Discurso durante a 208ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa do uso de recursos depositados em fundos públicos em benefício da população, a exemplo da infraestrutura de transportes.

Posicionamento favorável à fixação de um teto para a dívida pública da União.

Autor
Zequinha Marinho (PSC - Partido Social Cristão/PA)
Nome completo: José da Cruz Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Defesa do uso de recursos depositados em fundos públicos em benefício da população, a exemplo da infraestrutura de transportes.
ECONOMIA:
  • Posicionamento favorável à fixação de um teto para a dívida pública da União.
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/2019 - Página 30
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • DEFESA, UTILIZAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, DEPOSITO, FUNDO FINANCEIRO, GOVERNO, BENEFICIO, POPULAÇÃO, ENFASE, INFRAESTRUTURA, TRANSPORTE.
  • POSIÇÃO, APOIO, FIXAÇÃO, LIMITAÇÃO, DIVIDA PUBLICA, GOVERNO FEDERAL.

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA. Para discursar.) – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, falo como representante do Estado do Pará, o segundo maior do País em extensão. A sua extensão territorial corresponde a vários países da Europa – muito conhecidos nossos, como a Espanha, a Alemanha, a Itália – reunidos, para poder dar um território semelhante ao do Estado do Pará.

    Em nosso Estado, as estruturas de aeroportos regionais e locais, assim como as estruturas dos modais lacustres, muitas vezes são as únicas vias de transporte disponíveis e, na sua falta ou com seu funcionamento precário, várias localidades correm o risco de ficarem sem acesso.

    Para viabilizar investimentos nas áreas de transporte de pessoas e cargas em meu Estado, é essencial a atuação do Ministério da Infraestrutura, que conta com vários fundos públicos voltados especificamente para o atendimento da área de infraestrutura de transportes.

    Entretanto, Sr. Presidente, muitos desses fundos existem apenas no papel e oito deles não possuem recursos disponíveis, apesar relevância dos seus objetivos. São eles: Fundo Especial para Construção e Conservação de Estradas de Rodagem Federais, criado pelo Decreto nº 5.141, de 1927, ou seja, completará cem anos de existência legal daqui a oito anos; Fundo Ferroviário Nacional, criado pela Lei nº 1.272-A, de 1950, que completará setenta anos em 2020; Fundo Portuário Nacional, criado pela Lei nº 3.421, de 1958; Fundo Social Ferroviário, criado pela Lei nº 3.891, de 1961; Fundo Nacional de Investimento Ferroviário, criado pela Lei nº 4.102, de 1962; Fundo de Integração de Transportes, criado pelo Decreto-Lei nº 516, de 1969; Fundo Especial de Conservação e Segurança do Tráfego, criado pelo Decreto-Lei nº 512, de 1969; e por último, o de nº 8, Fundo Nacional de Infraestrutura de Transportes, criado pela Lei nº 10.636, de 2002.

    O fato é que esses fundos citados, apesar de sua existência legal quase centenária, não foram objeto de programação orçamentária nos últimos quatro anos. Assim, apenas dois fundos possuem recursos efetivamente disponíveis para a infraestrutura. O mais antigo é o Fundo da Marinha Mercante, criado pela Lei nº 3.381, de 1958, e disciplinado pela Lei nº 10.893, de 2004. O Fundo da Marinha Mercante destina a maior parte de seus recursos para o apoio financeiro reembolsável, isto é, para empréstimos. Tais empréstimos são gastos financeiros e, portanto, não estão sujeitos a teto constitucional de gastos primários, nem à meta anual de recursos ou de resultado primário. Com disponibilidades financeiras de mais de R$9 bilhões em 2018, o Fundo da Marinha Mercante tem gastos autorizados, em 2019, de até R$7 bilhões.

