito obrigado pelo aparte.

    O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - DF) – Eu só aproveito a oportunidade da presença aqui dos nossos colegas para pedir que vocês confirmem, no dia 5/11, terça-feira, na hora do almoço – e todo mundo aqui almoça –, a participação na reunião da Frente Parlamentar de Ciência, Tecnologia e Inovação que nós vamos promover com a CNI, com o movimento empresarial pela inovação. São as 250 maiores empresas do Brasil. Já está confirmada a presença do Presidente da Casa, da Câmara, do Vice-Presidente, do Ministro de Ciência e Tecnologia, para que a gente possa falar um pouco sobre inovação.

    Ontem eu fiz uma audiência na Comissão Mista do Orçamento exatamente levando esse tema: o impacto da ciência, tecnologia e inovação no desenvolvimento econômico. Só através da ciência, da tecnologia e da inovação é que nós vamos avançar.

    Nós perdemos, nos últimos anos, Senador Confúcio, 17 posições em inovação. Do ano passado para este, nós perdemos duas posições. Nós estamos na 66ª posição no ranking de inovação, enquanto somos a nona economia do mundo.

(Soa a campainha.)

    O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - DF) – Então, temos que avançar na inovação, na pesquisa; temos que melhorar o orçamento.

    Em relação à Lei de Informática, que agora foi questionada pela OMC, a Organização Mundial do Comércio, até 30 de setembro tinha que estar aqui uma medida provisória para não perdermos o prazo, porque são 90 dias, e vai encerrar em dezembro.

    São coisas que nós temos que agilizar para que possamos realmente ver o nosso País da forma como deve ser, realmente um País desenvolvido. Os nossos jovens estão precisando realmente de oportunidades...

    O Sr. Confúcio Moura (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - RO) – Senador Izalci, para não ser injusto, eu quero fazer uma correção no meu aparte: eu não citei o pessoal da Embrapa, o extraordinário trabalho da Embrapa no Brasil e para o mundo.

    É só isso.

    Muito obrigado.

    O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - DF) – A Embrapa esteve conosco ontem. É uma instituição que é reconhecida mundialmente. Se nós temos hoje uma balança comercial favorável no agronegócio, isso se deve à Embrapa. E, se você pegar o orçamento dela agora, não há orçamento, acabaram com o orçamento da Embrapa. É um negócio que a gente precisa realmente priorizar.

    Governar é eleger prioridade. Precisamos priorizar realmente a aplicação dos nossos recursos.

    Era isso.

    Agradeço, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/10/2019 - Página 17