    Apesar de estarmos nos encaminhando para o penúltimo mês do ano, esse fundo empenhou e executou orçamentária e financeiramente menos de 18% do autorizado, isto é, menos de um quinto do montante autorizado, que, por sua vez, já está aquém das disponibilidades financeiras. Importante também mencionar, Presidente, que praticamente toda essa execução orçamentária e financeira ocorreu como despesa financeira, ou seja, são empréstimos concedidos pelo Governo Federal.

    A modalidade gasto reembolsável é importante, mas pode não atender as necessidades do meu Estado, situado na Região Amazônica, com o menor Produto Interno Bruto por residente do País, o que indica maiores dificuldades relativas para elaborar e submeter bons projetos de investimento e infraestrutura e menor capacidade de pagamento e mobilização dos elevados recursos requeridos para investimentos em infraestrutura.

    Outro fundo mais recente, com efetiva disponibilidade financeira, é o Fundo Nacional de Aviação Civil, criado pela Lei nº 12.462, de 2011, que destina recursos não reembolsáveis à sua missão institucional, isto é, o fundo atua mediante gastos primários sujeitos ao teto constitucional e ao resultado primário.

    Pois bem, o Fundo Nacional de Aviação Civil tem mais de R$22 bilhões disponíveis depositados em banco. Entretanto, para 2019, foram autorizados gastos orçamentários de apenas R$3,1 bilhões e executados, orçamentária e financeiramente, menos de 12% do montante autorizado.

    Ao procurar entender o que pode ser feito para mudar essa situação em que o dinheiro fica depositado, rendendo juros, em lugar de ser utilizado para a sua finalidade legal, em benefício da infraestrutura em meu Estado, encontramos dois nomes já mencionados e conhecidos de todos: teto de gastos primário e meta de resultado, também primário. Com esses dois limitadores amplos, quaisquer outras iniciativas de liberação desses recursos parecem não produzir os resultados substantivos que o meu Estado do Pará tanto precisa.

    Diante desse cenário caótico, buscamos soluções para que esses recursos sejam destinados para as áreas devidas. Levantamos as seguintes possibilidades: primeira, reformulação e aglutinação dos vários fundos em um único fundo de infraestrutura; segunda, alteração do uso dos recursos para que sejam ofertados apenas como apoio financeiro reembolsável; terceira, alteração do cálculo do teto e do resultado para excepcionalizar ou não computar os gastos em infraestrutura ou, ainda, a desvinculação dos recursos desses fundos.

    Tais mudanças, Sr. Presidente, entretanto, tendem apenas a aumentar o endividamento federal, e é importante aqui esclarecer esse ponto.

    Senhores, todos nos assistem, preferencialmente, pela televisão, pelo rádio, pela internet ou nos acompanham por quaisquer outros meios de comunicação. Os atuais tetos de gastos e metas de resultados são indicadores...

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA) – ... enganosos do ponto de vista patrimonial contábil, pois lidam apenas com receitas e despesas não relacionadas ao sistema financeiro. É como se, em nossas casas, apurássemos nossas economias no fim do mês sem considerar o uso de dívida junto ao sistema financeiro, como o uso dos cartões de crédito e do cheque especial.

    Assim, o esforço fiscal do Governo, orientado por esses dois indicadores, está voltado apenas para gerar recursos para o pagamento dos serviços da dívida, ou seja, as chamadas despesas financeiras contraídas junto ao sistema financeiro.

    Ter crédito é bom, senhores, o problema é que a União, diferentemente das demais unidades federativas, não tem limite global de dívida, e não há por que o Senado Federal não aprovar uma resolução para tanto.

    Encaminhado pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso no ano de 2000, com o fim da legislatura passada, aquele projeto de resolução do Senado foi arquivado definitivamente e, pelo art. 52, inciso VI, da Constituição, a iniciativa do projeto de resolução é do Presidente da República. Assim, uma providência que precisa ser urgentemente adotada é o estabelecimento do limite global da dívida da União, determinado pelo Constituinte originário faz mais de 30 anos.

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA) – Nos termos constitucionais, cumpre ao Senhor Presidente Jair Bolsonaro e sua equipe econômica, encabeçada pelo Sr. Ministro Paulo Guedes, submeterem ao Senado Federal o projeto de resolução com o limite global da dívida federal.

    Sem esse limite, senhores e senhoras, requerido também pela Lei de Responsabilidade Fiscal, faz quase 20 anos que estamos discutindo o descumprimento, cada vez maior, da regra de ouro, ou seja, o pagamento de despesas de custeios com recursos da dívida pública, o que leva à descapitalização e a subsequente insubsistência de qualquer ente público ou privado. É uma situação insustentável, que coloca em risco até mesmo a economia nacional.

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA) – Rapidinho, Sr. Presidente, para fazer a conclusão, porque o raciocínio é um tanto prolongado.

    Por exemplo, a economia prevista com a reforma da previdência, recentemente aprovada pelo Senado Federal com enorme sacrifício, é de R$800 bilhões em dez anos, enquanto a proposta orçamentária para o próximo ano prevê singelos gastos de R$415 bilhões com juros e demais encargos financeiros da dívida. Isso significa que dois anos de custeio da dívida federal ultrapassam dez anos de economias previstas pela reforma da previdência.

    É óbvio que a conta não fecha. Não apenas não fecha como a ausência de limite parece estimular o aumento do endividamento federal.

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA) – É uma situação prevenível pela solução constitucional.

    O ponto é que, mesmo com os atuais tetos de gasto primário e meta de resultado também primário, a dívida pública bruta não para de crescer e o único ente sem limite global de dívida é a União. Todos os demais devem respeitar os limites estatuídos pelo Senado Federal.

    A crescente dependência federal de recursos de terceiros, além de não coibida, é até mesmo incentivada pelo teto de gasto primário desacompanhada do limite global de dívida. Essa dependência crescente e sem limite aumenta as taxas de juros pagas pelo setor público e diminui as ofertas de recursos para o setor privado...

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA) – .... além de reduzir também a capacidade governamental de propor e executar políticas públicas necessárias e demandadas pela população.

    Nesse contexto, Presidente, os recursos dos mencionados fundos para infraestrutura, que estão rendendo juros em lugar de se converterem em novos ou melhores portos, estradas e aeroportos e outras utilidades públicas essenciais de infraestrutura, servem apenas para melhorar o resultado fiscal primário e diminuir o saldo da dívida líquida do Governo, enquanto a dívida bruta não tem limite para aumentar.

    É como se qualquer um de nós – mesmo sentindo a necessidade de fixar residência mais perto do local de trabalho ou de um veículo melhor para trabalhar e aumentar nossa renda e qualidade de vida – preferisse deixar o dinheiro na conta bancária para fazer saldo médio e poder pedir mais empréstimos ao banco. Isso parece um contrassenso, pois a finalidade do Governo não é gerar lucros nem trabalhar para o sistema financeiro.

    A propósito dessas disponibilidades dos fundos de infraestrutura depositadas nos bancos, há notícias de gestores sendo até mesmo questionados pelos órgãos e pelas entidades de controle interno e externo sobre o uso dos recursos de fundos em finalidades diferentes das que lhes são legalmente atribuídas.

    Temos de usar outra lógica, para garantir a necessária credibilidade e confiança...

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA) – ... dos credores, inclusive os do sistema financeiro. Precisamos de uma lógica que permita aplicar os recursos disponíveis nas necessidades da nossa população, em cumprimento aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, constitucionalmente determinados, ao mesmo tempo em que se mantêm abertas as possibilidades relativas à renovação e à contratação de dívida nova.

    Assim, além do projeto de resolução de iniciativa presidencial, outra proposta legislativa para superar a presente lógica federal de entesouramento de recursos em saldos bancários, em lugar de sanar as necessidades da população, é a adoção do resultado nominal como meta de resultado fiscal da União em lugar do resultado primário.

    O resultado nominal está alinhado com a variação do patrimônio líquido e não leva a equívocos. Ademais, diferentemente do resultado primário, coloca gastos primários e financeiros num único plano, o que viabiliza mudanças na atual lógica de repressão dos gastos primários em favor do aumento sem limite dos gastos financeiros.

    A adoção dos resultados nominais como meta fiscal está prevista pela Lei de Responsabilidade Fiscal e aumenta a institucionalidade dos gastos, ou seja, favorece as aplicações dos recursos vinculados aos objetivos legalmente estatuídos em lugar do seu entesouramento.

    Essa é uma mudança legislativa que iremos sugerir assim que forem sancionadas as diretrizes orçamentárias para 2020, uma vez que as mudanças nas diretrizes vigentes são inoportunas devido à proximidade do encerramento do ano fiscal.

    Assim, fica lançada essa pauta, que permitirá ao meu Estado do Pará acessar os recursos de que precisa para investimentos em infraestrutura.

    Para concluir, Sr. Presidente, a atual lógica fiscal tem se mostrado uma gaiola de ferro que limita e compromete a qualidade dos gastos federais para o cumprimento dos objetivos fundamentais da República, como os tão necessários investimentos...

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA) – ... em infraestrutura para a redução das desigualdades sociais e regionais do meu Estado do Pará.

    Os dois nomes dessa camisa de força são teto de gastos primário e meta de resultado primário, que têm um importante papel, mas são indicadores enganosos do atual contexto fiscal.

    O problema é que a lógica fiscal associada a esses dois indicadores pressupõe limite também do gasto financeiro e, mais ainda, o limite da dívida da União, que tem drenado de forma crescente os recursos que deveriam ser destinados para outras finalidades. O que os torna enganosos é a ausência deste último limite, a cargo do Presidente da República e do Senado Federal.

    Em nossa análise, detectamos que a superação do presente gargalo nos investimentos em infraestrutura requer a ação presidencial, mediante a submissão ao Senado Federal de proposta de resolução que fixe limite global para a dívida da União, e a subsequente aprovação desses limites por esta Casa.

    Ao mesmo tempo, a alteração de meta de resultado primário para nominal, prevista pela Lei de Responsabilidade Fiscal, permitirá deliberações mais transparentes e bem informadas, assim como a maior racionalidade das alocações orçamentárias aos olhos dos nossos constituintes e cidadãos.

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA) – A responsabilidade proposta para mudança na meta de resultado será apresentada depois da sanção das diretrizes orçamentárias para 2020.

    Sr. Presidente, o que nós detectamos é que o Brasil se autoimobiliza. Nós temos quase R$11 milhões num fundo, o Fundo da Marinha Mercante, e temos mais de R$22 bilhões no Fundo Nacional de Aviação Civil. Meu Estado é um Estado diferenciado. Arquipélago do Marajó: ou você vai de barco ou você vai de avião. Nós precisamos, no Estado do Pará, de pelo menos 40 pistas que deem condições de pouso e decolagem com segurança e que se possa homologar isso junto à Anac.

    Não temos condições, não temos recursos próprios, mas existe dinheiro dormindo aqui no Fundo Nacional de Aviação Civil...

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PSC - PA) – ... enquanto a turma da burocracia impede o Governo de operar. E nós precisamos resolver essa questão. Isso é uma coisa burocrática que a gente precisa analisar de perto. V. Exa. já foi Governador do seu Estado, compreende muito bem essa situação e sabe que esta Casa tem a responsabilidade de, como a Casa da Federação, a Casa dos Estados, aqui poder soltar isso, adequar, legal e corretamente, a questão fiscal e orçamentária para possibilitar o crescimento do Brasil, construindo a infraestrutura de que ele precisa. O meu Estado espera por isso e espera contar com o bom senso do Governo Federal e com a aquiescência dos meus colegas aqui do Parlamento.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/2019 - Página 30